Os autores apresentam um caso clínico de duplicação da veia cava inferior (VCI) com drenagem pela veia ázigos diagnosticada durante flebografia diagnóstica, prévia à introdução de filtro.
Doente de 69 anos, sexo feminino, internada por acidente vascular cerebral hemorrágico com diagnóstico, ao 20.° dia de internamento, de trombose venosa profunda poplíteo‐femoro‐ilíaca esquerda com indicação para colocação de filtro da veia cava. Foi efetuada flebografia diagnóstica com acesso pela veia jugular interna direita tendo sido possível observar duplicação da VCI com drenagem cardíaca posterior anómala. Colocado filtro da VCI suprarrenal por acesso na veia femoral comum direita.
A duplicação da veia cava é rara com uma prevalência de 0,2‐3%. A sua abordagem em contexto da colocação de filtro torna‐se um desafio invulgar.
The authors describe the case of an inferior vena duplication with azygos vein drainage diagnosed during diagnostic venography, prior to filter introduction.
In a 69 years old medical inpatient woman with hemorrhagic stroke, a left popliteal‐femoro‐iliac DVT was diagnosed on the 20th day of admission. She was referred for vena cava filter placement. We performed a diagnostic venography with access from the right internal jugular vein. It has been possible to observe an inferior vena cava duplication with an anomalous posterior heart drainage. We placed an inferior vena cava filter in suprarrenal position, accessing the right common femoral vein.
Duplication of vena cava is rare with a prevalence of 0.2‐3%. Its approach in the context of placing a filter becomes an unusual challenge.
A duplicação da veia cava é rara com uma prevalência de 0,2‐3%1. O conhecimento de variações anatómicas da veia cava inferior (VCI) é fundamental para a estratégia a seguir durante procedimentos endovasculares.
Caso clínicoDoente de 69 anos, do sexo feminino, internada por acidente vascular cerebral hemorrágico. Ao 20.° dia de internamento, por trombose venosa profunda (TVP) poplíteo‐femoro‐ilíaca esquerda, foi decidida a colocação de filtro na VCI.
Em contexto de estudo de patologia abdominal realizou angio‐TC, que revelou duplicação da VCI (fig. 1). Efetuada flebografia diagnóstica por acesso pela veia jugular direita, tendo sido constatada ausência de comunicação do segmento hepático com o segmento renal (fig. 2). Posteriormente efetuado acesso pela veia femoral direita sendo evidente a duplicação de VCI e drenagem central via veia ázigos (fig. 3). Pela excessiva tortuosidade desta última, não foi possível cateterizá‐la, pelo que se optou pela inserção do filtro através da veia femoral comum direita (fig. 4). Neste contexto foi colocado filtro Optease® (Johnson & Johnson) na VCI em posição suprarrenal, sem intercorrências (fig. 5).
A duplicação da VCI ocorre quando a veia sacrocardinal esquerda perde a conexão com a veia subcardinal esquerda (fig. 6 A, C)2.
Desenvolvimento da veia cava inferior, veia ázigos e veia cava superior. A. Sétima semana. Relações anatómicas entre as veias subcardinais, supracardinais, sacrocardinais e cardinais anteriores. B. O sistema venoso no nascimento – os 3 componentes da veia cava inferior. C. Duplicação da veia cava inferior a nível lombar devido à persistência da veia sacrocardinal esquerda. D. Ausência da veia cava inferior. A metade inferior do corpo é drenada pela veia ázigos, que conflui para a veia cava superior.
A ausência da veia cava surge quando a veia subcardinal direita não se conecta com o fígado e desvia o fluxo sanguíneo diretamente na veia cardinal superior direita2 (fig. 6 B, D). Desta forma a drenagem venosa da região inferior do corpo é efetuada pela veia ázigos e pela veia cava superior. A veia hepática drena diretamente para a aurícula direita, na região da VCI (fig. 2).
Chee et al. identificaram anomalias da VCI em 5‐6,7% dos pacientes (<40 anos) com TVP, um valor maior que o esperado, sugerindo um risco aumentado3. No entanto, Anne et al. relatam que qualquer correlação entre a VCI duplicada e TVP é puramente incidental4.
Este caso descreve a concomitância das 2 anomalias (duplicação da veia cava com drenagem pela veia ázigos). As variações anatómicas da VCI, apesar de raras podem levar a ajustes técnicos durante a implantação de filtros. A colocação de filtro unilateral na VCI duplicada não previne o embolismo pulmonar, no caso da existência de TVP contralateral. Nas variantes de duplicação da veia cava torna‐se fundamental a colocação de filtros em cada uma das VCI ou na veia cava suprarrenal, logo após a veia renal esquerda.
A veia cava suprarrenal é usualmente mais larga que a sua porção infrarrenal, pelo que devem ser efetuadas medições cuidadas para garantir que se esteja na presença de um diâmetro inferior a 28mm, valor acima do qual está contraindicada a implantação de filtro. Durante o posicionamento suprarrenal é importante o alinhamento do filtro logo acima da veia renal mais cefálica, assim como abaixo da confluência da veia hepática para minimizar o risco de tromboses venosas locais5. Kalva et al. demonstraram que em 70 casos realizados a implantação de filtros da veia cava em posição suprarrenal é segura e não acresce maior risco de complicações quando comparados com aqueles colocados a nível infrarrenal6.
Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animaisOs autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.
Confidencialidade dos dadosOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
Direito à privacidade e consentimento escritoOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
Conflito de interessesOs autores declaram não haver conflito de interesses.