Se há momentos da vida em que, neste caso a SPEMD, ao concitar-me para esta justíssima homenagem a um amigo de eleição, Prof. Fernando José Brandão Martins Peres, me confronto no dilema tristeza / alegria é uma constante, uma verdade sentida. Tristeza porque muito mais gostaria de o ter feito com a sua presença física; alegria na escolha de ter recaído na minha pessoa, a felicidade que me dá o poder de deixar-vos uma ténue ideia do seu vastíssimo curriculum de cidadão e chefe de família exemplar, sem exageros de uma cúmplice amizade, mas sim de uma realidade indesmentível; a par do homem, do cidadão impoluto, polémico e frontal, como eu me julgo ser, mas acima de tudo em que a lealdade sempre foi o corolário de uma vida cheia.
Exemplo para os mais novos na procura do melhor, do aperfeiçoamento e para os mais velhos num grito de ânimo para nunca se deixarem vencer pelo desânimo, antes pelo contrário no labor, na luta constante.
Injustiças sim, todos as temos, mas o que não me cabe no bestunto é a sua existência. Mas enfim, é dos livros. O voo das águias sempre causaram inveja aos mosquitos.
Fernando José Brandão Martins Peres, nasce a 15 de Março de 1938 na cidade do Porto, filho do casal Peres oriundo de Arouca.
Concluí os seus estudos liceais e médicos na cidade do Porto, no ano de 1965. A sua tese de licenciatura intitulada “A dor em Estomatologia” já fazia antever o rumo que viria a dar na especialização em Estomatologia, após conclusão dos vários internatos, gerais e complementar efectuados no H.S. João.
Graças a uma bolsa de estudo, do governo Francês, note-se bem, inicia o estágio no Instituto de Estomatologia de Paris, entre 1969 e 1970.
No ano seguinte é nomeado médico eventual do Serviço de Estomatologia do H. S. João obtém o título de especialista pela O.M. e simultaneamente dá a sua colaboração ao Instituto de Oncologia do Porto como consultor científico.
Como o advento se 25 de Abril de 1974 movimentam-se os estomatologistas na luta de tantos anos – ensino organizado.
Em Aveiro no H.I.D.P., reúne pela primeira vez o Plenário da classe Estomatológica donde sai, por eleição, a comissão para o Estudo do Ensino em Portugal.
A presença interventiva do Prof. Peres é uma constante, sendo um dos eleitos, dessa plêiade de profissionais, os verdadeiros obreiros, o verdadeiro gérmen do que haveria de surgir, no ano seguinte, na cidade do Porto, a primeira Escola Superior de Medicina Dentária, á qual o Prof. Peres viria a dar toda uma vida, cheio de entusiasmo e esforço, integrando logo de inicio a respectiva Comissão Instaladora.
Merecem realce as varias actividades, as varias funções que vem a exercer, desde então até à sua aposentação, na referida Escola; mais tarde transformada na Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto (FMDUP).
Assume a regência da disciplina de Cirurgia Oral e integra a comissão permanente de consulta sobre assuntos do Ensino Estomatológico.
Sem descurar a carreira médica hospitalar presta provas publicas para obtenção do grau de chefe de clinica e simultaneamente é nomeado Professor Auxiliar da Escola, para mais tarde vir a ser promovido no cargo de Professor Associado.
Em 1989 é louvado pelo então Presidente da Direcção da ESMD pela sua competência, lealdade e zelo, enquanto membro da Comissão Instaladora da referida Escola
Cria o gabinete de Apoio ao Ensino e Investigação e os Gabinetes de Apoio ao Estudante e Apoio ao Ensino Médico Dentário, vindo a coordenar os mestrados de Cirurgia Oral, Implantologia e Periodontologia.
Um breve apontamento duma vivência académica tão cheia e traduzida na sua presença em inúmeros congressos, jornadas, cursos, seminários, simposiuns, nacionais e estrangeiros, onde a presença do Prof. Peres era uma constante, não só como assistente mas e ainda principalmente, como conferencista.
Membro efectivo de varias organizações profissionais de que apenas destaco a ASI, FDI, ICD, SEPES, ADEE (Association for Dental Education in Europe), AIO (Associacion Ibero Americana), ACD (American College of Dentits), SPE e tantas outras também, não só nacionais mas, e ainda, com maior proeminência estrangeiras.
Num curriculum tão vasto dele constam as varias presenças em júris de exames (Carreira Hospitalar, Ordem dos Médicos, Prova de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica, Concursos para Assistentes, Provas de Doutoramento e Mestrado) não só como presidente mas também como vogal.
Vejamos rapidamente a sua actividade extra-académica ligada ou não à profissão.
Integra comigo os corpos Directivos da SPEMD na legislatura de 1987/89, como presidente da secção norte e do seu labor, activo e constante, culmina com aquisição do espaço físico para a sede norte. Vem a ser eleito Presidente da Direcção da Sociedade para os anos de 1990/1993 e mais tarde Presidente da Assembleia Geral.
Naquele primeiro encargo desenvolve todo o processo, com êxito, da aquisição da nova sede nacional, sediada em Lisboa, já que a anterior se mostrava ao tempo pouco funcional.
É fundador da Sociedade Portuguesa de Cirurgia Oral- SPCO.
Referir ainda, dos variadíssimos cargos exercidos, a sua nomeação para Membro Permanente do Senado da Universidade do Porto e da Assembleia Geral do Senado da mesma Universidade.
Fã do automobilismo é membro fundador da Associação Portuguesa de Pilotos Automóveis- APPA vindo, mais tarde, a fazer parte da Direção da Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting.
Muito sucintamente aqui vos deixo um resumo muito resumidamente duma vasta e atuante ação em prol da Estomatologia Portuguesa e mais tarde do novo curso de Medicina Dentária de acordo com as diretivas europeias.
É evidente que não cabem nestas breves notas sobre a sua vida e o seu percurso notável tudo o que desejaríamos expressar, exaltando uma personalidade de referência, tão marcante que é o Prof. Fernando Peres, sob pena de nos tornarmos fastidiosos.
Assim ao terminar esta reflexão, não tão profunda como desejaria, sobre a figura de Fernando José Brandão Martins Peres, quero agora falar para o Além, para o Peres, como sempre o tratei, onde repousa, ninguém o duvidará, tranquilamente após uma passagem efémera nesta vida terrena onde se houve como um ser de eleição.
Nem sempre a estrela de David está presente iluminando as nossas almas. De um modo repentino eclipsa-se; Setembro de 2011, seleciona mais um de nós, o nosso querido amigo Peres.
É para ti Peres que quero que saibas daquilo de que nunca te apercebes-te, de que nunca te deste conta e é bom que todos o saibam; a tua humildade, não a falsa humildade a raiar a encobrir a mascara da vaidade, da hipocrisia de quem se arrima à espúria das leis e das normas; de homem sincero pleno de bondade, num amor acrisolado à tua vocação que soubeste exercer, com saber e humanidade, deixando um vazio naqueles que em ti sempre confiaram.
Momentos de desalento, momentos de injustiça e de reconhecimento daqueles que mais dever e obrigação tinham de o fazer, ninguém o duvidará, levam-me a refletir e enaltecer o apoio que nesses momentos difíceis e não só, como em toda a tua vida, sempre tiveste da companheira de todos os dias, nesta passagem terrena, da tua sempre querida Lena, a quem deixaste um vazio tão profundo como impossível de avaliar.
O teu corpo ali repousa na tua Arouca junto aos teus ancestrais, como sempre o desejaste. A alma subiu aos céus e no julgamento eterno nada manchará a decisão judiciosa que recairá sobre o homem bom, irreverente por vezes, mas sempre sincero e dedicado à família, aos seus verdadeiros amigos, aos seus doentes.
É todo este meu sentir e que aqui te deixo nesta justa e merecida homenagem que os responsáveis actuais da SPEMD em boa hora te promoveram.
E ao chegar a minha hora, o meu último e mais difícil exame, sei que lá estarás ao meu lado com todas as tuas influências celestiais a favor do colega, do amigo de sempre, do companheiro de luta na procura do melhor para os vindouros, a desvanecer qualquer dúvida, se é que possa surgir, ao Julgador.
Até breve.
Do teu dedicado companheiro de sempre
Coimbra, 21 de Outubro de 2011