O artigo apresenta uma análise política das reformas judiciais no Brasil no período de 2004 a 2015. Ele analisa as medidas de reforma adotadas, os seus efeitos para o desempenho dos tribunais e seu impacto para a efetividade dos direitos. Ele atualiza trabalho realizado pelos autores em 2010, que analisou as reformas implementadas de 2004 a 2009. Os dados mais recentes mostram que as reformas intensificaram a atividade jurisdicional e conseguiram deter o aumento explosivo do número de processos em andamento. Mas as reformas não foram capazes de conter a demanda, nem de reduzir o estoque de processos em andamento. Porém, o mais problemático é que o padrão de reformas traz importantes limitações para a efetividade dos direitos e da democratização do Judiciário.
El artículo presenta un análisis político de las reformas judiciales en Brasil en el período 2004 al 2015. Éste analiza las medidas de reforma adoptadas, así como los efectos de la misma para el desempeño de los tribuales y su impacto para garantizar los derechos. Asimismo, el artículo actualiza el trabajo realizado por los autores en el año 2010, en el cual se analizaron las reformas implementadas de 2004 a 2009. Los datos más recientes muestran que dichas reformas intensificaron la actividad jurídica y lograron detener el aumento significativo del número de procesos judiciales en transición. Sin embargo, las reformas no fueron capaces de contener la demanda, ni tampoco de disminuir la existencia de dichos procesos. No obstante, el mayor problema reside en que este patrón de reformas trae consigo limitaciones sustanciales para la efectividad de los derechos y la democratización del Poder Judicial.
The article presents a political analysis of the judicial reform in Brazil from 2004 to 2015. It analyzes the reform measures adopted, their effects on the performance of the courts and their impact on the effectiveness of rights. It updates on work carried out by the authors in 2010, which analyzed the reforms implemented from 2004 to 2009. The most recent data show that the reforms intensified judicial activity and were able to stop the explosive increase in the number of cases in progress. But the reforms have not been able to curb demand, or to reduce the stock of ongoing processes. However, the most problematic is that the pattern of reform has important limitations to the effectiveness of the rights and the democratization of the judiciary.
O presente artigo analisa a reforma do Poder Judiciário em curso no Brasil a partir da aprovação da Emenda Constitucional núm. 45, de 2004. Apresentam‐se dados sistemáticos sobre as medidas de reforma adotadas no período de 2004 a 2015 e o movimento de processos nos tribunais. O artigo atualiza e complementa as análises realizadas em 20105 e em 2015.6 Também se retoma discussão anterior sobre reforma do Judiciário, democracia e cidadania no Brasil.7
O debate sobre a reforma judiciária iniciou‐se em 1992, mas as medidas de reformas começaram a ser promovidas a partir de 2003, no primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva. Foi criada a Secretaria de Reforma do Judiciário (srj) e realizado o Pacto Republicano para a reforma, que permitiu a aprovação da Emenda Constitucional número 45, de 2004. A partir de então, medidas de reforma vêm sendo adotadas continuamente.
As medidas realizam um programa de reformas gerenciais, que adota um discurso de serviço público, com uma racionalidade de eficiência administrativa, prestado para os seus usuários por um corpo de profissionais qualificados. O seu compromisso com a efetividade social dos direitos se conclui com a “entrega” do serviço demandado, ou seja, a decisão judicial, segundo parâmetros de previsibilidade, com prazo e custos razoáveis. Mas ele bloqueia a participação social no Judiciário e as possibilidades de expressão, nos processos judiciais, de concepções distintas de justiça e vida boa. Ele é indiferente quanto aos efeitos sociais das decisões judiciais e suas relações com processos mais amplos de efetivação dos direitos.
Os estudos mais recentes sobre o Judiciário adotam em geral a perspectiva dos reformadores e analisam as reformas sob alguns de seus aspectos, tais como sua lógica, desenho ou papel institucional, as representações dos atores, e resultados das reformas. Os limites das reformas são vistos como dificuldades de implementação e as resistências seriam motivadas por corporativismo ou interesses privados.8 Algumas pesquisas sobre o Conselho Nacional de Justiça (cnj) enfocam a sua estratégia de legitimação institucional,9 a maneira pela o seu desenho institucional reforça os poderes do Supremo Tribunal Federal (stf) a intervirem na política,10 ou como, para além dos mecanismos institucionais, os próprios dirigentes do Judiciário controlam o cnj, o órgão destinado a controlar as suas atividades.11
A discussão que segue coloca em primeiro plano a dimensão política do Poder Judiciário, em que parte do confronto entre modelos para os direitos e as justiça, assim como as divisões, enfrentamentos e resistências produzidas pelas reformas. Em artigo anterior, distinguiram‐se três modelos para o Judiciário no debate das reformas nos anos recentes: o burocrático, o neoliberal e o democrático, ou participativo. Fabiano Engelman realiza uma análise política dos modelos do Judiciário que traz informações atualizadas e confirma, embora de outra perspectiva teórica, aquele artigo.12
Em artigo anterior chegou‐se à conclusão de que a agenda de reformas gerenciais do Poder Judiciário em curso a partir de 2004 é conduzida por uma coalizão dirigente liderada pelas cúpulas dos tribunais e apoiada por juristas de elite, altos funcionários e políticos de vários partidos.13 Essa coalizão se formou ao longo da década de noventa e veio a prevalecer sobre as alternativas. Ela conseguiu superar um modelo formal, legalista e burocrático para o Judiciário, que tinha uma atitude defensiva face às demandas por reformas. Mas também afastou concepções dos que pensam o Judiciário como um poder político, com participação cidadã e a pluralização dos julgadores, composto por indivíduos com outros perfis do que os juízes togados, que têm compromissos efetivos com a efetivação dos direitos sociais, e atuam em cooperação com outras agências do Estado, organizações jurídicas e movimentos sociais.
Nossos artigos anteriores se basearam em informações sobre o período entre 2004 e 2008 e em dados parciais para os anos mais recentes. O presente artigo completa os dados sobre as medidas de reforma adotadas pelos poderes políticos e outras agências estatais, assim como os números de processos e decisões judiciais. Na conclusão, apresentam‐se projeções sobre o Judiciário e a política de reformas.
O Poder Judiciário brasileiro entre a Constituição de 1988 e a Emenda Constitucional n° 45/2004O Poder Judiciário brasileiro é dividido em justiça comum e especializada e é organizado de forma dual, federal e estadual. Há, por um lado, a justiça comum federal e a estadual e as justiças especializadas federais, do trabalho, militar e eleitoral. Os tribunais de revisão são: o Superior Tribunal de Justiça (stj) (para a justiça comum federal e estadual), o Tribunal Superior do Trabalho (tst), o Tribunal Superior Eleitoral (tse) e o stm (Superior Tribunal Militar).
A Constituição brasileira de 1988 adotou os princípios do Estado social e democrático de direito, enunciou de forma extensa e detalhada direitos individuais, coletivos, políticos e sociais e criou novos instrumentos processuais para protege‐los. Ela inovou quanto ao papel do Poder Judiciário, ao fortalecer sua posição institucional frente aos demais poderes do Estado e modificar seu papel na promoção dos direitos fundamentais. A independência do Judiciário foi reforçada pela competência privativa aos tribunais para se organizarem internamente e proporem mudanças na organização judiciária (Art. 96, inciso I e II da Constituição Federal de 1988 – CF/88), bem como autonomia financeira e administrativa para eleger suas prioridades e gerirem seus recursos (Art. 99da CF/88). Ao Supremo Tribunal Federal (stf) foi atribuído o papel precípuo de guarda da Constituição, somado às suas atribuições tradicionais de alta corte de justiça, de tribunal da Federação, de garantia extraordinária dos direitos fundamentais e de julgamento de recursos das decisões dos tribunais superiores. Foram fortalecidos o Ministério Público (mp) e a Defensoria Pública, tomando‐os como instituições essenciais à função jurisdicional do Estado.
Após a promulgação da CF/88 foram adotadas inúmeras mudanças legislativas para efetivar os direitos constitucionais, ampliar o acesso e aproximar o Judiciário do povo. A Proposta de Emenda Constitucional (pec) no 96/1992 deu início a esses debates, que ganharam força durante a revisão constitucional de 1993. Ao longo dos anos seguintes, as discussões se intensificaram, resultando na aprovação da Emenda Constitucional número 45, ao final de 2004. A reforma foi aprovada a partir de uma pauta consensual entre atores que tinham projetos distintos e, assim, não adotou mudanças profundas no Judiciário, demandadas por políticos e juristas progressistas desde os anos 1980.
Análise das medidas de reforma judiciária após 2004Esta seção apresenta inicialmente a comparação entre as medidas de reforma tomadas nos dois períodos (2004‐2008 e 2009‐2015). O artigo original de 2010 analisou as reformas adotadas por um conjunto amplo de órgãos do Estado federal: o Conselho Nacional de Justiça (cnj), a Secretaria da Reforma do Judiciário (srj), a Advocacia Geral da União (agu) e iniciativas de juízes individuais.
Para analisar a reforma judicial brasileira no período de 2004 a 2008, levantamento, em sítios oficiais, de documentos e dados sobre as reformas realizadas por autoridades federais.14 Do levantamento resultou num total de 222 medidas,15 que foram classificadas segundo seus autores, domínios, meios e objetivos de acordo com os critérios detalhados no anexo. Elas foram organizadas em séries temporais e analisadas por meio de estatística descritiva básica para determinar seu padrão e tendências.
A análise das medidas mostrou que a característica predominante das reformas foi a racionalização e modernização da gestão do Judiciário. Foram adotadas mudanças administrativas nos tribunais, a informatização, a simplificação de procedimentos, a uniformização do entendimento sobre a aplicação das leis e a conciliação. As reformas voltadas a tornar mais efetivos os direitos resultavam de iniciativas individuais da agu e de juízes isolados. Essas reformas eram a prevenção de litígios, a ampliação do acesso, o reconhecimento de direitos e o fortalecimento da cidadania. Para a ampliação do acesso ao Judiciário foram utilizados, sobretudo, meios informais de atuação, como a conciliação, simplificação e oralidade. A especialização dos tribunais foi negligenciada.
O artigo indagava se o perfil das reformas adotadas até aquele momento seria mantido. Se as reformas futuras iriam combinar a maior eficiência do Judiciário com a efetividade dos direitos e garantias constitucionais. Se as medidas simplificadoras do processo judicial continuariam a ser centrais ou se seria redefinido o conceito de eficiência do Judiciário, considerandose outros objetivos além da modernização e racionalização da gestão.
No período entre 2009 e 2015, foram identificadas e selecionadas 241 medidas: 141 projetos de lei da Câmara dos Deputados; 4 enunciados administrativos do cnj; 39 recomendações do cnj; 20 programas e projetos do cnj; 18 instruções normativas da agu; 1 portaria interinstitucional da agu; 7 termos de conciliação da agu e 11 programas e projetos da agu.16
Classificamos as medidas segundo seus domínios, meios e objetivos. Em “domínios”, listamos questões civis, penais, processuais civis, processuais penais, processuais e administrativas. Em “meios”, registramos a oralidade, a desformalização, a simplificação, a informatização, a conciliação, a supressão de recursos, a uniformização, a especialização, a melhoria da infraestrutura, as normas para a carreira de magistrado, o consenso de cúpulas e outros. Em “objetivos”, encontramos a produção de normas gerais com diretrizes para a ação conjunta, a prevenção de litígios, a ampliação do acesso à Justiça, o reconhecimento de direitos, a racionalização ou eficiência do Poder Judiciário, a efetividade das decisões, a generalização dos efeitos das decisões, o controle externo sobre os juízes, a modernização da gestão, as garantias aos juízes, o fortalecimento da cidadania e formação de cidadãos e outros. A classificação dos atos normativos não foi exclusiva, ou seja, um mesmo ato pode ter recebido mais de uma atribuição.
Passando à análise dos resultados, mantém‐se a tendência anterior de medidas predominantemente administrativas, com grande presença das processuais.17 Em contraste, são poucas as medidas de direito substantivo.
No que diz respeito à relação entre autores e domínios das medidas, vemos que as administrativas são tomadas por diversos autores. Os projetos de lei trataram de questões administrativas, ao contrário do que se poderia prever, pois elas dizem respeito à gestão interna dos tribunais. O cnj deu prioridade a temas administrativos e processuais, mas tratou de matérias civis e penais, que, em princípio, não seriam de sua competência. Já as medidas da agu tratam sobretudo de temas administrativos.
Relação entre autores e domínios das medidas (2009‐2015)
Domínio | Governo e Congresso Nacional (Projetos de Lei) | Medidas do cnj | Medidas da agu | Total |
---|---|---|---|---|
Administrativo | 38 | 33 | 29 | 100 |
Processual Civil | 33 | 0 | 0 | 33 |
Civil | 1 | 7 | 0 | 8 |
Penal | 2 | 10 | 0 | 10 |
Processual | 42 | 15 | 8 | 65 |
Processual Penal | 25 | 2 | 0 | 27 |
Fonte de informação: elaboração com informação de dados extraídos do Relatórios “Justiça em números”.
As fontes das tabelas estão descritas no anexo.
Quanto aos meios, predominaram a especialização e a conciliação, enquanto no período anterior os mais numerosos eram a informatização e a simplificação. Junto com a infraestrutura, esses quatro meios continuam os mais numerosos dentre as medidas de reforma. Já consenso de cúpulas, oralidade e desformalização são pouco usados. Os projetos de lei tratam de todos os temas, com mais ênfase na especialização e conciliação. Há maior diversificação dos meios usados pelo cnj, com aumento de meios de infraestrutura, especialização dos tribunais e uniformização das decisões. No período anterior, o cnj utilizou mais a informatização e a simplificação. A agu priorizou a informatização e conciliação, mas também iniciativas de supressão de recursos e melhoria da infraestrutura.
Sobre os objetivos, manteve‐se o padrão do período anterior em que o maior número medidas visou a racionalização e modernização da gestão do Judiciário, presente em 199 medidas. O reconhecimento de direitos é o segundo objetivo mais marcante, seguido pela efetividade das decisões. Este último objetivo estava entre os mais recorrentes entre as medidas do período anterior. A novidade é, portanto, o aumento de medidas voltadas ao reconhecimento de direitos.
Relação entre autores das medidas e meios utilizados (2009‐2015)
Meio | Governo e Congresso Nacional (Projetos de Lei) | cnj | agu | Total |
---|---|---|---|---|
Oralidade | 3 | 1 | 0 | 4 |
Desformalização | 3 | 1 | 0 | 4 |
Simplificação | 21 | 6 | 2 | 29 |
Informatização | 13 | 4 | 9 | 26 |
Conciliação | 25 | 5 | 8 | 38 |
Supressão de recursos | 7 | 1 | 7 | 15 |
Uniformização | 12 | 17 | 5 | 34 |
Especialização | 32 | 14 | 4 | 50 |
Melhoria da infraestrutura | 11 | 17 | 7 | 35 |
Normas para a carreira | 17 | 0 | 0 | 17 |
Consenso de cúpulas | 2 | 0 | 0 | 2 |
Outros | 24 | 14 | 4 | 44 |
Fonte de informação: elaboração com informação de dados extraídos do Relatórios “Justiça em números”.
A análise da relação entre meios e objetivos das medidas de reforma confirma a tendência geral da comparação com o período anterior, mas apresenta algumas novidades. A maioria dos meios visa alcançar o objetivo de racionalização ou eficiência do Poder Judiciário, como destacado. Os outros objetivos (coordenação das decisões, ampliação do acesso, efetividade das decisões) mantiveram‐se presentes, mas com números muito menores. No período mais recente aparecem medidas para a prevenção de litígios, e aumentaram as que visam o reconhecimento de direitos e o fortalecimento da cidadania. As garantias dos juízes foram numerosas, mas não as de controle externo sobre eles. Outra diferença é que aumentaram as medidas de especialização dos tribunais para a ampliação do acesso, o que era negligenciado anteriormente.
Relação entre propositores e objetivos das medidas (2009‐2015)
Objetivo | Projetos de Lei | cnj | agu | Total |
---|---|---|---|---|
Produção de normas gerais com diretrizes para a ação conjunta | 4 | 11 | 3 | 18 |
Prevenção de litígios | 9 | 8 | 2 | 19 |
Ampliação do acesso à Justiça | 19 | 5 | 0 | 24 |
Reconhecimento de direitos | 21 | 9 | 4 | 34 |
Racionalização e modernização da gestão | 63 | 37 | 28 | 199 |
Efetividade das decisões | 28 | 4 | 0 | 32 |
Controle externo sobre os juízes | 2 | 1 | 0 | 3 |
Garantias aos juízes | 17 | 0 | 0 | 17 |
Fortalecimento da cidadania e formação de cidadãos | 4 | 5 | 0 | 9 |
Outros | 12 | 10 | 1 | 23 |
Fonte de informação: elaboração com informação de dados extraídos do Relatórios “Justiça em números”.
Em suma, as medidas de reforma tomadas a partir de 2009 dão continuidade ao programa anterior de racionalização da gestão dos tribunais, tanto nas medidas que adotam quanto nas que deixam em segundo plano. As inflexões podem resultar da acumulação das medidas, em que inicialmente foram adotadas a informatização e a simplificação dos procedimentos, seguidas no novo período pela especialização e a conciliação. Elas podem resultar dos compromissos do governo federal com a promoção de direitos. Por sua vez, as iniciativas do cnj visaram legitimá‐lo como órgão de cúpula perante a opinião pública. O protagonismo do Judiciário na promoção dos direitos substantivos é justificado pelos seus dirigentes como a missão dos tribunais na sociedade atual. O Judiciário viria em substituição aos demais poderes e sua ação fora do processo judicial para resolver conflitos coletivos seria mesmo privilegiada em relação às suas funções tradicionais de resolução de conflitos interindividuais.
Tendências da movimentação processualNo período de 2004 a 2008, em todos os tribunais analisados, o número de processos, distribuídos e julgados, mantinha‐se em patamares bastante elevados. O mesmo padrão se mantém no período mais recente, com algumas alterações.
O Supremo Tribunal Federal (stf) recebeu, desde os anos 1990 até 2008, mais de um milhão de processos, assistindo a um progressivo aumento ao longo dos anos. O número de processos distribuídos tendeu a se estabilizar a partir de 1999 num número muito elevado de cerca de 90 mil por ano.
Relação entre meios e objetivos das reformas (2009‐2015)
Meios | Oralidade | Desformalização | Simplificação | Informatização | Conciliação | Supressão de recursos | Uniformização | Especialização | Melhoria da infraestrutura | Normas para a carreira | Consenso de cúpulas | Outros |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Objetivos | ||||||||||||
Produção de normas para coordenação das decisões | 0 | 0 | 1 | 0 | 3 | 0 | 4 | 2 | 5 | 0 | 1 | 5 |
Prevenção de litígios | 0 | 1 | 1 | 0 | 13 | 1 | 0 | 7 | 2 | 0 | 0 | 1 |
Ampliação do acesso à Justiça | 1 | 1 | 6 | 3 | 6 | 0 | 3 | 8 | 2 | 0 | 0 | 3 |
Reconhecimento de direitos (setores subalternos e discriminados) | 1 | 0 | 6 | 1 | 2 | 2 | 1 | 15 | 1 | 0 | 0 | 9 |
Racionalização ou eficiência do Poder Judiciário | 2 | 4 | 17 | 24 | 21 | 10 | 24 | 21 | 35 | 3 | 0 | 15 |
Efetividade das decisões | 0 | 0 | 6 | 2 | 5 | 5 | 6 | 11 | 3 | 0 | 0 | 2 |
Controle externo sobre os juízes | 0 | 0 | 0 | 2 | 0 | 0 | 1 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 |
Garantias aos juízes | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 0 | 1 | 2 | 14 | 0 | 1 |
Fortalecimento da cidadania e formação de cidadãos | 0 | 0 | 0 | 0 | 2 | 0 | 1 | 5 | 1 | 0 | 0 | 1 |
Outros | 1 | 0 | 0 | 1 | 2 | 0 | 4 | 3 | 2 | 1 | 1 | 11 |
Fonte de informação: elaboração com informação de dados extraídos do Relatórios “Justiça em números”.
Um dos objetivos da Reforma Judiciária de 2004 foi reduzir o número de processos julgados pelo stf. Ela adotou duas mudanças importantes, a Súmula de Efeito Vinculante18 e o requisito da repercussão geral19 para a admissão do recurso extraordinário.20 O número de processos distribuídos no stf entre 2002 e 2008 mostrou variação anual acentuada entre cerca de 110 mil (2003 e 2006) e 70 mil (2004 e 2008), sem tendência estável no período.
Depois de 2009 houve a diminuição dos processos distribuídos para um patamar de cerca de 40 mil por ano, mas com aumento em 2014. A diferença com o número de processos protocolados, que são da ordem dos 70 mil por ano, mostra os efeitos dos filtros criados pela reforma. O aumento de decisões monocráticas, em número superior aos processos protocolados, indica que o Tribunal apresentou tendência ao superávit de decisões em relação aos processos distribuídos. Porém, o número total de julgamentos ainda se encontra em patamar bastante elevado, entre dez e quinze mil decisões colegiadas por ano, ou seja, mais de mil acórdãos por ministro.
Quanto aos recursos extraordinários, mantinham‐se numerosos no período de 2004 a 2008. Antes da reforma, os recursos extraordinários distribuídos estavam num patamar entre 30 e 40 mil. A reforma não inverteu imediatamente a tendência, pois esse número se manteve na ordem de 50 mil por ano em 2006 e 2007. Em 2008, o número caiu bastante, pois foram distribuídos cerca de 30 mil recursos extraordinários. Por sua vez, os agravos mantiveram‐se em níveis altos no período, sendo distribuídos entre 30 e 55 mil e julgados entre 55 e 59 mil por ano.
Nos anos mais recentes, o número de recursos extraordinários distribuídos manteve‐se reduzido. Foram cerca de oito mil em 2009 e entre 2010 e 2013, a média anual foi de seis mil. O número voltou a aumentar em 2014 para mais de nove mil. O número anual de recursos extraordinários julgados caiu de mais de 20 mil em 2009, 2010 e 2011 para a ordem de 12 mil os anos seguintes. O número julgamentos permanece superior ao de distribuições, o que significa a redução dos processos em andamento. O número de agravos protocolados e distribuídos também diminuiu a partir de 2011, invertendo a tendência de aumento observada nos anos anteriores. O número de agravos julgados se manteve constantemente superior aos ingressados ao longo do período.
Sobre o Superior Tribunal de Justiça (stj), a partir de sua implantação em 1989 ele passou a receber volume crescente de processos, atingindo em 2007 mais de 300 mil. A partir de 2001 ocorrem oscilações no número total de processos distribuídos, mas a tendência continuou crescente. Ela não foi interrompida nos primeiros anos da Reforma do Judiciário, pois passou de um patamar de 210 mil processos em 2004 e 2005 para mais de 310 mil em 2007.
No período de 2009 a 2014, o número de processos distribuídos no stj continuou na casa dos 300 mil por ano. Houve tendência de aumento gradual ao longo dos anos. Ao mesmo tempo, o número julgamentos mantém‐se superior ao de distribuições, o que indica a redução da carga de processos pendentes.
Desde 2001, o número de recursos especiais21 distribuídos manteve‐se estável na casa de cem mil por ano. A situação não foi alterada depois da instituição da Súmula Impeditiva de Recursos,22 com a qual o stj passa a impedir que novos recursos sejam impetrados contra decisões já reiteradamente decididas. Mas a demanda de revisão das decisões de apelação permanece alta, pois o número de agravos23 continuou a aumentar. Em 2003, os Recursos Especiais representavam 56% e os agravos 35% do total de processos distribuídos. A partir de 2006 o seu número passou a ser maior do que o de recursos especiais.
No período 2009 a 2014, o número de recursos especiais distribuídos diminui para um patamar mais baixo. Ele oscilou de cerca de 70 mil processos (2009 e 2014) para cerca de 55 mil (2010 e 2012). O número de agravos permaneceu acima dos cem mil por ano até 2010, caindo para 65 mil em 2011. Há equilíbrio nos anos recentes entre o número de recursos especiais distribuídos e julgados, estabilizando‐se o número de processos pendentes. Quanto aos agravos, há nítido superávit do número de julgados.
Quanto à Justiça Federal de primeira instância, a Constituição de 1988 determinou que os juízes federais deveriam processar e julgar diversos tipos de conflitos, como as causas que envolvem a União, entidade autárquica ou empresa pública federal que não sejam atribuídas à justiça especializada (falência, acidentes de trabalho, eleitoral e trabalho); crimes políticos e os crimes praticados contra bens públicos, interesses da União ou do poder público federal, mandados contra atos de autoridade federal inferior, e causas sobre direitos indígenas.
Desde 1988, vem ocorrendo grande mudança no perfil da justiça federal. Ela se expandiu, com o número de juízes federais passando de 277 no ano de 1987 para 1486, em 2003. As mudanças processuais e de métodos de trabalho permitiram ampliar sua capacidade de processamento e tomada de decisão. O número de processos distribuídos na 1ª instância aumentou de forma acentuada. Em 1999, ela recebia cerca de 1 milhão de processos por ano. Desde 2003, esse número se mantém acima da marca de 2 milhões de processos por ano. A marca de 2,5 milhões de processos foi ultrapassada em 2004, ano em que os Juizados Especiais Federais (jefs) se mostraram responsáveis por quase 60% dos processos entrados na Justiça Federal de 1° Grau.
O número anual de processos julgados quase quadruplicou entre 2000 e 2005. Em 2008, ainda era quase o triplo do número do início da década. A média anual de processos julgados por juiz a partir de 2004 variou entre 1300 e 2000 por ano, aumento que se deve à implantação dos Jefs. A média continuou alta nos anos seguintes e, se abaixou em 2007 e 2008, ainda é quase o dobro do início da década. Vê‐se, então, que houve modificações de grande alcance no seu perfil institucional e padrão de atuação. De modo geral, o número absoluto de processos ingressados apresenta tendência de diminuição gradual a partir de 2004, mas o número se situa num patamar bastante alto. O mesmo se verifica com o número de processos julgados e a média de julgamentos por juiz.
No período posterior a 2009 o número de casos ingressados na justiça federal de primeira instância ficou estável entre 2009 e 2013, variando entre 2,1 e 2,3 milhões de processos por ano. Os juízes federais julgam anualmente entre 1,8 e 2 milhões de processos por ano. Isso significa que há um déficit de cerca de 10%, com tendência de aumento dos processos pendentes. Em 2014 houve um pico de três milhões em 2014, que aumentou ainda mais o déficit de decisões em relação aos processos novos. O número de processos julgados por juiz mantém‐se entre 1,5 e 1,8 mil por ano, um patamar elevado, mas estável.
Quanto à Justiça Estadual recebeu em 2004 mais de 14 milhões de processos, dentre os quais quase 70% estavam na Justiça Comum de 1ª Instância e nos Juizados Especiais. O número de processos distribuídos passou de 14 milhões em 2004 para 19 milhões em 2008. Embora o número de juízes tenha aumentado de 9,7 mil para 11,1 mil, a carga de trabalho de cada juiz também aumentou em 20%. O número de processos distribuídos por juiz aumentou de 1454 a 1678 nos mesmos anos. No período, aumentou 30% o número de processos julgados anualmente, e 20% a média anual de processos julgados por juiz.
No período 2009 a 2014, o número de casos novos na justiça estadual continuou num patamar alto, entre 16 e 17,5 milhões de processos por ano. Esse número representa uma redução em relação ao pico de 2008 e, portanto, uma diminuição relativa da carga de trabalho. O número de casos julgados foi inferior em cerca de 15% ao número de casos distribuídos, o que significa o acréscimo de quase 2 milhões de processos pendentes por ano. O número de processos julgados por juiz aumentou no último período, pois entre 2004 e 2009 foram entre 1,1 e 1,4 mil julgamentos por ano e no período mais recente passou para de 1,5 a 1,7 mil.
Em suma, os dados apresentados indicam que a reforma do Judiciário teve efeitos positivos do ponto de vista da gestão dos processos. Nos tribunais superiores (stf e stj), o número de processos distribuídos diminuiu ou se estabilizou. Os tribunais passaram a realizar a seleção prévia dos casos ingressados, o que aumentou o número de decisões monocráticas, e tornou o processo de decisão mais ágil e fácil. Desse modo, eles apresentam tendências superavitárias e uma diminuição no número de processos pendentes de julgamento.
No caso da justiça federal e estadual de primeira instância, o número de processos distribuídos permanece estável ou em leve redução. O número de processos julgados por juiz manteve‐se estável na justiça federal e aumentou em cerca de 20% na justiça estadual. Mesmo assim, o déficit de casos julgados em relação aos ingressados é, nos dois casos, de mais de 10%.
Os resultados são, portanto, parcialmente positivos, mas são mitigados e insatisfatórios, do ponto de vista dos objetivos colocados pelos próprios reformadores. Isso se evidencia pelo aumento contínuo do número de processos em andamento, que é o indicador privilegiado por eles, o estoque. A título de ilustração, em 2012 eram estimados 92 milhões de processos em andamento, que teria aumentado para 95 milhões em 2014. Divulgados anualmente, os resultados negativos estimulam a imaginação para propostas de novas reformas gerenciais, tais como a difusão de meios de conciliação e outras formas de dissuasão dos litígios.24 Uma tendência forte das reformas é a criação de controles mais estritos, pelas cúpulas do Judiciário, sobre a atuação e o desempenho de cada juiz e funcionário. Essa tendência tornou‐se fator de insatisfação e estimula movimentos internos de resistência, o que torna novamente visível a dimensão política das reformas. No entanto, as associações de magistrados, criticam os controles exercidos pelo cnj e a direção dos tribunais de justiça,25 ao mesmo tempo em que se opõem a qualquer controle externo e que defendem a ampliação de suas vantagens salariais e privilégios associados à sua função (Caros Amigos, 2015).
A dimensão política das reformas se vê também nas questões que não foram enfrentadas. O padrão dos processos judiciais repete‐se monotonamente, e é conhecido desde o início dos anos noventa. A maior parte dos processos tem como partes, por um lado, um indivíduo e, por outro, um ente do setor público ou uma grande empresa prestadora de serviços públicos (bancos, telefônicas). Os processos em que as duas partes são indivíduos são uma parcela bastante reduzida em relação ao total e, ao mesmo tempo, pesquisas de opinião revelam que a grande maioria dos indivíduos que se sentem lesados em seus direitos não recorre ao Judiciário.26 Não se trata, pois, de suposta “cultura da litigiosidade”, da excessiva facilidade de utilizar o Judiciário nem de ativismo dos juízes, mas de violações repetidas aos direitos pelos cidadãos, praticadas por grandes corporações, públicas ou privadas.
ConclusãoO conjunto de reformas gerenciais do Judiciário brasileiro indica a plena implementação de um programa, que vem sendo realizado de forma consistente por mais de uma década e tem por escopo todos os tribunais do país, o que é uma absoluta novidade no campo das políticas judiciais. Adotou‐se um enfoque interno à organização, a partir do qual se colocam os desafios de encontrar a maneira mais eficiente de dar respostas às demandas. Racionalizaram‐se os processos, tanto de gestão como de decisão judicial, aumentando com isso a sua capacidade de resposta e a sua estabilidade face às pressões do ambiente. A readequação se dá pela ampliação dos filtros para o ingresso, pela simplificação de procedimentos, pela padronização de processos e decisões, e o controle dos resultados, além da qualificação e motivação dos seus profissionais.
O artigo de 2010 desenhava um Judiciário com intensa atividade jurisdicional, que possibilita amplo acesso e gestão mais eficiente dos processos judiciais, mas que, contraditoriamente, apresenta graves insuficiências do ponto de vista da efetividade dos direitos constitucionais, uma vez que é indiferente às distorções geradas pelas condições sociais e políticas nas quais os cidadãos exercerem seus direitos. Os dados do período mais recente confirmam esse cenário. As reformas intensificam a atividade jurisdicional e criam filtros que tendem a suprimir as oportunidades dos litigantes para exporem as suas experiências e seus pontos de vista, para produzir as provas necessárias. Elas limitam a atenção dos juízes para as questões normativas e sociais subjacentes aos litígios. Por isso, são indiferentes à pluralidade de formas de auto‐compreensão normativa e, pois, não atendem aos interesses e expectativas dos cidadãos nem produzem padrões normativos de referência para suas condutas. Elas tendem a serem indiferentes às desigualdades sociais e a reproduzir distorções geradas pelas condições precárias nas quais os cidadãos exercem seus direitos. Elas acabam por reforçar a precariedade dos direitos dos cidadãos, embora aumente o número de litígios ingressados e julgados no Judiciário.
O sucesso parcial das reformas –e a propaganda promovida pelos reformadores– modifica a percepção do desempenho do Judiciário, produzindo‐se novo influxo de demandas que, até o momento, têm sido reprimidas. A demanda é reforçada pelas iniciativas governamentais para a ampliação do acesso ao Judiciário e de reconhecimento de direitos. Enfim, as reformas gerenciais não produzem efeitos significativos para a redução da demanda, que depende de mudanças mais gerais nas condições de exercício dos direitos de cidadania.
A reforma atual do Judiciário produziu efeitos positivos, ao afastar a imagem de um poder do Estado próximo ao colapso e incapaz de gerir seu próprio trabalho. Mas os seus resultados mitigados evidenciam‐se pelo aumento do estoque de processos, pois embora a situação tenha melhorado nos tribunais superiores (stf e stj), o número de processos em andamento continua a aumentar.
As reformas atuais partem de um diagnóstico inadequado e adotam medidas insuficientes e contraditórias. É inadequado porque adota um enfoque exclusivamente interno para a reforma do Judiciário e considera que os problemas são de gestão e complexidade dos procedimentos, e que existiria em nossa sociedade uma “cultura da litigação” a ser substituída por uma cultura do consenso. Omite‐se o caráter estrutural dos conflitos sociais, que resultaram numa sociedade desigual e violenta, com precárias condições para o exercício dos direitos. Elude‐se a dimensão institucional dos problemas, que dizem respeito à inexistência de espaços para a participação cidadã no exercício da jurisdição e na sua administração.
As medidas são contraditórias porque, por um lado, elas partem do insulamento completo do Judiciário e, por outro, elas se esforçam em eliminar um estoque de processos cujo aumento é incentivado pelas suas próprias ações. O discurso da reforma é o da promoção do acesso à justiça e da efetividade dos direitos. No entanto, as reformas vão no sentido oposto: buscam os meios mais rápidos para eliminar os processos, mesmo que seja para arquivá‐los sem julgamento e promovem uma ‘cultura do consenso’ cujos destinatários principais são aqueles que historicamente têm os seus direitos violados. Isso se dá porque juízes insulados têm uma visão unilateral e tecnicizada dos problemas, e definem as políticas de reforma de modo a preservar seus privilégios e espaços de poder.
Neste ano de 2016 entra em vigor o Novo Código de Processo Civil, cujas normas poderão alterar substantivamente o estoque de processos em andamento no Judiciário. Elas permitem o bloqueio de recursos, a eliminação de processos repetitivos e a resolução mais rápida de conflitos de massa. Porém, é de se indagar se as inovações produzirão efeitos, por não incidirem no cálculo das corporações e por não terem tematizado a litigação emergente dos conflitos sociais.
O aspecto mais criticável das reformas do Judiciário é que elas não se acompanham de medidas para prevenirem violações sistemáticas de direitos. A desigualdade de recursos, de informação e de oportunidades entre os cidadãos permite arranjos e estratégias de exploração e dominação, que maximizam formas de vida, concepções de justiça e oportunidades de uns em detrimento dos demais. A expressão “violação sobreposta de direitos” parece sintetizar a situação da grande maioria da população, que não teve historicamente condições de elaborar e vocalizar suas demandas, e, menos ainda, de transformá‐las em litígios judiciais. A situação social representa um enorme potencial de demandas por igualdade social e melhoria das potencialidades de vida, que se expressam de diversas maneiras na arena política. As estratégias e repertórios de ação de partidos, movimentos sociais, advogados de causas coletivas e dos próprios indivíduos lesados colocam‐se sob a forma de demandas por direitos, pelo seu reconhecimento e efetivação, por meio de políticas estatais que viabilizem o seu exercício e garantam‐nos em face de terceiros. Essa é a dinâmica de reivindicações de uma democracia constitucional com participação aberta e ampliada dos seus cidadãos, da qual fazem parte os instrumentos, agentes e arenas judiciais.
Em resumo, o presente artigo é crítico em relação às políticas de reforma porque considera que se deveria adotar um enfoque que considerasse as relações entre os problemas institucionais e a dimensão estrutural dos conflitos. Uma política alternativa deveria, então, integrar a reforma do Judiciário a reformas sociais e políticas que diminuam as desigualdades e privações, que tornem os direitos mais efetivos e ampliem as possibilidades de participação popular no Estado, incluindo o Judiciário.
Enfim, a realização do programa gerencial e racionalizador da reforma do Judiciário supera muitas questões urgentes postas num passado recente e ainda presentes em muitos setores, e traz inovações relevantes no papel do Judiciário. Porém, não atende a demandas antigas, a projetos alternativos e coloca problemas novos, sobre os quais será reaberto o debate público.
As tabelas sobre o movimento processual foram elaboradas a partir dos dados extraídos do Relatórios “Justiça em números” publicados anualmente no site do cnj.
O levantamento dos dados do cnj foi realizado diretamente no site do Conselho Nacional de Justiça, nas seções “atos normativos” e “programas e ações”. O levantamento dos dados da agu foi efetuado no site da Advocacia Geral da União, nas seções “legislação e normas/normas da agu” e “Portfólio de Programas e Projetos Estratégicos”. No que diz respeito aos projetos de lei selecionados, cumpre esclarecer que no artigo publicado em 2010, parte do catálogo de projetos foi extraída do site da Secretaria de Reforma do Judiciário e do Ministério da Justiça. Tais instituições elencavam os projetos de lei e as leis infraconstitucionais provenientes dos esforços da reforma do Judiciário. No entanto, essas informações não constam mais nesses domínios.
A Secretaria de Reforma do Judiciário ou o Ministério da Justiça não divulgam mais informações sobre os projetos de lei referentes à reforma do Judiciário. As seções nos sites referentes à reforma do judiciário apresentavam erro ou estavam sem conteúdo. Diante disso, a busca por projetos de lei centrou‐se na Câmara dos Deputados.
Os projetos de lei compõem o maior número de medidas selecionadas, totalizando 141 propostas legislativas. O levantamento foi feito no site da Câmara dos Deputados, a partir dos seguintes critérios:
- 1)
Temporal: selecionamos os projetos de lei apresentados entre 2009 – 2015;
- 2)
Material: filtramos projetos a partir de palavras‐chaves ou indexadores que poderiam indicar questões pertinente à reforma do Judiciário: “Código de Processo Penal”; “Código de Processo Civil”; “juiz”; “Lei dos Juizados Especiais”; “Poder Judiciário”, “Judiciário”; “Defensoria Pública”; “juizado especial”; “Supremo Tribunal Federal (stf)”; “conciliação”; “magistrado”; “Supremo Tribunal Federal”; “Ministro do Supremo Tribunal Federal”; “simplificação”; “Juizado Especial Cível”; “audiência de conciliação”; “Tribunal Superior”; “instância superior”; “celeridade”; “celeridade processual”; “conciliação judicial”; “conciliador”; “Magistratura”; “órgãos judiciários”;
- 3)
Subjetivo: dentre os projetos encontrados, selecionamos apenas aqueles de autoria de supostos interessados na promoção da reforma do Judiciário: Poder Executivo; Parlamentares dos partidos de apoio ao governo (pt; pmdb; pcdob; prb; psb; pr; ptb; pv; pdt; pp; pdb; ptdob; prtb; prp; pmn; phs; ptn; psc e ptc); Ministério Público da União; Supremo Tribunal Federal; Tribunal Superior do Trabalho; Superior Tribunal de Justiça; e Defensoria Pública da União.
O resultado dessa triagem inicial foi o catálogo de 391 projetos de lei, que após a leitura das respectiva ementa e inteiro teor, computou 141 projetos. A classificação desses projetos indica a existência de uma concentração de medidas que tendem, notadamente, à especialização, à simplificação, à conciliação e que versam sobre normas para a carreira dos magistrados e serventuários da Justiça. No que diz respeito aos objetivos, a partir do gráfico radar abaixo, verifica‐se uma acentuada tendência à “racionalização ou eficiência do Poder Judiciário” e à “efetividade das decisões”.
Professor asociado do Departamento de Ciência Politica, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Linha de investigaçao: pensamiento político e constitucional, instituiçoes judiciais, Direitos humanos.
Professora na Faculdades de Ciências Econômicas/Campinas, doutoranda em Ciência Politica na UNICAMP, 2015. Linha de investigaçao: judiciário brasileiro.
Professora de Sociologia e Ciência Politica na Faculdade de Direito de Jaguariúna/ SP. Linha de investigaçao: Cidadania, Judiciário e políticas públicas, Teorías políticas sobre o Poder Judiciário.
O artigo foi apresentado no Congresso “A Sociologia do Direito em Movimento: Perspectivas da América Latina”, em Canoas (RS), de 5 a 8/05/2015, do Research Committee on Sociology of Law, da International Sociological Association (ISA/RCSL), com organização local da Associação Brasileira de Pesquisadores em Sociologia do Direito (ABRASD) e os cursos de mestrado em Direito do Unilasalle e da UFRJ, http://sociologyoflaw2015.com.br/portugues#home
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Cfr.Fragale Filho, Roberto (2014), “Conselho Nacional de Justiça: desenho institucional, construção de agenda e processo decisório”, Dados – Revista de Ciências Sociais, vol. 56, núm. 4, Rio de Janeiro, pp. 975‐1007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/dados/v56n4/v56n4a08.pdf; Koerner, Andrei y Roberto Fragale Filho (2015), “Do Controle Externo à participação cidadã: por uma revisão do modelo do Judiciário Brasileiro”, em Stoco, Rui & Penalva, Janaína (Org.), Dez Anos de Reforma do Judiciário e o Nascimento do Conselho Nacional de Justiça, Revista dos Tribunais, São Paulo, pp. 61‐68.
Engelmann, Fabiano (2015), “Sentidos políticos da reforma do Judiciário no Brasil”, Direito & Práxis, vol. 7, núm. 12, Rio de Janeiro, pp. 395‐412. Disponível em: http://www.epublicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/17304/14044
Foram analisadas somente medidas em nível federal, e não foram incluídas as medidas dos Judiciários dos estados e da justiça especializada. Dado o campo pesquisado, a análise deveria, a rigor, limitar‐se à justiça federal comum. No entanto, a análise pode ser generalizada para os demais ramos da justiça porque as medidas federais são obrigatórias para eles, embora reconheçamos que é necessário completar a pesquisa com os dados sobre aqueles ramos do Judiciário.
Este termo tem sentido bastante genérico que envolve propostas de lei, normas e atos normativos e exclui normas internas dos tribunais ou atos individuais de administradores. O levantamento compreende apenas as medidas no âmbito nacional e, portanto, exclui as estaduais.
As ações da Secretaria de Reforma do Judiciário não foram incluídas porque não estão mais disponíveis em seu site e não foi possível obtê‐las por outros meios.
Trata‐se de enunciados de caráter normativo sobre matérias de decisões pacíficas repetidas, adotados pelo STF, com aprovação de dois terços dos seus ministros. Os enunciados têm efeito vinculante para os demais órgãos do Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Ou seja, que a relevância da matéria a ser apreciada pelo tribunal ultrapassa o direito subjetivo do litigante.
Recurso apresentado ao STF contra decisão de 2ª instância, sob a alegação de contrariedade à Constituição da República ou de invalidade da lei local em face de lei federal.
É o recurso apresentado ao STJ contra decisão de segunda instância para a uniformização da interpretação e garantir a aplicação de lei federal.
Trata‐se de enunciado de jurisprudência predominante no Tribunal que serve como requisito da admissão de recurso de decisão pela instância inferior. Da decisão de inadmissão cabe agravo para o tribunal superior.
Trata‐se de recurso contra decisão interlocutória do juiz, isto é que não versa sobre o mérito. Neste caso, o agravo é oposto contra a decisão do juiz que não recebe o recurso especial interposto pelo autor.
Judiciário não vive crise de confiança, diz ministra Carmen Lúcia, publicada em 13/ 05/2015. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/05/1628444‐judiciarionao‐vive‐crise‐de‐confianca‐diz‐ministra‐carmen‐lucia.shtml. Cultura da litigiosidade” pode sobrecarregar Justiça com 114 milhões de processos em 2020, publicado em 10/11/2014. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/62232‐qcultura‐da‐litigiosidadeq‐podesobrecarregar‐justica‐com‐114‐milhoes‐de‐processos‐em‐2020
Relatório do CNJ aponta aumento de processos na Justiça | AMB emite nota pública. Publicado em 24 de setembro de 2014. Disponível em http://acmag.org.br/2014/09/relatoriodo‐cnj‐aponta‐aumento‐de‐processos‐na‐justica.