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Vol. 34. Núm. 4.
Páginas 447-453 (diciembre 2016)
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Vol. 34. Núm. 4.
Páginas 447-453 (diciembre 2016)
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Necessidades de assistência à criança com deficiência – Uso do Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade
Care needs of children with disabilities – Use of the Pediatric Evaluation of Disability Inventory
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Fernanda Moreira Teles, Rosa Resegue, Rosana Fiorini Puccini
Autor para correspondencia
rosanapuccini@gmail.com

Autor para correspondência.
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil
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Tablas (4)
Tabela 1. Tipo de deficiência de crianças em processo de inclusão. Diretoria Regional de Ensino – Penha, São Paulo (2007‐2009)
Tabela 2. Escolaridade dos cuidadores de crianças em processo de inclusão. Diretoria Regional de Ensino – Penha, São Paulo (2007‐2009)
Tabela 3. Necessidade de assistência referida pelo cuidador, segundo os tipos de deficiências. Médias e desvios‐padrão obtidos nas áreas de autocuidado, mobilidade e função social. Diretoria Regional de Ensino – Penha (2007‐2009)
Tabela 4. Habilidades funcionais de crianças em processo de inclusão e necessidade de assistência referida pelo cuidador, segundo as áreas de autocuidado, mobilidade e função social. DRE – Penha, São Paulo (2007–2009)
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Resumo
Objetivo

Descrever as necessidades de assistência referidas por cuidadores de crianças com deficiência em processo de inclusão escolar, por meio do Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade.

Métodos

Estudo transversal com 181 crianças de 7‐10 anos com deficiências físicas ou mentais, que se encontravam em processo de inclusão escolar no ciclo Fundamental I, em 2007. Local: 31 escolas da Diretoria Regional de Ensino – Distrito Penha, Zona Leste do Município de São Paulo. Foram avaliadas as necessidades de assistência do cuidador da criança em três áreas – autocuidado, mobilidade e função social, por meio do Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade, segundo a seguinte pontuação: 5 Independente, 4 Supervisão, 3 Assistência mínima, 2 Assistência moderada, 1 Assistência máxima e 0 Assistência total. Para análise estatística, usou‐se o teste t de Student e análise de variância (Anova) e foi significativo p<0,05.

Resultados

As menores médias, com diferença estatística, foram observadas para os itens relacionados à função social (55,8‐72), seguidas das funções de autocuidado (56‐96,5) para todos os tipos de deficiência, com exceção das crianças com deficiência física que apresentaram menores médias para autocuidado (56) e mobilidade (63,8).

Conclusões

A função social foi a área referida como a que necessita de maior assistência do cuidador e o Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade é um instrumento que pode contribuir para identificar essas necessidades e para o desenvolvimento de uma intervenção mais dirigida.

Palavras‐chave:
Saúde da pessoa com deficiência
Crianças com deficiência
Reabilitação
Atividades cotidianas
Abstract
Objective

To describe the care needs reported by caregivers of children with disabilities going through the school inclusion process using the Pediatric Evaluation of Disability Inventory.

Methods

Cross‐sectional study with 181 children aged 7 to 10 years with physical or mental disabilities, undergoing the inclusion process in Elementary school in 2007. Location: 31 schools of the Regional Education Board ‐ District of Penha, East Side the city of São Paulo. The children's care needs according to the caregivers were assessed in three areas ‐ self‐care, mobility and social function, using the Pediatric Evaluation of Disability Inventory, according to the following score: 5, Independent; 4, Supervision; 3, Minimum Assistance; 2, Moderate Assistance; 1, Maximum Assistance and 0, Total Assistance. For statistical analysis, we used Student's t‐test and analysis of variance (ANOVA), with p<0.05 being statistically significant.

Results

The lower means, with statistically significant differences, were observed for the items related to social function (55.8 to 72.0), followed by self‐care functions (56.0 to 96.5); for all types of disabilities, except for children with physical disabilities, who had lower means for self‐care (56.0) and mobility (63.8).

Conclusions

Social function was the area referred to as the one that needed a higher degree of assistance from the caregiver and the Pediatric Evaluation of Disability Inventory is a tool that can help identify these needs and develop a more targeted intervention.

Keywords:
Health of individuals with disabilities
Children with disabilities
Rehabilitation
Daily activities
Texto completo
Introdução

A inclusão da criança com deficiência é um processo que se inicia no núcleo familiar. Esse núcleo pode ser definido como uma unidade social significativa inserida na sociedade, tem influência na determinação do comportamento humano e na formação da personalidade dos seus membros.1 O nascimento de uma criança com deficiência ocasiona mudanças significativas na organização e estrutura das famílias é reconhecido o papel decisivo que essas exercem no processo de reabilitação da criança, tanto no que se refere ao seu desenvolvimento como na sua independência em habilidades funcionais.2 Nesse processo, o apoio social recebido pelos cuidadores da criança com deficiência é fundamental, pois ameniza o estresse de mães e pais e promove vinculação mais adequada com seu filho.3 A resposta da família a esse desafio depende da sua experiência anterior, de aspectos socioculturais, das relações familiares e da existência de rede social de apoio a essa condição, sobretudo nas áreas da educação e saúde.2

A escola, além do seu objetivo tradicional de promover a educação e a integração social, cumpre assim um papel fundamental para reverter situações de exclusão ao promover ações de conscientização sobre os direitos das pessoas com deficiência.4,5 A educação inclusiva é definida como o conjunto de processos educacionais integrantes de políticas articuladas impeditivas de qualquer forma de segregação e de isolamento. Essas políticas buscam alargar o acesso à escola regular, ampliar a participação e assegurar a permanência dos alunos, independentemente de suas particularidades. Sob o ponto de vista prático, a educação inclusiva garante a toda criança o acesso ao ensino fundamental.6

Em 1990, no Brasil, esse movimento se fortaleceu com as conquistas estabelecidas na Constituição federal (1988) que afirma a igualdade de condições de acesso e permanência na escola e ressalta o dever do Estado com a educação, efetivado mediante a garantia de ensino fundamental obrigatório e gratuito para todos, inclusive aos que a ele não tiveram acesso na idade própria, e, ainda, atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.7

Diante das dificuldades de integração das crianças com deficiência, considera‐se importante que, por meio de um instrumento de avaliação já validado, possam ser oferecidos informações e subsídios que contribuam para a escola e para a família dessas crianças no processo de inclusão. O PEDI – Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade foi desenvolvido em resposta à crescente conscientização de que, embora a habilidade de participar em atividades de vida diária seja o principal objetivo para crianças com deficiência e suas famílias, não havia instrumentos que pudessem mensurar esses ganhos eficientemente. Segundo Mancini,8 os instrumentos anteriormente existentes frequentemente enfatizavam o fato de a criança melhorar seu desempenho nessas atividades, tomando como referência o fazer da criança sem deficiência. O autor coloca que a mensuração deve focar na melhora do desfecho final, independentemente dos métodos usados pela criança para desenvolvê‐los. A capacidade funcional verdadeira das crianças com deficiência era geralmente subestimada e os resultados funcionais de intervenções não podiam ser completamente avaliados. O PEDI oferece informações detalhadas sobre as incapacidades e a necessidade de assistência do cuidador no desenvolvimento das atividades em três áreas – autocuidado, mobilidade e função social.8

Assim, este estudo foi feito com o objetivo de descrever a assistência do cuidador oferecida às crianças com deficiência em processo de inclusão, por meio do Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade (PEDI).

Método

Estudo transversal analítico, feito nas escolas de ensino fundamental da Prefeitura Municipal de São Paulo, da Diretoria Regional de Ensino do Distrito Penha, Zona Leste. Cada uma das 13 diretorias regionais de ensino do município é responsável por um grupo de escolas e tem um serviço de apoio à inclusão – Cefai (Centro de Educação e Formação de Apoio à Inclusão). Esse serviço tem como atribuições o acompanhamento dos alunos com deficiência por meio de visitas sistemáticas às escolas, avaliação pedagógica, reuniões com professores e coordenadores pedagógicos, atendimentos a pais e mapeamento dos atendimentos da região. As escolas com maior número de crianças com necessidades especiais apresentam também salas de apoio à inclusão, denominadas SAAI – Salas de Apoio e Acompanhamento à Inclusão. Essas salas são destinadas ao atendimento educacional em caráter complementar, suplementar ou exclusivo aos alunos que apresentam algum tipo de deficiência. (http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Main/Page/PortalSMESP/Atendimento‐Educacional‐Especializado).

De 33 escolas da DRE – Distrito Penha, Zona Leste de São Paulo, 31 tinham crianças com deficiência matriculadas, as quais foram incluídas neste estudo. Foram contatados pela pesquisadora os diretores ou orientadores pedagógicos dessas escolas, para os quais foi feita uma apresentação da pesquisa, seus objetivos e procedimentos. Nessa ocasião, obtiveram‐se informações sobre o processo de inclusão desenvolvido em cada escola – acessibilidade, qualificação dos professores, sistemática de reuniões com os pais, suas dificuldades, incluindo a discussão e definição compartilhada sobre a progressão nas séries.

A população avaliada foi constituída por crianças de 7‐10 anos em processo de inclusão escolar no ciclo Fundamental I – 1a a 4a séries (antes da ampliação para 9 anos), em 2007. Foi considerado o total de crianças com deficiência que apresentava laudo diagnóstico; a listagem das crianças foi fornecida pelo Cefai – Centro de Educação e Formação de Apoio à Inclusão da DER – Diretoria Regional Penha, totalizando 200 crianças, em 2007. A partir da lista de alunos, os pais ou cuidadores foram convidados a participar da pesquisa; a entrevista foi agendada e feita na escola pela pesquisadora. Do total de 200 crianças, foram excluídas 19: 16 por não comparecimento ou dificuldades de responder ao questionário e 3 por recusa. Assim, a população final do estudo foi constituída por 181 crianças. No que se refere ao tipo de deficiência, neste estudo adotou‐se a nomenclatura usada pelo Cefai – Centro de Formação e Apoio a Inclusão, a qual é descrita a seguir:

Conduta típica: grupo de crianças com diagnóstico médico de hiperatividade, doenças psiquiátricas e transtornos de comportamento e alterações das aquisições cognitivas, incluindo deficiência mental de todos os níveis.

DGD – Deficiência global do desenvolvimento: grupo de crianças com autismo de todos os tipos (leve, moderado, grave) e Asperger. Esse termo é usado pela SME e corresponde ao Cid 10 – F84.

Deficiência física: deficiências por falta de membros, assimetria de membros, assim como deformidades ósseas e deficiências motoras.

Síndromes genéticas: grupo com laudo de síndromes genéticas.

Síndrome de Down (SD): o Cefai classifica separadamente esse grupo.

Múltiplas deficiências: crianças com dois ou mais comprometimentos. São incluídas as crianças que apresentam deficiências associadas a qualquer outra alteração/doença. Exemplo: deficiência motora e epilepsia; deficiência auditiva e visual, entre outros.

Outras deficiências: correspondem a laudos de doenças como síndrome da amplificação dolorosa, deficiência visual, dislexia, distúrbios de fala e outros.

Na tabela 1 encontra‐se a distribuição dos alunos segundo o tipo de deficiência. Observa‐se que a conduta típica é a mais frequente, seguida pelos grupos com múltiplas deficiências e deficiência física.

Tabela 1.

Tipo de deficiência de crianças em processo de inclusão. Diretoria Regional de Ensino – Penha, São Paulo (2007‐2009)

Tipo de deficiência  n° de alunos 
Conduta típica  55  30,4 
Deficiência física  27  14,9 
Deficiência global do desenvolvimento  12  6,6 
Dislexia  1,1 
Distúrbios de fala  13  7,2 
Deficiência visual  2,8 
Múltiplas deficiências  33  18,2 
Síndrome de Down  17  9,4 
Síndromes genéticas  12  6,6 
Outras deficiências  2,8 
Total  181  100,0 

O cuidador foi entrevistado por meio de questionário estruturado. Considerou‐se como cuidador qualquer pessoa, independentemente do grau de parentesco, que acompanha a criança no seu cotidiano durante as atividades diárias.

A avaliação da necessidade de assistência do cuidador foi feita por meio do Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade – PEDI (Pediatric Evaluation of Disability Inventory). O PEDI foi desenvolvido por Haley et al. em 1992 e validado para a população brasileira por Mancini em 2005. Trata‐se de questionário estruturado composto por três partes. A primeira avalia as habilidades funcionais da criança nas áreas de autocuidado (73 itens), mobilidade (59 itens) e função social (65 itens), pontua‐se em 1 quando a criança faz o item avaliado e 0 quando ela não consegue fazer. A Parte II relaciona‐se à necessidade de ajuda fornecida pelo cuidador para a execução de 20 itens das mesmas áreas avaliadas na primeira parte, autocuidado, mobilidade e função social, com a seguinte pontuação: 5 ‐ Independente, 4 ‐Supervisão, 3 ‐ Assistência mínima, 2 ‐ Assistência moderada, 1 ‐ Assistência máxima e 0 ‐ Assistência total. São exemplos de assistência do cuidador: Autocuidado – come e bebe nas refeições regulares; Mobilidade – locomoção em ambiente interno, consegue percorrer 15 metros e não inclui abrir portas ou carregar objetos; Função social – compreensão funcional, entendimento das solicitações e instruções. Os cuidadores entrevistados assinalaram a opção que se referia à assistência necessária para cada criança em cada uma das funções. A terceira parte do instrumento avalia as modificações/adaptações necessárias no ambiente da criança para as atividades. A pesquisadora foi a única a aplicar o PEDI, após treinamento recomendado pelos autores; embora o PEDI possa ser aplicado sem a presença do paciente, neste estudo empregou‐se o método de entrevista simultânea à observação direta da criança.8

Neste artigo, foram analisados os resultados referentes ao cuidador e à necessidade de assistência do cuidador (Parte II do PEDI). As análises com a pontuação original dos itens (média) foram transformadas em escalas de 0‐100, assim como sugerem McDowell and Newell.9

Para comparar as subescalas entre as variáveis do estudo, usou‐se o teste t de Student ou a análise de variância (Anova); considerou‐se um nível de significância de 5%. Foram feitas as comparações entre as três escalas (autocuidado, mobilidade e função social) para cada grupo de crianças com diferentes diagnósticos por meio da análise de variância com medidas repetidas (univariada). Quando houve diferença significante entre as escalas, esta foi identificada por meio do teste de comparações múltiplas de Bonferroni.

Este estudo foi aprovado, em 20/07/2007, pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (CEP: 1115/07).

Resultados

Dos 181 cuidadores entrevistados, 92,3% eram do sexo feminino. Na tabela 2 encontra‐se descrita a escolaridade dos cuidadores. Observou‐se que mais de 50% dos cuidadores tinham ensino fundamental II completo ou mais anos de estudo.

Tabela 2.

Escolaridade dos cuidadores de crianças em processo de inclusão. Diretoria Regional de Ensino – Penha, São Paulo (2007‐2009)

Escolaridade  Número de cuidadores 
Analfabeto  07  3,0 
Ensino fundamental I incompleto  17  9,4 
Ensino fundamental I completo  24  13,3 
Ensino fundamental II incompleto  31  17,1 
Ensino fundamental II completo  33  18,2 
Ensino médio incompleto  2,8 
Ensino médio complete  54  29,8 
Ensino superior incompleto  2,2 
Ensino superior completo  3,3 
Total  181  100,0 

Na tabela 3 apresentam‐se as médias de pontuação obtidas, a partir da referência do cuidador, em relação à necessidade de assistência para cada uma das funções das três áreas – autocuidado, mobilidade e função social. Houve diferença estatisticamente significante entre três escalas nas áreas de autocuidado, mobilidade e função social, para todos os tipos de deficiência. A função social foi a mais comprometida em todos os tipos de deficiência, com exceção da deficiência física, que apresentou menor média para autocuidado. Destaca‐se também a deficiência global do desenvolvimento, que apresentou valores mais baixos para a função social. A escala de mobilidade obteve, em média, melhores resultados para todos os tipos de deficiência, com exceção da deficiência física.

Tabela 3.

Necessidade de assistência referida pelo cuidador, segundo os tipos de deficiências. Médias e desvios‐padrão obtidos nas áreas de autocuidado, mobilidade e função social. Diretoria Regional de Ensino – Penha (2007‐2009)

Grupo de deficiência  Auto cuidado  DP  Mobilidade  DP  Função Social  DP  p‐valor 
Conduta típica  92,2  16,1  99,9  0,8  70,9  20,6  0,004 
Deficiência física  56,0  26,4  62,8  36,2  71,6  23,9  0,019 
DGD  66,0  26,6  95,2  7,6  53,7  26,0  <0,001 
Múltiplas deficiências  91,2  17,2  98,1  10,0  68,0  17,5  <0,001 
Síndrome de Down  77,2  17,1  99,5  1,5  55,8  21,1  0,001 
Síndromes genéticas  70,7  21,5  98,4  5,2  63,3  28,2  0,004 
Outras deficiências  96,5  12,5  100,0  0,0  72,0  14,5  <0,001 

DP, desvio padrão; DGD, Deficiência Global do Desenvolvimento.

Para detalhamento desses resultados, foi feita análise de comparações múltiplas, para cada tipo de deficiência, cujos resultados são apresentados a seguir:

Conduta típica – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×mobilidade (p‐valor=0,003) e mobilidade×função social (p=0,004).

Grupo de deficiência física – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×função social (p=0,019).

DGD – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×mobilidade (p=0,001); autocuidado×função social (p=0,030); mobilidade×função social (p<0,001).

Múltiplas deficiências – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×função social (p<0,001) e mobilidade×função social (p<0,001).

Síndrome de Down – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×mobilidade (p<0,001); autocuidado×função social (p<0,001); mobilidade×função social (p<0,001).

Síndromes genéticas – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×mobilidade (p=0,003) e mobilidade×função social (p=0,004).

Outras deficiências – houve diferença estatisticamente significante entre as médias obtidas entre autocuidado×função social (p=0,002) e mobilidade×função social (p<0,001).

Pode‐se verificar que as áreas autocuidado e função social apresentam‐se, em sua maioria, com diferença em relação à mobilidade, exceção da deficiência física. Essas áreas são, para o cuidador, as que mais requerem sua participação, ou seja, que mais necessitam de sua ajuda.

Na tabela 4 são apresentadas as pontuações obtidas pelas crianças – Escala Transformada da Criança – segundo as habilidades funcionais da criança referidas pelo cuidador e os resultados obtidos referentes à necessidade de assistência do cuidador para essas mesmas atividades – Escala Transformada do Cuidador. É possível observar que as médias obtidas pelas crianças nas atividades avaliadas são semelhantes à necessidade de assistência do cuidador em cada área, e que a função social é a área com menores pontuações.

Tabela 4.

Habilidades funcionais de crianças em processo de inclusão e necessidade de assistência referida pelo cuidador, segundo as áreas de autocuidado, mobilidade e função social. DRE – Penha, São Paulo (2007–2009)

  Média  Desvio padrão 
Escala transformada – Criança     
Pontuação: Autocuidado (0‐100)  87,7  18,4 
Pontuação: Mobilidade (0‐100)  93,4  20,0 
Pontuação: Função Social (0‐100)  72,5  19,3 
Escala transformada (Cuidador)     
Pontuação: Cuidador – Autocuidado (0‐100)  82,6  23,5 
Pontuação: Cuidador – Mobilidade (0‐100)  93,4  19,8 
Pontuação: Cuidador – Função Social (0‐100)  68,1  21,6 
Discussão

Este estudo foi feito numa região do município de São Paulo e, ainda que existam diferenças em relação às condições socioeconômicas de cada região, de ações desenvolvidas pelas escolas no processo de inclusão e de recursos para apoio social, os resultados deste estudo, o qual descreve as necessidades de cuidados das crianças com deficiência, são reveladores do cotidiano enfrentado pelos pais dessas crianças e apontam para possíveis ações a serem desenvolvidas junto às famílias como ponto essencial do processo de inclusão.

Diferentes aspectos podem atuar positiva ou negativamente nas potencialidades de atuação dos pais, com destaque para a escolaridade. Lopes e Corrêa10 descrevem que desde muito cedo a criança com deficiência e sua família são encaminhadas para diversos profissionais de saúde ou educação, os quais, por sua vez, prescrevem inúmeras orientações quanto aos cuidados necessários. São os pais, portanto, os principais agentes para a estimulação ou treinamento de algumas funções e são também responsáveis pela troca de informações entre a escola e o núcleo familiar, sobre como a criança faz algumas atividades e o grau de independência para a feitura delas.11,12

O comportamento dos pais exerce grande influência no desenvolvimento da criança e no seu bem‐estar. Interações positivas com os filhos estão associadas ao desenvolvimento cognitivo positivo, comportamental e psicossocial da criança. Estudo longitudinal que acompanhou desde o nascimento um grupo de crianças e jovens canadenses com distúrbios neurológicos e problemas de comportamento constatou que as condutas dos responsáveis pelos cuidados de crianças podem influenciar o desenvolvimento de crianças. Os autores consideraram, também, características sociodemográficas, concluindo que os pais de crianças com vários problemas de saúde apresentam atitudes menos positivas e menos consistentes, o que pode influenciar na eficiência do tratamento.12

Assim, o processo de inclusão da criança com deficiência depende do apoio familiar e também do nível de escolaridade dos cuidadores. Em nosso estudo cerca de 50% dos cuidadores, mães em sua maioria, haviam cursado até o Fundamental II ou mais, o que representa um fator positivo para compreensão das orientações, busca de acesso aos serviços de saúde e outros equipamentos de apoio à atenção à criança com deficiência. O fato de serem crianças inseridas no sistema educacional já pode ser resultante de um perfil familiar que tem acesso à informação e aos seus direitos, bem como valoriza e reconhece a importância de a criança frequentar a escola.

O processo de inclusão requer, por outro lado, integração com outras áreas, especialmente saúde e assistência social. A Constituição Brasileira (1988) afirma a igualdade de condições de acesso e permanência na escola e ressalta o dever do Estado com a educação, inclusive aos que a ela não tiveram acesso na idade própria, e, ainda, atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.7 Para sua concretização, entretanto, muitas barreiras precisam ser rompidas. Historicamente, as iniciativas de atenção à pessoa com deficiência tiveram como foco principal a filantropia, a institucionalização e a segregação.13 A progressiva ampliação do papel dos municípios, a mudança da concepção de segregação para inclusão e as políticas de saúde que buscam integração de ações constituem a possibilidade de superar as ações mais limitadas e voltadas para tipos específicos de deficiência.14 Os resultados deste estudo revelaram que, para todos os tipos de deficiência, inclusive física, há maior necessidade de ajuda dos pais para ações de autocuidado e função social. Portanto, ações específicas voltadas apenas para a deficiência e não para a criança e seus familiares não serão capazes de promover a real inclusão.

A atenção à criança com deficiência exige sistemas de cuidados que promovam a participação e o desenvolvimento de parcerias dessas famílias com os sistemas de saúde, educação e redes de apoio social, reorganizando as necessidades específicas dos pais e irmãos de crianças com deficiência, a fim de oferecer estratégias para que eles próprios obtenham saúde física, emocional e bem‐estar, incluindo grupos de apoio à família e serviços de saúde mental.15,16 Em relação aos cuidadores, estudo que também usou o PEDI demonstrou dados relevantes em relação à família, identificou diferenças de perfis da criança atendida de acordo com aspectos socioeconômicos dos familiares, os quais também influenciavam no suporte social percebido pelos cuidadores.17

Mantoan descreve a evolução dos conceitos de incapacidade e inadaptação, referindo que as características do indivíduo constituíram por muito tempo a única meta das intervenções educativas. Entretanto, a autora ressalta que, hoje, nenhum modelo educativo pode ignorar as características do funcionamento das pessoas que apresentam incapacidades intelectuais, sem considerar a interação destas com sua família e com o meio.18 Silveira et al.19 analisaram a concepção de educadores e parentes de crianças com múltiplas deficiências em processo de inclusão. Os resultados indicaram que os pais percebem a deficiência dos seus filhos como algo que acarreta grande sofrimento e comprometimentos sociais e que, assim como os professores, não acreditavam ser possível a inclusão escolar dessas crianças, por considerarem a escola de ensino regular despreparada para recebê‐las.

Segundo Sá e Rabinovich,20 no estudo “Compreendendo a família da criança com deficiência física”, a rede de apoio familiar favorece a formação de vínculos e a estruturação da vida da criança com deficiência física, ampliando suas possibilidades a partir da autoestima advinda da afetividade. Por meio das relações de cuidado, a família transmite valores como os de tolerância e respeito às diferenças, corroborando para um desenvolvimento adequado. No presente estudo, a função social foi a mais comprometida, inclusive nas crianças com deficiência física, corroborando a importância da família e da escola no seu processo de inclusão. O PEDI mostrou‐se um instrumento capaz de identificar de forma mais detalhada as dificuldades em cada uma das habilidades funcionais, com potencial para contribuir para uma intervenção mais direcionada dos pais e educadores, que vise a superar essas necessidades, quando possível. Os resultados de ações e estratégias desenvolvidas por pais e professores podem ser mensurados, uma vez que o PEDI identifica as capacidades das crianças, suas necessidades de assistência por cuidador e aponta para redirecionamento dessas ações.

Em outros estudos, o PEDI demonstrou ser eficiente na avaliação de diferenças no desempenho funcional e de necessidade de auxílio do cuidador, favoreceu e contribuiu na identificação de prejuízos no desempenho da criança, possibilitando ao cuidador que acompanhasse a evolução do tratamento e colaborasse com o plano de tratamento.21,22

Embora tenha sido feito em 2007, o processo de inclusão nas escolas regulares das crianças com deficiência constitui permanente desafio. Os resultados deste estudo podem contribuir para discussão quanto aos benefícios trazidos pelo uso de instrumentos de avaliação das capacidades e necessidades de crianças com deficiência, no acompanhamento desse processo. Está bem estabelecido que a educação da criança com deficiência é uma atividade complexa, pois exige adaptações de ordem curricular que requerem cuidadoso acompanhamento dos educadores e pais. Por outro lado, frequentar a escola permitirá à criança com deficiência adquirir, progressivamente, conhecimentos que serão exigidos da sociedade e cujas bases são indispensáveis para a formação do indivíduo.

O PEDI, somado a outros processos de avaliação e acompanhamento da criança em processo de inclusão, pode contribuir na identificação de limites e possibilidades de intervenção mais específicas, não apenas para cada criança, mas também para o conjunto de crianças com deficiência, direcionar as ações de educadores e do trabalho junto aos seus parentes. Neste estudo, seu uso apontou de forma mais objetiva que a função social é a que requer maior assistência do cuidador, o qual, além de orientação, necessita de apoio frente às exigências dessa condição. Está bastante estabelecida a forte carga emocional envolvida no cuidado à criança com deficiência e a resposta que a família dará a esse desafio dependerá das experiências passadas, da situação econômica, bem como de aspectos culturais e relações familiares. Nesse processo devem ser envolvidos a escola, os pais e a sociedade.

Baseado na tese

Identificação de incapacidades em crianças com deficiência inclusas em escolas municipais pertencentes à DRE – Diretoria Regional de Educação Penha – São Paulo, por meio do PEDI – Inventário de Avaliação Pediátrica de Incapacidade. Apresentado na Universidade Federal de São Paulo – 2011.

Financiamento

O estudo não recebeu financiamento.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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