INTRODUÇÃO
O pseudotumor inflamatório é uma lesão benigna, pouco frequente e com uma histopatogénese desconhecida. Pode ter origem na túnica vaginalis, cordão espermático ou epidídimo, mas sempre sem envolvimento do testículo1. É uma situação rara em que o diagnóstico só é possível após tratamento cirúrgico, muitas vezes após orquidectomia radical por suspeita de malignidade.
CASO CLÍNICO
Um homem de 43 anos de idade foi enviado à consulta de Urologia por ter notado um aumento indolor do escroto com cerca de 9 meses de evolução. Não havia história de traumatismo local, medicação concomitante ou de patologia associada. Ao exame físico era evidente uma massa escrotal endurecida sem envolvimento dos testículos, epididímo ou do cordão espermático (fig. 1). A ecografia escrotal mostrou uma massa extra-testicular com cerca de 7,5 cm, multinodular e de ecoestrutura heterogénea, e testículos e epidídimos sem alterações.
Figura 1. Massa escrotal paratesticular.
O doente foi submetido a remoção cirúrgica da massa escrotal (lesão tumoral, pele e tecido celular subcutâneo). O resultado anatomopatológico mostrou uma massa com 10 x 7 x 6 cm, com 252 g de peso envolvida por uma cápsula membranosa, parcialmente coberta por pele e tecido subcutâneo e muscular (fig. 2). O exame microscópico revelou uma proliferação de células fusiformes e alongadas dispostas num padrão irregular e compacto adoptando um padrão indefinido dentro da cápsula fibrosa, sem alterações da pele ou do tecido muscular liso subjacente. Entre esses feixes de células haviam ninhos de histiócitos xantelasma-like e um escasso infiltrado inflamatório, composto por linfócitos, plasmócitos e alguns eosnófilos polimosfonucleares. Havia também alguns feixes de colagéneo com um arranjo perivascular. Não obstante a rara e focal atipia, o índice mitótico era escasso (fig. 3). A imunohistoquimica era negativa para os marcadores epiteliais e CD34, ligeiramente positiva para a proteína S100 e fortemente positiva para vimentina, SMA, HHF-35 e desmina no componente fusocelular e para CD68 nos histiócitos. Estes resultados permitiram o diagnóstico de tumor inflamatório miofibroblástico (pseudotumor inflamatório). Após 10 meses de follow up não existem sinais de recorrência da doença.
Figura 2. Massa com 10 cm coberta com pele.
Figura 3. Proliferação células fusiformes com escasso infiltrado inflamatório e índice mitótico escasso (E, 20).
DISCUSSÃO
Os pseudotumores inflamatórios são situações raras. Foi descrito pela primeira vez em 1937 localizado nos pulmões2, e desde então foi descoberto em praticamente todas as localizações anatómicas. No aparelho genito-urinário, descrito primeiro por Roth em 1980, estes tumores são mais frequentes na bexiga3,4. Vários sinónimos têm sido usados para descrever estes tumores: pseudotumor inflamatório, tumor miofibroblástico inflamatório, foliculite proliferativa ou pseudotumor fibroso1,2,5-7. Trata-se de uma lesão benigna que pode simular, quer clinica quer radiológicamente, um tumor maligno. Embora raros os pseudotumores inflamatórios são os tumores paratesticulares mais frequentes a seguir aos tumores adenomatoides do epidídimo5. Apesar de terem um pico de incidência na 3.ª década, podem ocorrer em qualquer idade, habitualmente como uma massa escrotal indolor acompanhada de hidrocele em cerca de 45% dos casos, e associado a traumatismo local ou orquiepididimite em 30% dos casos6. Apesar da sua etiologia desconhecida alguns autores crêm que se trata de um fibrossarcoma de baixo grau com fenómenos inflamatórios associados. Em alguns casos, parece ser resultado de uma reação inflamatória após traumatismo, cirurgia minor ou associado a outros tumores malignos. Uma etiologia infecciosa também tem sido associada a estes tumores pseudoinflamatórios. Os agentes encontrados em associação a estas neoplasias incluem Epstein Barr virus (descobertos em pseudotumores esplénicos e nodais), Actinomyces e Nocardia (presente nos pseudotumores hepáticos e pulmonares respetivamente) e Mycoplasma (pseudotumor pulmonar). Um mecanismo auto-imune também pode estar implicado. Histológicamente é caracterizado por uma proliferação celular e um arranjo fascicular ou fascicular/miofibroblástico, acompanhado por um infiltrado inflamatório crónico, espialmente plasmócitos e mastócitos2.
O tratamento de eleição é a excisão cirurgica. O prognóstico é excelente, e a recorrência apenas ocorre quando a reseção é incompleta6.
CONCLUSÕES
Os pseudotumores inflamatórios dos genitais externos são raros. O seu diagnóstico diferêncial inclui as situações inflamatórias, infecciosas e neoplásicas dos testículos e epidídimo6. Outras situações que levem à formação de massas escrotais como a torção testicular, espermatocele, varicocele, tuberculose ou condições malignas (neoplasias malignas paratesticulares, leiomiossarcoma, rabdomiossarcoma ou carcinoma sarcomatoide) devem também ser excluidas. A sua completa remoção cirurgica, sempre que possível, é o tratamento de eleição.
Correspondência: Dr. R.P. Gonçalves Borges.
Serviço de Urologia. Hospital Geral de Santo António.
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