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Vol. 3. Núm. 4.
Páginas 170-178 (octubre 2010)
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La periodización del entrenamiento y las cuestiones emergentes: el caso de los deportes de equipo
The training periodization and the emerged questions: the team sports' case
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A.. Moreiraa
a Escola de Educação Física e Esporte (EEFE). Departamento de Esporte. Grupo de Estudos e Pesquisa em Planejamento e Monitoramento do Treinamento Físico e Esportivo. Universidade de São Paulo. São Paulo. Brasil.
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La periodización clásica del entrenamiento, establecida hace décadas, aún se mantiene vigente. Sin embargo, recientemente, se han sugerido e investigado abordajes alternativos al diseño del proceso de entrenamiento. El deporte colectivo necesita de un abordaje particular con perpectivas diferentes y específicas. En este sentido, se hace necesario considerar y discutir algunas cuestiones emergentes relativas a la periodización del entrenamiento como un todo. Además habría que tener en cuenta algunas particularidades concernientes a deportes colectivos tales como la producción científico-académica, los modelos alternativos de periodización, los estudios en deportes colectivos con diseño de overreaching, cargas concentradas o periodización en bloque y la utilización de la prueba de campo e indicadores de percepción para el monitoreo del proceso de entrenamiento.
The so-called "traditional periodization" was established decades ago and has remained utilized on nowadays. Team sports need a particular approach with different and specific perspectives. However, recently, alternative approaches have been suggested and investigated. So, it is imperative to consider some emergent questions related to training periodization, and particularly within the team sports context, as the scientific merit of periodization content, alternative periodization models, overreaching designs and the use of highly concentrated workloads in team sports, as well as the usefulness of field test performance and perceptual markers to monitoring training process.
Keywords:
Monitoring
Sports training
Pereiodization
Sport
Texto completo

A periodização do treinamento e as questões emergentes: o caso do esporte coletivo

RESUMO

A periodização clássica do treinamento, estabelecidas há décadas, ainda se mantém vigente, no entanto, recentemente, abordagens alternativas ao delineamento do processo de treinamento têm sido sugeridas e investigadas. O esporte coletivo necessita de uma abordagem particular com perspectivas diferentes e específicas. Neste sentido, faz-se necessário considerar e discutir algumas questões emergentes relativas à periodização do treinamento como um todo e, particularmente, algumas nuances pertinentes ao esporte coletivo, entre elas: a produção científico-acadêmica, os modelos alternativos de periodização, os estudos no esporte coletivo com delineamento de overreaching, cargas concentradas e a utilização de testes de campo e indicadores perceptuais para o monitoramento do processo de treinamento.

Palavras-chave: Monitoramento. Treinamento esportivo. Periodização. Esporte.


Introdução

Para Matveev1, no processo de preparação esportiva, é fundamental compreender e relacionar os fatores que influenciam a preparação e a dinâmica da resposta de adaptação dos sistemas orgânicos dos atletas submetidos a essas influências, que, por sua vez, provocam as alterações em seus níveis de preparação. Este enfoque sugere a importância de observar as alterações de determinados marcadores funcionais ao longo da preparação, buscando entender as relações que condicionaram as transformações observadas, ou seja, o que se sucedia no processo de treinamento e o impacto da organização deste nas respostas individuais dos atletas.

A possibilidade da observação dos fatores supracitados, da relação entre conteúdo da preparação e alteração da condição (estado) do atleta, é possível, sobretudo, mediante o rígido controle da dinâmica das cargas durante as distintas etapas da estruturação do treinamento. Esse controle da dinâmica das cargas e das alterações dos marcadores (indicadores) funcionais durante as diferentes etapas do sistema de treinamento tem sido otimizado por meio de diferentes modelos de programação e estruturação.

A distribuição planificada das cargas ou a variação nos métodos, meios e conteúdo de treinamento em períodos (etapas) cíclicos tem sido denominada como periodização2-9. Nesse cenário, o processo de treinamento e sua estruturação estão intimamente ligados ao termo e ao conceito amplamente difundido de periodização do treinamento, definida por O'Bryant10 como uma abordagem cíclica do treinamento, na qual são realizadas alterações periódicas e planificadas nos parâmetros de treinamento (volume, intensidade, carga, seleção de exercícios, etc.) com o objetivo de que o atleta atinja sua ótima performance no momento apropriado.

Issurin11 pondera que a periodização do treinamento foi descrita como uma sequência proposta de diferentes unidades de treinamento (longa duração, duração média, ciclos de curto prazo de treinamento e sessões), a fim de que o atleta pudesse alcançar o estado desejado e os resultados planificados.

O modelo tradicional de periodização do treinamento estabelecido há cinco décadas ainda se mantém vigente, no que tange à aplicação por parte de muitos treinadores e em discussões teóricas inerentes ao treinamento esportivo. Recentemente, abordagens alternativas ao delineamento do processo de treinamento têm emergido, entretanto, conforme é apropriadamente considerado por Issurin11 muito mais em forma de relatos de profissionais e revistas para treinadores do que em periódicos científicos. Todavia, a despeito desse cenário, estudos recentes vêm sinalizando caminhos e diretrizes concernentes aos delineamentos experimentais e possibilidades de aplicação prática.

O presente artigo tem como objetivo realizar uma revisão e provocar uma reflexão acerca das questões emergentes concernentes a periodização do treinamento esportivo, notadamente no que se refere ao esporte coletivo. Nesse sentido, serão considerados pontos-chaves dessa discussão, como a produção científica nesse cenário, os modelos alternativos de periodização e as perspectivas de aplicação no esporte coletivo, os modelos de overreaching como delineamentos para a investigação e, ainda, considerar os problemas das cargas concentradas e o monitoramento do processo de preparação no esporte coletivo.

Periodização: existe diálogo entre a teoria e a prática?

Outra questão importante, referente à produção científica no âmbito da periodização e organização do treinamento esportivo, é que a grande maioria dos estudos científicos, particularmente os publicados em língua inglesa, ainda é amplamente relacionada ao treinamento com pesos. Um exemplo importante dessas considerações é o debate proposto em 2004 pela National Strength and Conditioning Association (NSCA), intitulado "Roundtable Discussion: periodization of training", mediado por Haff12,13 no qual cinco renomados pesquisadores discutiram a periodização e seus aspectos - entretanto, predominantemente no que diz respeito ao treinamento com pesos e suas facetas. Essa discussão buscou atualizar os conceitos abordados em 1986 nas páginas do NSCA Journal com o mesmo objetivo.

Entre diversas possíveis explicações para esse quadro é possível destacar a dificuldade de investigar atletas de elite em uma perspectiva experimental e o acesso a essa população por parte dos pesquisadores. Mesmo na ausência de intervenção, a perspectiva de avanço no conhecimento resultante da investigação do, e no, ambiente real desses esportistas ainda é um desafio para muitos pesquisadores. A possibilidade de experimentos sobre diferentes modelos de periodização com atletas de alto rendimento, com a natural e evidente resistência por parte de treinadores, atletas e comissões técnicas, adiciona outro obstáculo nesse contexto.

Outro problema frequentemente encontrado pelos pesquisadores da Ciência do Esporte é a necessidade de atender aos critérios estipulados pelos principais periódicos da área; por exemplo, nessa linha de raciocínio, Stone et al14 chamam a atenção para a abordagem mais comum no mundo acadêmico baseada em pré-pós-teste, com um delineamento experimental envolvendo grupo controle. Para os autores, esse delineamento é quase impossível quando se trata de Ciência do Esporte, envolvendo atletas de alto rendimento, que, por definição, são indivíduos únicos; assim, um grupo controle "comparável" é difícil de ser obtido.

Os autores salientam, ainda, que os estudos longitudinais na área da Ciência do Esporte envolvem múltiplas sessões de testes e relativamente poucos indivíduos. O poder estatístico é sempre uma questão em relação à qual um estudo longitudinal, um estudo de caso ou com poucos sujeitos pode parecer "pouco acadêmico" para a maioria dos conselhos revisores. A manipulação do treinamento de acordo com os resultados é uma prática habitual no "campo", e por consequência suas relações são bastante úteis no processo de estruturação da preparação do esportista; entretanto, essa abordagem não é comum nas pesquisas orientadas academicamente14.

Essas dificuldades podem, em parte, revelar essa intrigante faceta de aparente divórcio entre o universo acadêmico/evidências científicas e a prática relativa à organização, ao planejamento e ao monitoramento de esportistas de elite. Apesar desse cenário aparentemente desfavorável e incongruente, encontram-se, por outro lado, importantes sinalizações, considerações e buscas de evidências relacionadas à manipulação das variáveis do processo de treinamento, assim como as suas associações com respostas de adaptação diversas. Nesse sentido, é possível verificar na literatura, seja em livros-texto, seja em artigos científicos cercados de maior rigorosidade, a existência de propostas e indicações de caminhos alternativos para o planejamento e monitoramento do esporte de alto rendimento.

Periodização e modelos alternativos

Diferentes modelos de organização dos ciclos e conteúdos de treinamento ao longo da temporada e em ciclos anuais têm sido propostos e discutidos1,5,6,15,16. Na maioria das vezes, no Brasil, os treinadores utilizam-se da periodização clássica de treinamento com períodos bem definidos, como os períodos preparatórios, competitivos e transitórios6,7,11.

O modelo de periodização denominado "clássico" ou "tradicional" implica a utilização de um regime de cargas de forma simultânea (na mesma unidade de treinamento ou microciclo) e paralela (fases mais longas da preparação), que prevê o desenvolvimento de uma série de tarefas de treinamento com a utilização de cargas de distintas orientações funcionais, as quais visam propiciar o desenvolvimento harmonioso e multifacetado do atleta.

Essa característica peculiar de diluição e concorrência das cargas de preparação na periodização clássica tem sido largamente criticada e motivou muitos treinadores a proporem abordagens alternativas. O desenvolvimento simultâneo e concorrente de diferentes tarefas (treinamento físico, técnico, tático, etc.) e, consequentemente, de distintas capacidades motoras é uma das principais limitações do modelo na visão dos especialistas.

A mudança do ambiente esportivo e da conjuntura do esporte moderno tem uma influência significativa na modificação da concepção de organização do processo de treinamento. A despeito das características dos diferentes esportes, têm sido considerados pontos fundamentais para sustentar essa mudança de paradigma, entre outros: o incremento do número de competições, a motivação financeira e o caráter comercial evidente do esporte de alto rendimento, a globalização, permitindo maior intercâmbio entre especialistas e pesquisadores do esporte e o avanço da tecnologia7,11,17.

Uma das abordagens alternativas, decorrentes dessas considerações, é a concepção baseada na concentração de cargas unidirecionais em uma determinada etapa (bloco) do treinamento; nesse instante, há a concomitante redução ou mesmo ausência de estímulos de cargas de outras finalidades, necessitando-se, assim, de uma sequência conjugada de cargas de diferentes orientações funcionais distribuídas no tempo, a fim de se alcançar os parâmetros superiores de desempenho.

O treinamento em bloco, caracterizado como "avançado"6 tem sido alvo de utilização e investigação pelos especialistas do esporte atual5,11 e caracteriza uma forte oposição às ideias e princípios pedagógicos da periodização clássica. O modelo, por sua vez, também tem sido apresentado e investigado, com propostas e possibilidades de variações, contendo certo grau de liberdade e criatividade, limitado e ao mesmo tempo determinado pelas demandas do esporte específico5,11,17-20.

O modelo, que preconiza a utilização do método de sequência conjugada, compreendendo a introdução sucessiva no programa de treinamento de meios específicos, separados e concentrados no tempo em função do potencial, direção e efeitos acumulativos e posteriores, prevê a concentração de cargas de diferentes orientações (direções, finalidades) fisiológicas em determinadas etapas concretas da preparação. Por consequência, tem-se a predominância de estímulos com uma ênfase primária e um mínimo volume de carga destinado ao treinamento e manutenção das outras capacidades17.

Esse sistema também tem sido entendido como uma estratégia de variação intermesociclo que envolve períodos de acumulação ou overreaching intencional, seguido por outro de restituição, durante o qual respostas acima das alcançadas pelo sistema de periodização clássico são esperadas6. Esse fenômeno do overreaching funcional ou deliberado, reportado e conceituado na literatura21, é frequentemente utilizado por inúmeros atletas e técnicos durante determinados ciclos de treinamento.

Além disso, é plausível considerar que esse fenômeno guarda estreita relação com a resposta característica da concentração de cargas no modelo de treinamento em bloco, notadamente com as cargas concentradas de força, cujo papel no modelo é central e norteador. Ademais, pare-ce razoável admitirmos que esses efeitos, resultantes dos modelos de intensificação do treinamento em etapas (4-6 semanas), seguidos de etapas de redução da carga (taper; habitualmente 2 semanas), possam sustentar cientificamente os postulados relativos ao modelo de concentração de cargas de diferentes orientações (treinamento em bloco), agregando evidências aos dados e relatos dos treinadores, atletas e propositores do modelo.

O sistema de treinamento em bloco, proposto por Verkhoshansky17 está inserido no contexto das teorias relacionadas com a organização do processo de treinamento esportivo, como um modelo de planificação contemporâneo22-24. Para Gomes22, Oliveira23 e García-Manso et al24, esses modelos são caracterizados e discutidos com base em quatro aspectos:

1) A individualização das cargas de treinamento, justificada pela capaci-dade individual de adaptação do organismo.

2) A concentração de cargas de trabalho de uma mesma orientação em períodos de curta duração, levando a uma redução das capacidades e objetivos que se devem treinar dentro de uma estrutura média (ciclo médio/mesociclo) e o conhecimento profundo do efeito que produz cada tipo de carga de treinamento sobre as demais orientações que se desenvolvem no mesociclo.

3) Tendência a um desenvolvimento consecutivo de capacidades e objetivos, utilizando o efeito residual de cargas trabalhadas anteriormente.

4) Incremento do trabalho específico de treinamento. As adaptações necessárias para o esporte moderno só são possíveis com a realização de cargas especializadas.

Esses autores afirmam que a reserva atual de adaptação (RAA) está determinada pelo grau de desenvolvimento que o indivíduo e/ou o sistema alcançam em um momento concreto da vida esportiva. Conforme aumentam os níveis de rendimento adquiridos mediante o treinamento e a prática esportiva, diminui a reserva potencial de treinamento que se possui, porém, é possível suportar maiores níveis de carga, sem que o sistema seja excessivamente explorado. Esse fenômeno implica que, para uma carga determinada de treinamento, a fadiga é menor, e a recuperação, mais rápida e eficaz.

Adicionalmente, García-Manso et al24 entendem que o grau de adaptação que é capaz de alcançar um esportista é determinado pela reserva de adaptação que possui o seu organismo. Portanto, a intensidade, o volume e a duração das influências do treinamento determinam o desenvolvimento ótimo da RAA do corpo. Se a magnitude das influências estiver abaixo de determinado nível, o corpo não exigirá o máximo da RAA, porém, se o exceder, produzir-se-á o esgotamento do potencial de reserva e o efeito do treinamento será baixo ou negativo.

Os conceitos anteriormente citados demonstram a dimensão dessa perspectiva de abordagem do treinamento. Desse modo, pode-se en-tender a afirmação de Verkhoshansky17 no sentido de considerar a organização de treinamento eficaz tão somente quando se produz um aumento máximo da RAA do corpo mediante um volume apropriado de carga; em consequência, devem emergir meios apropriados de programar e organizar o treinamento e formas concretas de se avaliar a RAA, assim como critérios norteadores de determinação dos conteúdos e magnitudes das cargas de treinamento necessários para melhorar a RAA.

Um dos efeitos mais importantes da utilização das cargas concentradas é o efeito posterior duradouro de treinamento (EPDT)11,18. Após a saturação do sistema com um tipo de estresse durante algumas semanas, e com um possível decréscimo em determinadas capacidades do esportista por conta de uma fadiga residual, a ênfase é essencialmente modificada durante o subsequente bloco. O volume de treinamento de força (bloco de força) é marcadamente reduzido, enquanto o volume de carga para outra capacidade, tarefa/orientação (técnica/velocidade) é moderado e gradativamente incrementado. Espera-se então um efeito "rebote" no desempenho esportivo, explorando-se o fenômeno do EPDT, permitindo o alcance de níveis superiores de velocidade de movimento e de execução técnica.

Essa possível diminuição da capacidade de desempenho do atleta durante ou imediatamente após a concentração das cargas de força poderia ser explicada, pelo menos em parte, por alterações importantes relacionadas à homeostase do organismo. Fry et al25 conceituam essa possível alteração da homeostase com concomitante redução dos indicadores funcionais como uma diminuição intencional na performance do esportista, criada pela dificuldade do programa de treinamento com o objetivo posterior de propiciar o efeito rebote. Os autores também denominam esse conceito, ou estratégia de delineamento do treinamento, de overreaching. Essa estratégia prevê uma grande demanda de trabalho (treinamento) seguida pelo denominado incremento rebote explorando o potencial genético do indivíduo25. Essa associação entre os fenômenos, por vezes discutidos de forma diferenciada e com abordagem distinta nos delineamentos na literatura, parece adicionar evidências da utilidade das concentrações de carga no que diz respeito ao objetivo concreto de propiciar o efeito rebote, ou ainda o EPDT.

Estudos com delineamento de overreaching e testes de campo no esporte coletivo: a chave das evidências para os modelos de cargas concentradas?

As considerações anteriores sobre os fenômenos de overreaching, efeito rebote e EPDT, adicionadas aos achados de vários estudos sobre a intensificação deliberada ou não do treinamento, podem contribuir com um entendimento maior dos efeitos decorrentes das cargas concentradas e, por consequência, oferecer evidências para a sustentação do modelo.

Por exemplo, tem sido reportado no esporte coletivo que cargas intensas de treinamento com insuficientes períodos de recuperação podem ser as causas do overreaching e da síndrome do overtraining. Investigações no futebol26,27 handebol28 e basquetebol29 revelaram que a ausência de apropriados períodos de recuperação pode levar a reduções do desempenho na força e a alterações nas funções fisiológicas.

Adicionalmente, Coutts et al30 examinaram a influência de uma intensificação de treinamento deliberada de seis semanas na força, resistência, potência e nas respostas bioquímicas de jogadores semiprofissionais de rúgbi. Os resultados do estudo revelaram redução dos parâmetros de força, potência e resistência após a intensificação do treinamento, indicando possível estado de overreaching, revelando, assim, a importância dos parâmetros de performance para o monitoramento regular do processo de adaptação às cargas de treinamento e competição no esporte coletivo.

Em outro estudo com a intensificação deliberada de treinamento com jogadores de rúgbi31, os autores também revelaram a sensibilidade do teste de multiestágio para detectar possíveis estados de overreaching. Por outro lado, em contraste, somente um dos vários parâmetros bioquímicos utilizados (razão glutamina-glutamato) apresentou diferenças significantes entre o grupo de jogadores submetidos à intensificação do treinamento e o grupo controle.

No basquetebol, um grupo de jogadores adultos de alto rendimento foi submetido à intensificação deliberada do treinamento, a fim de que se observassem as respostas de determinados testes de campo a essa organização, particularmente em relação à sensibilidade destes para detectar possíveis estados de overreaching decorrentes da concentração de cargas de força, na primeira etapa da periodização32. Nesse estudo os participantes foram divididos em dois grupos. O grupo sem etapa de intensificação, considerado controle (treinamento normal - TN), e um grupo com etapa de intensificação do treinamento (TI). A investigação ocorreu no início do processo de treinamento do macrociclo. O grupo TI completou seis semanas de etapa de intensificação, buscando o overrea-ching funcional. Nesse estudo, recorreu-se às cargas concentradas de força aplicadas ao basquetebol18 para a intensificação do treinamento, diferentemente da estratégia adotada nos estudo de Coutts et al31,33 nos quais o volume de treinamento foi incrementado.

Os achados do estudo de Moreira32 demonstraram que testes distintos de desempenho podem apresentar certa heterocronia (diferença temporal de resposta adaptativa) e sensibilidade decorrente da intensificação do processo de treinamento. Os testes de natureza "explosiva", realizados por meio de ações rápidas, dependentes, possivelmente, de alta produção de potência, da taxa de aplicação de força, e utilizados na investigação para monitorar alterações relacionadas ao desempenho neuromuscular dos membros inferiores, não se mostraram sensíveis à intensificação do treinamento, não revelando, portanto, o esperado decréscimo no rendimento durante as semanas de intensificação.

Esse aspecto revela a necessidade de se investigar a intensificação do treinamento (overreaching intencional/funcional) e suas respostas também a partir da concentração das cargas de força, e não somente por meio da manipulação do volume de treinamento, podendo, dessa forma, avançar o conhecimento relativo às respostas dos atletas de esportes coletivos no modelo de treinamento em bloco.

Problemas relacionados às cargas concentradas no esporte coletivo e modelos alternativos

Um dos problemas relacionados com o processo de preparação esportiva no âmbito da planificação, seja adotando os conceitos do modelo tradicional de periodização do treinamento, seja no enfoque baseado na concentração de cargas de diferentes finalidades, sem dúvida, é o tempo reduzido destinado à preparação em função do calendário esportivo. Nesse sentido, Gomes22 preconizou o modelo de cargas seletivas com o objetivo de atender ao calendário dos esportes coletivos, em especial, o futebol.

O autor justifica a utilização desse modelo em virtude de o futebol não apresentar um período suficiente para uma boa preparação dos atletas antes do início dos jogos oficiais. Gomes22 justifica que o período competitivo no futebol varia de 8 a 10 meses no ano, com uma quantidade de 75 a 85 jogos na temporada; em função desse cenário, para o autor, não seria possível organizar a carga de treinamento a partir dos conceitos do modelo "clássico" de periodização. Uma característica peculiar do modelo proposto é a manutenção do volume de treinamento ao longo de toda a temporada (pequena oscilação), alternando as capacidades e, consequentemente, tarefas desenvolvidas a cada mês (mesociclo) da preparação.

Essa oscilação reduzida do volume de treinamento durante o macro-ciclo pode, segundo o autor, induzir a uma tendência de melhora da forma esportiva durante toda a etapa, com ligeira redução na fase de prétemporada, do segundo macrociclo, em razão de uma pequena redução do volume no início dessa segunda etapa competitiva.

De acordo com os conceitos do sistema de cargas seletivas, determinadas orientações (finalidades) de cargas devem ter em cada instante da preparação um "peso" maior sobre as demais, e, ao longo da preparação, a importância de utilização das diferentes orientações de cargas vai se modificando. O sistema de cargas seletivas, assim como o sistema de cargas concentradas (bloco), tem como alvo principal o aperfeiçoamento das capacidades de velocidade. Gomes22 apresenta um ciclo anual de 52 semanas, dividido em duas etapas, caracterizando dessa forma uma periodização dupla (bicíclica), com duração de 26 semanas cada.

O treinamento da força no contexto do modelo de cargas seletivas deve estar baseado nos movimentos velozes com prioridade nos trabalhos de força rápida na maior quantidade de sessões possíveis; o treinamento com pesos deve ter uma ação de fortalecimento muscular complementar.

Nesse sentido, Moreira et al34, investigando a possibilidade de aplicação do modelo de cargas seletivas no basquetebol, iniciaram a programação com predominância do treinamento com pesos, passando gradativamente à utilização de um maior volume dos exercícios de ação muscular reversível (pliométricos), de baixa para alta intensidade. O treinamento de força, desse modo, buscou utilizar as tarefas que propiciavam a realização dos movimentos rápidos, como os multissaltos, corrida com tração, entre outros. As cargas de alta intensidade metabólica e as competitivas foram, nesse primeiro momento, utilizadas em menor volume e tiveram caráter complementar. A velocidade e aceleração foram desenvolvidas por meio de exercícios de reação, aceleração máxima e de resistência de velocidade, devido à exigência especial do basquetebol. O volume de utilização dos esforços nesses domínios crescia gradativamente. Nesse estudo foram realizadas 51 sessões de treinamento ao longo da investigação. O primeiro momento de coleta de dados foi realizado durante a primeira semana do mesociclo e o segundo momento foi realizado no início da sexta semana de treinamento.

Com relação aos resultados apresentados, foram reportadas melhoras significantes nos indicadores de múltiplas acelerações (teste T adaptado), força (explosiva) de salto vertical com contramovimento, força explosiva de salto vertical sem contramovimento, salto triplo horizontal consecutivo lado direito, salto triplo horizontal consecutivo lado esquerdo e salto horizontal. A despeito da ausência de outro modelo (grupo) de periodização com o objetivo de comparar as respostas, esse estudo revelou a possibilidade de utilização do modelo para o basquetebol pela primeira vez no cenário brasileiro.

Esses achados adicionados aos reportados posteriormente, quando comparamos três modelos distintos de organização da carga de treinamento para o basquetebol, entre eles novamente o modelo de cargas seletivas, sugerem a possibilidade de utilização das cargas seletivas como alternativa ao modelo de treinamento em bloco, especialmente no caso da limitação de tempo apropriado para o desenvolvimento do modelo de concentração de cargas. Nesse estudo19, também sugeriu-se um modelo denominado de "complexo", o qual previa em um primeiro momento a concentração das cargas de força, porém, posteriormente, havia um delineamento que contemplava a carga de treinamento de forma diluída e semelhante à proposta de Gomes22 para a etapa competitiva.

A despeito de os três modelos se revelarem efetivos, o estudo mostrou que a dinâmica das respostas é distinta, e, portanto, se faz necessário o conhecimento do efeito da distribuição de cargas no processo de preparação; esse conhecimento, aliado aos objetivos da equipe e calendário esportivo, nortearão o treinador no sentido de se adotar um ou outro modelo de organização do conteúdo do treinamento.

Cargas concentradas no esporte coletivo: a multiplicidade de tarefas justifica a não adoção?

Apesar dos achados e proposições referentes aos modelos alternativos e concepções metodológicas para as diferentes modalidades esportivas, vários conceituados especialistas têm sugerido que os esportes coletivos, por apresentarem múltiplos objetivos, inúmeras e diferentes tarefas e demandas, não seriam apropriadamente contemplados pelos modelos de concentração de cargas unilaterais15,35.

Por outro lado, é razoável admitir que a limitação possa ser muito mais relacionada ao tempo disponível para a organização do processo de preparação do que às características peculiares do esporte coletivo. Evidentemente, o conteúdo da preparação, utilizando-se dos conceitos da periodização em bloco, será bastante distinto quando comparado ao conteúdo das modalidades de força-velocidade. Essa tentativa de explorar de forma criativa os conceitos básicos da periodização em bloco para as modalidades esportivas coletivas foi alvo de investigação do nosso grupo, particularmente no basquetebol18,19,32.

Por exemplo, em um estudo com jogadores de alto rendimento, participantes do principal campeonato nacional da modalidade, experimentamos dividir o ciclo anual em dois macrociclos com duração de 23 e 19 semanas, respectivamente18. Cada macrociclo consistiu em três etapas distintas. A primeira etapa (bloco A) caracterizou-se pela concentração das cargas de força, a segunda etapa (bloco B) foi caracterizada como uma etapa de restituição, com incremento gradativo do volume de exercícios de alta intensidade, e, por fim, a etapa competitiva (bloco C), com duração de 13 semanas. O efeito rebote (EDPT) observado para os testes de campo (indicadores funcionais) adotados na investigação sugere a efetividade do modelo para o esporte coletivo, evidentemente, desde que se tenha tempo suficiente para possibilitar a manifestação do fenômeno. Uma alternativa de estratégia, para as equipes cujo calendário competitivo não comporta tempo apropriado para a realização do treinamento em bloco, pode ser a adoção de modelos semelhantes ao proposto por Gomes22.

Monitoramento do processo de treinamento nos esportes coletivos

Em que pese a dificuldade de organização e realização das múltiplas tarefas de treinamento e o monitoramento das condições dos jogadores durante a temporada competitiva, a ausência de uma organização racional e de um rigoroso controle das respostas adaptativas ao longo do processo de preparação pode ser uma ameaça à manutenção do desempenho ótimo e da possibilidade da manifestação de elevados níveis de rendimento.

A preocupação com o nível de rendimento do jogador no esporte coletivo deve ser contemplada por um controle rigoroso de determinados elementos da preparação, desde a condição (estado) do jogador e os fatores que a influenciam, passando pelos efeitos parciais resultantes das diferentes orientações fisiológicas de cargas de treinamento e o seu potencial de treino, até, e fundamentalmente, a análise das adaptações de longo prazo do esportista de alta qualificação.

O desafio na organização dos modelos de periodização do treinamento, tanto no que tange à adoção do modelo clássico de periodização do treinamento, ou àqueles associados à concentração de cargas unidirecionais, ou ainda a outras propostas alternativas, é determinar a relação ideal entre dose e resposta, evidenciando a importância de se buscar o monitoramento sistemático do estresse de treinamento e da performance.

Urhausen e Kindermann36 consideram que o efeito da intensificação do treinamento é de difícil predição, pois as respostas individuais são bastante distintas entre os indivíduos; essas ponderações revelam a necessidade de se buscar alternativas para o monitoramento, na prática, das respostas dos diferentes jogadores em um mesmo grupo, normal-mente submetidos a cargas externas semelhantes, independentemente do modelo de periodização adotado.

Carga interna

Um problema recorrente para os treinadores é determinar a carga de treinamento apropriada para a prescrição durante a fase de competição da temporada esportiva37. Alguns fatores como a qualidade do oponente e consequentemente o grau de dificuldade da partida, o número de dias de treinamento entre os jogos e ainda as viagens para as partidas disputadas fora de seus domínios (como visitante) podem influenciar e ao mesmo tempo nortear a estruturação do planejamento das cargas de treinamento. Kelly e Coutts37 sugeriram que esses fatores deveriam ser levados em consideração para direcionar as cargas de treinamento durante a semana (microciclo). No entanto, essa proposta parece ainda não ter sido amplamente investigada.

De todo modo, as respostas perceptuais e métodos de monitoramento da carga de treinamento baseados na percepção do atleta para uma determinada atividade têm sido alvo de consistentes investigações. Essa abordagem possui uma possibilidade de aplicação prática bastante relevante e tem se mostrado um método confiável e válido para tanto. A necessidade de se buscar métodos práticos de monitoramento do treinamento no esporte coletivo é um desafio a ser constantemente perseguido, tanto por técnicos e atletas, quanto por pesquisadores da área. O monitoramento do processo de treinamento deve estar associado a uma medida válida da carga interna38 notadamente nos esportes coletivos, nos quais a carga externa de treinamento é frequentemente similar para todos os jogadores da equipe, em função da utilização predominante de exercícios e métodos dirigidos ao grupo de atletas como um todo.

Um dos exemplos desses meios e métodos "de grupo" é a ampla utilização dos denominados "jogos reduzidos" nas sessões de treinamento das equipes. O monitoramento do processo de treinamento tem sido mais amplamente realizado a partir da carga externa, ou seja, habitual-mente, atletas e treinadores utilizam-se de indicadores externos para controlar e monitorar as sessões e unidades de treinamento. Por exemplo, em se tratando de esportes coletivos, quantifica-se a duração e frequência dos "jogos reduzidos", do treinamento técnico e tático, relação entre exercícios gerais e específicos, entre outros.

No tocante às sessões de treinamento físico, considera-se a quantidade de trabalho expressa pelo número de saltos, pelas corridas cíclicas ou acíclicas em acelerações com distâncias e intensidades variadas, carga de treinamento nos exercícios com pesos (número de exercícios, séries, repetições e quantidade de peso levantado em quilos). Considera-se também o percentual de trabalho realizado a partir de diferentes métodos de treinamento ao longo da temporada19.

Refletindo sobre o binômio carga externa e carga interna, Impellizzeri et al39 propuseram um modelo teórico baseado na premissa de que as adaptações induzidas pelo treinamento são decorrentes do nível de estresse imposto ao organismo (carga interna de treinamento), o qual, por sua vez, será determinado pelas características individuais e pela quali-dade, quantidade e organização das variáveis do treinamento (carga externa de treinamento). Esse modelo também preconiza que as adaptações ao treinamento são dependentes e proporcionais ao estímulo decorrente da carga interna.

Essa utilização de meios e métodos dirigidos ao grupo de jogadores e sua associação com respostas individuais à carga externa também foi abordada em um estudo de Hoff et al40, no qual os autores reportaram que os jogadores de futebol com maior consumo máximo de oxigênio (VO2máx) tinham a tendência de se exercitar em percentagens inferiores dessa variável, quando comparados aos seus pares com valores de VO2máx inferiores.

Esses achados sugerem que essa abordagem metodológica (jogos reduzidos ou métodos similares) pode não oferecer estímulo suficiente para adaptações fisiológicas para alguns jogadores, particularmente aqueles cujo estado de treinabilidade é mais elevado, o que indicaria que os métodos de treinamento "em grupos" devem prever a utilização de indicadores de carga interna, objetivando os ajustes necessários na magnitude do estímulo e, portanto, a utilização eficaz da carga de treinamento, tanto no que tange à sua finalidade (direção), quanto no que concerne à sua magnitude.

A partir dessas considerações é pertinente assumir que o estímulo para as adaptações decorrentes do treinamento está relacionado ao estresse fisiológico (carga interna) imposto aos atletas pela carga externa41. Mesmo considerando que a carga externa seja o principal fator determinante da carga interna, sendo, portanto, fundamental para o monitoramento do processo de treinamento, outros fatores como nível de treinabilidade e potencial genético podem influenciar a carga interna imposta ao indivíduo e, consequentemente, modular a resposta.

Uma vez que a carga externa de treinamento é a variável mais comumente controlada39, o monitoramento da carga interna de treinamento torna-se vital para o sucesso do processo, sendo que esta pode ser mensurada de diferentes formas.

Diversos parâmetros podem ser utilizados para avaliar a carga inter-na, como, por exemplo, o perfil hormonal (cortisol, testosterona, hormonio de crescimento (GH), etc.), a concentração de metabólitos (lactato e amônia), o comportamento da frequência cardíaca e a percepção subjetiva do esforço (PSE). Vários desses parâmetros têm sido objetos de estudo nos jogadores de esportes coletivos, buscando maior compreensão dos efeitos das cargas de diferentes naturezas e orientações.

Por exemplo, pesquisadores buscaram comparar as respostas hormonais de sessões de treinamento ou exercícios realizados em situações laboratoriais com jogos oficiais em diferentes modalidades esportivas coletivas. Nesse sentido, Filaire et al42 demonstraram que a atividade competitiva induzia a maiores incrementos na resposta hormonal do que os exercícios realizados em laboratório, em jogadores de elite de handebol e voleibol do sexo feminino.

Elloumi et al43 corroboraram esses achados, revelando incrementos significantemente superiores do cortisol após um jogo de rúgbi do que após uma atividade extenuante realizada no laboratório. Esses resultados sugerem que as cargas competitivas induzem a maior magnitude de estresse, provavelmente decorrente de uma maior demanda fisiológica e psicológica do que as sessões de treinamento, o que indicaria a necessidade de se levar em consideração não somente a demanda metabólica da atividade, mas também a natureza desta.

Adicionalmente, outros estudos têm revelado uma grande variabili-dade de respostas individuais a uma mesma carga externa, para diferentes parâmetros e delineamentos no esporte coletivo. Moreira et al44, investigando a resposta do cortisol salivar a uma modelação da atividade competitiva, não encontraram diferenças significantes quando comparados os momentos pré e pós-simulação. Entretanto, nesse estudo, os valores individuais são apresentados e demonstram que alguns jogadores tiveram incrementos consideráveis, revelando a necessidade de se monitorar individualmente a carga interna no esporte coletivo.

Em outra investigação com jogadores profissionais de futebol, utilizando-se a imunoglobulina salivar A como parâmetro, também emergiu a grande variabilidade intragrupo45. No estudo, é possível observar, por exemplo, que 12 dos 24 jogadores investigados apresentaram incrementos nos valores da taxa de secreção da imunoglobulina salivar A, ao passo que 10 jogadores revelaram queda para o parâmetro.

Esses achados corroboram as afirmações de que, dentro de um mesmo grupo, diferentes respostas fisiológicas podem ser verificadas em face de uma mesma carga externa, nesse caso, para um marcador da imunidade da mucosa. É possível especular que esses indivíduos que revelaram queda para tal marcador poderiam estar, naquele momento, mais suscetíveis a infecções do trato respiratório superior do que seus pares que apresentaram resposta inversa, o que sugeriria uma abordagem distinta de procedimentos e aplicação de carga de treinamento, a fim de preservar a imunidade desses jogadores e consequentemente minimizar a chance de episódios de infecções banais.

O monitoramento das variáveis hormonais e imunes, apesar de prover um bom diagnóstico para avaliação do estresse imposto por sessões de treinamento, demanda um alto custo e grande quantidade de tempo despendido no laboratório para as coletas. Essas limitações têm implicações importantes para o controle do treinamento no dia a dia, para treinadores e atletas, assim, a utilização dos métodos baseados na percepção dos esportistas em relação ao conteúdo de treinamento, entendida como conceito de carga interna, torna-se fundamental para o monitoramento do processo.

Historicamente, as variáveis "volume" e "intensidade" têm norteado a estruturação do treinamento e as divisões dos ciclos de preparação durante a temporada nos esportes coletivos. Enquanto o volume de treinamento é relativamente fácil de quantificar, a intensidade ainda é objeto de discussão. A PSE da sessão emerge como um instrumento bastante útil para tal monitoramento. Os benefícios da utilização da PSE da sessão incluem a possibilidade de os treinadores avaliarem e compararem o estresse de treinamento durante cada componente do treinamento46. O monitoramento das adaptações decorrentes do processo de treinamento de forma individualizada, assim como da efetividade das estratégias de periodização, também pode ser realizado47,48.

Wallace et al46 exemplificam essa possibilidade, sugerindo que, para uma carga externa predeterminada, um incremento da PSE da sessão poderia ser um indicador do incremento da fadiga ou diminuição do nível da capacidade de trabalho do atleta. Por outro lado, uma redução na PSE da sessão para a mesma carga predeterminada poderia indicar adaptação ao treinamento. Esse procedimento, por sua vez, poderia "guiar" o treinador no sentido da organização da magnitude das cargas de treinamento ao longo da preparação e, adicionalmente, poderia ser utilizado para o entendimento e interpretação das respostas de adaptação decorrentes das diferentes etapas de periodização do treinamento, como os períodos de intensificação do treinamento e os de redução.

A validade da PSE da sessão foi investigada em algumas modalidades acíclicas e coletivas, merecendo destaque o futebol48-50. Ao se analisar os diversos tipos de treinamento realizados pelos jogadores (físicos e técnicos), mais os esforços em jogos oficiais, foram encontradas fortes correlações entre o método da PSE da sessão e os TRIMPs pelos métodos de freqüência cardíaca [FC] (r = 0,83-0,85) comparáveis às de modalidades cíclicas e aeróbias49. No entanto, ao se separar as análises por métodos de treinamento, observaram-se correlações ligeiramente mais fracas, tanto para exercícios de natureza aeróbia (r = 0,60-0,79), quanto de velocidade (r = 0,61-0,79) e treinos técnicos (r = 0,68-0,82). Para os jogos (r = 0,49-0,64) e sessões de treinamento de força (r = 0,25-0,52), as correlações foram ainda mais fracas. Estes achados indicam que para as atividades intermitentes, as cargas de treinamento calculadas a partir das respostas perceptuais e cardiovasculares não se relacionam fortemente. Isso não significa, necessariamente, que a PSE da sessão não seja válida nessas condições, mas sim que o critério adotado com base na FC pode não refletir, fielmente, a carga interna quando as sessões de treinamento envolvem esforços estocásticos e de alta intensidade.

Outros estudos utilizando a PSE da sessão também revelaram a sua confiabilidade e ampla possibilidade de utilização. Coutts et al30, por exemplo, monitoraram seis semanas de treinamento, com 5 a 7 sessões de treinamento físico por semana de jogadores de rúgbi semiprofissionais australianos. Além dos testes bioquímicos, funcionais e de performance, foi utilizada a PSE da sessão a fim de comparar o esforço percebido do grupo cujo modelo previa a intensificação do treinamento e o grupo controle. O grupo que intensificou o treinamento, ou seja, aquele do overreaching intencional apresentou valores significativamente maiores de PSE do que o grupo controle (treinamento normal) em todas as semanas do experimento, exceto na sétima semana, que previa redução e equiparação da carga de treinamento para ambos os grupos. Em outro estudo31 com a mesma população os resultados foram bastante semelhantes, revelando a sensibilidade da PSE da sessão no monitoramento do processo e sua utili-dade prática para controle da periodização do treinamento.

Além do rúgbi e do futebol, outros esportes coletivos também foram objeto de investigação com a PSE da sessão. Foster et al48 e Manzi et al51 demonstraram a validade do método da PSE da sessão para o monitoramento da carga interna para jogadores do college e profissionais de basquetebol, respectivamente. Manzi et al51 investigaram oito jogadores profissionais de basquetebol e verificaram correlações significantes entre a carga de treinamento derivada da PSE da sessão e a resposta individual da frequência cardíaca (r = 0,69 a 0,85; P < 0,001).

Moreira et al52 por sua vez, investigaram jovens jogadores de basque-tebol e voleibol durante seis semanas, em 60 sessões de treinamento. Em cada unidade de treinamento (dia), os jogadores realizavam em média duas sessões. Durante o experimento, os atletas participaram de seis jogos oficiais, pelo campeonato estadual, em cada uma das modalidades. Em cada sessão, era utilizada a percepção subjetiva de esforço da sessão (PSE da sessão) e, ao final da semana, os atletas preenchiam o daily analysis of life demands in athletes (DALDA)53 para o monitoramento do estresse percebido (tolerância ao estresse). Os atletas realizavam o preenchimento da PSE da sessão e do DALDA de maneira individual.

Os resultados do estudo revelaram uma interessante congruência entre a carga interna e a tolerância ao estresse. Nas duas primeiras semanas, a carga de treinamento foi significantemente superior à das demais semanas da investigação; nesse mesmo período, foi reportado um número superior e significante de respostas "pior do que o normal" no questionário DALDA, revelando o impacto da carga de treinamento na tolerância ao estresse.

Nas semanas subsequentes, com a redução da carga de treinamento, houve diminuição dos sintomas de adaptação negativa aos estresses, evidenciados pelo aumento do número de respostas "normal" dos diver-sos itens da parte B do DALDA (sintomas de estresse). Os resultados obtidos corroboram a hipótese inicial do estudo, reforçando os postulados de vários autores que consideram de fundamental importância o monitoramento do estresse percebido no esporte54.

Nesse sentido, Lehman et al55 sugerem que as diferenças individuais na capacidade de recuperação e na tolerância ao estresse podem explicar, pelo menos em parte, os diferentes tipos de respostas apresentados por atletas submetidos a cargas externas semelhantes. Em uma perspectiva prática, esse aspecto precisa ser considerado, pois sugere que dentro de um grupo de atletas uma mesma carga externa pode ser percebida e assimilada com diferentes magnitudes.

Esses achados e considerações sinalizam para a eficácia e efetividade da utilização da PSE da sessão como forma de monitorar apropriadamente as exigências e demandas das sessões, microciclos, mesociclos e macrociclos de treinamento nos esportes coletivos. A carga interna revelada pelos valores de PSE da sessão pode oferecer suporte fundamental no sentido da organização e reorganização da carga de treinamento por parte dos treinadores. Desse modo, é possível acompanhar, por meio de instrumento de fácil acesso, útil e prático, as respostas decorrentes das diferentes estruturas de periodização do treinamento, independentemente da estratégia ou modelo utilizado.

Recomendações finais

O monitoramento das respostas individuais de adaptação, agudas ou crônicas, é fundamental para a análise da eficácia do modelo em um enfoque complexo, que está longe de ser linear e, por isso, depende da observação e análise sistemática dos efeitos das cargas de treinamento e competição. Vários autores têm apontado para sensibilidade de testes de campo para o monitoramento do processo19,31-33,56,57.

Assim, a utilização em conjunto da PSE da sessão com testes de campo com rigor e procedimentos metodológicos apropriados emerge como uma estratégia fidedigna e necessária para tal acompanhamento, e possivelmente reflita não somente a carga de treinamento, mas a estrutura de periodização e outros fatores estressantes inerentes.

Nesse cenário de análise, considerações acerca de achados de estudos com esporte coletivo, propostas e especulações a respeito da planificação e monitoramento do treinamento esportivo, vale ressaltar a necessidade de uma maior discussão e abordagem acadêmica, com perspectiva real de aplicação prática decorrente do entendimento de que a relação dos diversos fatores envolvidos no treinamento esportivo é um problema dinâmico não linear.

Constantes variações entre esses fatores podem criar um sistema oscilatório58, sugerindo que a utilização da teoria do caos com a finalidade de se buscar identificar os fatores atraentes chaves e suas relações no sistema poderia auxiliar no avanço do nosso conhecimento no que concerne às respostas individuais e grupais. Adicionalmente, um olhar não linear, com a ótica dos sistemas complexos, aceitando que o comportamento é, sim, caótico e de interconexão de processos, poderia também nos auxiliar na compreensão e determinação da estrutura e lógica inter-na do esporte59.

Contudo, essa forma de afrontar o esporte, globalizante, reflexiva, dinâmica e participativa, como propõem García-Manso et al59, parece reforçar a necessidade de se investigar o esporte, e mais especificamente a planificação e as respostas decorrentes desta, dentro do contexto real, respeitando a identidade do esporte específico.

As considerações acerca das respostas aos diferentes conteúdos de treinamento, e particularmente dos delineamentos experimentais expostos no presente artigo, estão longe de sugerir uma ideia de relação linear entre o que se sucedia no treinamento e as respostas decorrentes, mas, por outro lado, reforçam a necessidade da busca do entendimento do input-process-output, porém, com o pressuposto de que o sistema é complexo e dinâmico.

O treinamento esportivo, na ausência de um modelo norteador de organização do conteúdo, contemplado por um monitoramento sistemático da resposta individual à relação "entrada-processo", pode levar o treinador à impossibilidade de gerir apropriadamente o sistema, exatamente por conta da característica dinâmica e não linear do fenômeno.

Portanto, há a evidente necessidade de continuarmos a buscar com maior rigorosidade e validade ecológica as tecnologias procedimentais para a implementação e para o monitoramento do processo de organização do treinamento por meio de diferentes modelos de periodização do treinamento, que passa, invariavelmente, por um avanço no entendimento das respostas geradas por esses modelos, assim como por uma compreensão maior dos fatores que levam a essas respostas diferenciadas dentro de um grupo de esportistas submetidos a um dado modelo. Para tanto, é desejável a adoção de indicadores válidos, confiáveis, práticos e úteis, que auxiliem na eficácia dessa abordagem.

Agradecimentos

Agradeço à FAPESP pelo auxílio financeiro (linha de fomento, auxilio a pesquisa, projeto de pesquisa regular processo 2008/10404-3), e faço um agradecimento especial ao Prof. Dr. Emerson Franchini, do Departamento de Esporte, da Escola de Educação Física e Esporte, da Universidade de São Paulo, pela valiosa colaboração no que diz respeito à revisão do presente texto, pelos comentários e sugestões, assim como pelo apoio durante toda a preparação do artigo.


Contacto:

A. Moreira

Departamento de Esporte.

Escola de Educação Física e Esporte. Universsidade de São Paulo.

Av. Prof. Mello de Moraes, 65. Cidade Universitária. 0555080030 São Paulo. Brasil.

E-mail: alemoreira@usp.br

Historia del artículo:

Recibido el 20 de junio de 2010

Aceptado el 17 de julio de 2010

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