O projeto «Papa Bem» tem como finalidade promover a literacia em saúde, através da criação e disseminação de materiais escritos e audiovisuais acerca da obesidade infantil e formas de prevenção, desde a conceção até aos 5 anos de idade.
Materiais e métodosA elaboração do plano editorial e a produção dos materiais tiveram por base um estudo exploratório, que contou com uma revisão da literatura e com um diagnóstico ecológico e educacional numa área‐piloto.
Ao longo de todo o processo de produção dos materiais foram consultados peritos nas diversas áreas temáticas. A legibilidade dos materiais produzidos foi testada.
ResultadosAtravés do estudo exploratório identificámos os fatores predisponentes, facilitadores e de reforço inerentes a comportamentos relacionados com a obesidade infantil, que nortearam a produção dos materiais. Os materiais produzidos, baseados na mais recente evidência científica, demonstraram ser acessíveis para pessoas com baixos níveis de escolaridade.
ConclusãoA metodologia participativa utilizada no projeto permitiu‐nos compilar informação relevante quanto aos principais pontos críticos para a compreensão e prevenção da obesidade infantil.
A elaboração das mensagens, com linguagem simples e organização lógica, adequadas à população, poderá ser facilitadora da mudança comportamental, particularmente se tiver o apoio de mediadores que as adaptem a cada contexto, reforçando a abordagem socioecológica na prevenção da obesidade infantil.
«Papa Bem» project («Eat Well») aims to promote health literacy through the production and dissemination of written and audiovisual materials concerning childhood obesity prevention. The focus is the period that goes from pregnancy to 5 years of age.
MethodologyThe editorial plan and materials production was based on an exploratory study, which included a literature review and an ecological and educational diagnosis conducted in a pilot area.
During the process of production of the materials several experts were consulted. The readability of the materials was tested.
ResultsIn the exploratory study, predisposing, enabling and reinforcement factors related to the behaviors associated with child obesity were identified to guide the materials production. Based in the most recent scientific evidence, these materials proved to be accessible to people with lower education levels.
ConclusionThrough the participatory methodology, it was possible to get relevant information about the main critical issues in understanding and managing the problem of child obesity.
The development of simple and logically organized messages may facilitate behavior change, especially with the support of mediators who adapt them to each context, ensuring the continuity of the socio‐ecological approach required for controlling child obesity.
A obesidade é considerada como um dos mais sérios desafios de saúde pública no início do século XXI. É um problema mundial, que afeta principalmente os países de médio e alto rendimento1. A sua prevalência entre crianças e adultos tem vindo a aumentar substancialmente2, sendo as populações com baixos níveis socioeconómicos e de escolaridade as que estão em maior risco3. Apesar dos esforços realizados nos últimos anos, as medidas de prevenção e tratamento não têm demonstrado sucesso no controlo deste problema de saúde pública2.
O excesso de peso e a obesidade estão associados ao desenvolvimento de condições adversas à saúde, como a hipertensão arterial, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia e resistência à insulina. Os riscos de doença coronária, acidente vascular cerebral isquémico e diabetes tipo II aumentam com o incremento do índice de massa corporal (IMC). Um IMC elevado parece influenciar também o risco de alguns tipos de cancro, como o cancro da mama, cólon‐retal, do endométrio, dos rins, do esófago e do pâncreas4.
Em crianças, o excesso de peso e a obesidade estão associados a uma redução na qualidade de vida e maior risco de bullying e isolamento social, com impacto negativo na saúde mental1.
Em 2011, mais de 40 milhões de crianças em todo o mundo já tinham excesso de peso antes dos 5 anos de idade5. Relativamente a Portugal, dados de um estudo realizado em 2001 revelavam uma prevalência de 23,1% de excesso de peso (incluindo obesidade) e 6,2% de obesidade em crianças de 4 anos de idade6.
Dados mais recentes demonstram um panorama ainda mais preocupante. Em 2010, o estudo Childhood Obesity Surveillance Initiative encontrou uma prevalência de 30,2% de excesso de peso (incluindo obesidade) e 14,3% de obesidade em crianças de 6‐8 anos7. Já o Estudo do Padrão Alimentar e de Crescimento Infantil (EPACI) revela uma prevalência de cerca de 38% de excesso de peso (incluindo obesidade) e de 6,5% de obesidade em crianças dos 12‐36 meses de vida8.
Sendo a obesidade uma doença crónica, com um impacto tão negativo na saúde de adultos e crianças e cada vez mais prevalente por todo o mundo, a sua prevenção precoce é estratégica e os períodos da gravidez e dos primeiros anos de vida têm sido apontados como oportunidades importantes neste sentido9,10.
De facto, alguns fatores de risco para a obesidade infantil surgem desde muito cedo. A vida intrauterina e os primeiros anos de vida são considerados períodos críticos na programação da regulação do balanço energético a longo prazo10. Além disso, os hábitos e preferências alimentares começam a ser estabelecidos durante este período11.
A obesidade no início da gravidez, o aumento excessivo de peso da mãe2 e o consumo de tabaco10 são exemplos de fatores de risco para a obesidade infantil no período da gravidez. Logo após o nascimento, a alimentação com leite de fórmula, a diversificação alimentar antes dos 4 meses de vida e um crescimento acelerado no primeiro ano de vida são outros exemplos2. Mais tarde, o baixo consumo de frutas e hortícolas, o hábito de comer fora de casa, as grandes porções de alimentos, o consumo excessivo de alimentos e bebidas de alta densidade energética, o hábito de petiscar, os baixos níveis de atividade física, o excesso de atividades sedentárias, como ver televisão e dormir menos horas do que o recomendado, são também fatores que contribuem para o excesso de peso2.
As recomendações mais recentes apontam claramente para a necessidade de abordagens precoces e mais ecológicas e holistas no combate à obesidade infantil, focando‐se na família e na comunidade em que esta se integra9,10,12.
Entre as estratégias de promoção da saúde, a importância da literacia e da literacia em saúde tem sido largamente documentada13. No contexto da obesidade, a baixa literacia e numeracia estão associadas a piores conhecimentos sobre aleitamento materno, a maiores dificuldades para compreender rótulos e porções e a um IMC mais elevado14. Vários estudos têm demonstrado que uma proporção elevada dos pais tem um nível de literacia em saúde que compromete a sua capacidade para realizar tarefas preventivas básicas, como seguir as recomendações de uma brochura ou usar uma tabela de percentis15. Adicionalmente, alguns estudos internacionais têm apontado que muita da informação sobre saúde infantil que é disponibilizada aos pais não se adequa aos seus níveis de literacia16,17. Desta forma, melhorar os resultados das intervenções preventivas implica também que estas sejam sensíveis e adequadas ao nível de literacia da população‐alvo. As recomendações mais recentes para a prevenção da obesidade infantil incluem a produção e disseminação alargada de mensagens simples14, que respeitem os princípios de produção e fornecimento de informação em saúde a populações com baixos níveis de literacia18–20.
O nível de literacia em saúde da população portuguesa é desconhecido21. No entanto, estando a literacia em saúde intimamente relacionada com os níveis de literacia em geral, cabe aqui referir que os estudos em Portugal sobre o tema, apesar de escassos, manifestam de forma semelhante os baixos níveis de literacia da população22–24.
O presente artigo descreve os procedimentos no projeto «Papa Bem», um projeto de produção e disseminação de informação sobre a obesidade infantil, veiculada pela Internet e destinada ao público em geral, desenvolvido no âmbito do Programa Harvard Medical School – Portugal.
O projeto «Papa Bem» pretende constituir um contributo para a prevenção da obesidade infantil, tendo como finalidade melhorar a literacia em saúde de futuros pais, pais e outros cuidadores de crianças até aos 5 anos de idade, através da disseminação de mensagens baseadas na evidência científica e veiculadas por materiais escritos e audiovisuais acerca da obesidade infantil e crescimento saudável.
Materiais e métodosO quadro de referência teórica que orientou o projeto «Papa Bem» é composto por 3 referências complementares: o modelo contextual de Davison e Birch12, a abordagem Health, Exercise, Nutrition for the Really Young (HENRY) de combate à obesidade infantil de Hunt e Rudolf9, adotada pelo Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, e o relatório Early Childhood Obesity Prevention Policies, do Institute of Medicine10.
Estas recomendações vão além das orientações mais habituais em torno da alimentação e da atividade física, valorizando o papel dos pais e do ambiente familiar para a formação de bons hábitos de alimentação, de atividade física e de sono e para um crescimento saudável, incluindo dimensões mais alargadas, como o estilo de vida, a organização familiar e a parentalidade. Por outro lado, é enfatizada a importância de abordagens de intervenção centradas na família, apoiando as mudanças de estilo de vida de acordo com as suas necessidades e investindo no reconhecimento do problema e motivação para a mudança25,26. Diversos estudos evidenciam a associação entre fatores parentais e alguns comportamentos dos filhos12,27,28. As práticas parentais de oferta de alimentos, como a restrição e a pressão para comer, também têm merecido destaque nesta área de estudo12,29,30. Alguns trabalhos discutem ainda a associação entre o estilo parental e os comportamentos alimentares das crianças e a obesidade infantil31, havendo autores que recomendam a promoção de um estilo parental «autoritativo», ou seja, firme, que estabelece limites (por exemplo, são os adultos que definem os alimentos que são oferecidos à criança), porém, caloroso e responsivo aos sinais da criança (por exemplo, respeito pelos sinais de fome e saciedade)31–33. As refeições em família também aparecem associadas a comportamentos alimentares e peso mais adequados em estudos com crianças e adolescentes34–37. Estas associações podem evidenciar a importância de aspetos relacionados com a dinâmica familiar31.
No sentido de conjugar a melhor evidência científica disponível com as necessidades específicas do público‐alvo seguimos os passos do modelo de planeamento PRECEDE‐PROCEED38 e a estratégia de investigação‐ação a ele subjacente.
Segundo este modelo de planeamento, começa‐se por identificar a questão ou problema de saúde e os fatores genéticos, comportamentais e ambientais eventualmente implicados na situação. Quando é necessário alterar comportamentos há que identificar os fatores predisponentes dos comportamentos em causa, bem como os fatores de facilitação e de reforço necessários para apoiar a mudança destes comportamentos de forma sustentada39.
Desenvolvemos um projeto‐piloto numa área do distrito de Lisboa, escolhida por conveniência devido à sua diversidade socioeconómica e cultural e ao interesse manifestado pelos profissionais de saúde dos cuidados de saúde primários e do hospital de referência em colaborar no projeto.
Este projeto‐piloto foi organizado em 4 fases interdependentes, que passaremos a descrever: estudo exploratório, produção dos materiais, avaliação dos materiais, implementação (fig. 1).
Estudo exploratórioSeguindo o modelo de planeamento PRECEDE‐PROCEED, após a identificação da obesidade como um problema de saúde pública e a sua caracterização em Portugal, partimos para a análise das variáveis modificáveis para a sua prevenção atuando sobre os comportamentos determinantes, abordando os seus fatores predisponentes, bem como os fatores facilitadores e de reforço para uma mudança sustentada dos mesmos.
Após a revisão da literatura avançámos para um diagnóstico ecológico e educacional da área‐piloto, que envolveu a recolha de dados junto da população‐alvo e de alguns dos seus principais mediadores, nomeadamente, os profissionais de saúde.
A etapa de recolha de dados assentou em diferentes metodologias e fontes de informação.
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Grupo Focal com profissionais de saúde dos cuidados de saúde primários da área‐piloto (um Grupo Focal com 9 profissionais de saúde, incluindo 4 enfermeiros e 5 médicos de família).
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Questionários dirigidos aos pais de crianças dos 6 meses aos 5 anos de idade presentes nas consultas de saúde infantil dos centros de saúde (n=11) e na consulta de pediatria do hospital (n=76) da área‐piloto (tabela 1).
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Entrevistas semiestruturadas a pais de crianças dos 6 meses aos 5 anos de idade presentes na consulta de pediatria do hospital da área piloto (8 mães, 5 de nacionalidade portuguesa e 4 estrangeiras).
A elaboração do plano editorial e a produção dos materiais seguiram um processo sistemático de seleção de mensagens, desenvolvimento de conteúdos, revisão e avaliação. Num primeiro momento foram considerados os fatores predisponentes, facilitadores e de reforço identificados na revisão da literatura e no diagnóstico da área‐piloto realizados no âmbito do estudo exploratório, dando origem a um plano editorial.
Os materiais foram produzidos e revistos pela equipa multidisciplinar do projeto, incluindo médicos de saúde pública, pediatras, nutricionistas, especialistas em atividade física, psicólogos, entre outros. Esta produção e revisão considerou o conteúdo, mas também teve em conta os baixos níveis de literacia da população portuguesa e as diretrizes do programa, que indicavam a produção de materiais escritos para um público com o 10.° ano de escolaridade e versões simplificadas dos mesmos para um público de mais baixa literacia (5.° ano de escolaridade), com recurso aos meios audiovisuais. Assim, foram consideradas as recomendações para produção de materiais que têm por base a metodologia Plain Language e se focam em 4 componentes principais: a adequação à população‐alvo, a linguagem e o estilo, a organização, o layout e o design40,41.
A equipa do projeto contou com a consultoria de especialistas internacionais em obesidade infantil e literacia em saúde. Adicionalmente, ao longo de todo o processo de produção dos materiais foram consultados os profissionais de saúde da área do estudo‐piloto, quer ao nível dos cuidados de saúde primários quer ao nível da consulta hospitalar da especialidade de obesidade infantil. Estes profissionais contribuíram para a triagem das mensagens, sua revisão e avaliação, até chegar ao produto final.
Por forma a motivar e capacitar a equipa do projeto e outros profissionais envolvidos, organizaram‐se 2 workshops: um sobre a produção de materiais de educação para a saúde para a população, orientado por uma perita em literacia em saúde da Universidade de Harvard, e outro sobre o modelo de intervenção HENRY para o controlo da obesidade infantil, orientado pela pediatra corresponsável pela criação e disseminação deste modelo no Reino Unido9,31.
Avaliação dos materiaisCom o objetivo de validar a adequação cultural, a clareza, a acessibilidade e a compreensão das mensagens presentes nos materiais produzidos passou‐se à etapa de avaliação da qual fizeram parte as seguintes componentes.
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Revisão dos materiais de acordo com uma lista de princípios de boa comunicação (por exemplo, utilização da voz ativa, frases curtas, recurso mínimo a termos técnicos…).
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Aplicação de uma adaptação para a língua portuguesa do teste Suitability Assessment of Materials18 a uma amostra aleatória de 40% dos materiais escritos. Esta avaliação foi feita pelos profissionais de saúde da área‐piloto que participaram nos workshops organizados pelo projeto.
A fase de implementação envolveu o desenho de diferentes estratégias de disponibilização e disseminação dos materiais produzidos e de envolvimento dos mediadores para facilitarem o acesso à informação pelo público‐alvo.
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Organização de workshops de sensibilização e capacitação dos profissionais de saúde e de educação.
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Divulgação do projeto e disponibilização de materiais através de diferentes veículos e contextos.
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Estabelecimento de contactos para a utilização dos materiais em diferentes contextos comunitários.
Seguindo os passos do modelo de planeamento PRECEDE‐PROCEED, através da revisão da literatura e do diagnóstico ecológico e educacional da área‐piloto, identificámos os fatores predisponentes (tabela 2), facilitadores (tabela 3) e de reforço (tabela 4) relacionados com os comportamentos que interferem com a obesidade infantil.
Fatores predisponentes relacionados com os comportamentos associados à obesidade infantil encontrados no estudo exploratório do projeto «Papa Bem» e opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais
Fatores predisponentes | Dados – fonte* | Opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais |
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Obesidade infantil | • Plano editorial orientado para a perceção do risco, deteção precoce e prevenção da obesidade infantil• Foco na mudança de atitude dos cuidadores e não na passagem de conhecimento31• Informação atualizada sobre os diversos temas, a explicar a importância da substituição de crenças e práticas mais antigas por outras com evidência de melhores resultados nos contextos atuais• Abordagem positiva: «Papa Bem» para um crescimento saudável• Foco nos comportamentos saudáveis e no estilo de vida familiar e não no peso da criança31,61• Abordagem familiar que destaca a importância do exemplo dos adultos mais próximos e das mudanças de atitudes• Explicação acerca das janelas de oportunidade para o desenvolvimento de preferências e hábitos mais saudáveis e alerta para as dificuldades na mudança de hábitos instalados31• Criação de animações que explicam de forma simples e muito clara como amamentar com sucesso | |
Conhecimentos, crenças e perceções dos pais e outros cuidadores sobre o excesso de peso e a obesidade infantil | Ex. Os pais acreditam que um bebé gordinho é um bebé saudável44. – RLEx. As mães preocupam‐se mais com o baixo peso do que com excesso de peso43. – RLEx. Influência intergeracional nos conhecimentos e crenças dos pais50. – RLEx. A maioria dos pais de crianças com excesso de peso ou obesidade subestima o peso dos seus filhos47,52,53. – RLEx. «É um problema cultural. Mães e avós muitas vezes querem ver crianças gordinhas.» – GFEx. As comidas plásticas e os fast foods são os culpados por haver cada dia mais crianças obesas. – EPEx. «Para a mãe é muito complicado não ver o filho aumentar de peso.» – GFEx. «Os pais pensam que os bebés vão emagrecer depois que começarem a andar...» – GFEx. «Se calhar falta conhecimento.» – GFEx. «(…) acham que a criança não é gorda e que está muito bem (…) não percebem como é que nós achamos a criança gorda.» – GF | |
Alimentação | ||
Hábitos e preferências das crianças | Ex. Preferência inata pelos alimentos doces9,11. – RLEx. Neofobia, que se manifesta entre os 12 e os 15 meses9,11. – RLEx. Aversões adquiridas por associações negativas9. – RLEx. Capacidade inata de autorregulação do consumo energético9. – RL | |
Conhecimentos e crenças dos pais e outros cuidadores sobre o aleitamento materno e a alimentação da criança | Ex. Alimentar tem uma forte componente emocional para as mães43. – RLEx. Para as mães, a oferta de alimentos como prémio é um direito das crianças43. – RLEx. Influência intergeracional nos conhecimentos e crenças dos pais50. – RLEx. «47,1% dos pais preocupam‐se com frequência que a criança coma pouco e 21,8% que coma demais.» – IPEx. «Não têm a noção de que a alimentação evoluiu» – GFEx. «Avós que contradizem o que foi dito pelo profissional de saúde.» ‐ GFEx. «Ela bebe sumo natural. Quando ela quer pede (A exibir um néctar com açúcar).» – EPEx. «Para tentarmos dissuadi‐la de dar leite artificial, explicamos que o bebé não chora só por fome. Elas acham que o leite é fraquinho, não presta.» – GFEx. «Há a crítica social: Que vergonha! O meu filho a levar pão para a escola.» – GF |
Atitudes e práticas dos pais e outros cuidadores acerca da alimentação da criança | Ex. Utilização de alimentos como prémio ou recompensa51. – RLEx. Pressão para comer51. – RLEx. Associação entre os hábitos alimentares dos pais e dos filhos9. – RLEx. Restrição e pressão para comer2. – RLEx. «Começou a comer com 2 meses. Porque a minha mãe é ama e sempre deu de tudo aos meninos. O meu também tinha que comer. Eu dava de tudo.» – EPEx. «Há sempre mães e sogras a pressionarem para dar o biberão quando o leite nem subiu.» – GFEx. «Não se esqueçam que as novas mães não fazem o tradicional, a sopa, pois é muito mais difícil. Ou porque têm a carreira ou porque têm um dia a dia difícil.» – GFEx. «É preciso disponibilidade quando a criança cospe a sopa, para limpar a roupa…» – GFEx. «O dia‐a‐dia corrido. As pessoas têm dificuldade de organizar a alimentação.» – EPEx. «Porque muitas crianças engordam nesta fase por causa dos maus hábitos dos pais.» – GFEx. Dificuldades de adaptação à alimentação portuguesa por parte dos estrangeiros. – GFEx. «As avós compensam os netinhos com alimentos: bolinhos etc.» – GFEx. «Quando começar a comer a comida da família está tudo estragado.» – GFEx. «Ontem tive uma mãe que referia que a filha adolescente estava com peso a mais e que só comia porcarias. Perguntei: Mas quem manda lá em casa?» – GFEx. «O que se nota aqui, nitidamente, é que são as crianças que mandam na casa. É a compensação da ausência.» –GF | • Promoção de uma parentalidade positiva, que responde às necessidades físicas e emocionais da criança, mas mantêm‐se «no comando», mantendo limites e regras claras e consistentes para os seus comportamentos. Traduz‐se inclusivamente no slogan: «Alimentar é educar!»• Sugestões práticas para serem implementadas gradualmente no dia‐a‐dia das famílias• Textos dirigidos especialmente para os avós, com o objetivo de incentivar a atualização de conhecimentos e a mudança de atitude no desempenho do seu importante papel no crescimento saudável das crianças• Informação acerca dos rótulos dos alimentos e alertas acerca das estratégias de marketing utilizadas pela indústria alimentar• Descrições e vídeos de receitas habitualmente sugeridas pelos profissionais de saúde |
Sono | ||
Conhecimentos, atitudes e práticas dos pais e outros cuidadores acerca das necessidades e hábitos saudáveis de sono das crianças | Ex. Necessidade de educação parental acerca do sono54,55. – RLEx. «70,9% dos pais não se preocupam com o número de horas que as crianças dormem ou têm preocupações inadequadas relativamente ao número de horas que as crianças devem dormir.» – IPEx. «Ele ainda não passou para o seu quarto e eu não sei como vou fazer isso.» – EP | |
Atividades de ecrã | ||
Conhecimentos, atitudes e práticas dos pais e outros cuidadores acerca da presença da televisão e dos videojogos na rotina das crianças | Ex. Os pais necessitam de informação acerca de como estabelecer regras para o tempo que as crianças podem passar em atividades de ecrã e conhecer sugestões de alternativas a estas atividades56. – RLEx. «39,1% dos pais concordam ou concordam um pouco que a televisão ajuda a criança a comer melhor.» – IPEx. «A televisão do quarto dele está sempre ligada, mas ele só olha de vez em quando.» – EPEx. «Quando vou ver novela ela deita e vê. É a hora que ela dorme.» – EPEx. «Prefiro que ele brinque e não fique ao computador. Mas não é fácil convencê‐los (os avós). Já criaram 2 e acham que sabem e fazem.» – EP | |
Atividade física | ||
Conhecimentos, atitudes e práticas dos pais e outros cuidadores acerca da atividade física | Ex. Associação entre o nível de atividade física dos pais e dos filhos9. – RLEx. «Nem as crianças nem os pais. Muitas vezes encontramos os pais com as crianças no shopping. (…) E nas zonas urbanas os pais não saem dos apartamentos.» – GFEx. «Em vez de irem andar de bicicleta vão ao centro comercial (…)» – GFEx. «Precisava de ler mais sobre o que é adequado para ele nesta fase.» – EP |
EP: entrevistas com os pais; GF: grupo focal com profissionais de saúde; IP: inquérito aos pais (n=87); *RL: revisão da literatura.
Fatores facilitadores relacionados com os comportamentos associados à obesidade infantil encontrados no estudo exploratório do projeto «Papa Bem» e opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais
Fatores facilitadores | Dados/fonte* | Opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais |
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Acesso à informação, ao aconselhamento e ao suporte prático por parte dos pais e outros cuidadores | Ex. «94,3% dos pais concorda que seria muito útil haver na Internet informações acerca do desenvolvimento, da alimentação, atividade física e sono na infância.» – IPEx. «E ensinar a mamar. As enfermeiras ensinam mesmo as mães a amamentarem.» – GFEx. «A sala de espera também ajuda como ambiente de informação.» – GFEx. «O ideal é já fazer a abordagem nas consultas de saúde materna.» – GFEx. «Ontem tive uma mãe que referia que a filha adolescente estava com peso a mais e que só comia porcarias. Perguntei: Mas quem manda lá em casa? Nós (profissionais de saúde) funcionamos como um clic.» – GF | • Produção de materiais orientada por guidelines que têm por base a metodologia Plain Language• Desenvolvimento de vídeos de curta duração com linguagem mais simples para facilitar o acesso à informação por parte de pessoas com mais baixa literacia• Formato de perguntas e respostas para reter a atenção e envolver o usuário• Criação de instrumentos de apoio à introdução de novos comportamentos, como folhetos de autorregisto e instrumentos de planeamento• Desenvolvimento participado de um programa de implementação da estratégia Papa Bem, num projeto‐piloto que visa identificar os diferentes contextos e metodologias de disseminação das mensagens e capacitar mediadores, como profissionais de saúde, da educação e da ação social, para atuarem junto das famílias• Criação e distribuição de DVD em reuniões de apresentação do projeto e no projeto piloto de implementação• Disponibilização dos vídeos no You Tube• Sugestões práticas para serem implementadas gradualmente no dia‐a‐dia das famílias, tendo em conta a limitação de recursos• Criação de um microsite Papa Bem em parceria com a Direção Geral da Saúde |
Formação dos profissionais de saúde nas diversas áreas temáticas | Ex. Há necessidade de formação e disseminação das informações sobre alimentação infantil para os enfermeiros49. – RLEx. Necessidade de formação dos profissionais de saúde acerca da obesidade infantil48. – RLEx. «Em termos de competências: formação atualizada. A evolução da alimentação é constante.» – GFEx. «Formação permanente dos profissionais de saúde: aleitamento materno, introdução dos alimentos, alimentação normal e alimentação no excesso de peso.» – GF | |
Acesso aos recursos para a prática de atividade física | Ex. Equipamentos quebrados ou inadequados e insegurança, tanto nos parques como nas redondezas43. – RLEx. «Mas, às vezes, é por falta de dinheiro para atividades como natação e futebol que os meus filhos fazem mas que eu pago. Também há falta de segurança em alguns parques.» – EP |
EP: entrevistas com os pais; GF: grupo focal com profissionais de saúde; *IP: inquérito aos pais (n=87); RL: Revisão da literatura.
Fatores de reforço relacionados com os comportamentos associados à obesidade infantil encontrados no estudo exploratório do projeto «Papa Bem» e opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais
Fatores de reforço | Dados /fonte* | Opções estratégicas na produção e disseminação dos materiais |
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Envolvimento de toda a família e pessoas influentes, dos diversos ambientes que a criança frequenta. Ex. pais, avós, educadores, irmãos mais velhos | Ex. As mães esforçam‐se e preocupam‐se que os seus filhos tenham uma alimentação saudável e uma vida ativa, mas necessitam de mais suporte comunitário43. – RLEx. Abordagem familiar9. – RLEx. «À mãe e à criança. E a avó.» – GFEx. «Uma intervenção mais alargada.» – GFEx. «Criança seria o catalisador da família toda. Trabalho articulado.» – GFEx. «Famílias, amas e infantários.» – GFEx. «Devemos fazer um acompanhamento mais próximo. Apertar a vigilância.» – GFEx. «Com o aleitamento materno nós abrimos completamente as portas para que venham imediatamente cá se sentirem necessidades.» – GFEx. «Tentamos fazer também grupos de interajuda. Principalmente com a amamentação.» – GFEx. «Todos: escola, família, media, Câmara, locais de trabalho...» – GF | • Desenvolvimento de materiais destinados especialmente às famílias, escolas e comunidade• Foco na importância do ambiente e no estilo de vida familiar para a formação de hábitos saudáveis• Desenvolvimento participado de um programa de implementação da estratégia Papa Bem, num projeto‐piloto que visa identificar os diferentes contextos e metodologias de disseminação das mensagens e capacitar mediadores, como profissionais de saúde, da educação e da ação social, para atuarem junto das famílias |
Crenças, atitudes e práticas dos profissionais de saúde | Ex. «É importante o reforço positivo nas pequenas conquistas que os pais fazem.» – GF | |
Publicidade e marketing e envolvimento dos media | Ex: As mães acreditam que são responsáveis pelo que os seus filhos comem, mas reconhecem a influência de outros fatores como o sector do retalho e o marketing43. – RLEx. «É a publicidade e o marketing. É oferecido, eles até gostam, e para não estragar: Eu vou dar a provar.» – GFEx. «Acho que tem de ser os media.» – GF |
EP: entrevistas com os pais: GF: grupo focal com profissionais de saúde; *IP: inquérito aos pais (n=87); RL: revisão da literatura.
Podemos destacar de entre estes resultados que os pais se preocupam, sobretudo, que a criança coma pouco (47,1% dos 87 pais que preencheram questionário), sendo muito menos os que atribuem importância ao facto da criança comer demais (21,8%). De acordo com um focus group, alguns profissionais de saúde atribuem o excesso de peso nas crianças aos maus hábitos dos pais. No que respeita ao sono verifica‐se que a maioria dos pais não lhe atribui a devida importância (70,9% dos pais não se preocupa ou tem preocupações inadequadas acerca do número de horas de sono que os seus filhos devem dormir). Os profissionais de saúde apontam hábitos familiares sedentários (em focus group afirmou‐se que «Muitas vezes encontramos os pais com as crianças no shopping […] e nas zonas urbanas os pais não saem dos apartamentos») e confirma‐se a forte presença da televisão no quotidiano das crianças (em entrevista aos pais: «A televisão do quarto dele está sempre ligada, mas ele só olha de vez em quando»), mesmo durante as refeições (39,1% dos pais «concordam» ou «concordam um pouco» que a televisão ajuda a criança a comer melhor).
Através dos questionários e das entrevistas levadas a cabo com os pais verificou‐se haver interesse por aceder à informação esclarecedora sobre a melhor forma de apoiar o crescimento dos seus filhos.
Os profissionais de saúde sugeriram que a abordagem das temáticas em causa junto dos pais deveria ocorrer nas consultas de saúde materna, considerando que «a sala de espera também ajuda como ambiente de informação».
É reconhecida pelos profissionais de saúde a necessidade de envolver todos os protagonistas e locais onde os pais vivem e trabalham – «escola, família, media, câmara, locais de trabalho» – para apoiar os pais no processo educativo dos seus filhos.
Produção de materiaisCom a análise dos resultados do estudo exploratório foram tomadas opções estratégicas para a produção dos materiais tendo em conta o contexto e as características da população‐alvo.
Assim, elaborámos um plano editorial orientado para a perceção do risco, deteção precoce e prevenção da obesidade infantil e crescimento saudável desde a gravidez até aos 5 anos de idade da criança, com foco nas seguintes áreas temáticas: gravidez saudável, alimentação, atividade física, sedentarismo, sono, interação educador/criança e dinâmicas intrafamiliares e da comunidade (nomeadamente, creches e jardins de infância).
Considerando as orientações para a produção de materiais para a população em geral, no desenvolvimento das mensagens utilizámos uma linguagem coloquial, com frases pequenas e simples, alguns exemplos ilustrativos das mensagens, voz ativa, amigável e envolvente e o modelo de perguntas e respostas.
Para lidarmos com níveis de literacia, necessidades e contextos de interação diferentes, decorrentes da realidade de cada indivíduo e família, bem como da sua sensibilidade às propostas para mudanças comportamentais, desenvolvemos diversos tipos de materiais para cada área temática: textos, folhetos, vídeos, áudios e testes do conhecimento (quizzes). Assim, os vídeos pretendem, principalmente, atender às necessidades da população de mais baixa escolaridade e permitem uma interação em salas de espera, por exemplo. Os testes do conhecimento (quizzes) aparecem como instrumentos de reforço à aprendizagem, podendo considerar‐se, também, adequados a qualquer nível de escolaridade. Já as sugestões práticas e os instrumentos de apoio à introdução de novos comportamentos, como folhetos de autorregisto e instrumentos de planeamento, constituem‐se como uma aposta para a tomada de decisão, perceção de autoeficácia e manutenção do comportamento. Os folhetos são particularmente adequados para a utilização por parte de mediadores, como os profissionais de saúde.
Organizámos os materiais segundo uma sequência lógica, agrupados por secções e por áreas temáticas e identificados com pictogramas.
Acerca do layout e do design, procurando ultrapassar eventuais resistências ou dificuldades no reconhecimento do problema, apostámos numa abordagem positiva, de um crescimento saudável e bem‐estar global da criança. Dedicámos especial atenção à consistência entre a imagem e o conteúdo e procurámos encontrar uma identidade para o projeto, com um nome, um logotipo e um slogan positivos e cativantes (fig. 2). Assim, a designação «Papa Bem» decorre da constatação da dificuldade dos pais em reconhecer o excesso de peso nos seus filhos e do seu grande interesse em ver os filhos «bem alimentados». O slogan «Alimentar é educar» remete para a ideia central do projeto de que alimentar uma criança é muito mais do que disponibilizar‐lhe alimentos. Implica ter em conta o tipo de relação afetiva e pedagógica entre educador e criança no que diz respeito aos comportamentos alimentares, de sono, de sedentarismo e de atividade física, em resposta às necessidades globais da criança em termos de desenvolvimento, quer físico quer psicológico quer social.
Estas e outras opções estratégicas para a produção de materiais podem ser observadas nas tabelas 2, 3 e 4, relacionadas com os fatores predisponentes, facilitadores e de reforço associados à obesidade infantil encontrados no diagnóstico da área‐piloto.
Foram produzidos cerca de 300 textos de base para a estrutura do Website, 17 vídeos de curta duração (cerca de 3 minutos), 15 áudios de cerca de um minuto, 5 quizzes e 40 folhetos.
Avaliação dos materiaisOs materiais escritos produzidos foram revistos e reavaliados sucessivamente até que todos os critérios da versão adaptada do teste Suitability Assessment of Materials recebessem pontuação 2 (excelente) ou, em alguns casos, um (adequado), quando não se conseguiu encontrar melhor formulação.
ImplementaçãoNo que se refere à sensibilização e capacitação de profissionais de saúde, participaram 33 profissionais de saúde no workshop sobre produção de materiais de educação para a saúde para a população e 28 profissionais de saúde no workshop sobre o modelo HENRY de intervenção na prevenção da obesidade infantil, incluindo médicos de família, enfermeiros, pediatras, psicólogos e médicos de saúde pública. Para além da criação de uma linguagem e abordagem comum ao problema, estes workshops contribuíram também para o fortalecimento da parceria com os profissionais.
A divulgação do projeto e disponibilização de materiais tem envolvido estratégias de disseminação orientadas pela Direção do Programa Harvard Medical School – Portugal em parceria com a Fundação para a Computação Científica Nacional e estratégias de disseminação elaboradas pela equipa de investigação no decorrer do próprio projeto.
Assim, de acordo com as orientações da direção do programa, os materiais desenvolvidos foram divulgados em diversos canais de informação, nomeadamente, ecrãs em grandes superfícies comerciais, programas de rádio e televisão e páginas da Internet (Facebook, Youtube e blog do programa).
Relativamente às estratégias de disseminação desenvolvidas pela equipa do projeto, a participação dos profissionais de saúde da área‐piloto nos workshops foi o primeiro passo deste processo.
Após a etapa de produção e teste dos materiais, organizámos 3 reuniões que contaram com a participação de 97 profissionais de saúde, entre enfermeiros, médicos de família, médicos de saúde pública, nutricionistas e psicólogos da área‐piloto. Nestas reuniões foram apresentados alguns materiais e disponibilizados exemplares aos participantes.
A Direção Geral de Saúde, reconhecendo a validade das informações veiculadas pelos materiais produzidos, iniciou a disponibilização dos materiais no seu website através de uma secção denominada «Papa Bem» que se encontra na área do Programa Nacional de Promoção da Alimentação Saudável. Cabe referir que todos os vídeos desenvolvidos no projeto estão disponíveis na Internet através do Youtube, num canal denominado «Papa Bem».
Foram ainda produzidos 200 DVD com todos os vídeos e folhetos desenvolvidos no projeto. Estes DVD têm sido distribuídos em reuniões de apresentação do projeto «Papa Bem» com profissionais do setor da saúde e da educação e por requisição de algumas instituições com interesse na divulgação dos materiais.
Finalmente, no que se refere ao estabelecimento de contactos para promover a utilização sistemática dos materiais, por proposta de uma das equipas dos cuidados de saúde primários que participou numa das reuniões de divulgação iniciámos a elaboração de um projeto‐piloto, designado por «Comunidades Papa Bem», para o desenvolvimento de uma metodologia de disseminação das mensagens do projeto «Papa Bem» a contar com diversos mediadores a partir das comunidades.
DiscussãoO projeto «Papa Bem» foi iniciado com o objetivo de produzir e disponibilizar um conjunto alargado de informação, tendo em conta os fatores determinantes da obesidade infantil, incluindo uma abordagem integrada das várias vertentes de um estilo de vida saudável. O facto do projeto «Papa Bem» ter sido desenvolvido através de um projeto‐piloto nos cuidados de saúde primários e respetivo hospital de referência permitiu compilar informação relevante quanto aos principais pontos críticos da compreensão e gestão do problema da obesidade infantil pelos diferentes atores: mediadores e pais.
Apesar do recurso a uma amostra de conveniência de mediadores e pais, com dimensões reduzidas, os dados encontrados no diagnóstico da área‐piloto estão de acordo com os resultados de outras investigações42–55. A pouca disponibilidade dos pais, que foram abordados no momento das consultas dos filhos, e as limitações de tempo para a concretização dos objetivos do projeto, foram os principais obstáculos que levaram à limitação do tamanho da amostra de pais e mediadores envolvidos no estudo. É de referir ainda o maior envolvimento de mães (93,1%), em comparação com pais (6,9%), como aliás é comum em estudos desta natureza42,44,45,50.
A metodologia usada na produção dos materiais investiu na translação do conhecimento produzido pela evidência científica para a utilização nas práticas do dia‐a‐dia da população, de acordo com as características e necessidades da mesma.
O resultado foi um conjunto diverso de materiais baseados na melhor evidência disponível, adaptados às necessidades específicas expressas por diferentes atores e adequados a níveis de literacia diversos, orientando a sua acessibilidade a pessoas com mais baixos níveis de literacia. Os materiais têm sido divulgados e disponibilizados em contextos diversos e recebido o apoio entusiasta de profissionais com um papel central na prevenção da obesidade infantil e promoção de um crescimento saudável.
A forma como são apresentadas as propostas de mudanças para reduzir a obesidade, bem como o papel dos mediadores na utilização dos materiais disponíveis basearam‐se em modelos sobejamente comprovados como úteis para apoio na mudança de comportamentos, tendo presente que a focalização apenas no balanço energético a nível individual é reducionista face a uma problemática complexa e multifacetada, que exige uma abordagem sistémica.
Contudo, sabe‐se que a obesidade não é um problema que se resolva, apenas, através da informação sobre como promover comportamentos saudáveis. O conhecimento e a capacidade crítica são componentes fundamentais para a mudança de comportamentos pelo que é tão importante investir numa literacia crítica. No entanto, este problema extravasa a célula familiar e está, também, relacionado com a atividade das grandes indústrias alimentares com as suas estratégias de marketing agressivas que colocam os seus produtos a preços convidativos, induzindo, assim, o seu consumo56.
Conforme refere o relatório do Institute of Medicine sobre a prevenção da obesidade, a abordagem deste problema requer a combinação de várias intervenções que ao serem integradas num programa compreensivo tornam‐se componentes fundamentais para o seu sucesso57. Os materiais desenvolvidos poderão ser parte integrante de programas desta natureza.
A oportunidade de fazer formação aos mediadores (profissionais de saúde e educadores de creches, jardins‐de‐infância, autarquias, entre outros), conforme está previsto no projeto‐piloto de implementação, «Comunidades Papa Bem», permitirá desenvolver competências para identificar e compreender a influência dos fatores contextuais, dos afetos às capacidades cognitivas que determinam as características das escolhas e preferências das comunidades e indivíduos, dos recursos às políticas, numa abordagem socioecológica que tem em conta a forma como estes fatores interagem58,59.
É no triângulo «investigação, práticas e políticas»60 que a combinação dos resultados da evidência científica nos vários domínios pode dar suporte e sustentabilidade a intervenções efetivas em que a conjugação de literacia em saúde e políticas relevantes, facilitadoras de escolhas saudáveis, poderá conduzir a práticas de sucesso na resolução de problemas como o da obesidade infantil.
ConclusõesFace à magnitude e severidade que o problema da obesidade assume hoje em todo o mundo e considerando que os fatores de risco para a obesidade começam a surgir ainda durante a gravidez, é necessário encontrar estratégias mais eficazes para a sua prevenção em estádios precoces. As estratégias aqui usadas fundamentam‐se no conhecimento entretanto desenvolvido sobre o processo de instalação do excesso de peso, investindo‐se no aumento da literacia em saúde dos pais e outros educadores para melhorarem os seus hábitos e a abordagem da alimentação e crescimento da criança desde o início da sua vida.
FinanciamentoEste trabalho foi financiado por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, QREN e COMPETE, no âmbito do Programa Harvard Medical School – Portugal, projeto HMSP‐IDSIM/SIM/0002/2009.
Conflito de interessesOs autores declaram não ter conflito de interesses.
Os autores gostariam de agradecer o apoio ao desenvolvimento deste projeto a Mary Rudolf, Rima Rudd, Anthony Komaroff, Marta Cerqueira, Rosa Pimentel e a todos os profissionais de saúde que sempre se disponibilizaram para apresentarem os seus pontos de vista, refletirem com os promotores desta investigação e facilitarem o acesso aos pais que participaram nos inquéritos por questionário e nas entrevistas, a quem, também, agradecemos a colaboração.