Os aneurismas da aorta abdominal (AAA) afetam cerca de 5% dos homens com mais de 65 anos estimando‐se serem a décima causa de morte nos países ocidentais. A cirurgia aberta (CA) ou a sua exclusão endovascular (EVAR) estão indicadas para prevenir a rotura em doentes com AAA de elevado diâmetro, evitando assim a sua principal complicação. Um estudo detalhado que compare a escolha entre CA e EVAR, bem como a sua mortalidade intra‐hospitalar nas diferentes regiões de Portugal continental, nunca foi realizado.
ObjetivoDeterminar i) a proporção de AAA em rotura vs. íntegros submetidos a intervenção em cada região de Portugal continental, ii) a proporção de cada tipo de intervenção e iii) a respetiva mortalidade hospitalar.
MétodosForam selecionados todos os doentes incluídos na base de dados administrativa de internamentos hospitalares com o diagnóstico de AAA, em rotura ou íntegros, submetidos a CA ou EVAR, no período compreendido entre 2000‐2010. A referida base de dados contém dados relativos a todos os episódios em hospitais públicos de Portugal continental. Foram avaliados os tipos AAA, o tipo de correção e a mortalidade intra‐hospitalar da mesma, para cada região nacional.
ResultadosForam registadas 3.101 correções de AAA entre 2000‐2010 em Portugal continental. A reparação de AAA íntegros foi 3 vezes mais frequente do que a intervenção em AAA em rotura (75 vs. 25%). A comparação regional demostrou que a relação de AAA íntegros/AAA em rotura no Norte e Lisboa foi significativamente maior do que no Centro. A frequência de AAA em rotura manteve‐se constante para cada região ao logo dos 11 anos estudados em todas as regiões nacionais. A CA foi a técnica mais utilizada quer para AAA em rotura quer para AAA íntegros. No entanto, a correção endovascular aumentou progressivamente, sendo em 2010 o método mais frequente de reparação de AAA íntegros no Norte e em Lisboa (55% para ambas as regiões). A mortalidade nos AAA em rotura não apresentou diferenças estatisticamente significativas entre as diferentes regiões nacionais (52% no Norte, 52% no Centro e 51% em Lisboa), nem entre as diferentes abordagens cirúrgicas (51% na CA vs. 52% por EVAR). No tratamento dos AAA íntegros a EVAR apresentou menor mortalidade intra‐hospitalar na região Norte e em Lisboa (2,1 vs. 6,6% no Norte e 5,0 vs. 8,7% em Lisboa, p<0,05).
ConclusãoO número de intervenções para tratamento de AAA tem vindo a aumentar em todas as regiões de Portugal continental, estando a EVAR progressivamente a assumir‐se como o tratamento de escolha. Para os AAA íntegros, a EVAR associou‐se a uma menor mortalidade hospitalar no Norte e em Lisboa.
Abdominal aortic aneurysms (AAA) affect approximately 5% of men over 65 years of age and are estimated to be the tenth leading cause of mortality in Western countries. Elective surgery either by open repair (OR) or endovascular aneurysm repair (EVAR) is indicated in patients with large AAAs, preventing rupture, the major complication of AAA. To the best of our knowledge a detailed study comparing the treatment choice for AAA repair as well as its associated in‐hospital mortality in Portuguese mainland state hospitals has never been performed.
AimThe purpose of this analysis was to determine i) the proportion of aneurysm type submitted to repair in each region state hospitals, ii) the proportion of each type of surgical treatment among them, iii) the in‐hospital mortality associated with each treatment.
MethodsAll individuals diagnosed with ruptured or non‐ruptured AAAs submitted to either OR or EVAR between 2000 and 2010, whose information was available on an inpatient hospital administrative database, were selected for the study. The database contained data from all Portuguese mainland state hospitals. To evaluate the regional chronological evolution of these data, a yearly characterization for the period between 2000 and 2010 was performed. The type of AAA, its choice of correction and the in‐hospital mortality were evaluated for each national region.
ResultsBetween the years 2000 and 2010, 3101 AAAs repairs were registered in mainland Portugal. Non‐ruptured AAAs were three times more frequent than ruptured AAAs (75% vs. 25%). Regional comparison showed the non‐ruptured AAA/ruptured AAA ratio in Norte and Lisboa to be significantly higher than that in Centro. Ruptured AAA frequency remained fairly stable during the 11 years evaluated. OR was the preferred method for treatment of both ruptured and non‐ruptured AAAs in all regions. Nevertheless, the choice for EVAR has been increasing from the period of 2005 to 2010, actually becoming the most frequent method in Norte and Lisboa during 2010 (55% in both regions). Ruptured AAAs mortality was similar in all the evaluated regions (52% in Norte, 52% in Centro and 51% in Lisboa). No significant differences were found between EVAR and OR in the repair of ruptured AAA (in‐hospital mortality of 51% in OR vs. 52% in EVAR). A significant improved outcome was obtained with EVAR in the repair of non‐ruptured AAA in state hospitals of Norte and Lisboa (2,1% vs. 6,6% in Norte and 5,0% vs. 8,7% in Lisboa, p<0,05). No differences were observed in state hospitals of Centro.
ConclusionsThe yearly number of AAA repairs in Portuguese mainland state hospitals is increasing across all regions, with EVAR repair consistently gaining prominence. Compared to OR, EVAR presents a more favourable in‐hospital mortality outcome in state hospitals of Norte and Lisboa, when used in elective surgeries for non‐ruptured AAA repairs.
Os aneurismas da aorta abdominal (AAA) infrarrenais afetam 1% dos indivíduos com mais de 55 anos de idade, aumentando posteriormente a sua incidência em 2‐4% por década1. Os homens têm 3 vezes mais probabilidade que as mulheres a desenvolver AAA2 e são 10 vezes mais propensos a ter um AAA de 4 ou mais centímetros de diâmetro3. A idade é um fator de risco importante, com a incidência de AAA a aumentar acentuadamente após os 55 anos nos homens e após os 70 anos nas mulheres3. A maioria dos AAA são assintomáticos e indetetáveis ao exame físico, permanecendo desconhecidos até serem diagnosticados por exames de imagem realizados por outras razões4. Os aneurismas sintomáticos ou superiores a 5,5cm de diâmetro têm indicação clássica para correção, enquanto os assintomáticos e de menores dimensões podem ser seguidos com vigilância periódica5. Contudo, a rotura pode ser a sua primeira manifestação6, com necessidade de intervenção urgente de modo a impedir a morte do doente.
As taxas de mortalidade descritas para a reparação de aneurismas intactos são frequentemente inferiores a 5%7, aumentando dramaticamente nos AAA em rotura, que apresentam uma mortalidade global de 80‐90%, acoplada com as taxas de sobrevivência que variam entre 30‐65% para aqueles doentes que chegam vivos ao hospital8. Nos países ocidentais, as 2 últimas décadas do século XX foram caraterizadas por um aumento progressivo da incidência de morte atribuída a AAA em rotura9. No entanto, no início do milénio parece definir‐se um ponto de viragem nesta tendência, sendo que, tanto a prevalência, quanto a incidência de AAA começaram a declinar10. Vários autores têm estudado este fenómeno, atribuindo essa redução a alterações epidemiológicas (p. ex.: prevalência de tabagismo, longevidade das populações), bem como a uma maior deteção do aneurisma, com a sua subsequente reparação eletiva por métodos mais seguros13,14.
A correção dos AAA em rotura e íntegros pode ser por cirurgia aberta (CA) ou por cirurgia endovascular (EVAR)11. A técnica cirúrgica atual, introduzida pela primeira vez em 1952, foi gradualmente aperfeiçoada, tanto em termos técnicos como nos cuidados pós‐operatórios, apresentando atualmente mortalidade e morbilidade perioperatória reduzidas quando realizada de forma eletiva. Desenvolvido em 1991, a EVAR é uma abordagem menos invasiva, resultando numa menor agressão cirúrgica com um potencial de redução da mortalidade e morbilidade, bem como num tempo de recuperação mais curto. Os benefícios de cada tipo de cirurgia (aberta vs. endovascular) foram exaustivamente escrutinados, existindo diversos estudos publicados a comparar os seus resultados nas suas diversas vertentes12–15. Embora tais resultados variem frequentemente entre países, algumas variáveis parecem seguir um padrão similar. Tem sido descrito de forma sistemática uma menor mortalidade hospitalar da EVAR, que é perdida a longo prazo devido a complicações associadas ao procedimento. Tendo em conta toda a informação disponível, o tipo de cirurgia a ser executada deve ter em conta o perfil do doente.
Nos países ocidentais estima‐se que o AAA é uma das 10 principais causas de morte em homens com mais de 65 anos6. Dada a sua prevalência, a elevada mortalidade e os custos inerentes ao seu tratamento, a ausência de informação nacional global sobre esta doença constitui uma falha epidemiológica grave. O presente estudo pretende colmatar esta lacuna e determinar, para cada região de Portugal continental e num período de 10 anos (2000‐2010), a proporção de cada tipo de aneurismas submetido a reparação, a proporção de cada tipo de tratamento cirúrgico e a respetiva mortalidade hospitalar.
MétodosParticipantesForam incluídos todos os episódios relativos a doentes com o diagnóstico de AAA em rotura ou íntegros submetidos a reparação por CA ou EVAR, com altas entre os anos de 2000‐2010. A informação foi obtida através de uma base de dados da administração central de saúde, com registos de todos os hospitais e centros hospitalares de Portugal continental.
MétodoA população alvo foi categorizada por sexo e idade. Para cada região nacional, foram calculados o rácio entre reparações de AAA em rotura e íntegros, a relação anual entre modalidades cirúrgicas utilizadas, a mortalidade intra‐hospitalar associada a cada procedimento.
Recolha de dadosOs dados foram extraídos de uma base de dados do Serviço Nacional de Saúde, habitualmente conhecida por base de dados dos Grupos de Diagnóstico Homogéneos (GDH). Esta base de dados inclui informação relativa aos vários episódios registados com um código CID‐9‐MC (Classificação Internacional de Doenças, Nona Revisão, Modificação Clínica), seja como diagnóstico principal ou secundário, atribuído a AAA em rotura ou íntegros e ao seu tratamento (tabela 1).
Códigos da CID‐9‐MC utilizados na seleção de episódios
Código de lesões e doenças | ||
441.3 | Em rotura | Aneurisma da aorta abdominal roto |
441.5 | Aneurisma da aorta de local inespecífico roto | |
441.4 | Íntegros | Aneurisma da aorta abdominal, sem menção de rutura |
441.9 | Aneurisma da aorta de local inespecífico, sem menção de rutura | |
Código de procedimentos | ||
38.34 | CA | Resseção de vasos com anastomose, aorta |
38.40 | Resseção de vasos com reposição, local inespecífico | |
38.44 | Resseção de vasos com reposição, aorta abdominal | |
38.60 | Outra excisão de vasos, local inespecífico | |
38.64 | Outra excisão de vasos, aorta abdominal | |
39.25 | Bypass aorto‐iliaco‐femural | |
39.51 | Clampagem de aneurisma | |
39.52 | Outra reparação de aneurisma | |
39.56 | Reparação de vaso sanguíneo com prótese biológica | |
39.57 | Reparação de vaso sanguíneo com prótese sintética | |
39.71 | EVAR | Implantação endovascular de prótese na aorta abdominal |
39.79 | Outra reparação endovascular (de aneurisma) de outros vasos |
As variáveis analisadas foram a mortalidade intra‐hospitalar, tipo de correção cirúrgica (CA vs. EVAR), tipo de AAA (em rotura vs. íntegros), dias de internamento, as caraterísticas demográficas dos doentes e a localização dos hospitais de acordo com a Nomenclatura das Unidades Territoriais Estatísticas – NUTS II (fig. 1, tabela 2).
Divisão sub‐regional de Portugal continental (NUTS II) e respetivo perfil demográfico (Instituto Nacional de Estatística, 2010)
Perfil demográfico | ||
---|---|---|
Sub‐regiões de Portugal continental | População (n) | Densidade populacional (n/km2) |
Norte | 3.741.092 | 175,8 |
Centro | 2.375.902 | 84,3 |
Lisboa | 2.839.908 | 946,0 |
Alentejo | 749.055 | 23,7 |
Algarve | 437.643 | 87,6 |
Foi calculada para cada região a percentagem relativa de cada tipo de AAA, o seu tipo de reparação e a mortalidade intra‐hospitalar de cada tipo de cirurgia. As diferenças encontradas foram testadas pelo teste Qui‐quadrado ou, nas amostras pequenas, pelo teste exato de Fisher. Toda a análise estatística foi realizada com o software IBM SPSS Statistics, versão 20.0.0, Somers, NY, EUA. Os gráficos foram elaborados através do Graph Pad‐Prisma, versão 4.0, San Diego, CA, EUA.
ResultadosNo período referido foram tratados 3.101 AAA. A análise por regiões demonstrou que o Norte, Centro e Lisboa foram responsáveis por mais de 99% do total de cirurgias. A maioria dos AAA analisados foi corrigida por CA (n=2.603, 83,9% do total de cirurgias no período analisado). Até 2005 não foi registado qualquer EVAR, tendo este sido registado pela primeira vez nessa data num hospital do norte do país. Dois anos mais tarde, este procedimento cirúrgico foi também codificado no Centro e Lisboa. Na região centro foram realizadas menos correções por EVAR do que no Norte e Lisboa (p<0,05), sendo a relação CA/EVAR nestas 2 regiões semelhante (p=0,664). A intervenção endovascular foi gradualmente adquirindo um papel mais importante na correção de AAA, representando 55, 33 e 55% de todos os procedimentos no Norte, Centro e Lisboa, respetivamente, em 2010. Até à conclusão do estudo, nenhum EVAR foi realizado em centros hospitalares do Alentejo e do Algarve. O número anual de CA e EVAR por região está sintetizado na tabela 3 e ilustrado na figura 2.
Distribuição anual de todos os procedimentos de AAA, de acordo com o tipo de cirurgia
2000 | 2001 | 2002 | 2003 | 2004 | 2005 | 2006 | 2007 | 2008 | 2009 | 2010 | Total | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Norte | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 40 | 57 | 44 | 58 | 66 | 91 | 73 | 98 | 63 | 72 | 46 | 708 |
% | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 98,9 | 84,9 | 90,7 | 70,8 | 60,0 | 44,7 | 82,0 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 13 | 10 | 26 | 48 | 57 | 155 |
% | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 1,1 | 15,1 | 9,3 | 29,2 | 40,0 | 55,3 | 18,0 |
Total | ||||||||||||
n | 40 | 57 | 44 | 58 | 66 | 92 | 86 | 108 | 89 | 120 | 103 | 863 |
Centro | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 23 | 39 | 37 | 34 | 29 | 33 | 48 | 37 | 40 | 44 | 32 | 396 |
% | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 86,0 | 95,2 | 78,6 | 66,7 | 91,7 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 6 | 2 | 12 | 16 | 36 |
% | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 14,0 | 4,8 | 21,4 | 33,3 | 8,3 |
Total | ||||||||||||
n | 23 | 39 | 37 | 34 | 29 | 33 | 48 | 43 | 42 | 56 | 48 | 432 |
Lisboa | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 95 | 99 | 121 | 123 | 153 | 175 | 201 | 153 | 129 | 126 | 95 | 1.470 |
% | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 79,3 | 66,2 | 59,2 | 45,5 | 82,7 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 40 | 66 | 87 | 114 | 307 |
% | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 20,7 | 33,8 | 40,8 | 54,5 | 17,3 |
Total | ||||||||||||
n | 95 | 99 | 121 | 123 | 153 | 175 | 201 | 193 | 195 | 213 | 209 | 1.777 |
Alentejo | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 1 | 0 | 3 | 4 | 1 | 7 | 4 | 2 | 2 | 3 | 0 | 27 |
% | 100,0 | ‐ | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | ‐ | 100,0 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
% | 0,0 | ‐ | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | ‐ | 0,0 |
Total | ||||||||||||
n | 1 | 0 | 3 | 4 | 1 | 7 | 4 | 2 | 2 | 3 | 0 | 27 |
Algarve | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 2 |
% | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | 100,0 | ‐ | 100 | 100,0 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
% | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | 0,0 | ‐ | 0 | 0,0 |
Total | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 2 |
Total | ||||||||||||
CA | ||||||||||||
n | 159 | 195 | 205 | 219 | 249 | 306 | 326 | 290 | 235 | 245 | 174 | 2.603 |
% | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 100,0 | 99,7 | 96,2 | 83,8 | 71,4 | 62,5 | 48,2 | 83,9 |
EVAR | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 13 | 56 | 94 | 147 | 187 | 498 |
% | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,3 | 3,8 | 16,2 | 28,6 | 37,5 | 51,8 | 16,1 |
Total | ||||||||||||
n | 159 | 195 | 205 | 219 | 249 | 307 | 339 | 346 | 329 | 392 | 361 | 3.101 |
Em todos os centros hospitalares continentais a relação AAA íntegros vs. em rotura foi de 3:1. Esta proporção manteve‐se sensivelmente constante ao longo de toda a duração do estudo (tabela 4, fig. 3). No entanto, foi constatada uma variação regional na proporção de correção de AAA íntegros/em rotura, sendo a percentagem de reparação de aneurismas íntegros em Lisboa (75%) e no Norte (78%) significativamente mais elevada do que a observada no Centro (70%, p<0,05).
Distribuição anual de todos os reparos de AAA, de acordo com o tipo de aneurisma
2000 | 2001 | 2002 | 2003 | 2004 | 2005 | 2006 | 2007 | 2008 | 2009 | 2010 | Total | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Norte | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 29 | 50 | 35 | 45 | 53 | 71 | 58 | 85 | 71 | 97 | 82 | 676 |
% | 72,5 | 87,7 | 79,5 | 77,6 | 80,3 | 77,2 | 67,4 | 78,7 | 79,8 | 80,8 | 79,6 | 78,3 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 11 | 7 | 9 | 13 | 13 | 21 | 28 | 23 | 18 | 23 | 21 | 187 |
% | 27,5 | 12,3 | 20,5 | 22,4 | 19,7 | 22,8 | 32,6 | 21,3 | 20,2 | 19,2 | 20,4 | 21,7 |
Total | ||||||||||||
n | 40 | 57 | 44 | 58 | 66 | 92 | 86 | 108 | 89 | 120 | 103 | 863 |
Centro | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 19 | 28 | 27 | 23 | 17 | 24 | 29 | 26 | 28 | 46 | 34 | 301 |
% | 82,6 | 71,8 | 73,0 | 67,6 | 58,6 | 72,7 | 60,4 | 60,5 | 66,7 | 82,1 | 70,8 | 69,7 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 4 | 11 | 10 | 11 | 12 | 9 | 19 | 17 | 14 | 10 | 14 | 131 |
% | 17,4 | 28,2 | 27,0 | 32,4 | 41,4 | 27,3 | 39,6 | 39,5 | 33,3 | 17,9 | 29,2 | 30,3 |
Total | ||||||||||||
n | 23 | 39 | 37 | 34 | 29 | 33 | 48 | 43 | 42 | 56 | 48 | 432 |
Lisboa | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 58 | 78 | 85 | 88 | 110 | 136 | 152 | 139 | 160 | 162 | 168 | 1.336 |
% | 61,1 | 78,8 | 70,2 | 71,5 | 71,9 | 77,7 | 75,6 | 72,0 | 82,1 | 76,1 | 80,4 | 75,2 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 37 | 21 | 36 | 35 | 43 | 39 | 49 | 54 | 35 | 51 | 41 | 441 |
% | 38,9 | 21,2 | 29,8 | 28,5 | 28,1 | 22,3 | 24,4 | 28,0 | 17,9 | 23,9 | 19,6 | 24,8 |
Total | ||||||||||||
n | 95 | 99 | 121 | 123 | 153 | 175 | 201 | 193 | 195 | 213 | 209 | 1.777 |
Alentejo | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 1 | 0 | 2 | 4 | 1 | 5 | 4 | 2 | 1 | 2 | 0 | 22 |
% | 100,0 | ‐ | 66,7 | 100,0 | 100,0 | 71,4 | 100,0 | 100,0 | 50,0 | 66,7 | ‐ | 81,5 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 1 | 0 | 0 | 2 | 0 | 0 | 1 | 1 | 0 | 5 |
% | 0,0 | ‐ % | 33,3 | 0,0 | 0,0 | 28,6 | 0,0 | 0,0 | 50,0 | 33,3 | ‐ | 18,5 |
Total | ||||||||||||
n | 1 | 0 | 3 | 4 | 1 | 7 | 4 | 2 | 2 | 3 | 0 | 27 |
Algarve | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 |
% | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | 0,0 | ‐ | 0,0 | 0,0 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 2 |
% | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | 100,0 | ‐ | 100,0 | 100,0 |
Total | ||||||||||||
n | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 2 |
Total | ||||||||||||
Íntegros | ||||||||||||
n | 107 | 156 | 149 | 160 | 181 | 236 | 243 | 252 | 260 | 307 | 284 | 2.335 |
% | 67,3 | 80,0 | 72,7 | 73,1 | 72,7 | 76,9 | 71,7 | 72,8 | 79,0 | 78,3 | 78,7 | 75,3 |
Em rotura | ||||||||||||
n | 52 | 39 | 56 | 59 | 68 | 71 | 96 | 94 | 69 | 85 | 77 | 766 |
% | 32,7 | 20,0 | 27,3 | 26,9 | 27,3 | 23,1 | 28,3 | 27,2 | 21,0 | 21,7 | 21,3 | 24,7 |
Total | ||||||||||||
n | 159 | 195 | 205 | 219 | 249 | 307 | 339 | 346 | 329 | 392 | 361 | 3.101 |
A tabela 5 evidencia as caraterísticas demográficas dos doentes incluídos. Foram tratados 10‐15 vezes mais homens que mulheres.
Caraterísticas dos 3.101 doentes submetidos a reparação de AAA entre 2000‐2010
Norte (n=863) | Centro (n=432) | Lisboa (n=1.777) | Alentejo (n=27) | Algarve (n=2) | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Intervenção | CA (n=708) | EVAR (n=155) | CA (n=396) | EVAR (n=36) | CA (n=1.470) | EVAR (n=307) | CA (n=27) | EVAR (n=0) | CA (n=2) | EVAR (n=0) |
n/100 mil habitantes | 18,9 | 4,1 | 16,7 | 1,5 | 51,8 | 10,8 | 3,6 | ‐ | 0,5 | ‐ |
Idade média±DP | 70,6±8,8 | 72,0±8,0 | 70,5±8,5 | 73,1±8,6 | 71,1±8,7 | 74,3±8,5 | 71,5±9,2 | ‐ | 63,5±2,1 | ‐ |
Sexo masculino, % | 93,4 | 95,5 | 91,9 | 100 | 91,8 | 86,3 | 92,6 | ‐ | 100,0 | ‐ |
A análise da mortalidade de acordo com o tipo de AAA demonstra que as reparações de AAA em rotura estão associadas a uma mortalidade muito mais alta do que nos íntegros (tabela 6). De facto, a taxa de sobrevivência do AAA em rotura que chega vivo ao hospital é inferior a 50%, independentemente da região nacional. Em relação ao tipo de cirurgia, os dados revelam que, quer no Norte quer em Lisboa, a EVAR está associado a menor taxa de mortalidade intra‐hospitalar (p<0,05) quando escolhido para a reparação eletiva de AAA íntegros (2,1 e 5,0% vs. 6,6 e 8,7%, respetivamente). Por outro lado, nos casos de AAA em rotura, não foram encontradas diferenças significativas nas taxas de mortalidade entre EVAR e CA no Norte, Centro e Lisboa (tabela 5).
Distribuição regional da mortalidade intra‐hospitalar, de acordo com o tipo de AAA e procedimento
AAA | Tipo de cirurgia | Norte(n=863) | p* | Centro(n=432) | p** | Lisboa(n=1.777) | p* |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Íntegros | CA | 6,6%(35/533) | 0,039 | 8,1%(22/270) | 0,488 | 8,7%(92/1.054) | 0,038 |
EVAR | 2,1%(3/143) | 3,2%(1/31) | 5,0%(14/282) | ||||
Em rotura | CA | 50,9%(89/175) | 0,289 | 52,4%(66/126) | 0,671 | 51,0%(212/416) | 0,774 |
EVAR | 66,7%(8/12) | 40,0%(2/5) | 48,0%(12/25) |
A análise dos dias de internamento por tipo de AAA e tipo de cirurgia revelou que a correção de AAA íntegros por EVAR se associou a menos 3 dias de internamento que a reparação por CA (p<0,001) (tabela 7).
DiscussãoDada a inexistência de dados que caraterizem as variações regionais na decisão terapêutica e na mortalidade intra‐hospitalar do tratamento do AAA nos hospitais públicos portugueses, consideramos relevante a realização desta análise.
Ao contrário do descrito na literatura internacional16, em Portugal não foi observada uma diminuição da proporção de correção de AAA em rotura vs. íntegros ao longo dos 10 anos estudados. Este facto pode estar relacionado com a ausência de um programa de rastreio de AAA assintomáticos, revelando que a sua implementação poderá ser benéfica no impacto da mortalidade por AAA em Portugal.
A mortalidade observada em Portugal para a correção de AAA quer em rotura quer íntegros, por CA ou por EVAR, mantém‐se significativamente superior à descrita em estudos internacionais (tabela 8)16–27. A mortalidade do tratamento eletivo de AAA íntegros, de 6,6% na região norte, 8,1% na região centro e 8,7% em Lisboa é significativamente superior à descrita como estado da arte pela Sociedade Europeia de Cirurgia Vascular (ESVS) de<5%. Da mesma forma, a mortalidade de 2,1% na região norte, 3,2% na região centro e 5,0% em Lisboa na reparação por EVAR é substancialmente superior à recomendada pela ESVS de<2%. Estes dados demonstram que o potencial de melhoria no tratamento e cuidados dos doentes com AAA íntegros é enorme e deve ser priorizado.
Informação publicada referente à mortalidade intra‐hospitalar e aos 30 dias após reparação de AAA em rotura e íntegros
Estudo | Ano da publicação | País de origem | Doentes operados (n) | Mortalidade | Mortalidade (%) | |
---|---|---|---|---|---|---|
EVAR | CA | |||||
AAA íntegros | ||||||
Garcia‐Madrid | 2004 | Espanha | 83 | Aos 30 dias | 3,7 | 6,6 |
Greenhalgh | 2008 | Reino Unido | 1.082 | Aos 30 dias | 1,7 | 4,7 |
Mani | 2011 | Dinamarca | 2.500 | Aos 30 dias | 1,2 | 4,0 |
Mani | 2011 | Finlândia | 293 | Aos 30 dias | 2,3 | 4,4 |
Mani | 2011 | Itália | 9.107 | Aos 30 dias | 0,9 | 2,2 |
Mani | 2011 | Suécia | 4.134 | Aos 30 dias | 1,9 | 3,2 |
Prinssen | 2004 | Holanda/Bélgica | 345 | Aos 30 dias | 1,2 | 4,6 |
Schermerhorn | 2008 | Estados Unidos | 45.660 | Aos 30 dias | 1,2 | 4,8 |
Wahlgren and Malmstedt | 2008 | Suécia | 3.831 | Aos 30 dias | 1,8 | 2,8 |
Wang | 2012 | China | 2.862 | Aos 30 dias | 2,4 | 6,2 |
Wanhainen | 2008 | Suécia | 7.175 | Aos 30 dias | 2,5 | 4,1 |
Leon | 2005 | Estados Unidos | 12.399 | Intra‐hospitalar | 2,3 | 6,0 |
Mani | 2011 | Austrália | 1.814 | Intra‐hospitalar | 1,3 | 3,8 |
Mani | 2011 | Hungria | 269 | Intra‐hospitalar | 4,3 | 2,3 |
Mani | 2011 | Noruega | 2.707 | Intra‐hospitalar | 0,3 | 2,7 |
Mani | 2011 | Suíça | 1.814 | Intra‐hospitalar | 2,6 | 3,6 |
Mani | 2011 | Reino Unido | 8.789 | Intra‐hospitalar | 1,8 | 5,3 |
McPhee | 2007 | Estados Unidos | 183.387 | Intra‐hospitalar | 1,0 | 4,5 |
Neste estudo (total) | 2013 | Portugal | 2.335 | Intra‐hospitalar | 3,9 | 8,1 |
Norte | 676 | 2,1 | 6,6 | |||
Centro | 301 | 3,2 | 8,1 | |||
Lisboa | 1.336 | 5,0 | 8,7 | |||
Alentejo | 22 | ‐ | 13,6 | |||
AAA em rotura | ||||||
Mani | 2011 | Dinamarca | 1.026 | Aos 30 dias | 33,3 | 35,4 |
Mani | 2011 | Itália | 994 | Aos 30 dias | 19,6 | 28,9 |
Mani | 2011 | Suécia | 1.517 | Aos 30 dias | 18,7 | 30,1 |
Starnes | 2010 | Estados Unidos | 179 | Aos 30 dias | 18,5 | 57,2 |
Visser | 2009 | Holanda | 201 | Aos 30 dias | 25,9 | 39,9 |
Wanhainen | 2008 | Suécia | 3.516 | Aos 30 dias | 15,2 | 36,1 |
Acosta | 2006 | Suécia | 162 | Intra‐hospitalar | 33,9 | 45,2 |
Greco | 2006 | Estados Unidos | 5.798 | Intra‐hospitalar | 39,3 | 47,7 |
Mani | 2011 | Austrália | 334 | Intra‐hospitalar | 22,6 | 33,0 |
Mani | 2011 | Hungria | 42 | Intra‐hospitalar | 50,0 | 37,5 |
Mani | 2011 | Noruega | 552 | Intra‐hospitalar | 12,5 | 29,0 |
Mani | 2011 | Suíça | 369 | Intra‐hospitalar | 21,1 | 44,6 |
Mani | 2011 | Reino Unido | 2.075 | Intra‐hospitalar | 20,4 | 34,6 |
McPhee | 2007 | Estados Unidos | 37.016 | Intra‐hospitalar | 29,0 | 38,2 |
Vogel | 2009 | Estados Unidos | 700 | Intra‐hospitalar | 45,1 | 52,4 |
Neste estudo (total) | 2013 | Portugal | Intra‐hospitalar | 52,4 | 51,1 | |
Norte | 187 | 66,7 | 50,9 | |||
Centro | 131 | 40,0 | 52,4 | |||
Lisboa | 441 | 48,0 | 51,0 | |||
Alentejo | 5 | ‐ | 40,0 | |||
Algarve | 2 | ‐ | 50,0 |
Também a duração do internamento para correção de AAA íntegros é significativamente maior em Portugal que a referenciada nas recomendações da ESVS (8 vs. 3 dias para EVAR e 11 vs. 7 dias para CA). Parte desta diferença estará relacionada com o longo período de internamento pré‐operatório que em Portugal é em média de 3 dias, quer para a CA quer para a EVAR (tabela 7). O período pós‐operatório em Portugal, de 5 dias para a EVAR e 8 dias para a CA, aproxima‐se da duração recomendada de internamento pela ESVS e revela que a articulação entre o dia de internamento e o agendamento cirúrgico pode ser um fator a melhorar no futuro em Portugal.
Ao contrário do observado em outros países (tabela 8), a EVAR não demonstrou, em hospitais nacionais, melhores resultados que a CA na reparação de AAA em rotura. Estes resultados merecem reflexão no sentido de aperfeiçoar a técnica, as indicações e as condições logísticas em que este procedimento é realizado no AAA em rotura, no sentido de aproximar Portugal dos números apresentados por outros países (tabela 8)28,29.
Um estudo que permita avaliar o seguimento dos doentes submetidos a correção de AAA em Portugal seria da maior importância.
Possíveis erros associados à utilização de dados secundários, nomeadamente a recolha de informação e codificação (através de códigos ICD‐9‐CM) no sistema de registo e a possível falta de formação específica para o uso correto das aplicações informáticas, associada a procedimentos complexos para o registo dos dados, podem ter prejudicado a inclusão da totalidade das cirurgias de reparação de AAA na base de dados hospitalar30.
Responsabilidades éticasProteção dos seres humanos e animaisOs autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos estabelecidos pelos responsáveis da Comissão de Investigação Clínica e Ética e de acordo com os da Associação Médica Mundial e da Declaração de Helsinki.
Confidencialidade dos dadosOs autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.
Direito à privacidade e consentimento escritoOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
AutoriaOs autores Ricardo Castro‐Ferreira e Manuel Neiva‐Sousa contribuíram de igual forma para a elaboração deste artigo.
Conflito de interessesOs autores declaram não haver conflito de interesses.
Os autores gostavam de agradecer à ACSS por permitir o acesso aos dados analisados. Os autores também gostariam de agradecer a Ana Catarina Rodrigues, Carolina Rodrigues, Catarina Cruz, Diogo Costa, Isabel Vasquez, Joana Garcia, Joana Rei, João Paulo Carvalho, José João Monteiro, José Pedro Vale, Lúcia Vieira, Marisa Martins e Ricardo Coutinho, que colaboraram na versão prévia deste trabalho.
Trabalho apresentado no Congresso Nacional SPACV em Coimbra, 2013.