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Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial
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Vol. 54. Núm. 3.
Páginas 156-160 (julio - septiembre 2013)
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Vol. 54. Núm. 3.
Páginas 156-160 (julio - septiembre 2013)
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Correlação entre diagnóstico clínico e patológico das lesões brancas da cavidade oral
Correlation between clinical and pathological diagnosis of white lesions of the oral cavity
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Filipe Coimbra
Autor para correspondencia
, Inês Nunes, Otília Pereira-Lopes, António Felino
Faculdade de Medicina Dentária, Universidade do Porto, Porto, Portugal
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Tabela 1. Distribuição do diagnóstico histológico de lesão branca por idades
Tabela 2. Índices de discrepância (ID)
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Resumo
Objetivos

Verificar os índices de discrepância (ID) entre o diagnóstico clínico e histológico em portadores de lesões brancas da mucosa oral.

Métodos

Sessenta e quatro relatórios histológicos de lesões brancas submetidas a biópsia, entre 2000-2010, na clínica da Faculdade de Medicina Dentária do Porto, foram consultados no arquivo da Faculdade. O ID foi expresso pela percentagem de discrepâncias no número total de casos.

Resultados

Em 26 líquenes o ID foi de 7,7% com 2 leucoplasias idiopáticas (leucoqueratoses). Em 14 leucoplasias foi de 14,4% com 2 diagnósticos laboratoriais de líquen plano. Nas 5 lesões brancas por trauma o ID foi de 60% com um líquen, uma hiperplasia inflamatória e uma doença de Fordyce. Das 2 eritroleucoplasias uma era um carcinoma (50%). Nos 14 papilomas o ID foi de 21% devido a uma leucoplasia, uma hiperplasia inflamatória e um carcinoma. Dos 2 carcinomas um era uma leucoplasia. A única candidose era um líquen (100%). Na totalidade dos 64 casos o ID foi de 25%.

Conclusão

Os consideráveis ID demonstrados aconselham biópsia seguida de exame histopatológico nas lesões brancas de diagnóstico duvidoso.

Palavras-chave:
Doenças orais
Diagnóstico
Anatomia e histologia
Lesões brancas
Abstract
Objectives

To evaluate the discrepancy indexes (DI) between clinical and histopathological diagnoses in patients with oral white lesions.

Methods

: The histological reports of 64 white lesions subject to biopsy between 2000 and 2010, in the Faculty of Dental Medicine of Oporto, were reviewed in the Faculty archives. The DI for each pathology was expressed by the percent ratio between the number of discrepant cases and all cases.

Results

Of the 26 lichens there were two leukoplakias (DI=7.7%), while in the 14 leukoplakias two lichens occurred (DI=14.4%). Within the five traumatic white lesions, the laboratory recorded one lichen, one inflammatory hyperplasia and one Fordyce disease (DI=60%). Of two erytroleukoplakias one was a carcinoma (50%). Among the 14 papillomas there was a DI of 21% due to one inflammatory hyperplasia, one leukoplakia and one carcinoma. A DI of 50% occurred within the 2 carcinomas since one was a leukoplakia. The sole candidose was in fact a lichen (100% ID). The overall DI for the 64 cases amounted to 25%.

Conclusion

The considerable DI's recorded recommend histopathological examination in all doubtful oral white lesions.

Keywords:
Mouth diseases
Diagnosis
Anatomy and histology
White lesions
Texto completo
Introdução

As lesões brancas orais são em geral de fácil diagnóstico clínico, mas em muitos casos não dispensam comprovação histopatológica por várias razões. Uma delas é porque uma das mais frequentes, a leucoplasia, é potencialmente maligna, dando origem em 5-25% dos casos ao carcinoma escamoso1–4.

Por outro lado, algumas lesões brancas de patologia inteiramente distinta podem ter aspetos clínicos semelhantes à vista desarmada. Assim, a variante em placa do líquen plano, a forma não pediculada do papiloma e a candidose hiperplásica podem assumir a aparência de uma mancha branca de consistência variável, tal como acontece numa leucoplasia idiopática2,5,6. Por outro lado, a forma erosiva do líquen plano apresenta por vezes áreas eritematosas hemorrágicas extensas, entre estrias de Wickham que se desvanecem, de tal forma que o conjunto sugere a existência de um carcinoma invasivo7.

Certas drogas, a presença de amálgama ou doenças sistémicas como o lúpus podem originar reações liquenóides unilaterais em que as típicas estrias brancas são mais ténues e convergem entre si desenhando uma mancha branca contínua indistinguível de uma leucoplasia2,5,6,8.

Em tais circunstâncias, e noutras, o diagnóstico clínico torna-se duvidoso e requer confirmação laboratorial. A não correspondência entre os 2 diagnósticos pode ser expressa pelo índice de discrepância, ou seja, a percentagem de diagnósticos clínicos e histopatológicos incompatíveis no número total de lesões brancas estudadas9.

O objetivo deste trabalho foi estudar através desse índice o grau de concordância entre o diagnóstico clínico e o diagnóstico histológico de 64 lesões brancas orais estudadas na Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto (FMDUP).

Métodos

Entre 2000-2010, 64 casos de lesões brancas da cavidade oral foram diagnosticados na FMDUP e as peças enviadas ao Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (IPATIMUP) para exame histopatológico. Tratou-se de um estudo observacional de tipo transversal de todos os exames anátomo-patológicos dos pacientes da FMDUP que foram submetidos a biópsias. Foram excluídas as citologias aspirativas por serem em número reduzido e não fornecerem um diagnóstico específico.

O exame clínico das lesões e a execução das biopsias estiveram a cargo de assistentes da Faculdade de Medicina Dentária do Porto adstritos à lecionação das aulas práticas de Medicina Oral ou Cirurgia Oral, sempre supervisionados pelos professores respetivos. Quanto aos boletins histológicos, foram fornecidos pelos patologistas do IPATIMUP.

A informação recolhida incluía o sexo (fig. 1) e a idade do paciente (tabela 1), o diagnóstico clínico (fig. 2) e o local de colheita das peças (fig. 3).

Figura 1.

Distribuição do diagnóstico clínico de lesão branca por sexo.

(0.16MB).
Tabela 1.

Distribuição do diagnóstico histológico de lesão branca por idades

    16-30 anos  31-45 anos  46-60 anos  61-75 anos  76-90 anos 
Líquen plano 
  0,0  24,0  36,0  36,0  4,0 
Leucoplasia 
  9,1  0,0  45,5  45,5  0,0 
Lesão branca por trauma 
  0,0  14,3  42,9  42,9  0,0 
Eritroleucoplasia 
  9,1  0,0  45,5  45,5  0,0 
Papiloma 
  9,1  27,3  45,5  18,2  0,0 
Carcinoma epidermóide 
  0,0  0,0  0,0  50,0  50,0 
Figura 2.

Resultados globais do diagnóstico clínico das lesões brancas. 1-Líquen plano, 2-Leucoplasia, 3-Lesão branca por trauma, 4-Eritroleucoplasia, 5-Papiloma, 6-Carcinoma, 7-Candidose.

(0.07MB).
Figura 3.

Distribuição das lesões pelo local afetado.

(0.2MB).

Os diagnósticos clínicos registados nos relatórios (fig. 2) foram líquen plano (26 casos), leucoplasia idiopática e papiloma (14 cada), lesão branca traumática5, eritroleucoplasia e carcinoma epidermóide (2 cada) e candidose oral1.

A não correspondência entre o diagnóstico clínico e o histopatológico foi expressa na seguinte fórmula:

Índice de discrepância=N.° de diagnósticos incompatíveis×100/N.° de casos.

Os dados foram analisados e registados na versão 17.0 do SPSS® (Statistical Package for Social Sciences, Nova Iorque, NI, EUA) para o Windows, bem como o Microsoft Excel 14.0 (Microsoft Corporation, EUA) utilizando técnicas de estatística descritiva para organização dos dados. A relação entre o número de ID de cada lesão não foi analisada e por isso não se recorreu a técnicas de estatística inferencial. Foram respeitadas as regras de conduta expressas na Declaração de Helsínquia e a legislação nacional em vigor, garantindo a necessária confidencialidade das informações pessoais recolhidas.

O presente estudo foi aprovado pela comissão de ética da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, Portugal. Todos os doentes deram consentimento escrito à execução da biópsia.

Resultados

Na maioria (24) dos 26 casos (fig. 2) com diagnóstico clínico de líquen plano, existiu compatibilidade com o diagnóstico histopatológico típico desta afeção autoimune (tabela 2). Porém, 2 foram incompatíveis (ID=7,7%) revelando ao microscópio apenas hiperqueratose ou leucoqueratose que é a alteração histológica típica da leucoplasia clínica. No relativo aos 14 casos de leucoplasia idiopática clínica, 12 acusaram de facto hiper ou leucoqueratose mas, em 2, o diagnóstico histopatológico foi de líquen plano correspondendo a um ID de 14,4% (tabela 2). Os 5 diagnósticos de lesão branca traumática foram na maioria incompatíveis (ID=60%), um rotulado histologicamente de líquen plano, outro de hiperplasia fibroepitelial inflamatória e outro de doença de Fordyce (tabela 2). Apenas 2 mostraram o quadro histopatológico de hiperqueratose que se pode considerar como compatível. Dos 2 casos de eritroleucoplasia clínica, um era incompatível pois consistia num quadro histopatológico de carcinoma (ID=50%).

Tabela 2.

Índices de discrepância (ID)

Diagnóstico clínico (n)  Diagnóstico histológico (n)  ID (%) 
Líquen plano (26)  Líquen (24); leucoplasia (2)  7,70 
Leucoplasia (14)  Hiperqueratose (12); líquen (2)  14,40 
Lesão branca por trauma (5)  Hiperqueratose (2); líquen (1); Hiperplasia inflamatória (1); Fordyce (1)  60,00 
Eritroleucoplasia (2)  Eritroleucoplasia (1); carcinoma (1)  50,00 
Papiloma (14)  Papiloma (11); leucoplasia (1); hiperplasia inflamatória (1); carcinoma (1)  21,00 
Carcinoma (2)  Carcinoma (1); leucoplasia (1)  50,00 
Candidose (1)  Líquen (1)  100,00 

Dos 14 papilomas enviados ao laboratório, 11 eram totalmente compatíveis. Entre os outros 3, um acusava uma hiperqueratose, outro era uma hiperplasia fibroepitelial inflamatória e o outro um carcinoma (ID=21%).

Dos 2 casos clinicamente classificados como carcinomas, um era uma leucoqueratose. Finalmente, a única candidose clínica era de facto um líquen plano (ID=100%).

Em conclusão, registaram-se 16 incompatibilidades nas 64 peças enviadas ao laboratório, o que dá um ID geral de 25%.

Discussão

O índice geral de discrepância não desprezível encontrado leva-nos a pensar que grande número de afeções bucais com embranquecimento da superfície da mucosa pode levar o estomatologista/médico dentista a certos equívocos. Contudo, na maior parte dos casos o diagnóstico estava correto.

Os 2 casos de líquen plano em que existiu discrepância por serem simples leucoplasias sugerem que pertenceriam à variedade em placas. Na verdade, a forma clínica mais comum do líquen, a reticular, é inconfundível pelas típicas estrias brancas entrecruzadas de Wickham e pela sua localização mais frequente na parte posterior da mucosa jugal bilateralmente, o que não é usual na leucoplasia que predomina no terço anterior da língua, pavimento bucal e mucosa jugal, unilateralmente2,10. A forma erosiva do líquen é também pouco confundível com a leucoplasia, dado o aspeto eritematoso e ulcerado onde o elemento branco em raias periféricas é secundário5,6,11. A confusão com a variedade em placas do líquen parece assim ter sido o que aconteceu, embora esta mancha branca seja por via de regra mais elevada e dura do que na leucoplasia3. Nesses 2 casos a biopsia apresentou-se como muito útil ao diagnóstico porque o líquen plano como doença autoimunitária tem tratamento enquanto a leucoplasia simples apenas requer vigilância aturada cada 6 meses para surpreender a possível degenerescência neoplásica1,5,12.

No referente à leucoplasia idiopática, em 85,7% dos 14 casos existiu concordância entre o diagnóstico clínico e o diagnóstico histopatológico, certamente devido à existência de uma mancha branca sem endurecimento nem elevação acima da mucosa circundante. Tal alteração de cor, sem qualquer outra modificação acompanhante, é quase sempre indicativa de hiperqueratose e, embora esta possa ter múltiplas causas, é também, no máximo até 25% dos casos, o primeiro sinal de neoplasia1,2.

A lesão branca traumática apareceu em 5 casos, mas revelou-se mais enganosa com apenas 2 diagnósticos corretos. A confusão com líquen plano é explicável com base em que certas restaurações em amálgama em contacto com a mucosa oral podem dar origem a reações liquenóides2,5,6,8. A patologia inflamatória presente num dos casos sugere ter existido algum ferimento prévio da mucosa que passou despercebido ao clínico. Finalmente, a confusão com a doença de Fordyce é inaceitável, dado que esta consiste em glândulas sebáceas heterotópicas congénitas sem qualquer causa traumática2.

Os 50% de ID nas duas eritroleucoplasias justificam-se pelo facto destas lesões brancas representarem frequentemente leucoplasias cancerizadas3.

Também o papiloma, cujo número de diagnósticos clínicos – 14 – não era despiciendo, revelou uma considerável percentagem de concordância clínico-patológica. Isto deve-se certamente à notável tipicidade do aspeto macroscópico dos papilomas em que à massa pediculada se sobrepõem as projeções aguçadas brancas periféricas. Em 2 casos o clínico diagnosticou estas lesões como leucoplasia ou como uma hiperplasia inflamatória, provavelmente devido ao facto de se tratar de uma das raras formas sésseis do papiloma2,13. O equívoco com o carcinoma escamoso é explicável uma vez que na sua forma exofítica este pode por vezes ter aspeto verruciforme comum a certos papilomas2. Igualmente aqui a biopsia foi benéfica pois mostrou que não se tratava de uma afeção benigna e viral como o simples papiloma.

O diagnóstico clínico de um dos carcinomas escamosos, que afinal era uma leucoplasia, foi provavelmente o resultado da lesão apresentar endurecimento e espessamento locais3.

A única candidose diagnosticada pode ter sido da variedade hiperplásica, na qual a mancha branca não é removível por raspagem, o que levou ao falso diagnóstico clínico3.

Conclusões

Devido ao elevado número de falsos diagnósticos clínicos de lesões brancas, exames histológicos deverão ser realizados por rotina.

Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animais

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos de seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes e que todos os pacientes incluídos no estudo receberam informações suficientes e deram o seu consentimento informado por escrito para participar nesse estudo.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência deve estar na posse deste documento.

Conflito de intereses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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