As organizações de saúde são estruturas muito complexas e com grande dinamismo, aonde, à volatilidade do conhecimento e das tecnologias, se associam as alterações no próprio padrão epidemiológico da procura.
As questões relacionadas com a liderança, a estratégia e a inovação assumem, neste contexto de atuação, particular relevância. E os modelos de gestão, em que essas questões se enquadram, são decisivos para a sua eficácia.
O livro, que agora comentamos, trata justamente deste conjunto de questões, tentando descortinar, através da análise de novos modelos de gestão aplicados à realidade hospitalar, como evoluíram as dimensões da liderança, da estratégia e da inovação.
Parece evidente, no setor público, a evolução para modelos de gestão mais próximos da Nova Gestão Pública, em que a incorporação de metodologias importadas da gestão privada reforça o foco nos resultados, em detrimento dos aspetos procedimentais ou burocráticos.
Na área da saúde e, em particular nos hospitais, não temos um modelo consensual para a liderança (um médico ou um gestor? um órgão colegial ou um órgão individual?) como bem assinala o autor, após a sua investigação. Mas convirá também esclarecer qual o tipo de liderança a que nos referimos: a estratégica, mais próxima da gestão de topo, ou a intermédia, mais próxima da liderança técnica e em que predomina a figura do médico?
O autor reflete bem sobre este tema, traçando, como corolário, as 2 linhas de autoridade, por vezes conflituantes e que são muito visíveis nos hospitais: a hierarquia administrativa ou gestionária que representa o poder formal; e a hierarquia técnica, muito centrada na componente médica e que, muitas vezes, assume um poder (informal) de decisão muito superior à sua posição hierárquica.
Diz o autor, e muito bem, que a inovação (outro dos temas abordados) deve ser fundamentada em critérios objetivos que articulem custos e benefícios, riscos e utilidade. Todos sabemos que esta é uma das caraterísticas mais impressivas dos modos de produção clínicos, em que as tecnologias estão cada vez mais intensamente presentes no diagnóstico, na terapêutica e na reabilitação. A sua prévia avaliação e a definição rigorosa das formas de utilização são elementos da maior importância para que as tecnologias sejam um benefício efetivo para os doentes e não apenas um encargo crescente para os serviços, que passam a adquiri-las sem critério e a utilizá-las indiscriminadamente.
Mas há outros tipos de inovação em que, ao invés, o autor descortina pouca atenção das administrações e dos serviços e pouco investimento: a inovação organizacional.
Esta é manifestamente escassa e provoca muitas vezes a rejeição dos profissionais: modelos compreensivos/integrados de tratamento dos doentes, novas modalidades ambulatórias e de apoio domiciliário, registos em formato eletrónico, uniformização dos processos clínicos, modelos de atendimento para hora certa, integração com os cuidados primários, etc.
Hoje, aborda-se a gestão como se fosse um compromisso: entre a disponibilização de recursos finitos e a aposta em resultados cada vez mais exigentes. Esse compromisso, no setor da saúde, exige lideranças partilhadas e não antagónicas. E em que os modelos da «nova organização» (os Centros da Responsabilidade e a Governação Clínica) pretendem espelhar justamente essa partilha de responsabilidades.
Em síntese, trata-se de um trabalho, no essencial conseguido: a relevância e a oportunidade do tema são inquestionáveis, as escolhas do autor para o seu trabalho de campo são manifestamente acertadas e a metodologia seguida irrepreensível.
As conclusões do autor revelam algum pessimismo: novos modelos de gestão e poucos resultados. De facto, nas últimas décadas várias foram as experiências inovadoras de gestão no modelo hospitalar público. E parece hoje evidente que nenhuma delas trouxe vantagens indiscutíveis e sustentáveis face ao passado. O que falta fazer?