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Revista Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo
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Inicio Revista Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo A satisfação com a vida e a adesão ao tratamento da diabetes dos jovens adult...
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Vol. 9. Núm. 2.
Páginas 122-128 (julio - diciembre 2014)
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Vol. 9. Núm. 2.
Páginas 122-128 (julio - diciembre 2014)
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A satisfação com a vida e a adesão ao tratamento da diabetes dos jovens adultos com diabetes tipo 1
Satisfaction with life and adherence to diabetes treatment of young adults with type 1 diabetes
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Lurdes Serrabulhoa,
Autor para correspondencia
lserrabulho@apdp.pt

Autor para correspondência.
, Margarida Gaspar de Matosb, João Valente Nabaisc, João Filipe Raposoa
a Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, Lisboa, Portugal
b Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal
c Universidade de Évora, Évora, Portugal
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Tablas (7)
Tabela 1. Estrutura fatorial da satisfação com a vida
Tabela 2. Adesão dos jovens ao tratamento da diabetes
Tabela 3. Adesão global dos jovens ao tratamento da diabetes
Tabela 4. Correlação bivariada entre os aspetos da adesão ao tratamento da diabetes com o teste de Pearson
Tabela 5. Correlação entre a hemoglobina glicosilada A1c e os aspetos da adesão ao tratamento da diabetes com o teste de Spearman
Tabela 6. Análise de regressão para determinação de preditores de número de refeições por dia
Tabela 7. Análise de regressão para determinação de preditores de horas de atividade física por semana
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Resumo
Introdução

A satisfação com a vida e a adesão ao tratamento dos jovens adultos com diabetes tipo 1 podem ser afetadas pela instabilidade originada pelas constantes mudanças sociais, ocupacionais, familiares e emocionais na vida dos jovens.

Objetivos

Avaliar os comportamentos de saúde, suporte social, satisfação com a vida e adesão ao tratamento dos jovens adultos com diabetes tipo 1.

Métodos

Este estudo foi realizado com jovens adultos que frequentaram as consultas de diabetes. Consistiu num estudo quantitativo, com aplicação de questionários a 278 jovens adultos (18‐35 anos) com diabetes tipo 1.

Resultados

Os jovens consideram ter bom suporte social e a média de satisfação com a vida é 6,6±1,7 (escala 0‐10).

A análise fatorial da escala de satisfação com a vida permitiu encontrar 2 fatores que explicam 75% da variância total: qualidade de vida (58%) e expetativas de mudança (17%).

A maior parte dos jovens evidencia boa adesão ao fracionamento da alimentação (83%), à insulinoterapia (83%), à vigilância glicémica (73%), mas apenas um terço pratica a atividade física recomendada. Verifica‐se correlação estatisticamente significativa positiva entre a adesão à alimentação, insulinoterapia e vigilância glicémica.

A média de HbA1c é 8,7±1,6%. Verificou‐se que quanto mais elevada a HbA1c menor a adesão às administrações de insulina e às pesquisas de glicemia.

Conclusões

Os jovens adultos com diabetes tipo 1 evidenciam bom suporte social e satisfação com a vida. Contudo, o controlo metabólico não é satisfatório, apesar da razoável adesão ao tratamento da diabetes e dos estilos de vida saudáveis. A continuidade da investigação com um estudo qualitativo com os jovens adultos poderá permitir compreender melhor estas discrepâncias.

Palavras‐chave:
Jovens adultos
Diabetes tipo 1
Comportamentos de saúde
Adesão ao tratamento
Satisfação com a vida
Suporte social
Abstract
Introduction

Nowadays, the life satisfaction and the adherence to diabetes management tasks of young adults with type 1 diabetes can be increasingly affectedby the change and instability at several levels, throughout early adulthood, namely social, occupational, familiar and emotional.

Aims

The objectives targeted the evaluation of lifestyles and health behaviours, social support, satisfaction with life and treatment adherence of young adults with type 1 diabetes.

Methods

This research was developed with young adults with type 1 diabetes that attended diabetes consultations. This study included a quantitative analysis of questionnaires filled in by 278 young adults with type 1 diabetes, ranging between 18 and 35 years old.

Results

Young adults consider having a good social support, from family, friends, peers and health care providers.

Satisfaction with life is scored at 6.6±1.7 (on a scale 0‐10).

Factorial analysis relating life‘s satisfaction scale allowed to find 2 factors that explain 75% of total variance: quality of life (58%) and changes’ expectations (17%).

Most of young adults show good adherence to dietary intake (83%), insulin therapy (83%) and glucose monitoring (73%), but only one third practice recommended physical activity. We verified positive statistically significant correlation between adherence to nutrition, insulin therapy and glucose monitoring.

Youngsters present 8.7±1.6% as mean value for HbA1c. The highest levels of HbA1c are related to less frequent glucose monitoring and less insulin administration.

Conclusions

The young adults with type 1 diabetes presented good social support and satisfaction with life. Nevertheless, despite a reasonable adherence to diabetes treatment and a healthy lifestyle, metabolic control is unsatisfactory, A qualitative research with focus groups is being developed to better understand and address these discrepancies.

Keywords:
Young adults
Type 1 Diabetes
Health behaviours
Treatment adherence
Satisfaction with life
Social support
Texto completo
Introdução

As mudanças sociais, económicas, culturais e estruturais nos países ocidentais têm resultado no prolongamento da maturidade psicológica para o final da adolescência ou para o início da juventude, correspondendo a um período intitulado de emergência da idade adulta. O jovem adulto está numa fase de desenvolvimento entre a adolescência e a idade adulta, compreendida entre os 20‐29 anos, mas que se pode prolongar para além dos 30 anos. Verifica‐se atualmente maior flexibilidade nas fronteiras etárias, pois a fase de assumir responsabilidades e papéis tradicionais de adultos como uma relação afetiva, ter filhos e começar a trabalhar começa mais tarde1–5.

Os jovens adultos com diabetes tipo 1 precisam também de integrar a doença no seu estilo de vida, o que lhes coloca novos desafios, pois a diversidade de oportunidades a nível académico, profissional, familiar e social pode gerar situações de sucesso ou insucesso, o que pode condicionar o controlo glicémico6.

A qualidade de vida relacionada com a diabetes refere‐se ao impacto da saúde, da doença e do tratamento no dia a dia. A gestão da diabetes pode interferir na vida social quando os jovens precisam de pesquisar a glicemia ou administrar a insulina e estão com amigos ou em contexto de trabalho5. O suporte social é uma das variáveis que estão associadas à satisfação com a vida, saúde, bem‐estar e adaptação psicológica. A investigação confirma uma forte correlação entre o apoio social e a saúde, sugerindo que tem efeitos mediadores na proteção da saúde e desempenha um papel protetor ao longo de toda a vida7–9.

A educação terapêutica na diabetes é desenhada para formar as pessoas com doença crónica no desenvolvimento de capacidades de autogestão ou adaptação do tratamento à sua doença, para ajudar a pessoa e a família a gerir o tratamento e prevenir as complicações, enquanto mantêm ou melhoram a sua qualidade de vida10,11. Para manter uma boa gestão da diabetes os jovens precisam de apoio da família, amigos, namorados/cônjuges e profissionais de saúde5.

O autocuidado na diabetes implica que se façam adaptações nos diferentes aspetos do tratamento para manter um controlo metabólico adequado e reduzir a probabilidade de complicações. Estes cuidados referem‐se à adaptação da alimentação de acordo com as necessidades diárias, à atividade física (AF) regular, à administração e ajuste das doses de insulina, às pesquisas de glicemia e ao acompanhamento em consultas de vigilância periódica10,12,13.

As pesquisas têm demonstrado que os jovens com diabetes tipo 1 que fazem as consultas de vigilância regularmente e que têm melhor controlo glicémico têm melhor compensação e ganhos na saúde a longo prazo6,14.

O desenvolvimento deste trabalho está relacionado com a necessidade de realizar investigação com jovens adultos com diabetes tipo 1, na sequência da longa experiência de trabalho interdisciplinar realizado nesta instituição com crianças, adolescentes e jovens adultos com diabetes tipo 1, em consultas de vigilância periódica, consultas em grupo, sessões de educação em grupo, cursos, encontros e campos de férias15.

O trabalho apresentado faz parte de um projeto de investigação que incluiu um estudo quantitativo16 e um estudo qualitativo.

Os objetivos do estudo quantitativo, aqui em parte apresentado, referem‐se a:

  • 1

    Conhecer os estilos de vida e comportamentos de saúde, suporte social, satisfação com a vida e adesão ao tratamento e compensação da diabetes dos jovens adultos com diabetes tipo 1.

  • 2

    Detetar se os jovens com hemoglobina glicosilada mais elevada apresentam menor adesão ao tratamento da diabetes.

Material e métodos

Neste estudo participaram 278 jovens adultos com diabetes tipo 1, dos 18 aos 35 anos, dos quais 139 do sexo masculino (50%) e 139 do sexo feminino (50%), que frequentaram as consultas de vigilância periódica na instituição, no período entre abril de 2011 e abril de 2012 e aceitaram responder ao questionário, com preenchimento de consentimento informado, tendo sido informados dos objetivos do estudo e do caráter confidencial da informação individual recolhida. Os jovens adultos deste grupo etário que fizeram consultas de vigilância periódica na instituição durante o ano de 2011 foram 1.089, pelo que a amostra estudada se refere a 25,5% da população. O estudo decorreu depois de ter sido aprovado pela comissão de ética da instituição (setembro de 2010). O critério de exclusão foi patologia psiquiátrica descompensada.

O instrumento de colheita de dados foi um questionário, baseado no questionário utilizado no estudo «A Saúde e os Estilos de Vida dos Adolescentes com Diabetes Tipo 1»17,18, adaptado para este grupo etário.

O questionário tem 63 questões relacionadas com comportamentos de saúde, estilos de vida, satisfação com a vida, suporte social e diabetes. As 20 questões do âmbito da diabetes abordam a adesão ao tratamento, compensação, complicações, representações e adaptação psicológica.

Na maior parte das questões foram utilizadas escalas de Likert. A escala de satisfação com a vida varia entre 0=«pior vida possível» até 10=«melhor vida possível». As respostas ≥7 representam uma satisfação positiva com a vida.

Atendendo a que a adesão ao tratamento da diabetes está relacionada com a adesão à alimentação, AF, insulinoterapia e pesquisas de glicemia, em relação a cada um dos aspetos, considerou‐se adesão e pouca adesão:

Alimentação – número de refeições por dia (dia de semana):

  • adesão – 5 ou mais refeições por dia – score 1;

  • pouca adesão – 4 ou menos refeições por dia – score 0.

Atividade Física – número de horas de prática de AF por semana:

  • adesão – 3 horas ou mais – score 1;

  • pouca adesão – menos de 3 horas – score 0.

Insulinoterapia – número de administrações de insulina por dia:

  • adesão – 4 vezes por dia ou mais (5 ou mais) e bomba de insulina – score 1;

  • pouca adesão – 3 vezes por dia ou menos – score 0.

Pesquisas de glicemia – número de pesquisas de glicemia por dia:

  • adesão – 3 ou mais por dia – score 1;

  • pouca adesão – 1‐2 por dia ou menos.

A avaliação da compensação da diabetes foi baseada na análise de hemoglobina glicada (HbA1c), realizada no mesmo dia do preenchimento do questionário, no laboratório da instituição, com o método High Performance Liquid Chromatography (HPLC) por troca iónica.

Após adaptação do questionário seguiu‐se a fase de apreciação do mesmo pelo painel de especialistas da instituição, composto por 34 técnicos de saúde da equipa multidisciplinar com experiência no trabalho com crianças, adolescentes e jovens adultos com diabetes tipo 1. Em simultâneo foi solicitada a colaboração de 3 jovens e 4 adultos com diabetes tipo 1 para darem opinião sobre o questionário.

Quanto à análise de dados, este estudo consistiu numa Investigação quantitativa, com análise descritiva (os resultados são apresentados como média±desvio padrão e percentagens), fatorial, correlacional e inferencial. O tratamento estatístico dos dados foi efetuado com o programa «Statistical Package for Social Science» – SPSS para Windows (SPSS, versão 19, IBM, Nova Iorque, EUA).

Para estudar as características psicométricas dos itens da escala de satisfação com a vida desenvolveu‐se uma análise fatorial exploratória de componentes principais. Para aferir a qualidade das correlações entre variáveis utilizou‐se o método estatístico de Kaiser‐Meyer‐Olkin (KMO) e o teste de esfericidade de Bartlett19.

ResultadosDados demográficos

A média de idade dos jovens é de 27±5 anos. Em média, os jovens têm diabetes há 14±8 anos e frequentam as consultas na instituição há 12±8 anos.

No que se refere às habilitações, 45% têm formação superior, 42% têm habilitações entre 10.°/12.ª ano e 13% têm habilitações iguais ou inferiores ao 9.° ano de escolaridade.

Em relação à ocupação, 23% dos jovens estudam, 57% trabalham e 9% estudam e trabalham.

Relativamente ao agregado familiar, 39% dos jovens vivem com marido/mulher/companheiros, 15% têm filhos e cerca de 50% vivem com os pais.

Apoio social e relações afetivas

Relativamente ao à vontade que sentem para falar sobre os temas que os preocupam, os jovens consideram ser fácil e muito fácil falar com familiares (58‐88%), amigos (90%), namorados (92%), pessoas com diabetes (79%) e equipa de saúde (64‐82%).

No que se relaciona com o à vontade que sentem para falar sobre a diabetes, a maior parte dos jovens referem ser fácil e muito fácil falar com a família (78‐96%), amigos (84%), namorados (92%) e equipa de saúde (81‐93%).

Satisfação com a vida

A média de satisfação com a vida dos jovens, numa escala de 0 (pior vida possível) a 10 (melhor vida possível) é de 6,6±1,7.

Para estudar as características psicométricas dos itens da escala de satisfação com a vida desenvolveu‐se uma análise fatorial exploratória de componentes principais. Os resultados relativos à matriz final com as 6 variáveis foram de 0,829 para o KMO, sendo o teste Bartlett de esfericidade muito significativo (qui‐quadrado 742,64 [15]; p <0,001).

Foram encontrados 2 fatores principais com eigenvalue superior a um (3,45 e 1,02). O 1.° fator explica 58% e o 2.° fator 17%, ou seja, 75% da variância total no conjunto dos 6 itens analisados.

Através da análise da natureza dos itens, optou‐se por denominar o primeiro fator por «Qualidade de vida», atendendo a que é caracterizado por uma forma positiva de encarar a vida e tem a ver com a realidade da vida. Os itens associados ao fator 2 ilustram as expetativas e os sonhos em relação à vida, a necessidade de ter uma vida diferente, pelo que foi denominado «Expetativas de Mudança».

Na tabela 1 observa‐se a proporção da variância total de cada variável explicada pelos fatores. Assim, as variáveis: «A minha vida corre bem», «Gosto de como as coisas me têm corrido», «Sinto‐me bem com o que me tem acontecido» e «Tenho uma boa vida», apresentam «pesos», por ordem decrescente, entre 0,857‐0,795, indicando que cada componente contribui para definir bem o fator «Qualidade de vida». Por outro lado, as variáveis: «Gostaria de mudar muitas coisas na minha vida» e «Desejava ter um tipo de vida diferente» apresentam «pesos», por ordem decrescente, entre 0,875‐0,824, contribuindo para definir bem o fator «Expetativas de mudança». Foram conservados todos os pesos superiores a 0,30, retiraram‐se da tabela 1 todos os pesos iguais ou inferiores a 0,30.

Tabela 1.

Estrutura fatorial da satisfação com a vida

Variáveis  Fator 1 Qualidade de vida  Fator 2 Expectativa de mudança 
A minha vida corre bem  0,857   
Gosto de como as coisas me têm corrido  0,849   
Sinto‐me bem com o que me tem acontecido  0,831   
Tenho uma boa vida    0,795 
Gostaria de mudar muitas coisas na minha vida    0,875 
Desejava ter um tipo de vida diferente    0,824 
Eigenvalues – valores próprios  3,45  1,02 
Percentagem de variância explicada  58%  17% 

Método de extração: análise de componentes principais.

Método de rotação: varimax com normalização de Kaiser.

A rotação convergiu em 3 iterações.

Adesão ao tratamento da diabetes

Pela observação da tabela 2, verifica‐se que mais de 4 quintos dos jovens apresenta boa adesão em relação à alimentação (83%) e à insulinoterapia (83%), cerca de 3 quartos apresenta boa adesão às pesquisas de glicemia (73%) e apenas 43% realizam a AF recomendada.

Tabela 2.

Adesão dos jovens ao tratamento da diabetes

  Adesão %  Pouca adesão % 
Adesão à alimentação  83  17 
Adesão à atividade física  43  57 
Adesão às pesquisas de glicemia  73  27 
Adesão à insulinoterapia  83  17 

Na tabela 3 pode observar‐se a frequência e a percentagem de adesão ao tratamento da diabetes por número de fatores de adesão em relação ao score 1 (boa adesão). Verifica‐se que cerca de 2 terços dos jovens apresentam boa adesão ao tratamento, com 39% dos jovens a apresentarem boa adesão a 3 aspetos do tratamento e 29% com boa adesão aos 4 aspetos do tratamento. Por outro lado, verifica‐se que cerca de um terço dos jovens apresenta adesão apenas a um e a 2 aspetos do tratamento.

Tabela 3.

Adesão global dos jovens ao tratamento da diabetes

Nível de adesão – score 1 – boa adesãoNúmero de fatores de adesão 
2,5 
25  9,0 
58  20,9 
108  38,8 
80  28,8 

No que se refere à adesão à alimentação, não se observaram diferenças estatisticamente significativas entre grupos etários (18‐26 anos e 27‐35 anos), mas verificaram‐se diferenças estatisticamente significativas entre género: as raparigas fazem mais refeições que os rapazes (χ2=12,394 [5] p=0,030).

Relativamente à adesão à AF, verificaram‐se diferenças estatisticamente significativas entre grupo etário – os jovens mais novos (≤26 anos) praticam mais atividade que os mais velhos (χ2=12,732 [6] p=0,048) – e entre género – os rapazes praticam mais AF que as raparigas (χ2=16,648 [6] p=0,011).

Quanto à adesão à insulinoterapia e às pesquisas de glicemia, não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre género nem entre grupo etário.

Correlação entre os aspetos de adesão ao tratamento da diabetes

Para verificar se existe correlação entre os vários aspetos de adesão ao tratamento da diabetes – número de refeições em dia de semana, número de horas de exercício físico por semana, número de pesquisas de glicemia por dia e número de administrações de insulina por dia – utilizou‐se o teste de correlação de Pearson.

Pode observar‐se na tabela 4 que se verifica correlação estatisticamente significativa positiva entre o número de refeições por dia e o número de pesquisas de glicemia por dia (r=0,127; p=0,036). Verifica‐se igualmente correlação estatisticamente significativa positiva entre o número de refeições por dia e o número de administrações de insulina por dia (r=0,144; p=0,022). Observa‐se também a correlação estatisticamente significativa positiva entre o número de pesquisas de glicemia por dia e o número de administrações de insulina por dia (r=0,348; p<0,001).

Tabela 4.

Correlação bivariada entre os aspetos da adesão ao tratamento da diabetes com o teste de Pearson

  Número de horas de atividade física  Número de refeições dia  Número de pesquisas de glicemia dia  Número de administrações de insulina dia 
 
Número de horas de atividade física  ‐       
Número de refeições dia  0,049  ‐     
Número de pesquisas de glicemia dia  –0,013  0,127*  ‐   
Número de administrações de insulina dia  0,066  0,144*  0,348**  ‐ 

p: valor p; r: coeficiente de correlação de Pearson; *: correlação significativa ao nível de 0,05; **: correlação significativa ao nível de 0,01.

Compensação da diabetes

Quanto ao valor da última análise de HbA1c – análise mais utilizada para avaliar a compensação da diabetes e referente à média dos últimos 3 meses, com valores recomendados até 7%20 – a média é de 8,7%±1,6 (mínimo 5%, máximo 15%).

Correlação entre a HbA1c e a adesão ao tratamento da diabetes

Para verificar se existe relação entre a HbA1c e os vários aspetos da adesão ao tratamento da diabetes utilizou‐se o teste de correlação de Spearman. Como se pode observar na tabela 5, verifica‐se que a HbA1c apresenta correlação estatisticamente significativa negativa com o número de pesquisas de glicemia por dia (r=–0,236; p<0,001) e com o número de administrações de insulina por dia (r=–0,160; p=0,014). Quanto às outras variáveis em estudo, não se verificam relações estatisticamente significativas, apesar de se verificar também uma correlação negativa, o que sugere que, quanto mais elevada a HbA1c, menor a adesão à AF e ao fracionamento alimentar.

Tabela 5.

Correlação entre a hemoglobina glicosilada A1c e os aspetos da adesão ao tratamento da diabetes com o teste de Spearman

 
Número de refeições dia  −0,119  0,060 
Número de horas de atividade física  −0,092  0,145 
Número de pesquisas de glicemia dia  −0,236**  0,000 
Número de administrações de insulina dia  −0,160**  0,014 

p: valor p; r: coeficiente de correlação de Spearman; *: correlação significativa ao nível de 0,05; **: correlação significativa ao nível de 0,01.

Correlacionando a HbA1c com a adesão global ao tratamento da diabetes com o teste de Pearson, verificou‐se correlação estatisticamente significativa negativa: quanto mais elevada a HbA1c, pior a adesão aos vários aspetos do tratamento da diabetes (r=–0,153, p=0,015).

Complicações da diabetes

No que se refere às complicações da diabetes, 25% dos jovens referem ter complicações, nomeadamente retinopatia (86%), nefropatia (19%) e neuropatia (13%).

Análise de regressão para determinação de preditores de número de refeições

Com o objetivo de explicar a variável número de refeições em dia de semana por um conjunto de variáveis relacionadas com os restantes aspetos da adesão ao tratamento da diabetes, a idade e as representações sobre a diabetes (ver tabela 6), usando uma regressão linear multivariada obteve‐se um modelo ajustado F ([14,233] 2,872) p=0,001 e a equação da regressão explica 9,6% da variância (R2 ajustado 0,096).

Tabela 6.

Análise de regressão para determinação de preditores de número de refeições por dia

Variável  β standardizado 
Número de avaliações de glicemia por dia  0,198  2,992  0,003** 
Número de administrações de insulina por dia  0,021  0,321  0,749 
Número de horas de atividade física por semana  0,107  1,648  0,101 
Idade  0,058  0,919  0,359 
Ter diabetes não impede de sermos felizes  −0,169  −1,910  0,057 
Ser diabético é ser jovem igual aos outros, tem que conviver com os amigos e conhecer os seus limites  0,209  2,532  0,012* 
É muito importante o apoio familiar e a educação de toda a família sobre a diabetes  0,166  2,110  0,036* 
Uma alimentação saudável é fundamental para o controle da diabetes  0,049  0,649  0,517 
Ter diabetes é ter a vida organizada ao máximo, de forma a usufruir do que posso e gerir aquilo que não posso, para o meu bem‐estar  −0,042  −0,590  0,556 
Fazer desporto é saudável e controla a diabetes  −0,083  −1,144  0,254 
Os amigos devem saber que eu tenho diabetes  0,104  1,457  0,147 
A discussão em grupo é o melhor método para a compreensão da diabetes  0,000  −0,001  1,000 
Com a diabetes bem controlada podemos ganhar muito na vida  −0,037  −0,514  0,608 
A diabetes não impossibilita que se sigam os sonhos  0,020  0,257  0,797 

p: valor p; *: correlação significativa ao nível de 0,05‐, **: correlação significativa ao nível de 0,01.

Neste modelo, o número de avaliações de glicemia por dia surge como uma das variáveis preditoras do número de refeições em dia de semana. As outras variáveis preditoras positivas do número de refeições por dia de semana são as representações «Ser diabético é ser jovem igual aos outros, tem que conviver com os amigos e conhecer os seus limites» e «É muito importante o apoio familiar e a educação de toda a família sobre a diabetes».

Análise de regressão para determinação de preditores de horas de AF por semana

A fim de explicar a variável horas de AF por semana por um conjunto de variáveis relacionadas com os restantes aspetos da adesão ao tratamento da diabetes, a idade e as representações sobre a diabetes (ver tabela 7), foi encontrado um valor ajustado de 8,4% (R2 ajustado 0,084) e um modelo ajustado F ([14,233] 2,619) p=0,002.

Tabela 7.

Análise de regressão para determinação de preditores de horas de atividade física por semana

Variável  β standardizado 
Número de refeições por dia  0,108  1,648  0,101 
Número de administrações de insulina por dia  0,075  1,116  0,266 
Número de avaliações de glicemia por dia  −0,009  −0,128  0,898 
Idade  −0,184  −2,930  0,004** 
Ter diabetes não impede de sermos felizes  −0,045  −0,503  0,616 
Ser diabético é ser jovem igual aos outros, tem que conviver com os amigos e conhecer os seus limites  0,119  1,415  0,158 
É muito importante o apoio familiar e a educação de toda a família sobre a diabetes  −0,145  −1,826  0,069 
Uma alimentação saudável é fundamental para o controlo da diabetes  0,024  0,311  0,756 
Ter diabetes é ter a vida organizada ao máximo, de forma a usufruir do que posso e gerir aquilo que não posso, para o meu bem‐estar  0,007  0,097  0,922 
Fazer desporto é saudável e controla a diabetes  0,217  3,022  0,003** 
Os amigos devem saber que eu tenho diabetes  −0,086  −1,192  0,235 
A discussão em grupo é o melhor método para a compreensão da diabetes  0,107  1,562  0,120 
Com a diabetes bem controlada podemos ganhar muito na vida  −0,186  −2,623  0,009** 
A diabetes não impossibilita que se sigam os sonhos  −0,006  −0,078  0,938 

p: valor p; *: correlação significativa ao nível de 0,05; **: correlação significativa ao nível de 0,01.

A idade surge como uma das variáveis preditoras das horas de AF por semana, com correlação negativa, o que indica que, quanto menor a idade, mais horas de AF os jovens realizam por semana. A outra variável preditora positiva das horas de AF realizadas por semana é a representação «Fazer desporto é saudável e controla a diabetes» e, com correlação negativa, «Com a diabetes bem controlada podemos ganhar muito na vida».

Discussão

Este estudo permite constatar que nesta fase da vida os jovens têm ocupações variadas e agregados familiares diversificados, com mudanças no ciclo de vida familiar, o que proporciona diferentes experiências e desafios.

A maior parte dos jovens sente à vontade para falar sobre os temas que os preocupam e sobre a diabetes com a família, os amigos, companheiros e pessoas com diabetes, o que revela bom suporte social. Atendendo às mudanças que os jovens enfrentam neste período da vida, é difícil manter uma adesão diária aos vários aspetos do tratamento da diabetes, conseguir um bom controlo metabólico e manter uma boa qualidade de vida, mas o apoio das várias fontes de suporte é facilitador. À medida que os jovens crescem começam a assumir maior responsabilização pelo seu autocuidado na diabetes e a família continua a fornecer suporte e supervisão. Os jovens adultos poderão assumir a total responsabilidade por toda a gestão da diabetes, mas o apoio da família mantém‐se ao longo da vida. Nesta fase, muitos jovens poderão transferir o apoio dado pelos pais para o «companheiro/a significativo/a»1,4,5,25.

Em estudos sobre os efeitos do apoio social na qualidade de vida, concluiu‐se que as pessoas com diabetes que referem maior satisfação com o apoio social apresentam uma melhor qualidade de vida na maioria dos domínios e que há uma correlação positiva entre as crenças de uma boa qualidade de vida e a adesão e a boa compensação da diabetes8,21.

No que se refere à comunicação com a equipa de saúde multidisciplinar, a maioria dos jovens sente‐se à vontade para falar sobre os temas que os preocupam e sobre a diabetes, o que revela boa comunicação e apoio. Como é referido em outros estudos, uma boa comunicação e relação entre o jovem e a equipa de saúde poderá favorecer a adesão ao tratamento, a compensação e a melhoria dos aspetos psicossociais1,4,5. As pessoas com diabetes tipo 1 reconhecem que necessitam uma equipa de saúde para os aconselhar relativamente à alimentação, AF e regime terapêutico farmacológico, com o objetivo da manutenção de um bom controlo metabólico e prevenção das complicações22. Os jovens adultos poderão sentir dificuldade em fazer consultas de vigilância periódica da diabetes e os que faltam mais às consultas estão em maior risco de ter complicações. A frequência das consultas é mais elevada nas instituições que proporcionam consultas ao fim do dia e que relembram as consultas23.

Relativamente à satisfação com a vida, os jovens fazem uma apreciação positiva. Num estudo realizado com jovens adultos que tinham diabetes desde a puberdade, com o objetivo de investigar a sua qualidade de vida e esperança no futuro, os resultados indicaram que a maioria considerava ter boa qualidade de vida (96%) e esperanças num bom futuro (87%)24. Propõe‐se a realização de estudos posteriores que permitam a comparação do grau de satisfação com a vida dos jovens adultos com diabetes tipo 1 com outros jovens da mesma faixa etária sem doença crónica.

Relativamente à adesão ao tratamento da diabetes, a maior parte dos jovens tem boa adesão à alimentação, à realização de esquema intensivo de insulinoterapia e à frequência da autovigilância de glicemia. Em relação à prática de AF recomendada, de 3 horas ou mais de AF por semana, pouco mais de um terço dos jovens realiza, estando de acordo com o que foi referido no estudo DAWN, em que 36% dos jovens realizavam o recomendado25.

Verificou‐se correlação positiva entre o número de refeições, o número de administrações de insulina e o número de pesquisas de glicemia por dia, o que revela que os jovens apresentam adesão em simultâneo a estes 3 aspetos.

O esquema intensivo de insulinoterapia, com recurso a análogos de insulina, é recomendado para este grupo etário26,27. Uma administração de insulina de ação lenta e análogo de insulina rápida 4 ou mais vezes por dia permite uma gestão mais flexível da diabetes, de acordo com os estilos de vida dos jovens. O foco nos benefícios imediatos deste esquema insulínico poderá ajudar os jovens a melhorar o autocuidado, com consequente melhoria da compensação1. As pesquisas de glicemia realizadas várias vezes por dia, de acordo com as necessidades, permitem prevenir o aparecimento de complicações agudas ou tratá‐las atempadamente13,26. Num estudo realizado no Japão28, relativamente à adesão dos jovens ao tratamento da diabetes, concluiu‐se que 19% referiam adesão completa aos vários aspetos do tratamento, 75% tinham adesão satisfatória e 6% uma adesão pobre. A boa adesão ao tratamento estava relacionada com motivação e força de vontade dos jovens, apoio dos familiares, médicos e enfermeiros, uma atitude positiva relativamente à doença e ao tratamento, bem‐estar social e receio das complicações das diabetes.

Verificou‐se que quanto mais elevada a HbA1c menor a adesão às pesquisas de glicemia e às administrações de insulina. A correlação entre a HbA1c e a adesão global a todos os aspetos do tratamento mostrou correlação negativa significativa. Estes resultados são também referidos noutro estudo28. Como já foi referido, nesta fase da vida o jovem enfrenta exigências e desafios, com novas experiências sociais, emocionais, educacionais, ocupacionais e financeiras, o que vai dificultar os cuidados com a diabetes, colocando em risco a adesão ao tratamento e o controlo glicémico1,5.

Verificou‐se que as variáveis preditoras positivas do número de refeições são as avaliações de glicemia realizadas por dia e as representações «Ser diabético é ser jovem igual aos outros, tem que conviver com os amigos e conhecer os seus limites» e «É muito importante o apoio familiar e a educação de toda a família sobre a diabetes». O apoio da família tem sido reconhecido em vários estudos como vital para as pessoas com diabetes, pois podem apoiar a gestão diária da doença e encorajar e apoiar as tomadas de decisão, facilitando a gestão e a adaptação à doença. A perceção do suporte positivo da família contribui também para o bem‐estar dos jovens com diabetes1,4,5,9.

Apesar de cerca de 2 terços dos jovens apresentarem boa adesão ao tratamento da diabetes, a média de HbA1c é superior ao recomendado e um quarto dos jovens tem complicações da diabetes, o que confirma a dificuldade de ter boa compensação neste grupo etário devido à instabilidade durante o período de jovem adulto, que contribui para as dificuldades na gestão da diabetes e no controlo glicémico pelas várias razões já abordadas e que são também referidas em muitos estudos na literatura1,4,5,14,26.

As principais limitações deste estudo estão relacionadas com: o facto de ter sido utilizada uma amostra de conveniência; o contexto único da população, no local em que são prestados os cuidados de saúde; a maior parte dos jovens ser proveniente de zona urbana e cerca de metade dos jovens ter formação de nível superior, o que poderá promover uma melhor literacia em saúde; a utilização de questionários de autopreenchimento pelos jovens, que poderá influenciar a tendência para dar respostas socialmente desejáveis às diferentes questões, ao invés de responderem de acordo com o que acontece na realidade. Todos estes aspetos poderão condicionar a generalização e a extrapolação dos resultados a nível nacional.

Apesar das limitações referidas, estes resultados proporcionaram melhor conhecimento dos jovens com diabetes tipo 1.

De acordo com o estudo Dawn, os cuidados na diabetes na Europa ocidental são geralmente de elevada qualidade, mas é cada vez mais claro que o tratamento médico é apenas uma parte da resposta. Se os jovens com diabetes forem capazes de partilhar os seus desejos e necessidades e tiverem acesso a suporte psicossocial adequado ficarão mais capacitados para gerir a doença de forma mais efetiva e consistente, o que poderá contribuir para melhorar o controlo glicémico e a qualidade de vida. As ações a nível nacional relacionadas com a formação das equipas escolares, a criação de fóruns na internet para os jovens, a disponibilização do apoio psicossocial e da educação em diabetes para jovens e famílias e a organização de atividades comunitárias e com apoio de pares poderão contribuir para melhorar a adaptação à diabetes29.

As atividades de educação em grupo realizadas na instituição para os jovens com diabetes, no último ano em colaboração e parceria com o Núcleo Jovem, com atividades lúdicas, desportivas, sociais, educativas (com intervenção nas escolas) e solidárias, poderão ser mais‐valias para os jovens que revelaram resultados menos positivos neste estudo, de forma a melhorarem o seu bem‐estar e qualidade de vida com o apoio dos pares e equipa de saúde.

Acredita‐se que este estudo possa contribuir para ajudar as equipas que acompanham os jovens com diabetes tipo 1 a compreender melhor os jovens e a promover mais parcerias com os pares, de forma a corresponder aos seus interesses e necessidades e a melhorar a qualidade de vida dos jovens com diabetes tipo 1.

Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animais

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Agradecimentos

A todos os jovens adultos com diabetes tipo 1 acompanhados na instituição, que se disponibilizaram a participar neste estudo e que foram imprescindíveis para a sua realização.

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