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Inicio Angiologia e Cirurgia Vascular Úlcera crónica do membro inferior — experiência com cinquenta doentes
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Vol. 9. Núm. 4.
Páginas 148-153 (diciembre 2013)
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19741
Vol. 9. Núm. 4.
Páginas 148-153 (diciembre 2013)
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Úlcera crónica do membro inferior — experiência com cinquenta doentes
Chronic leg ulcers- experience with 50 patients
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19741
Ana Afonso
Autor para correspondencia
ana.raquel.22@gmail.com

Autor para correspondência.
, Pedro Barroso, Gil Marques, Ana Gonçalves, António Gonzalez, Nádia Duarte, Maria José Ferreira
Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular, Hospital Garcia de Orta, Almada, Portugal
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Estadísticas
Figuras (1)
Tablas (7)
Tabela 1. Dados demográficos
Tabela 2. Caraterização da Ulcera
Tabela 3. Relação entre dimensão da úlcera e tempo de cicatrização
Tabela 4. Relação entre tempo de cicatrização e comorbilidades e presença de infeção documentada
Tabela 5. Etiologia
Tabela 6. Tratamento cirúrgico
Tabela 7. Diagnóstico diferencial da etiologia da úlcera de perna7
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Resumo
Objectivo

Pretende-se caraterizar os doentes com úlcera crónica ativa, seguidos em Consulta de Cirurgia Vascular, identificando a patologia vascular envolvida e as modalidades terapêuticas instituídas e seus resultados. Pretendemos ainda identificar alguns fatores preditores de atraso de cicatrização.

Material e métodos

Estudo retrospectivo, descritivo, de uma população de 50 doentes consecutivos com úlcera crónica ativa, seguidos em Consulta de Cirurgia Vascular entre 2000–2010. Foram recolhidos dados do processo clínico que incluíram: idade, sexo, presença de comorbilidades como a diabetes, hipertensão, obesidade, antecedentes de úlcera. Foi definida a etiologia vascular através do exame físico, complementando com eco-doppler. Foi registado o tipo de terapêutica efetuada e resultados da mesma.

Resultados

A média de idade foi de 69 anos, com uma ligeira prevalência do sexo masculino. A insuficiência venosa esteve presente em 56% dos doentes, predominando a insuficiência venosa superficial em 71,4% dos doentes. A insuficiência arterial esteve presente em 44% da amostra, e responsável isoladamente pela úlcera em 18%. 53% dos doentes com úlcera de etiologia venosa foram abordados por cirurgia e 47% por tratamento compressivo. A taxa de cicatrização foi semelhante nos dois grupos. A infeção esteve presente em 30% das mesmas.

Conclusões

Nas úlceras de perna estão envolvidos múltiplos fatores que dificultam a abordagem terapêutica. Nas úlceras de etiologia venosa, a terapêutica cirúrgica e compressiva oferecem excelentes resultados, sobretudo se envolver isoladamente o sistema venoso superficial. O envolvimento arterial e a infeção podem estar associados e devem ser despistadas, pois contribuem para um pior prognóstico.

Palavras-chave:
Ulcera perna
Insuficiência venosa
Terapêutica compressiva
Abstract
Objective

To characterize patients with chronic active ulcer, by identifying the vascular pathology involved and therapeutic modalities used and their results. We also want to identify some predictors of delayed healing.

Material and methods

A retrospective, descriptive study form data collected between 2000 and 2012, from 50 patients attending a Vascular Surgery. The Data was collected from the clinical file process which included age, sex, presence of comorbidities such as diabetes, hypertension, obesity, previous history of ulcer. It was also defined the etiology through physical examination, complemented with Doppler ultrasound. It as recorded the type of treatment carried out and their results.

Results

The average age of patients studied was 69 years, with a slight prevalence of males. Venous insufficiency was present in 56% of patients, predominantly superficial venous insufficiency in 71.4% of patients. Arterial insufficiency was present in 44% of the sample, accounting alone for 18% ulcer 53% of patients with venous ulcer underwent surgery and 47% were treated with compression treatment. The healing rate was similar in both groups, with 60% improvement / ulcer healing. The infection was present in 30% of the patients.

Conclusions

Multiple factors are involved in leg ulcers that make the therapeutic approach difficult. In venous ulcers, surgical therapy and compression offer great results, especially if they involve the superficial venous system alone. The arterial involvement and the infection should be excluded as it contributes to a worse prognosis.

Keywords:
Leg ulcers
Venous insufficiency
Compression therapy
Texto completo
Introdução

Define-se úlcera crónica dos membros inferiores como uma ferida que não cicatriza num período de 6 semanas, apesar do tratamento adequado1.

Trata-se de uma entidade comum, envolvendo 1 a 1,5% da população mundial, que consome recursos, causando frustração nos profissionais de saúde e nos doentes, condicionando degradação da sua qualidade de vida e dias de trabalho perdidos2.

São múltiplas as causas de úlceras crónicas, incluindo vasculares, neuropáticas, linfedema, artrite reumatoide, traumáticas, osteomielite crónica, anemia falciforme, vasculites, tumores cutâneos (basocelulares e espinocelulares), doenças infecciosas crónicas (lepra, tuberculose, leishmaniose), entre outras1–3. Em aproximadamente 3,5% dos doentes, a causa da úlcera não é identificada2.

A etiologia vascular predomina, sendo que a hipertensão venosa é responsável por 60 a 70% das úlceras e 10 a 25% por insuficiência arterial, que pode coexistir com a doença venosa (úlcera mista). Esta situação requer uma abordagem mais complexa e reveste-se de maior gravidade4.

Neste estudo abordámos as úlceras de etiologia vascular, procurando traçar o perfil deste doente e qual a resposta à terapêutica otimizada integrada, adaptada ao status vascular do doente. Avaliámos também os fatores que poderão contribuir para o atraso de cicatrização, realçando o papel da infeção.

Material e métodos

Realizámos um estudo retrospetivo e descritivo, de 50 doentes consecutivos documentados, com o primeiro episódio de consulta de Cirurgia Vascular entre 2000 a 2010.

Como critério de inclusão, selecionaram doentes com úlcera localizada na perna ou pé, que não cicatrizou por um período superior a 6 semanas. Foram excluídos doentes sem capacidade de deambulação.

Por consulta do processo clínico foram recolhidos os dados epidemiológicos respeitantes à idade, sexo, raça, diabetes, hipertensão arterial, obesidade (considerado o índice de massa corporal superior a 35), antecedentes de insuficiência cardíaca congestiva, evidência de trombose venosa profunda e episódios de úlcera homolateral no passado.

Todos os doentes efetuaram Eco-doppler arterial e venoso dos membros inferiores, pelo mesmo operador, com aparelho Vivid 7, sonda 7.5mHz. Para o estudo arterial, foi efetuada abordagem femoral, popliteia, tibial posterior retromaleolar e pediosa. Nos doentes em que era possível, pelas dimensões da úlcera, foi determinado o índice tornozelo braço (Pressão Arterial Sistólica Membro inferior/Pressão Arterial Sistólica do Membro Superior). Foi considerada obstrução arterial significativa a perda do caráter trifásico da curva de velocidade e/ou índice tornozelo braço inferior a 0,9.

O eco-doppler venoso foi efetuado com o doente em pé e em decúbito, avaliando-se a permeabilidade e competência do sistema profundo a nível femoral e poplíteo. O sistema venoso superficial foi estudado quanto à competência valvular a nível de toda a veia safena interna, externa e perfurantes. Foi considerada segmento com refluxo quando havia fluxo retrógrado com tempo superior a 0,5 segundos e velocidade maior que 30cm/segundos.

Foram registadas as análises bacteriológicas das úlceras, se efetuadas, com respetiva sensibilidade antibiótica.

Foram ainda discriminadas as modalidades terapêuticas utilizadas e respetivo resultado.

Resultados

A idade média dos doentes foi 69,16 anos e verificou-se uma ligeira prevalência do sexo masculino (56%).

Relativamente às comorbilidades, verificou-se em uma maior percentagem de doentes a presença de HTA (80%), e com menor frequência, a obesidade e a diabetes. Em 42% dos doentes já existiam antecedentes de úlcera de perna (tabela 1).

Tabela 1.

Dados demográficos

N°  50 
Idade média  69,16 (36–87) 
Sexo (♀/♂)  46/54% 
Diabetes  28% 
HTA  80% 
Obesidade  46% 
Antecedentes de úlcera  42% 

HTA, Hipertensão arterial.

A dimensão média da úlcera foi de 17,8cm2 e cerca de 70% dos doentes apresentavam úlcera ativa com mais de 6 meses de evolução (tabela 2).

Tabela 2.

Caraterização da Ulcera

Duração   
<6 meses  30% 
6 a 18 meses  42,5% 
>18 meses  27,5% 
Dimensão média  17,8cm2 (0,48 a 120cm2

Ao comparar as dimensões das úlceras com o tempo de cicatrização, verificou-se que, quanto maior o tamanho inicial da úlcera, mais prolongado é o tempo de cicatrização (tabela 3).

Tabela 3.

Relação entre dimensão da úlcera e tempo de cicatrização

Dimensão média (cm2Tempo médio cicatrização (meses) 
0–6  3,6 
7–12  11,6 
13–24  17 
>24  25 

Ao caraterizar os grupos, de acordo com o tempo de cicatrização, e investigar a presença de fatores adversos na cicatrização como as comorbilidades bem como a presença de infeção, verificamos que, no grupo com tempo de cicatrização superior a 18 meses, 63% dos doentes tinha Diabetes Mellitus e 45% eram obesos. A presença de infeção foi maior no grupo com úlcera de duração 6–18 meses (tabela 4).

Tabela 4.

Relação entre tempo de cicatrização e comorbilidades e presença de infeção documentada

  <6 meses  6–18 meses  >18 meses 
HTA  92%  88%  63% 
DM  15%  35%  63% 
Obesidade  46%  52%  54% 
Infeção  0%  47%  36% 

HTA, Hipertensão arterial; DM, Diabetes Mellitus.

Em relação à etiologia 56% eram venosas, e destas, 71,4% tinham envolvimento do sistema venoso superficial apenas e 21,4% com envolvimento do sistema venoso profundo e superficial. 26% das úlceras tinham etiologia mista e 18% apresentavam etiologia arterial (tabela 5).

Tabela 5.

Etiologia

Venosa – 56%SVS− 71,4% 
SVP− 7,2% 
SVP+SVS− 21,4% 
Mista – 26%   
Arterial – 18%Doença aorto-iliaca- 11% 
Doença femoro-popliteia- 55% 
Doença tíbio-peroneal- 33% 

SVP: sistema venoso profundo; SVS: sistema venoso superficial.

Relativamente à insuficiência venosa pelo sistema venoso superficial, os doentes apresentavam diferentes distribuições pela veia safena interna, externa e/ou perfurantes (fig. 1).

Figura 1.

Gráfico da distribuição da insuficiência venosa.

(0.06MB).

Quanto à terapêutica, esta foi diversificada já que o padrão de patologia também abrangia várias patologias.

A Cirurgia foi realizada essencialmente para a insuficiência venosa superficial isolada (53,1% dos doentes) e na úlcera com componente arterial (77% dos doentes com úlceras isquémicas). Foram ainda utilizados procedimentos cirúrgicos isolados de intervenção direta, como os enxertos de pele em 11,7% ou como forma de terapêutica associada em 23,5% (tabela 6).

Tabela 6.

Tratamento cirúrgico

Úlcera venosa  53,1%  Terapia associada 
Safenectomia  58,8%  Enxerto pele - 23,5% 
Laq isolada de perfurantes  5,8%  VAC pré op - 7% 
Enxerto pele isolado  11,7%   
Úlcera arterial  77%   
Bypass  42,8%  Terapia hiperbárica - 44% 
Angioplastia  42,8%   
Amputação primária  14,3%   
Amputação secundária  42,8%   

VAC: Vacuum-assisted closure

A terapia compressiva foi aplicada tanto nos doentes submetidos a cirurgia bem como nos 47% dos doentes que não foram operados, por apresentarem insuficiência do sistema venoso profundo isolada (20%), comorbilidades significativas (60%) e ainda em doentes que estavam a aguardar cirurgia na altura da realização do estudo (20%).

O tipo de contenção elástica usada foi a meia elástica em 71% e a ligadura elástica em 24%. O grau de adesão à contenção elástica foi de 75%, não havendo dados em 3,5% doentes.

A percentagem de doentes que apresentaram melhoria ou mesmo a cicatrização da úlcera com o tratamento compressivo foi 66%.

Discussão

A úlcera crónica dos membros inferiores está associada um elevado tempo de cicatrização e frequente recorrência, consumindo recursos e tempo aos cuidadores, ao doente e à sua família.

O nosso estudo pretende conhecer melhor esta população e os fatores envolvidos no desenvolvimento e manutenção da úlcera, de modo a abordar os doentes de forma mais eficaz com vista à cicatrização das lesões e à prevenção das recorrências. Para tal, a partilha de cuidados e conhecimentos com os cuidados de saúde primários é fundamental, numa visão holística e integrada da saúde.

No estudo que efetuámos com esse fim, a população estudada apresentou uma média de idade de 69 anos, que está de acordo com a literatura, que refere maior prevalência de úlcera com a idade, que é de 1–2% na população global, aumentando para 3 a 5% na população com idade superior a 65 anos5.

Em relação à etiologia, o nosso estudo incidiu num subgrupo populacional orientado especificamente para a consulta de Cirurgia Vascular, pelo que foi detetada etiologia vascular em 100% dos doentes. Verificou-se que a etiologia venosa foi predominante estando envolvida de forma isolada em 56% dos casos, associada à insuficiência arterial em 26% (úlceras de etiologia mista) e unicamente relacionadas com doença arterial em 18% dos doentes. Os dados referentes ao número de úlceras mistas e arteriais são superiores aos descritos na literatura, sendo provavelmente enviesados por ser uma consulta altamente especializada6.

Nos doentes com úlceras de etiologia venosa, a alteração fisiopatológica responsável pela manutenção da úlcera é a hipertensão venosa. Esta é mais frequentemente causada por insuficiência do sistema venoso superficial, constituindo a causa mais simples de abordar de forma curativa com cirurgia (vulgo “Úlcera varicosa”). Também a oclusão ou insuficiência do sistema venoso profundo, secundária a tromboses venosas, condicionam hipertensão venosa, que é uma situação mais grave e com uma abordagem terapêutica mais difícil e refratária. As cirurgias do sistema venoso profundo são muito invasivas e com resultados pouco promissores quando comparado com a terapia compressiva bem aplicada. Importa assim distinguir estas duas alterações do sistema venoso, com o mesmo defeito fisiopatológico (hipertensão venosa), mas de abordagem terapêutica distinta.

Também pelo mecanismo da hipertensão venosa, as situações de bloqueio da articulação tibiotársica ou imobilidade, ao interromper o efeito da bomba muscular, poderá condicionar úlceras de perna, mesmo sem alterações da circulação arterial ou venosa.

No nosso estudo a insuficiência venosa superficial isolada foi responsável por 71% das úlceras de etiologia venosa e o sistema venoso profundo isolada em 7,2%, sendo que em 21,4% estavam envolvidos os dois.

No nosso estudo, verificou-se ainda que em 44% dos doentes existia compromisso da circulação arterial, e em 18% como único fator vascular responsável pela úlcera, distribuindo pelos vários territórios: 11% do setor aorto-ilíaco, 55% do sector femoro-popliteo e 33% do setor tibio-peroneal.

Nos doentes com compromisso arterial e venoso, a abordagem é particularmente difícil, pois a existência de alteração da perfusão arterial contra-indica o uso de compressão elástica, já que pode compromoter ainda mais a perfusão, levando ao agravamento da isquémia.

Deste modo, apesar do aspeto da úlcera ser um precioso indicador da etiologia arterial ou venosa da úlcera (tabela 7), o sistema arterial deve ser avaliado sistematicamente ao selecionar a terapêutica compressiva7.

Tabela 7.

Diagnóstico diferencial da etiologia da úlcera de perna7

Tipo  Localização  Dor  Hemorragia com manipulação  Caraterísticas da lesão  Inflamação circundante  Achados associados 
Arterial  Distal (antepé)  Agrava em decúbito  Ligeira ou nenhuma  Bordos irregulares, fraco tecido de granulação  Ausente  Alterações tróficas da isquemia cronica; ausência de pulsos 
Venosa  1/3 inferior perna  Lligeira, alivia com elevação  Sim  Base tecido granulação  Presente  Lipodermato esclerose; pigmentação 

Uma revisão Cochrane concluiu que a compressão venosa promove a cicatrização da úlcera nos doentes cuja etiologia da mesma era a hipertensão venosa, sobretudo se utilizada a alta compressão, estando assim recomendada uma pressão de 40mmHg8.

Utilizámos essencialmente para terapia compressiva o “kit de úlcera”, que constitui atualmente um auxiliar muito útil na abordagem dos doentes com hipertensão venosa. É muito superior a bandagem com ligaduras pois é mais consistente, não variando com o operador e permitindo ao doente a sua remoção e colocação para a higiene. Este kit é constituído por duas meias de compressão sobrepostas de 20mmHg de pressão a nível do tornozelo (baixa pressão). A meia a usar diretamente sobre o penso é constituída por 71% poliamina, 28% elastano e 1% prata, com propriedades antimicrobianas e deve ser usado dia e noite. A segunda meia é composta de 75% poliamina e 25% de elastano e é usado apenas durante o dia, quando há deambulação e aumento da hipertensão venosa.

Esta sobreposição de meias para alcançar a pressão eficaz torna também a utilização mais fácil, sobretudo nos doentes idosos e com grandes pensos, simplificando colocar duas meias de mais baixa pressão em alternativa a apenas uma mais forte.

Esta eficácia de terapia compressiva foi ainda demonstrada no nosso estudo ao conseguirmos obter uma cicatrização da úlcera em 66% dos doentes quem que esta foi a única modalidade terapêutica utilizada (doentes com patologia do sistema venoso profundo, comorbilidades que impediram a cirurgia ou doentes que se encontravam a aguardar cirurgia).

Nos doentes com etiologia arterial e mista da úlcera, verificou-se taxas mais baixas de cicatrização, verificando-se no grupo de doentes unicamente arteriais, que cerca de metade sofreram amputação, o que realça o mau prognóstico destes casos e a necessidade de abordagem precoce, evitando rotular todas as úlceras de “varicóticas”, sendo de suma importância o despiste de doença arterial.

Além da idade e da patologia de base na etiologia da úlcera, foram estudados outros fatores que poderiam comprometer a cicatrização da úlcera, verificando-se que a diabetes mellitus estava presente em igual percentagem nos doentes que cicatrizaram e nos que não cicatrizaram, contribuindo a hipertensão arterial para a não cicatrização. A obesidade esteve presente em 46% dos doentes com úlcera.

As úlceras estão frequentemente colonizadas por flora mista que não deve ser confundida com infeção secundária. São sinais que fazem suspeitar da infeção o aparecimento de dor, aumento de exsudação, aumento das dimensões da úlcera ou aparecimento de odor. Nestes casos é fundamental efetuar zaragatoa e valorizar úlceras colonizadas por mais de 105 microrganismos por grama de tecido9. Nestes casos deve ser instituída antibioterapia dirigida pelo teste de sensibilidade antibiótica. Não deve ser realizado o despiste sistemático de infeção se não houverem sinais concretos que esta poderá estar presente de modo a evitar a antibioterapia desnecessária e dispendiosa, associada ao desenvolvimento de resistências bacterianas.

Na nossa série isolado agente infeccioso em 30% das úlceras, estando 50% destas com valores patológicos de MRSA. A presença de infeção documentada esteve também associada a maior dificuldade de cicatrização, observando-se uma duração média de úlcera ativa de 21,6 meses nos doentes infetados e 80% destes mantiveram úlcera ativa mais de 18 meses.

A recorrência também é frequente, descrevendo-se na literatura 30% de recorrência no primeiro ano e de 78% aos dois anos10. No nosso estudo 42% dos dentes já tinham tido episódio prévio de úlcera homolateral. A adesão à contenção elástica, mesmo após a cirurgia de varizes, e a cicatrização da úlcera é incontornável nestes doentes para prevenir a recorrência (recomendação com nível de evidência C)11.

Como se pode observar no nosso estudo, a intervenção para a terapêutica destes doentes com úlceras extensas (média de dimensões de 17,8cm2) e de longa evolução, requereram tratamentos complementares além do dirigido à etiologia vascular da úlcera. Foi necessário em 44% dos doentes com úlceras de etiologia arterial efetuar terapia hiperbárica e em 23,5% dos doentes com cirurgia de varizes proceder a enxerto de pele. Esta abordagem integrada, complexa, foi essencial para a cicatrização da úlcera e não deve ser perdido o timing ideal, com altas precoces sem o doentes estar curado, facilitando a sobreinfeção e consequente agravamento da lesão deitando a perder o que já tinha sido investido.

E finalmente, não devem ser esquecidos o despiste e a correção de fatores gerais do doente que possam contribuir para o atraso da cicatrização como o estado nutricional, equilíbrio da diabetes e tensão arterial, controlo de fatores de risco para aterosclerose e o acompanhamento do doente ao longo do seu tratamento reforçando a adesão à terapêutica, nomeadamente a contenção elástica.

Conclusão

O conhecimento da realidade desta doença e das necessidades dos doentes permitem a elaboração de estratégias de intervenção de modo a poder melhorar a prestação de cuidados aos doentes com úlceras de perna no sentido de reduzir o tempo de cicatrização, prevenir a reincidência e promover a racionalização de recursos da saúde e melhoria da qualidade de vida.

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Trabalho apresentado no XI congresso da Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular, 23 a 25 de Junho 2011 em Viseu.

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