RESUMO
Objetivo. Analisar a distribuição do mês do nascimento de jogadores convocados para a seleção brasileira de futebol em todas as categorias.
Métodos. Amostra foi constituída por 167 jogadores de futebol convocados para a seleção brasileira de futebol nas categorias Sub-14, Sub-15, Sub-16, Sub-17, Sub-18, Sub-19, Sub-20 e a equipe principal. Apenas os atletas que participaram da última lista de convocação de cada categoria listados no website oficial e de domínio público da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) em junho de 2010 foram considerados. Os indivíduos foram separados de acordo com a categorização de idade cronológicaem por quadrimestres, 1o quadrimestre (1o QDT), jovens nascidos entre janeiro e abril; 2o quadrimestre (2o QDT), jovens nascidos entre maio e agosto e 3o quadrimestre (3˚ QDT), jovens nascidos entre setembro e dezembro. Para comparação da distribuição encontrada nos quadrimestres em cada categoria foi utilizado o teste não paramétrico do qui-quadrado (X2). A significância adotada foi P<0,05.
Resultados. Os resultados demonstraram que em todas as categorias até o Sub-18 observou-se maior número de atletas nascido no 1o QDT, comparado ao 2o QDT (P<0,05). Na categoria Sub-18, o número de atletas nascidos no 1o QDT e 2o QDT foram semelhantes (P>0,05). Deve-se ressaltar, entretanto, que um pequeno número de atletas selecionados foram nascidos no 3o QDT quando comparado ao 1o QDT e 2o QDT em todas as categorias de base (P<0,05). Quanto aos atletas da equipe principal, verificou-se que não houve diferença significativa entre o número de atletas nascidos no 1o QDT, 2o QDT e 3o QDT (P>0,05).
Conclusão. Uma possível explicação para o maior número de atletas selecionados nascidos no 1˚ QDT para todas as categorias de base até o Sub-18 esta relacionada provavelmente a maior maturação física desses, o que poderia aumentar sua chances de se tornar atletas selecináveis, enquanto aqueles que amadurecem mais tarde não são sistematicamente selecionados.
Palavras-chave: Futebol. Seleção Brasileira. Mês de nascimento. Maturação. Jovens.
Introdução
O futebol é um dos esportes mais populares do mundo, apresentando mais de 240 milhões de praticantes em 20041. O esporte passou por grandes evoluções com o passar dos anos, ganhou ainda mais adeptos, tornou-se uma modalidade com grandes investidores atraindo inúmeros jovens que buscam brilhar nos gramados mais famosos do mundo.
No Brasil, além do grande número de praticantes, é comum a aparição de jovens com um talento motor para a modalidade. Esses talentos são encontrados nas diversas regiões do país, mas pouco se sabe da origem e do processo que esses jovens talentos passam até chegarem aos níveis competitivos mais altos. Para Rogel et al2, nenhum jovem desenvolve seu talento se não for apoiado por adultos, e é justamente essa influência do meio, encontrado nas categorias antecedentes ao profissionalismo (categorias de base), que possibilita tal oportunidade do aprimoramento do jovem considerado com um talento motor.
A categorização de jovens jogadores de futebol utiliza um sistema semelhante ao utilizado pela maioria das organizações escolares, clubes, federações e confederações, ou seja, por faixa etária de acordo com a idade cronológica. Tal categorização visa permitir a participação adequada e equitativa oportunidade de formação. Para fins de categorização, a maioria dos países adotam as regras da FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado), que usa o ano do nascimento, como critério de seleção, definindo 1º de janeiro como a data-limite do ano de seleção3.
No entanto, esta norma pode ser arbitrária quando se trabalha com jovens, uma vez que existe variação significativa em diversas variáveis, como aspectos emocionais, motivacionais e experiência4-6, entre os jogadores mais jovens nascidos no final do ano de seleção e jogadores mais velhos nascidos no início do ano de seleção. Já há algum tempo, estudos tem relatado que meninos mais velhos, nascidos no início do ano, são significativamente mais altos e mais pesados do que os rapazes mais jovens durante a adolescência7-9. A essas diferenças tem-se referido como o efeito relativo da idade (ERI)2,10.
Em contrapartida, qualquer impacto que o ERI tenha sobre os resultados da seleção de talentos para o futebol em idades menores, tenderia a causar assimetria na distribuição dos meses de nascimento entre os jovens jogadores de futebol11,12 e jogadores sênior de futebol10,13. Neste sentido, algumas pesquisas têm encontrado forte relação entre a distribuição dos meses de nascimento e dimensões corporais de atletas jovens9,14.
Apesar desse achado, ainda não é claro qual o verdadeiro impacto do ERI sobre a seleção de talentos. Nossa hipótese inicial é que o ERI pode influenciar na seleção de talentos no futebol em idades menores proporcionando aos atletas nascido nos primeiros meses do ano maior possibilidade de serem selecionados. Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi analisar a distribuição do mês de nascimento dos jogadores de futebol convocados para as seleções brasileiras Sub-14, Sub-15, Sub-16, Sub-17, Sub-18, Sub-19, Sub-20 e principal.
Métodos
A amostra foi composta de 167 jogadores de futebol convocados para a seleção brasileira das categorias Sub-14, Sub-15, Sub-16, Sub-17, Sub-18, Sub-19, Sub-20 e principal. Foram considerados na análise apenas os atletas que fizeram parte da última lista de convocação para participar da preparação ou das competições em cada categoria, e listados no endereço eletrônico oficial de domínio público da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) no mês de Junho de 2010 (tabela 1).
Os sujeitos foram separados de acordo com a categorização de idade cronológica em quadrimestres, 1˚ quadrimestre (1 QDT), jovens nascidos entre janeiro e abril; 2˚ quadrimestre (2 QDT), jovens nascidos entre maio e agosto e 3˚ quadrimestre (3 QDT), jovens nascidos entre setembro e dezembro.
Tratamento estatístico
Todas as informações foram analisadas por meio da estatística descritiva, utilizando-se do pacote estatístico StatisticaTM 7.0® (Statsoft Inc., Tulsa, OK , USA). Os dados são apresentados em termos de distribuição de frequências absoluta (F) e relativa (FR). Para comparação da distribuição encontrada nos quadrimestres em cada categoria foi utilizado o teste não paramétrico do qui-quadrado (Χ2). A significância adotada foi P<0,05.
Resultados
Na tabela 2 são apresentados os resultados da análise da distribuição do mês de nascimento dos jogadores de futebol da seleção brasileira em todas as categorias.
Os resultados demonstram que até a categoria Sub-18, o número de atletas selecionados, nascidos nos meses correspondentes ao 1 QDT foram maiores quando comparado ao 2 QDT e 3 QDT (P<0,05). Nas categorias Sub-19 e Sub-20, o número de selecionados foi semelhante entre os nascidos no 1 QDT e 2 QDT. Entretanto, um menor número de atletas selecionados foi encontrado para os nascidos no 3º QDT comparado 1 QDT e 2 QDT em todas as categorias de base (P<0,05). E, com relação aos atletas da seleção principal, verificou-se que não houve diferenças significantes entre o número de atletas selecionados nos 1 QDT, 2 QDT e 3 QDT.
Discussão
Considerando que o ERI pode influenciar na seleção de talentos no futebol em idades menores, e pode causar assimetria na distribuição dos meses de nascimento entre os jovens jogadores o objetivo do presente estudo foi analisar a distribuição do mês de nascimento dos jogadores de futebol convocados para as seleções brasileiras Sub-14, Sub-15, Sub-16, Sub-17, Sub-18, Sub-19, Sub-20 e principal.
Nossos achados mostraram que os atletas selecionados para compor as seleções brasileiras das categorias de base até a Sub-18, na sua maioria são atletas nascidos no 1 QDT (~62%), ou seja, janeiro a abril. Seguido de uma grande proporção de nascidos no 2 QDT ~30%), de junho a setembro. Curiosamente, observasse que o ERI diminui conforme o atleta é selecionado para uma categoria maior. Sugere-se que isso possa ser atribuído possivelmente ao fato desses atletas apresentarem maturação física superior o que leva os mesmos a serem preferidos pelos técnicos.
Helsen et al13 demonstraram forte relação entre o mês de nascimento e a proporção de jogadores de futebol que se profissionalizam na Bélgica. O estudo contou com 1.200 datas de nascimentos, de três grupos de jogadores de futebol: jogadores profissionais, jogadores de 10 a 16 anos selecionados para times nacionais, e jogadores menores de 16 anos transferidos para a primeira divisão. Os resultados indicaram que jovens jogadores nascidos entre agosto e outubro, período considerado o começo do ano do esporte (janeiro a março no Brasil) teriam maior probabilidade de serem identificados como talentos, e com mais chance de serem transferidos para times nacionais e se tornarem profissionais. Em contraste, jogadores nascidos mais tarde (de acordo com o ano de seleção) acabariam sua carreira antes dos doze anos de idade.
Para confirmar essa afirmação, foi invertido o início do ano de competição na Bélgica, passando a ser em janeiro, semelhantemente como é feito no Brasil. Dessa forma, jogadores nascidos de janeiro a março, passaram a ter maior probabilidade de serem selecionados2. Esse ERI pode ser explicado pelo fato de que um atleta nascido em janeiro no Brasil, por exemplo, tem 11 meses de diferença quando comparado a outro jovem talento nascido em novembro, sendo assim ele pode apresentar uma maturação física superior quando nascido em um mês supostamente «favorável» a seleção de talentos no futebol15.
Outro fator interessante é relacionado com a teoria da prática deliberada. Se duas crianças apresentam 300 dias de diferença entre seus nascimentos, o nascido no começo do ano praticando quatro horas por dia irá somar ao final do ano 1.200 horas a mais do que o jovem nascido ao final do ano, podendo gerar uma vantagem também na maturação cognitiva e no desempenho da modalidade, assim tem sido dadas maiores oportunidade aos garotos nascidos no início do ano e talvez muitos talentos estejam sendo desperdiçados2,15. Adicionalmente, Carling et al11, afirmam que jovens jogadores de futebol que maturam precocemente toleram mais a fadiga que atletas maturados mais tardiamente. Todavia, um estudo semelhante realizado no futebol feminino americano, com
1.344 garotas, não apresentou nenhuma diferença entre os meses de nascimento16.
Mais recentemente, Carling et al11 sugeriram que as diferenças no tamanho do corpo causadas pelo ERI exercem influência sobre a assimetria da distribuição dos meses de nascimento em jovens jogadores de futebol. Considerando uma possível existência desta relação, Hirose17 utilizou exame mais aprofundado para saber se essas alterações resultavam de alguma interação com a maturação biológica e, após investigar a relação entre a distribuição dos meses de nascimento, idade esquelética e características antropométricas em jovens jogadores de futebol com idades entre 9 e 15 anos, constatou que as assimetrias na distribuição dos meses de nascimento são resultados da relação com a maturação biológica, o que poderia indicar que os jogadores que amadurecem precocemente são favorecidos na seleção de jovens jogadores de futebol. Diante disso, o autor sugere que a maturação biológica individual deva ser considerada ao selecionar jovens jogadores de futebol.
Estudos recentes sugerem que entre os jovens jogadores de futebol, os que amadurecem fisicamente de forma precoce podem ser selecionados, preferencialmente, sendo que esses terão maiores chances de se tornarem atletas de destaque15,18. Este fator tem levado a profissionalização antecipada dos atletas de futebol nos dias de hoje no Brasil. Em contrapartida, aqueles que amadurecem mais tarde são sistematicamente não selecionados8,19.
Contudo, isso não foi confirmado em nosso estudo quando analisada a distribuição dos meses de nascimento da seleção principal, uma vez que esta se mostrou semelhante entre os quadrimestres, demonstrando que o ERI parece não exercer influencia na seleção de jogadores de futebol em idades maiores, pelo menos quando esta for formada por jogadores profissionais. Acreditamos que esses resultados possam ser explicados pelo menos em parte pelo fato dos atletas já se encontrarem maturados.
A partir dos resultados deste estudo foi possível concluir que o ERI influencia na seleção de talentos no futebol em idades menores, uma vez que os jogadores escolhidos para compor as seleções brasileiras até a categoria Sub-18, na sua maioria são atletas nascidos no 1 QDT. Além disso, constata-se que o ERI diminui conforme o avanço das categorias. Em contra partida o ERI parece não influenciar na seleção de jogadores de futebol em idades maiores, pelo menos quando esta for formada por jogadores de alto nível.
Conctacto:
J. Melo Altimari.
Faculdade de Educação Física.
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
E-mail:jullianamelo@hotmail.com
Historia del artículo:
Recibido el 27 de junio de 2010
Aceptado el 22 de septiembre de 2010