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Inicio Revista Paulista de Pediatria Prevalência de sequências do Y e de gonadoblastoma em síndrome de Turner
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Vol. 34. Núm. 1.
Páginas 114-121 (marzo 2016)
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1979
Vol. 34. Núm. 1.
Páginas 114-121 (marzo 2016)
Artigo de revisão
Open Access
Prevalência de sequências do Y e de gonadoblastoma em síndrome de Turner
Prevalence of Y‐chromosome sequences and gonadoblastoma in Turner syndrome
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1979
Alessandra Bernadete Trovó de Marqui
Autor para correspondencia
alessandratrovo@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Roseane Lopes da Silva‐Grecco, Marly Aparecida Spadotto Balarin
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Uberaba, MG, Brasil
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Tabela 1. Frequência de sequências do cromossomo Y, identificada por técnicas moleculares, em pacientes com síndrome de Turner
Tabela 2. Cariótipos determinados por citogenética convencional (GTG) nas pacientes com sequências do cromossomo Y identificadas por técnicas moleculares
Tabela 3. Frequência de gonadoblastoma em pacientes com síndrome de Turner e sequências do cromossomo Y
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Resumo
Objetivo

Apresentar a prevalência de sequências do cromossomo Y por técnicas moleculares e de gonadoblastoma em pacientes com síndrome de Turner.

Fontes de dados

Foi feita uma pesquisa bibliográfica no Pubmed, com limite de período entre 2005 e 2014, com os descritores Turner syndrome and Y sequences (n=26) e Turner syndrome and Y chromosome material (n=27). Os critérios de inclusão foram artigos que tivessem relação direta com o tema e publicados no idioma inglês ou português. Foram excluídos aqueles que não cumpriram esses critérios e eram do tipo revisão. Após aplicação desses critérios, 14 foram selecionados.

Síntese dos dados

Os principais resultados quanto à prevalência de sequências do cromossomo Y em síndrome de Turner foram: 1 – cerca de 60% dos estudos foram feitos por pesquisadores brasileiros; 2 – a frequência variou de 4,6 a 60%; 3 – os genes SRY, DYZ3 e TSPY foram os mais investigados; 4 – a técnica de PCR foi empregada exclusivamente em sete estudos e nos sete restantes, associada à FISH. Nove dos 14 estudos apresentaram informações sobre gonadectomia e gonadoblastoma. Dois estudos relataram a maior prevalência para gonadoblastoma (33%). Cinco dos nove estudos referiram prevalência de 10 a 25% e em dois esse valor foi nulo.

Conclusões

De acordo com os dados apresentados, é indicada a pesquisa molecular para sequências do cromossomo Y em pacientes com ST, independentemente do cariótipo. Naquelas com positividade para essas sequências, é necessária a investigação de gonadoblastoma.

Palavras‐chave:
Síndrome de Turner
Cromossomo Y
Gonadoblastoma
Prevalência
Reação em cadeia da polimerase
Disgenesia gonadal
Abstract
Objective

To assess the prevalence of Y‐chromosome sequences and gonadoblastoma in patients with Turner syndrome using molecular techniques.

Data source

A literature search was performed in Pubmed, limiting the period of time to the years 2005 to 2014 and using the descriptors: Turner syndrome and Y sequences (n=26), and Turner syndrome and Y‐chromosome material (n=27). The inclusion criteria were: articles directly related to the subject and published in English or Portuguese. Articles which did not meet these criteria and review articles were excluded. After applying these criteria, 14 papers were left.

Data synthesis

the main results regarding the prevalence of Y‐chromosome sequences in Turner syndrome were: 1–about 60% of the studies were conducted by Brazilian researchers; 2–the prevalence varied from 4.6 to 60%; 3–the most frequently investigated genes were SRY, DYZ3 and TSPY; 4–seven studies used only PCR, while in the remaining seven it was associated with FISH. Nine of the 14 studies reported gonadectomy and gonadoblastoma. The highest prevalence of gonadoblastoma (33%) was found in two studies. In five out of the nine papers evaluated the prevalence of gonadoblastoma was 10 to 25%; in two of them it was zero.

Conclusions

according to these data, molecular analysis to detect Y‐chromosome sequences in TS patients is indicated, regardless of their karyotype. In patients who test positive for these sequences, gonadoblastoma needs to be investigated.

Keywords:
Turner syndrome
Y chromosome
Gonadoblastoma
Prevalence
Polymerase chain reaction
Gonadal dysgenesis
Texto completo
Introdução

A síndrome de Turner (ST) é um distúrbio cromossômico com incidência de uma a cada 2.500 meninas; sua etiologia está associada à monossomia total ou parcial do cromossomo X e o diagnóstico é feito pelo exame do cariótipo.1,2 Um estudo retrospectivo em 260 pacientes com ST mostrou que o aprimoramento da análise cromossômica promoveu uma modificação da proporção dos tipos de cariótipos observados.3

As pacientes com ST exibem como principais sinais clínicos baixa estatura e disgenesia gonadal. Também podem apresentar implantação baixa de cabelos na nuca, estrabismo, ptose palpebral, palato ogival, micrognatia, pescoço curto e/ou alado, linfedema de mãos e/ou pés, encurtamento de metacarpianos e/ou metatarsianos, deformidade de Madelung, cubitus valgus, genu valgum, escoliose e múltiplos nevos pigmentados, anomalias cardiovasculares e renais, doenças tireoidianas, deficiência auditiva, hipertensão, osteoporose e obesidade.1,2 No entanto, essa síndrome é caracterizada por ampla variabilidade fenotípica, desde pacientes com fenótipo clássico até aquelas quase indistinguíveis da população geral.

Mulheres com ST que apresentam material do cromossomo Y têm risco aumentado de desenvolver tumores gonadais, tais como gonadoblastoma e disgerminoma. O gonadoblastoma é um tumor gonadal benigno com um alto potencial de transformação maligna, pode diferenciar‐se em disgerminoma invasivo em 60% dos casos e, também, em outras formas malignas de tumores. Cerca de 90% dos pacientes com gonadoblastoma têm material do cromossomo Y em sua constituição genética. Por esse motivo, a detecção de sequências do cromossomo Y, por técnicas citogenéticas e/ou moleculares, em pacientes com ST é de extrema importância clínica. Em casos positivos, tem sido indicada a cirurgia profilática para retirada das gônadas.4 Dois estudos retrospectivos publicados recentemente revelaram frequências de material do cromossomo Y em ST por citogenética clássica de 6,6% (4/61)5 e 7,6% (12/158).6 Em um desses estudos, 4/12 (33%) das pacientes exibiram gonadoblastoma e em duas esse evoluiu para disgerminona ou teratoma.6 Em outro, com 11 pacientes com distúrbios de diferenciação sexual, sete mostraram fenótipo Turner e cariótipo mosaico de Y em sangue periférico.7 Todas as pacientes com ST foram submetidas à gonadectomia e os achados histopatológicos revelaram que quatro delas (57,1%) tinham gonadoblastoma e em dois casos associação desse com disgerminoma.7 Ainda em relação à citogenética clássica por bandamento GTG, linfócitos de sangue periférico constituem o material de escolha devido à facilidade de obter esse tecido e a análise é, geralmente, feita em 30 metáfases, o que permite a detecção de 10% de mosaicismo.8 Os métodos moleculares têm como vantagem a não necessidade de cultura celular e de apenas uma pequena quantidade de amostra para análise e são mais sensíveis para detecção de baixo mosacismo, frequente em ST.8

Desse modo, o objetivo desta revisão é apresentar a prevalência de sequências do cromossomo Y por técnicas moleculares e gonadoblastoma em pacientes com ST.

Método

Foi feita uma pesquisa bibliográfica no Pubmed, em 24/10/2014, com limite de período entre 2005 e 2014. A figura 1 apresenta o fluxograma dessa busca eletrônica.

Figura 1.

Representação do método e resultados da busca eletrônica.

(0.26MB).
Resultados

A tabela 1 apresenta a frequência de sequências do cromossomo Y, identificada por técnicas moleculares, dos 14 estudos selecionados. O cariótipo dessas pacientes encontra‐se na tabela 2. A frequência de gonadoblastoma, em pacientes com ST com amplificação positiva para o cromossomo Y, consta sumarizada na tabela 3. Essa apresenta informações sobre gonadectomia e gonadoblastoma em ST em nove dos 14 estudos. Os resultados de cinco estudos não constam na tabela 33,14,15,17,21 pelos seguintes motivos: 1 –dois estudos não apresentaram informações sobre gonadectomia e gonadoblastoma no texto;3,21 2 – em dois, os pacientes foram agendados para seguimento clínico17 ou acompanhamento por equipe multidisciplinar composta por biólogo, psicólogo, geneticista, endocrinologista e ginecologista14 e 3 – no outro estudo, a gonadectomia profilática foi oferecida a todas as pacientes que apresentaram sequências do Y, entretanto, as mesmas optaram por acompanhamento periódico por ultrassonografia e tomografia.15

Tabela 1.

Frequência de sequências do cromossomo Y, identificada por técnicas moleculares, em pacientes com síndrome de Turner

Referência  Método e sequência(s) do cromossomo Y e/ou sonda(s) utilizada(s)  n/Origem  PY  Frequência 
Bianco et al.9  PCR: SRY/DYZ3  20/Brasil  35,0% 
Bianco et al.10  PCR: SRY/DYZ3  5/Brasil  60,0% 
Bianco et al.11  PCR: SRY/DYZ3/TSPY  87/Brasil  16  18,5% 
Bianco et al.12  PCR: SRY/TSPY  104/Brasil  17  16,3% 
Barros et al.3  PCR e PCR nested: SRY/TSPY/DYZ3  96/Brasil  10  10,4% 
Barros et al.13  PCR e PCR nested:SRY/TSPY/DYZ3; FISH: DXZ1/DYZ3  101/Brasil  16  15,8% 
Araújo et al.14  PCR: SRY/ZFY/DYZ1/PABY/DYS1/DYZ3  42/Brasil  4,8% 
Bispo et al.15  FISH: CEP X/CEP Y; PCR multiplex: SRY/TSPY/AMGY/DAZ  74/Brasil  6,8% 
Mazzanti et al.16  PCR: SRY/DYZ3; FISH: CEP 18 SA/X SG/Y SO  171/Itália  14  8,2% 
Semerci et al.17  PCR:PABY/SRY/DYS14/AMGY/DYZ3/DYS273/DYS280/DYS218/DYS224/DYS209/DYS231/DYS1/YRRM/DYZ1  40/Turquia  5,0% 
Sallai et al.18  RT‐PCR:SRY/DDX3Y/HSFY1/TSPY; FISH: whole chromosome painting Y/wcp  130/Hungria  9 (RT‐PCR)  6,9% 
      6 (FISH)  4,6% 
Cortés‐Gutiérrez et al.19  PCR: SRY; FISH: CEP‐Y  32/México  9,4% 
Freriks et al.20  FISH: CEP X/CEP Y/SRY; PCR: Yp (SRY) e Yq (sY84/sY86/sY127/sY134/sY254/sY255); RT‐PCR: SRY/DSY14  63/Holanda  7,9% 
Knauer‐Fischer et al.21  FISH: Ycen‐1089/1090; PCR Multiplex: Yp11 (GBY: TSPY/SRY), Yq11 (AZFa/AZFb/AZFc)  60/Alemanha  11,7% 

PY, pacientes com sequência Y; PCR, Polimerase Chain Reaction – Reação em Cadeia da Polimerase; SRY, sex‐determining region on the Y chromosome ou sex releated region Y; Fish, Fluorescence in situ hybridization – Hibridização in situ fluorescente; RT‐PCR, Real‐time PCR; DDX3Y, DEAD/H box polypetide, Y‐chromosome; HSFY1, heat‐shock transcription factor, Y‐linked; AZF, azoospermia factor; CEP X, X‐specific centromeric probe; CEP Y, Y‐specific centromeric probe; GBY, gonadoblastoma Y gene; TSPY, testis‐specific protein Y‐encoded ou testis specific protein Y.

Tabela 2.

Cariótipos determinados por citogenética convencional (GTG) nas pacientes com sequências do cromossomo Y identificadas por técnicas moleculares

Referência  Cariótipos 
Bianco et al.9  45,X: n=7 
Bianco et al.10  45,X/46,X,+mar: n=2; 45,X/45,X,add(15)(p11): n=1 
Bianco et al.11  45,X: n=12; 45,X/46,X,+mar: n=2; 45,X/45,X,add(15)(p11): n=1; 45,X/46,X,r(?): n=1 
Bianco et al.12  45,X: n=12; 45,X/46,X,+mar: n=2; 45,X/45,X,add(15)(p11): n=1; 45,X/46,X,r(?): n=1; 45,X/47,XXX: n=1 
Barros et al.3  45,X/46,X,+mar: n=5; 45,X: n=3; 45,X/46,X,r(?): n=2 
Barros et al.13  45,X: n=3; 45,X/46,XY: n=5; 45,X/46,X,+mar: n=5; 45,X/46,X,r(?): n=2; 45,X/47,XYY: n=1 
Araújo et al.14  45,X: n=2 
Bispo et al.15  45,X/46,XY: n=2; 45,X: n=1; 45,X/46,XY: n=1; 46,X,i(Xq): n=1 
Mazzanti et al.16  45,X/46,XY: n=6; 45,X: n=2; 45,X/46,X,idic(Y): n=3; 45,X/46,X,+mar: n=2; 45,X/46,XY/46,X,idic(Y): n=1 
Semerci et al.17  45,X: n=2 
Sallai et al.18  45,X: n=3; 45,X/46,XY: n=3; 45,X/46,X,+mar: n=2; 45,X/46,X,del(Xq): n=1 
Cortés‐Gutiérrez et al.19  45,X/46,X,+mar: n=1; 45,X/46,XY: n=1; 45,X: n=1 
Freriks et al.20  45,X: n=5 
Knauer‐Fischer et al.21  45,X: n=2; 45,X/46,X,idicY(q11.2): n=2; 46,X,i(X)(q10): n=1; 46,X,del(X)(q12 ou q13.1): n=1; 46,X,der(X)t(X;Y)(p22.3;q11.21): n=1 
Tabela 3.

Frequência de gonadoblastoma em pacientes com síndrome de Turner e sequências do cromossomo Y

Referência  PY/P total  PG/PY  PG operadas  % com gonadoblastoma  Idade da PG (anos) 
Bianco et al.9  7/20  4/7 (57,1)  25,0  16 
Bianco et al.10  3/5  3/3 (100)  – 
Bianco et al.11  16/87  11/16 (68,7)  18,2  16 e 19a 
Bianco et al.12  17/104  12/17 (70,6)  16,7  16 e 19a 
Barros et al.13  16/101  16/16 (100)  18,8  15,9b (OCT4+: GE);18,2b (OCT4+: GD);17,7b (OCT4+: GD e GE) 
Mazzanti et al.16  14/171  12/14 (85,7)  33,3  7,64 e 2,8: GBBb15,9 e 11,6: GBMb 
Sallai et al.18  9/130  9/9 (100)  11,1  5,5b 
Cortés‐Gutiérrez et al.19  3/32  3/3 (100)  33,3  10 
Freriks et al.20  5/63  4/5 (80)  – 

PY/P total, pacientes com sequência Y em relação ao total de pacientes; PG/PY, pacientes com gonadoblastoma em relação às pacientes com sequência Y; PG operadas, pacientes com gonadoblastomas submetidas à cirurgia; Pac, paciente; OCT4, octamer‐binding transcription factor 4; G, gônada; D, direita; E, esquerda; GBB, gonadoblastoma bilateral; GBM, gonadoblastoma monolateral.

a

Idade no diagnóstico.

b

Idade na gonadectomia.

Discussão

O presente estudo, do tipo revisão bibliográfica, apresentou a prevalência de sequências do cromossomo Y e o risco de desenvolvimento de gonadoblastoma em pacientes com ST.

Sequências do cromossomo Y

Dos 14 estudos inclusos nesta revisão, cerca de 60% foram feitos por pesquisadores brasileiros.3,9‐15 Quatro foram publicados pelo mesmo grupo de pesquisadores9‐12 e os dois que relataram maior prevalência de sequências do cromossomo Y analisaram amostras de diferentes tecidos (sangue periférico, células de mucosa oral e raiz de cabelo).9,10 Um deles avaliou 20 pacientes com ST e cariótipo 45,X9 e o outro, cinco com anomalias cromossômicas, tais como cromossomo marcador, material adicional ou cromossomo em anel.10 Três estudos9‐11 mostraram que todas as pacientes investigadas apresentaram amplificação para o gene SRY e apenas algumas para DYZ3 e TSPY. Esse dado mostra que especialmente o gene SRY deve ser investigado em pacientes com ST.9‐11 Em seu estudo publicado em 2010, Bianco et al.12 também avaliaram a expressão gênica (SRY, TSPY, SF1, WT1, DAX1, OCT4, GATA4, FOG2, STRA8) nas gônadas (direita e esquerda) de seis pacientes submetidas à gonadectomia e não observaram diferença na expressão desses genes nesse tecido tanto em pacientes quanto em controles, exceto em um caso em que houve alta expressão dos genes SRY, TSPY e OCT4 em ambas as gônadas [cariótipo: 45,X/45,X,add(15)(p11)]. Esses nove genes investigados estão envolvidos na determinação sexual, diferenciação e tumorigênese gonadal.12 Nesse estudo,12 todas as pacientes exibiram amplificação para o gene SRY, o que reforça os achados previamente publicados.9‐11 Os estudos apresentados acima empregaram exclusivamente a técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR) para investigação de sequências do cromossomo Y em ST9‐12 e relataram frequências que variaram de 16,3 a 60%.

Dois estudos conduzidos por outro grupo de pesquisadores também usaram a PCR e PCR neste.3,13 Um deles analisou sequências do cromossomo Y em 96 pacientes com ST de um total de 260.3 Essa pesquisa foi indicada somente nos casos com: a) cariótipo 45,X e cromatina X negativa; b) presença no cariótipo de cromossomos marcadores, ou seja, fragmentos cromossômicos de origem indefinida e c) impossibilidade da identificação citogenética da origem de cromossomos em anel. Desse modo, 96 pacientes cumpriram esses critérios e dessas 10 exibiram amplificação positiva para os genes investigados. Nesse mesmo estudo, seis casos de cromossomo Y íntegro haviam sido identificados previamente por citogenética clássica (45,X/46,XY: n=5 e 45,X/47,XYY: n=1). Em um estudo posterior, esses mesmos autores avaliaram 101 pacientes de 260 com ST por PCR e quando positivo, empregaram a técnica de Fish (hibridização in situ fluorescente).13 Os 101 casos analisados por PCR para sequências do cromossomo Y apresentaram cariótipo 45,X e corpúsculo de Barr negativo (n=73), cromossomo marcador (n=25) e em anel (n=3).

Duas outras pesquisas referiram os menores valores de frequências do cromossomo Y dentre os estudos conduzidos no Brasil.14,15 Em quatro pacientes com ST, a detecção de sequências do cromossomo Y foi identificada apenas por PCR [cariótipos: 45,X e 46,X,i(Xq)].14,15 Assim, a inclusão da técnica de PCR na rotina de investigação na ST seria indicada.14 Vale destacar que seis estudos brasileiros empregaram exclusivamente a técnica de PCR para investigação de sequências do cromossomo Y. As vantagens dessa técnica incluem: 1 – rapidez de execução, 2 – baixo custo, 3 – processamento de diversas amostras simultaneamente, 4 – aplicabilidade em rastreamento (screening) de um grande número de pacientes e 5 – alta sensibilidade no reconhecimento do mosaicismo. O emprego da técnica de PCR para investigação de 14 sequências do cromossomo Y identificou uma prevalência de 5%,17 valor semelhante àquele referido por um estudo que analisou apenas seis sequências.14

As técnicas de Fish e PCR foram, concomitantemente, empregadas em vários estudos.15,16,18‐21 Um deles, publicado em 2005, identificou uma frequência de aproximadamente 6% por citogenética clássica (10/171) e 8% por análise molecular (14/171).16 Em outro estudo19 o bandamento GTG revelou três casos positivos: cariótipos 45,X/46,X,mar; 45,X/46,XY e 45,X. A análise por Fish em linfócitos revelou: 1) que o cromossomo marcador era o Y, 2) confirmou o cromossomo Y identificado previamente por citogenética clássica e 3) não identificou material do cromossomo Y, respectivamente. A análise de Fish de tecido gonadal mostrou que o cromossomo Y estava presente em 57; 46 e 26% das células, respectivamente. A pesquisa por PCR/SRY em linfócitos e gônadas foi positiva nos três casos. O caso considerado Y negativo em linfócitos por GTG e Fish (45,X) apresentou positividade para o SRY por PCR/linfócitos. Diante disso, os autores sugeriram: 1 – o emprego da PCR, além da análise citogenética convencional, para descartar a possibilidade de mosaicismo oculto do cromossomo Y e 2 – o uso da técnica de Fish somente após um resultado positivo para PCR, pois ela é dispendiosa e laboriosa.19 Além de Fish, a técnica de PCR em tempo real (RT‐PCR) também foi aplicada.18,20 O primeiro estudo18 identificou mosaicismo do cromossomo Y, por análise citogenética convencional, em três das 130 pacientes investigadas (cariótipos: 45,X/46,XY n=3). Duas pacientes exibiram mosaicismo de todo o cromossomo Y enquanto a outra, apenas de parte do Y. Por RT‐PCR, nove pacientes apresentaram positividade para o Y. Das quatro sondas específicas do cromossomo Y usadas na técnica de RT‐PCR, duas (SRY e TSPY1) estão no braço curto do cromossomo Y (Yp) e duas (DDX3Y e HSFY1) no braço longo (Yq). Seis pacientes tiveram amplificação para as quatro sequências, três para duas sequências (SRY e TSPY1) ou três (SRY, TSPY1 e DDX3Y), ou seja, três pacientes não mostraram complicações do gene HSFY1 e uma delas exibiu perda da região DDX3Y, o que sugere deleção de Yq. A análise por Fish confirmou positividade para o Y em seis casos. Desse modo, a frequência de sequências do cromossomo Y foi de 2,3%; 4,6% e 6,9% pelas técnicas de banda GTG, FISH e RT‐PCR, respectivamente. No estudo de 201320 com 162 pacientes com ST, 75 tinham cariótipo 45,X e dessas 63 concordaram em fazer investigações moleculares adicionais. Sequências do Y foram identificadas por Fish em cinco pacientes em amostras de células orais, mas não em linfócitos de sangue periférico por PCR. A análise por RT‐PCR revelou a presença de SRY e DYS14 em duas delas.20 Em outro estudo, o uso combinado de PCR e Fish permitiu a identificação de uma frequência de aproximadamente 12% de sequências do cromossomo Y em ST. Das sete pacientes com sequências do Y,21 quatro não o apresentavam no cariótipo.

Em suma, no presente estudo a frequência de sequências do cromossomo Y em pacientes com ST variou de 4,6% a 60%. Segundo a literatura, essa prevalência é de 0% a 61%.19 Essa diferença pode ser devida aos seguintes fatores: critérios de seleção das pacientes, tamanho da amostra, metodologia e marcadores do cromossomo Y usados. Quando o tecido analisado foi somente sangue periférico, a prevalência de sequências do Y variou de 4,6% a 18,5%.11‐18,21 No entanto, nos estudos nos quais mais que um tecido foi avaliado, essa prevalência foi ainda maior.9,10 Os genes SRY, DYZ3 e TSPY foram os mais amplamente investigados. O gene SRY está localizado no braço curto do cromossomo Y (Yp11.3) e o DYZ3 na região pericentromérica em Yp12. Ambos os genes desempenham papel na determinação sexual e na estabilidade cromossômica, respectivamente.22 O TSPY (testis‐specific protein Y encoded), localizado no loco do gonadoblastoma no cromossomo Y (GBY), em Yp11.2, está envolvido no desenvolvimento de gonadoblastoma e sua expressão foi detectada nesse tecido e em testículo.23‐25 Quanto à técnica, sete estudos3,9‐14,17 empregaram unicamente a PCR para investigação de sequências do cromossomo Y em ST e nos sete estudos restantes também Fish.13,15,16,18‐21 Um achado intrigante foi relatado por um desses estudos que referiu negatividade para sequências do Y em todos os 56 casos, inclusive nos cinco positivos por FISH/células bucais.20 Esse resultado contradiz aqueles publicados na literatura que recomendam o uso da PCR na investigação de sequências do cromossomo Y em ST. Os autores atribuem essa sensibilidade baixa à dificuldade de detectar mosaicismo inferior a 10%.20 Mosaicismo cromossômico é definido como a presença de duas ou mais linhagens celulares diferentes em um mesmo indivíduo resultante de não disjunção pós‐zigótica. Quando esse ocorre em células já diferenciadas, o mosaicismo pode ser confinado a um ou poucos tecidos.26 Nesse sentido, a investigação de sequências do cromossomo Y em tecidos com diferentes origens embrionárias é aconselhada, como, por exemplo, as células de mucosa oral, que podem ser facilmente obtidas por procedimentos não invasivos.

De nosso conhecimento, há apenas um estudo de revisão com enfoque nas características clínicas e genéticas da ST, mosaicismo, cromossomo Y e risco de tumor gonadal.8 Os dados apresentados nesse estudo apontaram: 1 – que a detecção de sequências do cromossomo Y em ST, independentemente do cariótipo, é necessária para prevenir o desenvolvimento de gonadoblastoma e 2 – a técnica de PCR deve ser empregada devido a alta sensibilidade, baixo custo e fácil execução.

Após a confirmação da ST pela citogenética, sugere‐se a inclusão da técnica de PCR como complementação para detecção de sequências do cromossomo Y nessas pacientes. Essa técnica molecular é mais sensível e pode detectar a presença de material do cromossomo Y.

Gonadoblastoma

O gonadoblastoma, frequentemente observado na segunda década de vida, é um tumor gonadal benigno com um alto potencial de transformação maligna.4 É uma lesão com bom prognóstico, pode diferenciar‐se em tumor de células germinativas, como disgerminomas, e em menor frequência em teratomas, carcinoma embrionário, tumor de saco vitelínico e coriocarcinoma.13 Esse tumor está presente principalmente em mulheres com disgenesia gonadal e aproximadamente 95% delas têm material do cromossomo Y em seu genoma. Portanto, a detecção dessas sequências por técnicas citogenéticas e/ou moleculares tem sido estimulada para nortear a indicação profilática de cirurgia para retirada das gônadas nesse grupo de pacientes, uma vez que não são, em geral, tumores metastáticos e pela possibilidade de cura com a sua retirada.4 Mulheres com ST exibem disgenesia gonadal e, portanto, a detecção de sequências do cromossomo Y nessas pacientes é de extrema importância clínica.

A maior prevalência para gonadoblastoma nessa revisão foi 33%16,19 e está de acordo com outros estudos.6,27 Esse valor foi identificado em uma pesquisa recente e as quatro pacientes com ST tinham cariótipo 45,X/46,XY.6 Em duas delas, foi observado um disgerminoma (idade na cirurgia: 11,25 anos) e um teratoma (15 anos). Nas duas pacientes com gonadoblastoma apenas, a idade na cirurgia em anos foi 1,5 e 11,7.6 Outro estudo publicado recentemente relatou incidência de 35,3% de gonadoblastoma.28 Vinte pacientes com ST exibiram sequências do cromossomo Y de um total de 217 e 17 delas foram submetidas à gonadectomia.28 Uma frequência ainda maior foi relatada por Alvarez‐Nava et al.,29 que investigaram 52 pacientes, detectaram quatro com sequências do cromossomo Y (7,7%), todas foram submetidas à gonadectomia e duas apresentaram gonadoblastoma (50%). Cinco estudos referiram incidências de 10% a 25%.9,11‐13,18 Estudos prévios têm relatado frequências de 7%‐10%30 e 16,7%.31 Esses achados evidenciam que a frequência de gonadoblastoma é variável e pode ser reflexo de uma investigação precoce.

Nos estudos conduzidos por Bianco et al.,9‐12 os resultados obtidos foram: 1 – uma paciente 45,X com gonadoblastoma bilateral e amplificação positiva para o gene SRY nos três tecidos analisados;9 2 – duas pacientes com gonadoblastoma bilateral [45,X: SRY+ e 45,X/46,X,r(?): SRY+DYZ3+];11 3 – duas pacientes com gonadoblastoma bilateral [45,X: SRY+ e 45,X/46,X,r(?): SRY +].12 Apesar de não ter sido identificado paciente com gonadoblastoma, o estudo histopatológico das gônadas de uma paciente revelou hiperplasia celular e luteoma estromal.10 Estudos posteriores também mostraram pacientes com esses achados histopatológicos.11,12

Outro gene associado à gonadoblastoma é o OCT4 (octamer‐binding transcription factor 4),12,13 também conhecido como OCT3 ou POU5FI. Esse gene é considerado um marcador de tumores de células germinativas, tais como gonadoblastoma, disgerminoma, seminoma e outros, e sua expressão foi detectada por imuno‐histoquímica em 100% dos casos de gonadoblastoma.32 O estudo publicado em 2010 mostrou alta expressão dos genes SRY, TSPY e OCT4 em ambas as gônadas de uma paciente com resultado positivo por PCR (SRY+ e TSPY+).12 Outro estudo revelou que a análise imuno‐histoquímica para OCT4 foi positiva em três casos (cariótipos: 45,X/46,XY: n=2 e 45,X/46,X,+mar: n=1), resultado sugestivo de tumor de células germinativas (gonadoblastoma ou carcinoma in situ).13 Nessa pesquisa, os 16 casos com sequências do Y foram submetidos à gonadectomia bilateral e as gônadas direita e esquerda avaliadas por coloração convencional com hematoxilina & eosina (H&E) e imuno‐histoquímica para OCT4. Neoplasia gonadal não foi detectada em alguma das 32 gônadas avaliadas por H&E; entretanto, quatro gônadas (12%) de três pacientes (19%) exibiram positividade para OCT4, o que sugere a existência de tumores das células germinativas.13 Por esse motivo, esses autores recomendam um estudo histopatológico específico em gônadas, tais como imuno‐histoquímica com OCT4 para avaliar o risco real de desenvolvimento de tumores gonadais em pacientes com ST e sequências do cromossomo Y.12,13

Ainda em relação a pesquisas que relataram maior prevalência de gonadoblastoma, uma delas referiu duas pacientes com gonadoblastoma monolateral (cariótipos: 45,X e 45,X/46,X,+mar) e duas com gonadoblastoma bilateral (cariótipos: 45,X/46,XY)16 e outra, uma paciente 45,X/46,XY com gonadoblastoma.19 No estudo publicado em 2010, a cirurgia profilática foi feita em todas as nove pacientes com material do cromossomo Y antes dos 20 anos e uma delas, uma menina de cinco anos, a paciente mais jovem do estudo, exibiu gonadoblastoma bilateral sem qualquer sinal clínico.18 Essa paciente apresentou cariótipo 45,X/46,XY (GTG), wcpY+93 (Fish) e positividade para todas as sequências específicas do Y (SRY, TSPY1, DDX3Y e HSFY1). A histologia de tecido ovariano não revelou gonadoblastoma em quatro das pacientes submetidas à gonadectomia.20

Um estudo histopatológico recente revelou tumores nas gônadas em seis de 11 pacientes (56%), incluindo quatro de sete (57%) com ST.7 Duas pacientes com ST exibiram gonadoblastoma nas gônadas direita e esquerda [cariótipos e idade na gonadectomia, respectivamente: 45,X/45,X,t(15;Y)(p11.2;q11.2) e dois anos e 11 meses; 45,X/46,XY e 10 anos e três meses]. Gonadoblastoma associado à disgerminoma foi observado em apenas uma gônada (direita em uma paciente e esquerda na outra) em outras duas pacientes (cariótipos 45,X/46,XY e 46,X,+der(15)/46,XY e idades: 11 anos e seis meses e 15 anos e quatro meses, respectivamente). A paciente mais jovem com ST submetida à gonadectomia tinha apenas dois anos.7

De acordo com os dados apresentados, pode‐se concluir que é indicada a pesquisa molecular para sequências do cromossomo Y em pacientes com ST, independentemente do cariótipo, como complementação ao diagnóstico citogenético. A técnica sugerida é a PCR por ser de baixo custo, sensível, rápida e possibilitar o rastreamento de várias sequências do cromossomo Y simultaneamente. Também seria adequada a análise de um segundo tecido, além de sangue periférico. Naquelas pacientes com positividade para as sequências do cromossomo Y, é necessária a investigação de gonadoblastoma.

Financiamento

O estudo não recebeu financiamento.

Conflitos de interesses

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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