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Vol. 34. Núm. 4.
Páginas 432-438 (diciembre 2016)
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Vol. 34. Núm. 4.
Páginas 432-438 (diciembre 2016)
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Efeito da interação com palhaços nos sinais vitais e na comunicação não verbal de crianças hospitalizadas
Effect of interaction with clowns on vital signs and non‐verbal communication of hospitalized children
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Pauline Lima Alcântaraa, Ariane Zonho Wogela, Maria Isabela Lobo Rossia, Isabela Rodrigues Nevesa, Ana Llonch Sabatesb, Ana Cláudia Pugginaa,b,
Autor para correspondencia
apuggina@prof.ung.br

Autor para correspondência.
a Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), Jundiaí, SP, Brasil
b Universidade Guarulhos (UnG), Guarulhos, SP, Brasil
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Tablas (4)
Tabela 1. Características das crianças. Jundiaí, 2014‐2015
Tabela 2. Comparação das médias antes e depois dos sinais vitais analisados. Jundiaí 2014‐2015
Tabela 3. Comparação da mudança ou permanência dos comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes analisados antes e durante a intervenção. Jundiaí 2014‐2015
Tabela 4. Comparação da mudança ou permanência dos comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes analisados antes e durante a intervenção. Jundiaí 2014‐2015
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Resumo
Objetivo

Comparar a comunicação não verbal das crianças antes e durante a interação com palhaços e comparar os sinais vitais antes e após essa interação.

Métodos

Estudo intervenção não controlado, transversal, quantitativo, com crianças internadas em um hospital público universitário. A intervenção foi feita por alunos de medicina vestidos como palhaços e incluiu truques de mágica, malabarismo, canto com as crianças, bolhas de sabão e encenações cômicas. O tempo de intervenção foi de 20 minutos. Os sinais vitais foram avaliados em duas mensurações com um intervalo de um minuto imediatamente antes e após a interação. A comunicação não verbal foi observada antes e durante a interação por meio do Quadro de Modelos Não Verbais de Comunicação, instrumento em que os comportamentos não verbais são avaliados em efetivos ou ineficazes nas interações.

Resultados

A amostra foi de 41 crianças com média de 7,6±2,7 anos, a maioria tinha entre 7‐11 anos (n=23; 56%) e era do sexo masculino (n=26; 63,4%). Houve diferença estatisticamente significativa na pressão arterial sistólica e diastólica, na dor e nos comportamentos não verbais das crianças com a intervenção. As pressões arteriais sistólicas e diastólicas aumentaram e as escalas de dor mostraram diminuição na sua pontuação.

Conclusões

A interação lúdica com palhaços pode ser um recurso terapêutico para minimizar os efeitos do ambiente estressor durante a intervenção, melhorar o estado emocional das crianças e diminuir a percepção de dor.

Palavras‐chave:
Comunicação não verbal
Terapia do riso
Sinais vitais
Abstract
Objective

Compare the non‐verbal communication of children before and during interaction with clowns and compare their vital signs before and after this interaction.

Methods

Uncontrolled, intervention, cross‐sectional, quantitative study with children admitted to a public university hospital. The intervention was performed by medical students dressed as clowns and included magic tricks, juggling, singing with the children, making soap bubbles and comedic performances. The intervention time was 20minutes. Vital signs were assessed in two measurements with an interval of one minute immediately before and after the interaction. Non‐verbal communication was observed before and during the interaction using the Non‐Verbal Communication Template Chart, a tool in which nonverbal behaviors are assessed as effective or ineffective in the interactions.

Results

The sample consisted of 41 children with a mean age of 7.6±2.7 years; most were aged 7 to 11 years (n=23; 56%) and were males (n=26; 63.4%). There was a statistically significant difference in systolic and diastolic blood pressure, pain and non‐verbal behavior of children with the intervention. Systolic and diastolic blood pressure increased and pain scales showed decreased scores.

Conclusions

The playful interaction with clowns can be a therapeutic resource to minimize the effects of the stressing environment during the intervention, improve the children's emotional state and reduce the perception of pain.

Keywords:
Non‐verbal communication
Laughter therapy
Vital signs
Texto completo
Introdução

A terapia da alegria, terapia do riso ou risoterapia é um método terapêutico existente desde a década de 1960. Foi propagado pelo médico americano Hunter Adams, chamado de “Patch Adams”, que desde a sua época de estudante já implantava o método em hospitais e escolas. A alegria é como uma onda que se propaga por todos os nervos, órgãos e glândulas do corpo inteiro. Nada fica indiferente ao riso. O sorriso e o riso são uma linguagem universal de comunicação que se exterioriza sem palavras no semblante do indivíduo.1

O poder do sorriso é grande e saber sorrir é algo importante. O riso é unicamente humano. O riso é um mecanismo de resistência vital e que proporciona liberação de sentimentos reprimidos para enfrentamento do estresse, do sofrimento ou da dor.2 O riso tem a capacidade de reduzir os efeitos danosos que o estresse gera no organismo, pois quando o indivíduo ri o sistema parassimpático, por meio das encefalinas, atua no sistema imune, aumenta a concentração de anticorpos e alivia as dores provocadas pelo sistema simpático.3

Quando ocorre o riso, o nível de cortisol sérico diminui, o cérebro libera endorfinas, substâncias que aliviam a dor e garantem sensação de bem‐estar. A respiração mais forte aumenta a quantidade de ar captada pelos pulmões e facilita a saída de gás carbônico. Analgésico poderoso, mas também produtor de euforia e sensação de paz.2,4 Dessa forma, a transmissão de estímulos dolorosos fica inibida e existe um “efeito residual”.4

O sorriso beneficia o indivíduo também em aspectos sociais; propaga‐se de um indivíduo para outros, melhora o vínculo entre as pessoas e clarifica a comunicação interpessoal. A comunicação, por mais clara e objetiva que se pretenda ser, sempre irá conter subjetividade, pois envolve relações humanas, e a percepção e a interpretação das mensagens verbais e não verbais se dão pelos órgãos sensoriais: a visão, o tato, o paladar, o olfato e audição.5

O riso é uma comunicação não verbal de bem‐estar, mas existem outros sinais que podem ser observados pelo profissional de saúde. Perceber não somente o que o paciente declara verbalmente, mas os sinais não verbais, é indispensável para entendê‐lo por completo, e não somente a patologia que o acomete. A linguagem corporal não verbal do corpo traz muitas mensagens para bons observadores6 ao completar, substituir ou contradizer o verbal. Cabe, assim, ao profissional, perceber os sinais e interpretá‐los.7

Os profissionais devem buscar compreender a criança no sentido holístico, conhecer suas necessidades, capacidades e desejos, torna‐se evidente o fato de que quando a relação do profissional‐paciente ocorre de maneira eficiente, a assistência prestada será a mais benéfica possível. Inevitavelmente, as relações que ocorrem dentro do ambiente hospitalar irão influenciar diretamente o tratamento da criança.8 O brincar é uma das necessidades da criança hospitalizada que precisa ser atendida, porque o seu desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e social não cessa, mesmo que ela adoeça.9

Além disso, o brincar possibilita aos profissionais uma vivência diferente com as crianças, não lida apenas com as incapacidades e limitações. A atuação dos palhaços também pode proporcionar a socialização e a interação entre as crianças, o que permite a criação de nova rede social, age como circunstância facilitadora para saída do isolamento social, que, por vezes, a internação provoca. Tal fato também pode ser associado à condição de recuperação.8 O brincar altera também o ambiente em que a criança se encontra, aproximando‐o de sua realidade. Com isso, o próprio brincar de forma recreativa, livre e desinteressada apresenta um efeito terapêutico.10

No ambiente hospitalar, em que o processo de internação é uma experiência geralmente desgastante, a criança pode associá‐lo ao medo, sofrimento ou sentimento de punição. Dentre as muitas formas de amenizar o estresse, melhorar o vínculo e entender o indivíduo na sua totalidade, uma interação lúdica pode ser uma estratégia efetiva nesse contexto. O lúdico proporciona efeitos benéficos, como a melhoria do quadro clínico e a diminuição de ansiedade e do estresse do momento difícil da permanência hospitalar.11 Nesse sentido, o lúdico aparece como um recurso importante para ajudar a criança a lidar com a realidade da hospitalização.

As considerações apresentadas mostram que dentre as maneiras de minimizar os efeitos perniciosos da hospitalização está à atividade lúdica, estratégia que ajuda a criança a expressar seus sentimentos. Assim, este estudo foi feito com o objetivo de conhecer melhor os efeitos da interação lúdica dos palhaços na comunicação não verbal e nos parâmetros fisiológicos da criança hospitalizada.

Método

Trata‐se de um estudo de intervenção não controlada, transversal, com pesquisa de variáveis quantitativas, tem como variáveis dependentes os sinais vitais e a comunicação não verbal.

O estudo foi feito na unidade de pediatria de um hospital público universitário com 24 leitos. Os critérios de inclusão foram: 1) crianças de 2‐11 anos; 2) internadas na unidade pediátrica; 3) hemodinamicamente estáveis; 4) acordadas e dispostas a participar da pesquisa. Foram excluídas do estudo crianças com deficiência intelectual e visual que a impedissem de identificar o desenho da escala facial de dor ou de interagir com os palhaços.

O desenvolvimento do estudo atendeu os requisitos da Resolução 466/2012, vigente no país, sobre ética em pesquisas envolvendo seres humanos, e foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Jundiaí sob número de parecer 840.408.

A coleta de dados ocorreu de novembro de 2014 a março de 2015 e iniciou‐se com a abordagem de uma pesquisadora vestida com roupas comuns, jaleco branco, estetoscópio e prancheta. Foi explicado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ao responsável e o Termo de Assentimento para crianças acima dos 6 anos. A criança foi informada de como seria a mensuração dos sinais vitais com abordagem segundo as características do seu desenvolvimento, os equipamentos usados (estetoscópio, esfigmomanômetro, termômetro e escala facial de dor) foram mostrados e foi iniciada uma aproximação cuidadosa com a criança. Na sequência foi aplicado o questionário de caracterização, que continha cinco questões a respeito da criança (idade, número de irmãos, sexo, se frequenta a escola e se faz alguma atividade física) e foram verificados os sinais vitais (temperatura, pulso, frequência respiratória, pressão arterial e dor) em duas mensurações com um intervalo de um minuto. Feito isso, a pesquisadora agradeceu e disse que ficaria no quarto para fazer anotações. A observação prévia da comunicação não verbal foi feita nesse momento.

A intervenção foi por meio de interação lúdica de alunos membros da Liga da Alegria da Faculdade de Medicina de Jundiaí. Entende‐se por atividade lúdica toda ou qualquer atividade que tem como objetivo produzir prazer quando de sua execução, ou seja, divertir.12 A intervenção incluiu o trabalho dos voluntários da Liga da Alegria e visou a minimizar o estresse da hospitalização por meio de truques de mágica, malabarismo, canto com as crianças, bolhas de sabão e encenações cômicas. O tempo de intervenção foi de 20 minutos.

A pesquisadora que controlou o tempo observou e anotou a linguagem não verbal durante a intervenção. Logo após, a mesma pesquisadora verificou novamente os cinco sinais vitais da criança em duas mensurações com um intervalo de um minuto. Terminada a mensuração, a pesquisadora agradeceu ao parente que acompanhava a criança, assim como a própria criança, e se despediu.

De maneira específica, foram analisados: temperatura corporal, pressão arterial, frequência respiratória e cardíaca, dor e linguagem não verbal. A frequência respiratória foi avaliada por observação abdominal ou torácica e a frequência cardíaca foi mensurada pela palpação da artéria radial ou ausculta cardíaca. Para a mensuração da pressão arterial foi usado o aparelho de pressão digital automático Microlife Mesa Azul BP 3BTO‐A (Microlife®, Widnau, Suíça) e manguitos de mesma marca adequados à circunferência do braço dos participantes. Esse equipamento é validado e certificado pela BHS (Sociedade Britânica de Hipertensão) e pelo Hospital do Rim e Hipertensão da Universidade Federal de São Paulo. A temperatura foi verificada com um termômetro infantil na região axilar G‐Tech digital com ponta flexível – Urso (Accumed‐Glicomed®, Rio de Janeiro, Brasil).

Para avaliação da dor, considerada o quinto sinal vital,13 foi usada a escala facial de dor que usa os personagens de Maurício de Sousa, Cebolinha e Mônica, que expressam diferentes faces emocionais em cada graduação de dor. Essa escala foi escolhida por ser muito usada na avaliação de intensidade da dor na população pediátrica no Brasil. A escala varia de zero a quatro, sendo 0=sem dor; 1=dor leve; 2=dor moderada; 3=dor forte; 4=dor insuportável.14 Foram feitas duas mensurações antes e duas mensurações depois. Entretanto, para análise foi obtida uma média antes e depois para cada sinal vital.

A comunicação não verbal foi analisada por meio do Quadro de Modelos não Verbais, que consiste de uma diretriz para avaliar a comunicação não verbal em diversos contextos; não é uma escala e não tem escore.7 Esse instrumento contem 14 itens (postura, contato dos olhos, móveis, roupas, expressão facial, maneirismo, volume de voz, ritmo de voz, nível de energia, distância interpessoal, toque, cabeça, postura corporal e paraverbal), que são avaliados em comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes nas interações. São considerados comportamentos efetivos aqueles que encorajam a fala ou aproximação do outro por demonstrar aceitação e respeito; comportamentos ineficazes são aqueles que, provavelmente, enfraquecem a conversação e distanciam o outro da interação. A interação da criança com os palhaços foi avaliada por meio de sete itens dos 14 do Quadro de Modelos não Verbais que mais se adequavam ao contexto analisado. Os itens selecionados referem‐se a postura, contato dos olhos, móveis, expressão facial, nível de energia, cabeça e postura corporal. A comunicação não verbal da criança foi avaliada como efetiva quando sua postura estava relaxada e atenta, contato dos olhos com frequência regular e média intensidade em relação aos palhaços, quando os móveis ou objetos disponíveis foram usados para unir, e não como barreiras, a criança estava sorridente, alerta, movimentava a cabeça em meneios positivos (dizer “sim” com a cabeça) e sua postura corporal estava voltada para os palhaços que interagiam com ela. Sinais não verbais ineficazes foram observados quando a postura da criança estava rígida e tensa, olhar desafiante ou ausente, os móveis ou objetos usados como barreira entre as pessoas, o rosto da criança estava voltado para o outro lado, oposto aos palhaços ou inexpressivo, quando a criança se apresentava apática, sonolenta ou irrequieta na interação, fazia meneio negativo com a cabeça (dizer “não” com a cabeça) e apresentava postura corporal lateral ou de costas para os palhaços.7

Em muitos estudos que avaliam comunicação não verbal é usual a avaliação de dois observadores e confronto das opiniões, justamente porque a decodificação não verbal pode ser subjetiva. Entretanto, sabe‐se que quanto mais o indivíduo sente‐se observado, mais esse comportamento é modulado e enviesado. Por isso, optou‐se pela avaliação de um único observador pelos seguintes motivos: deixar a criança mais à vontade na interação com os palhaços, não causar constrangimento e viabilizar o benefício terapêutico deste estudo.

Os dados quantitativos foram digitados em um banco de dados no Excel versão 2010 para posterior tratamento estatístico no software SPSS Statistical Package for the Social Science versão 23 (IBM®, Chicago, EUA). Foi feita análise descritiva (frequência absoluta, relativa, média e desvio‐padrão) e inferencial. A normalidade dos dados foi testada pelo Kolmogorov‐Smirnov e foram usados testes paramétricos ou não paramétricos de acordo com a distribuição. Para comparar as médias antes e depois dos sinais vitais foram usados o teste de Wilcoxon e o teste t de Student. Para comparar a mudança ou permanência dos comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes analisados antes e durante a intervenção foi usado o teste de McNemar. Esse teste compara as diferenças entre duas amostras, identifica mudanças na observação de uma variável. O tamanho da amostra foi baseado no número de crianças de estudos de caráter lúdico identificados na literatura.

Resultados

A amostra total foi de 41 crianças, com média de 7,6±2,7 anos, a maioria tinha entre 7 e 11 anos (n=23; 56%), era do sexo masculino (n=26; 63,4%), tinha um ou dois irmãos (n=28; 68,3%), frequentava a escola (n=38; 92,7%) e praticava atividade física (n=32; 78%) (tabela 1).

Tabela 1.

Características das crianças. Jundiaí, 2014‐2015

Variáveis 
Idade
3 a 6 anos  18  43,9 
7 a 11 anos  23  56,1 
Sexo
Feminino  15  36,6 
Masculino  26  63,4 
Números de irmãos
12,2 
15  36,6 
13  31,7 
≥3  19,5 
Frequenta escola
Sim  38  92,7 
Não  7,3 
Faz atividade física
Sim  32  78,0 
Não  7,3 

Houve alterações estatisticamente significativas na comparação das médias antes e depois da intervenção pressão arterial sistólica, diastólica e dor. Depois da interação lúdica, as pressões arteriais sistólicas e diastólicas aumentaram e a dor diminuiu (tabela 2). As alterações encontradas na pressão arterial (aumento da média de 112×71 para 117×75) e na dor (diminuição da média de 1,1 para 0,6) aparentemente não são clinicamente significantes. Entretanto, apontam para alterações fisiológicas e benéficas frente à interação lúdica das crianças com os palhaços. Ou seja, esse resultado indica que houve uma relação entre a pressão arterial, a dor e a atividade lúdica, uma vez que as crianças mostraram uma resposta emocional positiva constatada pelo aumento no nível de energia, expressão facial sorridente e participação ativa nas brincadeiras com os palhaços (tabelas 3 e 4).

Tabela 2.

Comparação das médias antes e depois dos sinais vitais analisados. Jundiaí 2014‐2015

  AntesDepois 
Sinais Vitais  Média  DP  Média  DP  p‐valor 
Frequência respiratória  26,2  8,0  25,9  6,8  0,944 
Pulso  93,5  17,5  95,0  16,6  0,574a 
Pressão arterial sistólica  112,2  13,0  116,7  14,9  0,047 
Pressão arterial diastólica  71,0  11,7  75,0  15,7  0,040 
Temperatura  36,3  0,5  36,3  0,6  0,712a 
Dor  1,1  1,2  0,6  1,0  0,001 

Teste de Wilcoxon.

a

Teste t de Student.

Tabela 3.

Comparação da mudança ou permanência dos comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes analisados antes e durante a intervenção. Jundiaí 2014‐2015

Comportamentos não verbais  p‐valor 
Postura      0,004 
Relaxada, mas atenta antes e durantea  28  68,3   
Relaxada, mas atenta antes e rígida duranteb  0,0   
Rígida antes e relaxada, mas atenta durantec  22,0   
Rígida antes e duranted  9,8   
Contato dos olhos      0,002 
Regular, médio antes e durantea  27  65,9   
Regular, médio antes e ausente, desafiador duranteb  0,0   
Ausente, desafiador antes e regular, médio durantec  10  24,4   
Ausente, desafiador antes e duranted  9,8   
Móveis      0,016 
Usados para unir antes e durantea  32  78,0   
Usados para unir antes e usados como barreira duranteb  0,0   
Usados como barreira antes e usados para unir durantec  17,1   
Usados como barreira antes e duranted  4,9   
Expressão facial      <0,001 
Sorridente, mostra sentimentos antes e durantea  24  58,5   
Sorridente, mostra sentimentos antes e rosto voltado para o outro lado ou inexpressivo duranteb  0,0   
Rosto voltado para o outro lado ou inexpressivo antes e sorridente, mostra sentimentos durantec  14  34,1   
Rosto voltado para o outro lado ou inexpressivo antes e duranted  7,3   

Teste de McNemar. Situações analisadas:

a

Efetivo permanece efetivo;

b

Efetivo torna‐se ineficaz;

c

Ineficaz torna‐se efetivo;

d

Ineficaz permanece ineficaz.

Nas situações a e d os comportamentos não se modificam com a intervenção. Nas situações b e c os comportamentos modificam‐se com a intervenção.

Tabela 4.

Comparação da mudança ou permanência dos comportamentos não verbais efetivos ou ineficazes analisados antes e durante a intervenção. Jundiaí 2014‐2015

Comportamentos não verbais  p‐valor 
Nível de energia      <0,001 
Em alerta antes e durantea  16  39,0   
Em alerta antes e apático, sonolento, cíclico ou irrequieto duranteb  0,0   
Apático, sonolento, cíclico ou irrequieto antes e em alerta durantec  19  46,3   
Apático, sonolento, cíclico ou irrequieto antes e duranted  14,6   
Cabeça      0,125 
Meneio positivo antes e durantea  30  73,2   
Meneio positivo antes e meneio negativo duranteb  0,0   
Meneio negativo antes e meneio positivo durantec  9,8   
Meneio negativo antes e duranted  17,1   
Postura corporal      0,004 
Voltada para a pessoa antes e durantea  29  70,7   
Voltada para a pessoa antes e de lado ou de costas duranteb  0,0   
De lado ou de costas antes e voltada para a pessoa durantec  22,0   
De lado ou de costas antes e depoisd  7,3   

Teste de McNemar. Situações analisadas:

a

Efetivo permanece efetivo;

b

Efetivo torna‐se ineficaz;

c

Ineficaz torna‐se efetivo;

d

Ineficaz permanece ineficaz.

Nas situações a e d os comportamentos não se modificam com a intervenção. Nas situações b e c os comportamentos modificam‐se com a intervenção.

Foram encontradas alterações estatisticamente significativas na comparação dos comportamentos não verbais antes e durante em relação à postura, ao contato dos olhos, ao uso dos móveis ou objetos na interação, à expressão facial, ao nível de energia e postura corporal, ou seja, em seis dos sete comportamentos observados (tabelas 3 e 4).

As mudanças comportamentais não verbais foram todas ineficazes para comportamentos efetivos durante a intervenção, ou seja, a postura anteriormente rígida tornou‐se relaxada e atenta (n=9; 22,0%). O contato dos olhos ausente e desafiante tornou‐se regular e médio (n=10; 24,4%). O olhar ausente ou fixo incomoda e pode ser invasivo nas relações; um olhar frequente (regular) e com intensidade adequada (médio) é acolhedor e facilita a interação com outras pessoas. Móveis e objetos usados anteriormente como barreira (por exemplo, lençol sobre a cabeça ou cobrindo boa parte do corpo) foram empregados para unir ou foram retirados (n=7; 17,1%). O rosto da criança, voltado predominantemente para algum lado do quarto ou inexpressivo, modificou‐se para sorridente na presença dos palhaços e mostrou sentimentos (n=14; 34,1%). O nível de energia, anteriormente apático, sonolento, cíclico ou irrequieto, tornou‐se alerta (n=19; 46,3%). Finalmente, a postura corporal da criança, observada inicialmente de lado ou de costas, voltou‐se para os palhaços, mostrou abertura e aceitação na relação interpessoal (n=9; 22,0%) (tabelas 3 e 4).

As mudanças comportamentais não verbais encontradas com a intervenção feita mostram a efetividade da atividade lúdica com palhaços como recurso terapêutico. As crianças mostraram‐se, em termos gerais, mais relaxadas, abertas e sorridentes. A intervenção foi capaz de modificar o contexto inicial.

Discussão

Neste estudo, os pesquisadores procuraram fazer um contato próximo, humanizado e individual com as crianças, uma vez que as visitas eram feitas dentro do quarto onde estavam internadas e as brincadeiras fluíam diferentemente em cada encontro. A importância de a interação lúdica acontecer dessa forma foi mostrada em pesquisa feita na Austrália, na qual fez‐se videoconferência para promover uma interação entre palhaços do Royal Children's Hospital com crianças internadas ou em domicílio. A experiência mostrou que a interação entre os palhaços e as crianças institucionalizadas via videoconferência é tecnicamente viável e prática. Entretanto, seria necessário tornar as brincadeiras individualizadas para cada criança, algo mais fácil pessoalmente, Nesse contexto, a interação online foi mais limitada, mas não deixou de ser uma opção.15

Estudos da literatura16,17 mostram resultados convergentes com os encontrados. A interação lúdica da criança com palhaços, como mostrado neste estudo, foi uma estratégia eficiente de redirecionamento da energia da criança para sentimentos positivos e benéficos. As mudanças comportamentais não verbais durante a intervenção mostraram que a criança se torna mais relaxada, atenta e sorridente. Um estudo em Portugal foi feito com 70 crianças de 5‐12 anos divididas em dois grupos para acompanhamento ambulatorial pré‐operatório. Em um grupo, as crianças eram acompanhadas na sala por seus pais e dois palhaços; no outro grupo apenas pelos pais. Foi usado o The Child Surgery Worries Questionnaire para descrição das aflições dos pacientes. As crianças acompanhadas pelos palhaços sentiram‐se menos preocupadas com a hospitalização e com os procedimentos médicos, apresentaram menos angústia quanto à doença em si e sentiram‐se mais felizes e calmas em comparação com o outro grupo.16

Em outro estudo caso‐controle, foram recrutadas 60 crianças de 6‐10 anos que estavam com cirurgia agendada. Dessas, 30 receberiam a visita de dois palhaços antes da cirurgia (grupo caso) e 30 não receberiam (grupo controle). A ansiedade foi medida com as escalas State Trait Anxienty Inventory for Children, Community‐Campus Partnerships for Health e Faces Scale depois da atuação dos palhaços e até sete dias após a cirurgia. Ambos os grupos tiveram aumento na ansiedade, porém nas crianças do grupo que sofreu a intervenção dos palhaços o aumento da ansiedade foi menos importante.17

Resultados semelhantes aos do presente estudo em relação à pressão arterial foram encontrados em uma pesquisa feita no Japão. Dezessete adultos aparentemente saudáveis, entre 23‐42 anos, assistiram a 30 minutos de comédia (experimental) e a um documentário (controle) em dias diferentes. A frequência cardíaca e a pressão arterial aumentaram de forma significativa enquanto os indivíduos assistiam à comédia, não ocorreram tais mudanças durante o documentário.18 O riso e a alegria causam excitação e bem‐estar.

A relação do humor e da dor foi estudada com 80 participantes entre 18 e 44 anos. Nessa investigação, a estimulação fria foi feita com água mantida a 1°C por um refrigerador de imersão e em circulação por um misturador subaquático. Na parte superior do recipiente de água havia um descanso de braço no qual o participante mantinha o braço esquerdo. Os participantes foram divididos em quatro grupos de 20. O Grupo 1 assistiu um vídeo de humor, o Grupo 2 a um vídeo repulsivo, o Grupo 3 a um vídeo neutro e o Grupo 4 nada assistiu. Foram usados State‐Trait Anxiety Inventory, Humor Questionnaire, itens sobre autoeficácia de medida de controle da dor, escala visual analógica de ansiedade e um questionário pós‐experimento. O humor aumentou significantemente a tolerância à dor.19

Além dos efeitos comportamentais e fisiológicos, os benefícios da interação com palhaços não ficam restritos aos pacientes; família e profissionais também parecem ser beneficiados. Estudos da literatura20–22 mostram isso e essa percepção também foi compartilhada no atual estudo, apesar de não documentada, pois tanto a equipe quanto os profissionais de saúde verbalizaram inúmeros elogios à iniciativa da pesquisa e aos alunos membros da Liga da Alegria. A interação com palhaços interfere em todo um contexto no qual a criança está inserida. Um exemplo disso foi encontrado em estudo feito na Alemanha, em que um dos objetivos foi avaliar a atuação dos palhaços pelos pais das crianças hospitalizadas e pelos funcionários do hospital. Foram incluídos na pesquisa 37 pais e 43 funcionários e foi aplicada uma escala de satisfação e acompanhamento no campo de atuação. Tanto os pais quanto os funcionários relataram que eles e os pacientes se beneficiam com a intervenção.20

Um estudo etnográfico se propôs a avaliar princípios, valores e metodologia da Associação Operação Nariz Vermelho durante visitas a crianças hospitalizadas. Os resultados mostram uma forte relação de empatia e cumplicidade entre os doutores palhaços e as crianças, bem como um forte sentimento de pertencer, da parte dos artistas, à comunidade hospitalar, visível nas relações estabelecidas com os profissionais e no direcionamento a um cuidado de qualidade que proporcione bem‐estar e alegria. Esse sentimento de partilha e de criação de laços estende‐se ainda aos parentes das crianças, que funcionam como canais de comunicação entre a relação doutor palhaço e a criança.21

Para mostrar que as mudanças não são percebidas apenas pelos que assistem à apresentação, um estudo investigou algo diferente em relação ao tema. Foram analisadas as expectativas de profissionais pediátricos (n=34) por meio de entrevista semiestruturada a respeito das vantagens e desvantagens da presença dos palhaços junto às crianças e adolescentes, antes mesmo da sua intervenção. Os dados revelaram uma ampla abertura à presença dos artistas, apontou‐os como potenciais amenizadores do impacto emocional da internação e dos tratamentos e foi ressaltada sua contribuição para a humanização dos cuidados e desmistificação dos profissionais de saúde. Entretanto, desvantagens apontadas foram medo/pânico do palhaço por parte de algumas crianças, pouca receptividade por estar em sofrimento e resistência à presença dos palhaços pelo adolescente devido a infantilidade envolvida.22

Finalmente, o levantamento das desvantagens22 desse tipo de intervenção traz para discussão o reconhecimento de limitações da interação lúdica com palhaços, relacionadas ao medo da criança em relação ao palhaço advindo principalmente de fantasias, o que torna essencial que os profissionais envolvidos na atividade lúdica com palhaços tenham sensibilidade, bom senso e respeito com as crianças e suas reações negativas (choro, gritos, recusa da brincadeira com palhaço) para que essa seja realmente benéfica e terapêutica.

O estudo, apesar das limitações, tais como viés observacional (a observação dos comportamentos e a aplicação da escala de comportamentos não verbais foram feitas por um único observador), opção pela aplicação de um instrumento não validado, viés de aferição (falta de uma mensuração contínua dos sinais vitais), apresentou resultados que indicam que a interação lúdica com palhaços pode ser um recurso terapêutico para minimizar os efeitos do ambiente estressor durante a intervenção, melhorar o estado emocional das crianças e diminuir a percepção de dor.

Financiamento

Trabalho de Iniciação Científica financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo n° 152551/2014‐0.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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