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Vol. 31. Núm. 1 - 2.
Páginas 16-21 (septiembre 2014)
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Vol. 31. Núm. 1 - 2.
Páginas 16-21 (septiembre 2014)
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Nefrectomia Parcial Laparoscópica - experiência do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto
Laparoscopic Partial Nephrectomy - Oporto's hospital centre experience
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D. Gil-Sousaa,
Autor para correspondencia
diogogil85@gmail.com

Autor de correspondência.
, D. Oliveira-Reisb, F. Coutinhoc, J. Soaresd, L. Osórioe, A. Fragaf
a Interno Urologia do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
b Interno Urologia do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
c Interno Oncologia Médica do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
d Assistente Hospitalar Graduado, Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
e Assistente Hospitalar, Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
f Director de Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto, Portugal
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Tabela 1. Casuística das NPL do CHP
Resumo

Introdução: A laparoscopia está a desafiar o papel da abordagem aberta na nefrectomia parcial, ocupando progressivamente um papel de destaque na cirurgia “nephron-sparing”.

Objectivo/Material e métodos: Descrever a experiência do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto (CHP) em Nefrectomia Parcial Laparoscópica (NPL), através da análise retrospectiva de 31 doentes submetidos a NPL entre janeiro/2010 e março/2013.

Resultados: Abordagem laparoscópica representou 32,3% das nefrectomias parciais realizadas no Serviço nos últimos 3 anos. A população apresentava idade média de 55,9 anos [25-76 anos], com 64,5% do sexo masculino. A principal indicação foi massa renal, cuja histologia mostrou malignidade em 73,3%, enquanto 26,7% eram benignas (Angiomiolipoma). Tamanho tumoral médio 27,4mm [17-45mm], sendo a maioria exofítico (75%) e localizando-se na região média (45,2%) e pólo inferior (35,5%). Taxa de margem positiva 7,1%. Abordagem transperitoneal foi realizada em 90,3%. Tempo operatório médio 199min [105-324min], com tempo médio de isquemia quente 22,8min [7-46min]. A maioria dos procedimentos foi realizada com clampagem arterial selectiva, com apenas 17,9% procedimentos sem clampagem. Taxa de conversão 9,7% (por hemorragia e dissecção difícil do pedículo). Um doente necessitou de reintervenção devido a hematoma peri-renal com necessidade de drenagem percutânea. Tempo médio de internamento foi 5,4 dias [3-16 dias]. Nenhum dos doentes necessitou de diálise, ou apresentou Taxa de Filtração Glomerular (TFG) < 30ml/min em qualquer momento durante o seguimento, verificando-se uma variação de apenas -4,7% da TFG após a cirurgia.

Conclusão: NPL apresentou bons resultados oncológicos em tumores renais T1, associado a um tempo de internamento curto, baixo índice de complicações e excelentes resultados funcionais.

© 2014 Associação Portuguesa de Urologia. Publicado por Elsevier España, S.L.U. Todos os direitos reservados.

Palavras-Chave:
Nefrectomia
Laparocopia
Neoplasia
Células Renais
Abstract

Introduction: Laparoscopy is currently challenging the role of open approach for nephron-sparing surgery. We describe our experience of laparoscopic partial nephrectomy (LPN).

Material and methods: Thirty-one patients submitted to LPN between January 2010 and March 2013 were retrospectively reviewed and analysed.

Results: Laparoscopic technique accounted for 32,3% of total partial nephrectomies performed in our department. The mean age was 55,9years (range 25-76years) and 64,5% of patients were male. The main indication for nephron-sparing surgery was renal tumours; only three patients had partial functional exclusion (two secondary to lithiasis and one with an ectopic ureter). Those presenting with renal masses, 73,3% were malignant (renal cell carcinoma) while 26,7% had benign disease (angiomyolipoma). Positive margin rate was 7,1%. The mean tumour size was 27,4mm (range 17-45mm); the majority were exophytic (75%) and located in the middle region (45,2%) and lower pole (35,5%). Transperitoneal approach was performed in 90,3% of the patients. Mean operative time was 199min (range 105-324min) with mean warm ischemia time of 22,8min (range 7-46min). The majority of cases were performed only with arterial clamping with 17,9% no-clamping procedures. Double J stent was placed in 16,1% of the patients. The conversion rate was 9,7% (two patients by uncontrolled bleeding and one due to difficult pedicle dissection). One patient needed reintervention due to perirenal hematoma requiring percutaneous drainage. No patient needed dialysis, neither presented GFR < 30ml/min at any time during follow-up. Comparing the evolution of the GFR we were able to confirm the importance of this procedure in preserving the renal function with -4,7% of variation of GFR after surgery.

Conclusions: Laparoscopic partial nephrectomy is a technique with good oncological outcomes in stage T1 renal tumours, associated with short hospital stay, low rate of complications and excellent functional results, while preserving renal function.

© 2014 Associação Portuguesa de Urologia. Published by Elsevier España, S.L.U. All rights reserved.

Keywords:
Nephrectomy
Laparoscopic
Carcinoma
Renal Cell
Texto completo
Introdução

O carcinoma de células renais (CCR) é o tumor mais comum do rim, correspondendo a 3% do total das neoplasias na população geral, e é responsável por 85% dos tumores do rim, com uma incidência ajustada à idade de 12,8 casos por 100.000 e mortalidade ajustada à idade de 4,2 por 100.0001.

Classicamente, a nefrectomia radical tem sido descrita como a opção terapêutica standard para abordagem de massas renais suspeitas de malignidade. No entanto, actualmente, diversos estudos indicam a Nefrectomia Parcial como uma opção com resultados de controlo oncológico similares à abordagem radical2, e com a vantagem de reduzir o risco de desenvolvimento de doença renal crónica (DRC), em comparação com a nefrectomia radical3-5. A Nefrectomia Parcial Aberta é actualmente o tratamento de referência para pequenas massas renais6.

Evidência crescente na literatura defende esta opção mesmo em tumores com tamanho superior a 4cm (4 a 7cm), com base em resultados de vários estudos que demostraram controlo oncológico semelhante à nefrectomia radical7,8.

Actualmente, é defendido que as dimensões tumorais não devem ser, por si só, uma limitação para a realização de Nefrectomia Parcial. A evolução da função renal no pós-operatório, juntamente com os resultados oncológicos e cirúrgicos, é cada vez mais um marcador de qualidade e sucesso na terapêutica desta patologia9.

A Nefrectomia Parcial Laparoscópica (NPL) foi introduzida em 1993, tendo-se assumido como alternativa válida à Nefrectomia Parcial Aberta, quando realizada por urologistas com experiência em laparoscopia10,11.

A abordagem laparoscópica da Nefrectomia Parcial, aplicada mais activamente na prática clínica no final da década de 90, gerou grande interesse e investimento devido às importantes vantagens na rápida recuperação funcional e estética12. A técnica laparoscópica está a desafiar o papel da abordagem aberta na Nefrectomia Parcial, ocupando cada vez mais um papel de destaque na cirurgia “nephron-sparing”.

Não obstante, a experiência inicial da NPL estava associada a tempos de isquemia prolongados e complicações pós-operatórias graves em comparação com a abordagem aberta13. Com a progressão da curva de aprendizagem e o incrível incremento da laparoscopia, juntamente com várias modificações da técnica, os resultados melhoraram exponencialmente14.

Neste aspecto, o tempo de isquemia quente é um factor decisivo, sendo ainda assunto de discussão e investigação intensa o limite ideal. Este cut-off recomendado de tempo de isquemia quente tem sido reduzido ao longo do tempo, sendo actualmente indicado um tempo inferior a 20minutos como o ideal15.

Estes objectivos podem ser alcançados com abordagem laparoscópica, com as vantagens inerentes a uma técnica minimamente invasiva. No entanto, a longa curva de aprendizagem, a elevada experiência e domínio de aptidões laparoscópicas exigidos para atingir os melhores resultados são ainda uma limitação importante para a selecção desta opção cirúrgica de uma forma mais generalizada9.

Em relação à abordagem robótica, uma realidade crescente em diversas áreas urológicas, ainda não existem estudos randomizados comparando os resultados oncológicos com a NPL.

Material e métodos

Descrevemos a experiência do serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto (CHP) em NPL, através da análise retrospectiva de trinta e um doentes submetidos a NPL entre janeiro de 2010 e março de 2013.

Foram analisadas as variáveis relacionadas com a população (sexo, idade, raça, ASA, comorbilidades relevantes), patologia (indicação cirúrgica, tamanho tumoral, localização, lateralidade, resultado histógico e margens de ressecção), procedimento cirúrgico (via de abordagem laparoscópica, tempo de cirurgia, tempo de isquemia a quente, técnica de clampagem vascular, perda sanguínea e necessidade de transfusão sanguínea, colocação de catéter ureteral JJ, necessidade de conversão em cirurgia aberta), seguimento no pós-operatório (tempo de internamento, complicações pós-operatorias), e evolução da função renal durante o seguimento (através do cálculo da Taxa de Filtração Glumerular (TFG) pela fórmula Cockroft-Gault em 3 períodos: pré-operatório, durante o internamento (dia 1 a 3 de pós-operatório) e último registo durante o seguimento).

Como indicador da evolução da função renal os autores utilizaram a percentagem de alteração da TFG, segundo a fórmula (eTFGfollow-up - eTFGpré-op)/ eTFGpré-op X 100.

O tratamento estatístico dos dados foi realizado utilizando o software estatístico SPSS V.21.

Resultados

A abordagem laparoscópica foi seleccionada em 32,3% das nefrectomias parciais realizadas no serviço de Urologia do CHP nos últimos 3 anos (Janeiro/2010 a Março/2013). Ao longo deste período a abordagem laparoscópica desta patologia foi aumentando de forma constante no serviço de Urologia do CHP, num total de 31 procedimentos, realizado por 2 equipas cirúrgicas (4 cirurgiões).

A população em estudo apresentava uma idade média de 55,9 anos (variando de 25-76 anos), com 64,5% dos doentes do sexo masculino.

A principal indicação para esta abordagem cirúrgica “nephron-sparing” consistiu em massas renais suspeitas de malignidade, com apenas três doentes a apresentarem exclusão funcional parcial (dois secundários a litíase e um por ureter ectópico). Entre aqueles que se apresentaram com massas renais, 73,3% eram malignas (97% com evidência de carcinoma de células renais, com apenas um caso de tumor neuroendócrino), correspondendo as restantes a doença benigna (Angiomiolipoma).

A taxa de margem positiva foi de 7,1%, o que correspondeu a 2 casos de margem positiva. Um dos doentes apresentava um angiomiolipoma e portanto teve alta da consulta; o segundo doente revelou na anatomia patológica carcinoma neuroendócrino, tendo realizado totalização de nefrectomia radical 2 meses após a cirurgia de nefrectomia parcial.

O tamanho médio do tumor foi 27,4mm (intervalo de 17-45mm), sendo a maioria exofítico (75%) e predominando na região média (45,2%). 35,5% das massas localizavam-se no pólo inferior, e 19,3% no polo superior.

A abordagem transperitoneal foi realizada em 90,3% dos pacientes, com apenas 9,7% dos doentes a serem abordados por retroperitoneoscopia. O tempo operatório médio foi de 199min (intervalo 105-324min), com tempo de isquemia quente média de 22,8min (variando de 7-46min). A maioria dos procedimentos foi realizada com clampagem arterial selectiva (clampagem isolada da artéria renal), com apenas 17,9% procedimentos sem clampagem. Cateterismo ureteral com Duplo J foi realizado em 16,1% dos pacientes.

A taxa de conversão foi de 9,7% (dois doentes por hemorragia de difícil controlo e um devido a dissecção do pedículo difícil). Um doente desenvolveu um abcesso peri-renal que resolveu com antibioterapia intravenosa. Apenas um doente necessitou de reintervenção devido a hematoma peri-renal com necessidade de drenagem percutânea.

O tempo médio de internamento foi 5,4 dias (variando de 3-16 dias). A TFG foi avaliada em três momentos (através da fórmula de Cockcroft-Gault): antes da cirurgia (93,4ml/min), durante o internamento (90,2ml/min) e um mês de pós-operatório (87,7ml/min). Nenhum doente necessitou de diálise ou apresentou TFG < 30ml/min em qualquer momento durante o seguimento. Analisando a evolução da TFG ao longo dos 3 tempos referidos, observou-se uma variação de apenas - 4,7% da TFG após a cirurgia (tabela 1).

Tabela 1.

Casuística das NPL do CHP

31 doentes 
Sexo  Masculino - 64,5% 
  Feminino - 35,5% 
Raça  Caucasiana - 100% 
Idade  55,9 anos ± 12,5 (25-76) 
Indicação cirúrgica  Exclusão funcional parcial - 9,7% 
  Massas renais - 90,3% 
Malignidade  73,3% 
Tumor (tamanho)  27,4mm ± 8,3 (17-45) 
Localização  Polo superior - 19,4% 
  Região média - 45,2% 
  Polo inferior - 35,5% 
Exofítico  75% 
Abordagem Laparoscópica  Transperitoneal - 90,3% 
  Retroperitoneoscopia - 9,7% 
Tempo de Cirurgia  199min ± 53,8 (105-324) 
Tempo de Isquemia Quente  22,8min ± 8,9 (7-46) 
Clamping  Arterial - 67,9% 
  Arterial e Venoso - 10,7% 
  Em Bloco - 3,6% 
  No isquemia - 17,8% 
Cateterimo ureteral  16,1% 
Conversão  9,7% 
Complicações  Leak urinário - 0 
  Pneumotórax - 0 
  Necessidade de transfusão - 0 
  Abcesso perirrenal - 1 caso 
  Hematoma perirrenal - 1 caso 
  Reintervenção - 1 caso (drenagem percutânea de hematoma) 
  Diálise permanente - 0 
  Diálise temporária - 0 
  GFR < 30ml/min - 0 
Tempo de internamento  5,4 dias ± 2,6 (3-16) 
Margem positiva  7,1% 
TFG  Pré-operatório - 93,4ml/min ± 28,5 
  Pós-operatório - 90,2ml/min ± 28,1 
  Último registo follow-up - 87,7 ± 27,7 
Variação TFG (pré-op → último registo)  -4,7% 
Discussão

Os autores apresentam a experiência do serviço de Urologia do CHP na abordagem laparoscópica da nefrectomia parcial entre Janeiro de 2010 e Março 2013, período em que o serviço iniciou uma produção crescente deste procedimento que exige elevada diferenciação e experiência na abordagem laparoscópica.

A opção de clampagem foi preferencialmente arterial selectiva após dissecção cuidadosa do hilo renal. No entanto, em 17,8% dos casos optou-se por um procedimento sem clampagem (sem isquémia), correspondendo a casos seleccionados de tumores pequenos e exofíticos; os autores optaram por não incluir o tempo de isquemia 0 na média global do tempo de isquemia quente.

O tempo médio de isquemia quente foi 22,8min. Este valor está dentro de intervalo de grandes séries internacionais, ainda que a duração “segura” de isquemia quente seja tema de debate e controvérsia, com frequentes alterações na referência ao tempo máximo ideal. Actualmente, existem diversos estudos que recomendam tempos de clampagem inferiores a 20min16.

Estudos experimentais demonstraram que o dano renal e a morte celular começa após 20-30min de clamping, sendo o tempo de iquemia quente considerado em recente reunião de consenso como o factor de risco cirúrgico modificável mais importante para o desenvolvimento de doença renal crónica no pós-operatório17.

Diversos estudo demostraram uma associação entre lesão renal e tempo de isquemia, no entanto, ainda não existem dados que possam confirmar uma curva linear entre tempo de isquemia - deterioração da função renal17.

Na tentativa de diminuir o compromisso da função renal, bem como diminuir o risco de desenvolvimento de DRC no pós-operatório imediato e a longo-prazo, surgiram diversos métodos para reduzir a temperatura renal durante a clampagem vascular. Na nossa série utilizamos geralmente soro fisiológico frio, que se instila antes da laqueação da artéria renal através do canal de irrigação do sistema aspirativo. No entanto, estas técnicas de arrefecimento renal, para além da dificuldade técnica da sua aplicação e da impossibilidade de confirmação precisa da diminuição da temperatura intraparenquimatosa renal, ainda carecem de estudos prospectivos randomizados a confirmar a sua validade e relevância na preservação da função renal17.

Os autores apresentam uma taxa de margem cirúrgica positiva de 7,1%, discretamente superior à descrita na literatura. Este valor deve ser interpretado à luz de um reduzido número de casos da série em questão (em comparação com grandes séries internacionais), e um dos dois casos de margem positiva revelou-se uma lesão benigna no estudo anatomo-patológico (angiomiolipoma). A outra lesão que cursou com margem positiva tratava-se de um tumor neuroendócrino, tendo sido submetido a totalização de nefrectomia radical 2 meses após a NPL, estando livre de doença até ao momento.

A taxa de margens positivas pós NPL demonstra variabilidade importante entre os diversos estudos e séries apresentadas (0 a 7%). De acordo com uma revisão recente na revista European Urology, a abordagem seleccionada está associada a percentagens diferentes de risco de margem positiva: 0-7% após Nefrectomia Parcial Aberta, 0,7-4% após NPL, e 3,9-5,7% após Nefrectomia Parcial robótica18.

Apesar de ser essencial garantir margens negativas pós Nefrectomia Parcial, de acordo com as boas práticas na abordagem de cirurgia oncológica, a evidência actual na literatura não conseguiu demonstrar um aumento do risco de recorrência local ou progressão metastática nos doentes com margem cirúrgica positiva19. Estudos recentes investigaram o impacto da presença de margens cirúrgicas positivas, sugerindo que a sua presença não implica necessariamente doença residual20-22. Deste modo, à luz do conhecimento científico actual, a presença de margem cirúrgica positiva no pós-operatório de NPL é ainda motivo de intenso debate, e não deve ser utilizado como principal indicador de eficácia de cirurgia oncológica.

Partindo da análise comparativa com cirurgias por outras neoplasias sólidas, a Nefrectomia Parcial apresenta 3 características únicas que podem contribuir para a incapacidade de demonstração da importância de margens cirúrgicas negativas como factor positivo de resultado oncológico:

  • 1.

    A utilização de electrocoagulação no leito da nefrectomia parcial, com o intuito de hemostase parenquimatosa renal segura, pode potencialmente erradicar células neoplásicas residuais;

  • 2.

    A isquemia renal induzida pela laqueação da artéria renal pode induzir a morte de células com elevadas exigências metabólicas, como é o caso das células tumorais;

  • 3.

    Um foco microscópico residual de neoplasia renal pode ter uma evolução insidiosa, de forma que seria necessário um tempo de seguimento mais longo para se registar uma evolução desfavorável19.

Os autores revelam uma taxa de complicações reduzida, em comparação com a restante literatura, não se observando necessidade de suporte transfusional em nenhum doente. Durante o seguimento não se observou nenhum caso de fuga urinária, sendo que em 16,1% dos casos optou-se pela colocação intraoperatória de catéter ureteral devido a abertura importante do sistema colector durante a ressecção da lesão.

Existe na literatura uma grande variabilidade no uso e referência a cateterização ureteral intra-operatória. No artigo de Zor et al, sobre o impacto do encerramento do sistema colector em situações de abertura importante do mesmo, o autor descreve uma taxa de cateterização ureteral de 58,3% quando abertura importante do sistema excretor e de 34,2% quando esta não se verifica, não se observando diferença estatisticamente significativa no risco de fístula urinária no pós-operatório23. Assim, a utilização criteriosa de catéter ureteral, se noção de abertura importante do sistema colector, pode ser relevante na ausência de casos de fístula urinária reportada pelos autores.

Em nenhum dos casos se constatou pneumotórax iatrogénico, ou necessidade de diálise temporária ou definitiva. A complicação mais grave, de acordo com a escala de Clavien, foi um abcesso perirenal com fraca resposta à antibioterapia de largo espectro e com necessidade de reintervenção para drenagem percutânea (classificaçao 3B).

No estudo de Wheat et al, foram revistas as taxas de complicações de 336 NPL consecutivas, observando-se 6,6% de complicações major. A hemorragia pós-operatória e a fuga urinária são descritas em vários estudos como as principais complicações associadas a este procedimento. Na série de Wheat et al., hemorragia importante com necessidade de transfusão foi 8,6%, em linha com com a taxa descrita na literatura que varia de 2 e 9%. Wheat et al. demonstrou a associação entre maior diâmetro tumoral e maior risco hemorrágico, com um aumento do risco hemorrágico em 45% por cada 1 cm de aumento de dimensões tumorais24.

Na nossa série foi necessário converter a nefrectomia parcial laparoscópica em cirurgia aberta em 3 doentes. Em 2 casos por hemorragia do pedículo de difícil resolução por via laparoscópica e no outro caso por dissecção difícil do pedículo vascular.

A evolução da função renal no pós-operatório foi realizada através do cálculo da clearance de creatinina pela fórmula de Cockroft-Gault em 3 momentos: pré-operatório, durante o internamento (1-3 dias após cirurgia) e o último registo durante seguimento.

Os autores apresentam uma variação média da TFG entre o pré-operatório e o último registo de seguimento de -4,7%. Esta queda marginal da TFG é inferior ao descrito na maioria da literatura. Na série de Gill et al., a avaliação da progressão da função renal em 3 épocas distintas deste procedimento, realizado pelo mesmo cirurgião, demonstrou no último coorte de NPL realizadas uma diminuição de TFG média de 11%, substancialmente inferior à do primeiro coorte realizado (11% vs 29% de diminuição da TFG após a NPL). Os autores deste estudo concluíram que a experiência do cirurgião e o menor tempo de isquemia quente conseguido ao longo da curva de aprendizagem foram determinantes na menor disfunção renal pós-operatória observada na última era de doentes submetidos a NPL14.

Ao realizar a análise crítica da variação mínima da TFG na nossa série, devemos considerar o curto tempo de seguimento da casuística apresentada e a necessidade de um seguimento destes doentes para uma correcta percepção da evolução da função renal a longo prazo. Assim, este número poderá subestimar a verdadeira queda da TFG ao longo do tempo e a importância de alcançar um tempo de isquemia inferior. A experiência cirúrgica na abordagem laparoscópica será fundamental no alcançar deste objectivo, através da concentração deste procedimento altamente diferenciado num reduzido e seleccionado número de cirurgiões com experiência em laparoscopia.

Conclusão

A NPL apresentou bons resultados oncológicos em tumores renais T1, associado a tempos de internamento curtos, baixo índice de complicações e excelentes resultados funcionais, preservando a função renal. A evolução da função renal, através do cálculo da variação da TFG, demonstrou uma deterioração mínima, com resultados oncológicos sobreponiveis aos descritos para a nefrectomia radical.

A abordagem laparoscópica, com as reconhecidas vantagens estéticas e funcionais em relação ao procedimento aberto, foi capaz de alcançar reduzidos tempos de isquemia quente com preservação da função renal, e sem elevar o risco de margens cirúrgicas positivas.

A equivalência, quanto ao resultado oncológico, entre Nefrectomia Parcial Aberta e NPL já foi demonstrada, assumindo-se no entanto a primeira ainda como o tratamento cirúrgico de referência no tratamento de pequenas massas renais, devido à menor taxa de complicações major nos artigos considerados.

Estes resultados reflectem a experiência do serviço do CHP em NPL, e a importância da progressão na curva de aprendizagem através da manutenção de um número crescente destes procedimentos, realizados por um número limitado de cirurgiões com experiência em laparoscopia.

Autoria

Os autores Diogo Gil-Sousa e Daniel Oliveira-Reis são os autores principais, com igual contribuição para a realização deste artigo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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