Avaliar a prevalência de comportamentos de risco, comportamento sexual e disfunções sexuais (DS) em estudantes de medicina portugueses.
Materiais e métodosEstudantes da Faculdade de Medicina do Porto foram divididos em 3 grupos de acordo com o ano académico – grupo 1 (1.°/2.° anos, n=288), grupo 2 (3.°/4.° anos, n=267) e grupo 3 (5.°/6.° anos, n=250) – e convidados a preencher um questionário sobre sexualidade e comportamento de risco. A análise estatística foi efetuada com recurso ao programa SPSS®.
ResultadosResponderam ao questionário 258 homens e 547 mulheres, com idade mediana de 20 anos. A idade mediana da primeira experiência sexual dos inquiridos foi 17 anos, no entanto, 33,9% dos estudantes ainda não tinha tido qualquer experiência sexual. Verificou‐se que a prática conjunta de sexo oral e vaginal foi a mais comum (56,2%). A disfunção ejaculatória foi a DS mais referida pelos homens (18,2%), seguida da disfunção erétil (DE) (7,8%), particularmente quando associada ao consumo de drogas ilícitas (22,2%). As mulheres reportaram com maior frequência dispareunia (40,8%), dificuldade em atingir um orgasmo (34,7%) e falta de lubrificação (18,5%).
ConclusõesEmbora os estudantes de medicina representem uma população jovem saudável, a tensão física, emocional e mental a que estão sujeitos afeta negativamente a sua sexualidade. Além disso, a autoconsciência sexual pode afetar futuras interações com doentes com DS. Este estudo transversal demonstra que esta população em particular é globalmente inexperiente, contudo, são necessários mais estudos de avaliação dos padrões sexuais na população portuguesa para melhor esclarecer o seu perfil relativamente aos restantes jovens.
To assess the prevalence of risk behavior, sexual behavior and sexual dysfunctions in Portuguese medical students.
MethodsStudents of the Faculty of Medicine of Porto were divided into three groups according to the year they are enrolled: group 1 (1st/2nd year, n=288), group 2 (3rd/4th year, n=267) and group 3 (5th/6th year, n=250). An anonymous questionnaire about sexuality and risk behavior was filled in. Statistical analysis was performed using SPSS®.
ResultsThe questionnaire was answered by 805 students (female=547; male=258), with median age of 20 years. The median age of the first sexual experience was 17 years, but 33.9% of the students denied having any sexual experience. The most common sexual practice is the joint practice of oral and vaginal sex (56.2%). Ejaculatory dysfunction was the sexual dysfunction most referred by men (18.2%), followed by erectile dysfunction (7.8%), particularly when associated to illicit drugs consumption (22.2%). The sexual dysfunctions most reported by women were dyspareunia (40.8%), difficulty in attaining an orgasm (34.7%) and lack of lubrication (18.5%).
ConclusionsAlthough medical students represent a healthy young population, the physical, emotional and mental strain they are subjected to affect negatively their sexuality. Furthermore, sexual self‐awareness may negatively impact future interactions with patients with sexual dysfunctions. This cross‐sectional study is very inclusive, and demonstrated that this population is globally inexperienced. However, more studies of Portuguese population are needed in order to better understand their profile in relation to the other youngsters.
O elevado nível de exigência das escolas médicas e a luta para a aquisição de conhecimentos e competências necessárias para o atendimento ao doente podem sobrecarregar aqueles que escolheram uma carreira médica1. Os estudantes de medicina representam uma população jovem saudável em que disfunções sexuais (DS) não são esperadas. No entanto, a tensão física, emocional e mental a que são submetidos pode comprometer a sua sexualidade, numa fase da vida em que os pares experimentam o pico de atividade sexual2–5. Preocupações com a saúde sexual são relativamente comuns, surgindo em 10‐52% dos homens e em 25‐63% das mulheres6. Nesta perspetiva, há mais de 40 anos foram realizados alguns estudos com o objetivo de avaliar os níveis de ansiedade e as preocupações relacionadas com a sexualidade dos estudantes de medicina7,8. Atualmente, esta questão continua a ser ainda objeto de investigação, com a publicação de vários estudos que descrevem a vida sexual e comportamentos de risco deste grupo específico de alunos5,9–14. Destes trabalhos, pode verificar‐se que os alunos mais jovens têm menos experiência sexual do que os alunos em anos mais avançados, bem como por comparação aos médicos a realizar o internato da especialidade9,15. Além disso, estudantes do sexo feminino referem não só ter menos experiência sexual do que os homens, mas também ter relações íntimas com menor frequência. Relativamente a queixas no espetro da função sexual, as mulheres reportam com frequência dispareunia (39%), dificuldade em atingir o orgasmo (37%) e desejo sexual hipoativo (32%), enquanto os homens referem DS em 28% dos casos, sendo a queixa principal os distúrbios ejaculatórios5. Considerando a pertinência do tema, o objetivo do presente trabalho foi de analisar o comportamento sexual dos alunos, de ambos os sexos, ao longo da sua formação académica em medicina. Para além disso, procuramos avaliar a prevalência de comportamentos de risco e de DS nesta comunidade específica e determinar como o seu comportamento sexual é influenciado por determinantes socioculturais.
Materiais e métodosO estudo foi realizado na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), localizada no norte de Portugal continental. A amostra incluiu alunos dos 6 anos académicos que constituem o curso de medicina daquela faculdade. Os estudantes foram convidados a preencher um questionário sobre o comportamento de risco e sexualidade, com questões comuns e específicas para a população feminina e masculina (apêndice 1, versão portuguesa; apêndice 2, versão inglesa), o qual foi distribuído pelo representante de cada turma. A confidencialidade e anonimato foram garantidos através do uso de envelopes não identificados, que foram selados pelos inquiridos após o seu preenchimento. De forma a maximizar a taxa de participação no estudo, durante as aulas os alunos foram informados sobre a finalidade do estudo e de como iria decorrer a entrega do questionário.
Após reunião de todos os questionários, os mesmos foram analisados e, antes de se proceder à informatização dos dados, foram excluídos todos os questionários danificados e não preenchidos, questionários incompletos (menos de 50% das perguntas respondidas) e aqueles com respostas incongruentes.
Os alunos foram divididos em 3 grupos de estudo, de acordo com o ano letivo que estavam a frequentar (grupo 1: 1.° e 2.° anos; grupo 2: 3.° e 4.° anos; grupo 3: 5.° e 6.° anos). A variável satisfação sexual foi dividida em 3 categorias baseadas nas pontuações atribuídas pelos alunos: baixa satisfação sexual (0‐4), satisfação sexual intermédia (5‐7) e máxima satisfação sexual (8‐10), nas perguntas 12 e 18 dos questionários dirigidos à população feminina e masculina, respetivamente. No que respeita ao estado civil, os alunos foram considerados solteiros quando não estavam envolvidos em qualquer relação íntima e em relacionamento de longo prazo quando tinham um namorado/namorada.
A análise estatística foi realizada com recurso ao programa informático SPSS® versão 16.0 para Windows. A distribuição da frequência foi obtida para as variáveis demográficas, comportamentais e sexuais. Utilizou‐se o teste do qui‐quadrado (com correção de Yates, sempre que necessário) e a correlação de Spearman, para análise das diferenças entre variáveis categóricas e para a avaliação da associação entre 2 variáveis contínuas, respetivamente. Os resultados foram considerados estatisticamente significativos se p<0,05.
ResultadosCaracterísticas demográficas da amostraDos 861 questionários recebidos, correspondentes a 51,6% dos alunos que frequentam a FMUP, 56 questionários foram excluídos de acordo com os critérios definidos anteriormente. De entre os alunos que participaram no estudo (n=805), 35,8% foram alocados no grupo 1 (n=288), 33,2% no grupo 2 (n=267) e 31,0% no grupo 3 (n=250). A idade mediana dos participantes foi de 20 anos (pc25=19; pc75=22). Globalmente, 68,0% eram do sexo feminino (n=547) e 32,0% do sexo masculino (n=258), o que é consistente com a distribuição de géneros observada naquela faculdade. A taxa de resposta específica por género foi de 40,1 e 53,5%, para homens e mulheres, respetivamente. A maioria dos alunos era de nacionalidade portuguesa (92,2%, n=742).
Relativamente à situação conjugal, 51,1% dos participantes eram solteiros (n=410), 47,1% estavam num relacionamento de longo prazo (n=378) e 1,8% eram casados (n=15). O grupo 1 incluiu uma maior proporção de alunos solteiros em relação aos grupos 2 e 3, nos quais prevaleceram relacionamentos de longo prazo. Apenas 0,7% (n=6) dos entrevistados eram pais, dos quais 3 alunos tinham um filho e os restantes 2 filhos.
Prática e experiência sexualOs dados relativos à experiência e práticas sexuais, bem como a relação entre as variáveis e os grupos previamente definidos, são apresentados na tabela 1. Relativamente à experiência sexual, 66,1% dos participantes (n=532) tiveram algum tipo de relação sexual. Os alunos dos últimos anos (grupo 3) eram sexualmente mais ativos do que os do grupo 2 e estes, por sua vez, mais ativos do que os do grupo 1. Verificou‐se que a idade mediana da primeira experiência sexual era 17 anos (pc25=16; pc75=19), sendo a primeira experiência sexual mais precoce entre os alunos mais jovens (grupo 1), por comparação com os do grupo 2, e destes em relação ao grupo 3. Globalmente, a mediana de relações sexuais era de 2 vezes por semana (pc25=0; pc75=3) e a maioria dos estudantes tinha tido apenas um único parceiro sexual (69,8%). A prática de sexo oral e vaginal foi a mais frequente (56,2%), seguida de sexo oral, anal e vaginal (19,2%) e, por último, da prática exclusiva de sexo vaginal (18,9%). Menos comuns foram a prática exclusiva de sexo oral (2,9%), prática conjunta de sexo anal e oral (2,6%) e de sexo vaginal e anal (0,2%). A orientação sexual também foi avaliada, verificando‐se que a maioria dos estudantes era heterossexual (95,7%). Não obstante, 5,7% dos participantes (n=45) admitiu ter tido pelo menos uma experiência homossexual.
Estado civil e padrão sexual dos estudantes de medicina inquiridos, de acordo com grupo de estudo em que foram alocados (grupo 1: 1.° e 2.° anos letivos; grupo 2: 3.° e 4.° anos letivos; grupo 3: 5.° e 6.° anos letivos) e género. Os dados são apresentados em percentagem
Grupo 1 | Grupo 2 | Grupo 3 | p | Mulheres | Homens | p | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Estado civil | |||||||
Solteiro | 62,7 | 46,2 | 42,8 | <0,001* | 50,8 | 51,6 | 0,515 |
Relação longo prazo | 35,9 | 50,8 | 56,0 | 47,5 | 46,1 | ||
Casado | 1,4 | 3,0 | 1,2 | 1,7 | 2,3 | ||
Relações sexuais | 49,7 | 71,5 | 79,2 | <0,001* | 62,5 | 73,6 | 0,002* |
Idade da 1.ª relação sexual | |||||||
<15 anos | 14,9 | 9,1 | 5,6 | <0,001* | 10,5 | 7,3 | 0,028* |
15‐18 anos | 78,0 | 64,2 | 51,8 | 59,0 | 70,7 | ||
≥19 anos | 7,1 | 26,7 | 42,6 | 30,5 | 22,0 | ||
Relações sexuais por semana | |||||||
0 | 33,1 | 22,0 | 22,6 | 0,055 | 22,5 | 29,9 | 0,123 |
1 | 20,9 | 26,3 | 23,1 | 25,6 | 20,3 | ||
2 | 27,3 | 24,3 | 22,1 | 26,1 | 20,9 | ||
≥3 | 18,7 | 27,4 | 32,2 | 25,8 | 28,9 | ||
Número de parceiros sexuais | |||||||
1 | 78,3 | 67,9 | 66,0 | 0,130 | 73,4 | 63,6 | <0,001* |
2‐5 | 18,1 | 27,8 | 29,9 | 25,4 | 27,1 | ||
6‐10 | 3,6 | 2,7 | 3,6 | 1,2 | 7,1 | ||
11‐20 | 0,0 | 1,6 | 0,5 | 0,0 | 2,2 | ||
Masturbação | 40,5 | 55,9 | 50,6 | <0,001* | 32,3 | 82,9 | <0,001* |
Orientação sexual | |||||||
Heterossexual | 95,7 | 94,3 | 97,2 | 0,179 | 97,5 | 91,9 | <0,001* |
Homossexual | 1,8 | 4,2 | 1,2 | 0,6 | 6,2 | ||
Bissexual | 2,5 | 1,5 | 1,6 | 1,9 | 1,9 | ||
Experiência homossexual | 4,6 | 8,0 | 4,5 | 0,152 | 3,9 | 9,4 | 0,003* |
Práticas sexuais | |||||||
Vaginal | 17,0 | 20,4 | 18,7 | 0,613 | 21,4 | 14,3 | <0,001* |
Oral | 4,3 | 3,1 | 1,5 | 2,6 | 3,2 | ||
Vaginal + oral | 53,2 | 55,6 | 59,1 | 56,9 | 55,0 | ||
Vaginal + anal | 0,7 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 0,5 | ||
Oral + anal | 3,5 | 3,1 | 1,5 | 0,0 | 7,4 | ||
Vaginal + oral + anal | 21,3 | 17,8 | 19,2 | 19,1 | 19,6 |
Quanto à prática de masturbação e sua frequência, 48,7% reconheceu masturbar‐se (n=377). Entre eles, 41,9% faziam‐no 2‐3 vezes por semana e 3,8% 7 ou mais vezes por semana. A masturbação foi mais frequente entre os estudantes no grupo 2, seguidos pelos alunos alocados no grupo 3.
A relação entre as variáveis analisadas em função do género revelou diferenças significativas na maioria das associações (relações sexuais, idade da primeira relação sexual, número de parceiros sexuais, masturbação, orientação sexual, experiência homossexual e práticas sexuais) (tabela 1). Verificou‐se que os homens tendem a ter uma maior experiência sexual do que as mulheres e que iniciam a sua vida sexual mais precocemente (15‐18 anos de idade) relativamente às mulheres do mesmo grupo. No entanto, a proporção de mulheres que refere ter iniciado sua vida sexual antes dos 15 anos ou depois dos 19 anos de idade foi maior do que a dos homens. Na avaliação do número de parceiros, registamos uma tendência para os homens terem um maior número de parceiras sexuais do que as mulheres. No que respeita à prática de masturbação, uma maior proporção de homens assumiu masturbar‐se em relação às mulheres (82,9 versus 32,2%, p<0,001). Além disso, enquanto 43,1% dos homens admitiram masturbar‐se 2 vezes por semana, 26,5% 4‐5 vezes por semana, 24,0% uma vez por semana e 6,4% mais de 7 vezes por semana, a maioria das mulheres refere masturbar‐se uma vez por semana (51,6%), 40,4% 2‐3 vezes por semana, 7,5% 4‐5 vezes por semana e uma pequena minoria (0,5%) mais de 7 vezes por semana.
A homossexualidade foi verificada com maior frequência no sexo masculino. Além disso, apesar da maioria dos alunos ser heterossexual, à data do questionário, um maior número de alunos do sexo masculino admitiu ter tido pelo menos uma experiência homossexual. A prática de sexo oral e vaginal era a prática sexual mais comum em ambos os sexos; não obstante, os homens referem praticar sexo anal com mais frequência.
Consumo de tabaco, álcool e drogas ilícitasDe entre os inquiridos, 11,2% eram fumadores (n=90), com uma mediana de 5 cigarros diários (pc25=2; pc75=10). A idade mediana para o início do consumo de tabaco foi de 16 anos (pc25=15; pc75=18). Embora não fossem encontradas diferenças significativas para o consumo de tabaco entre os diferentes grupos (p=0,953), os homens apresentaram uma maior tendência para consumir tabaco do que as mulheres (15,5 versus 9,1%, p=0,011). Da mesma forma, indivíduos sexualmente ativos tinham uma maior tendência para o consumo de tabaco comparativamente a quem referiu nunca ter tido uma experiência sexual (14,5 versus 4,8%, p<0,001). Não foram encontradas diferenças com significado estatístico relativamente ao número de cigarros diários e idade de início do consumo de tabaco entre os 3 grupos académicos, género e atividade sexual.
O consumo regular de álcool foi referido em 62,4% (n=502) dos estudantes. Os tipos de bebidas alcoólicas consumidas com maior frequência foram as bebidas espirituosas (30,0%), seguidas do vinho, cerveja e bebidas espirituosas (24,7%), bebidas espirituosas e cerveja (23,3%), bebidas espirituosas e vinho (9,1%), unicamente cerveja (6,6%), cerveja e vinho (4,6%) e unicamente vinho (1,3%). Apesar de se ter verificado que os homens consumiam álcool com maior frequência do que os estudantes do sexo feminino (72,9 versus 57,4%, p<0,001), não se registaram diferenças significativas para o consumo de álcool entre os grupos académicos (p=0,339). Os indivíduos sexualmente ativos também apresentaram uma maior tendência para a ingestão de bebidas alcoólicas do que aqueles que negaram ter tido experiências sexuais (68,2 versus 50,9%, p<0,001). Não se observaram diferenças entre os diversos tipos de bebidas alcoólicas e os grupos académicos ou atividade sexual (p=0,482 e p=0,064, respetivamente). Contudo, as mulheres referem consumir mais bebidas espirituosas (39,5%), enquanto os homens tendem a consumir todos os tipos de bebidas com álcool (34,4%, p<0,001).
Quarenta e três alunos (5,3%) admitiram o consumo de drogas ilícitas, sendo a idade mediana para o início do consumo aos 18 anos (pc25=16; pc75=18). Verificou‐se que a marijuana era a substância mais consumida (69,4%) e, apesar do uso isolado de haxixe ser menos frequente (13,9%), o consumo combinado de marijuana e haxixe é relativamente frequente nestes universitários (16,7%). Nenhum dos alunos mencionaram o consumo de cocaína, heroína e/ou drogas alucinogénias. Os alunos do sexo masculino parecem ser mais propensos ao uso de drogas, em comparação com as mulheres (9,3 versus 3,5%, p<0,001). Não foram observadas diferenças significativas para o consumo de drogas entre os diferentes grupos académicos ou indivíduos sexualmente ativos (p=0,160 e p=0,140, respetivamente).
Disfunções sexuais masculinasA presença de DE foi referida em 7,8% (n=15) dos inquiridos que já tinham tido relações sexuais. Apenas 2 estudantes afirmaram tomar inibidores da fosfodiesterase tipo 5 (1,1%). Não foi encontrada qualquer associação entre DE e o ano académico (p=0,343), bem como DE e consumo de álcool ou de tabaco (p=0,746 e p=0,302, respetivamente). No entanto, registou‐se uma maior proporção de indivíduos com DE entre aqueles que consumiram drogas ilícitas por comparação aos que negaram o seu consumo (22,2 versus 5,9%, p=0,033).
A disfunção ejaculatória foi a DS mais referida, afetando 18,2% dos alunos (n=35), com uma frequência mediana de 3 vezes ao longo de sua vida sexual (pc25=1,3; pc75=5). Verificou‐se que a presença de disfunção ejaculatória é transversal aos 3 grupos académicos (p=0,412). A ejaculação prematura foi a DS mais comum (67,6%), com um tempo de latência ejaculatória intravaginal (IELT) mediano de 180 segundos (pc25=120; pc75=180), seguida da ejaculação retardada (20,8%), anorgasmia, anenjaculação e atraso da ejaculação associada a anorgasmia ou anenjaculação (todos com 2,9%). Apenas 3,2% dos inquiridos (n=6) referiram problemas na obtenção do orgasmo.
Disfunções sexuais femininasA dispareunia foi a DS mais frequente nas mulheres (40,8%), não sendo observadas diferenças entre os grupos académicos (p=0,388). Apesar de não se terem encontrado diferenças com significado estatístico (p=0,141), são as mulheres com menor número de relações sexuais semanais que referem dispareunia com mais frequência (44,0 e 50,0%, para nenhuma e uma relação sexual por semana, respetivamente) por comparação com as que referem ter relações sexuais 2 vezes por semana (37,9%) e 3 ou mais vezes por semana (33,3%).
A dificuldade na obtenção do orgasmo é a segunda DS mais referida (34,7%), com 38,4% das mulheres inquiridas a referir que esta situação ocorre com grande frequência, seguida da dificuldade de lubrificação durante o ato sexual (18,5%). Nenhuma destas DS apresentou diferenças significativas entre os grupos (p=0,969 e p=0,070, respetivamente).
Métodos de contraceção utilizados pelos inquiridos do sexo masculinoEmbora o preservativo tenha sido o método contracetivo mais utilizado (43,2%), sobretudo pelos alunos do grupo 1, 26,0% do total de inquiridos referiu ter tido relações sexuais ocasionalmente sem uso de preservativo (n=49; pc25=1; pc75=5). Para além do preservativo, são usados com frequência como métodos contracetivos a combinação do preservativo e contracetivo oral feminino (CO) (33,5%) e o uso isolado de CO (21,6%). Verificou‐se ainda que a utilização destes 2 últimos métodos tendem a aumentar com a progressão dos alunos para anos académicos superiores, reduzindo a utilização de preservativo (tabela 2).
Métodos contracetivos utilizados pelos estudantes de medicina do sexo masculino e respetiva satisfação sexual após entrada na universidade, de acordo com grupo de estudo em que foram alocados (grupo 1: 1° e 2° anos letivos; grupo 2: 3° e 4° anos letivos; grupo 3: 5° e 6° anos letivos). Os dados são apresentados em percentagem
Entre os inquiridos do sexo feminino pode observar‐se que relações sexuais ocasionais sem o uso de preservativo tinham ocorrido em 24,8% dos participantes (n=83; pc25=1; pc75=5), não se tendo observado diferenças quer entre os grupos académicos quer entre o estado civil (p=0,215 e p=0,308, respetivamente). O método contracetivo mais usado pelas mulheres era a combinação de preservativo e CO (44,6%), seguida pela utilização de CO (34,4%) e uso de preservativo de forma isolada (20,1%), sendo este último mais frequente nos indivíduos do grupo 1 (tabela 3). Dois dos participantes mencionaram o uso de outros métodos contracetivos (0,6%) e outro estudante referiu não utilizar quaisquer tipos de contracetivos (0,3%). Tal como verificado nos alunos do sexo masculino, o uso do CO e a combinação de preservativo e CO aumenta à medida que os estudantes do sexo feminino progridem para anos letivos superiores.
Métodos contracetivos utilizados pelos estudantes de medicina do sexo feminino e respetiva satisfação sexual após entrada na universidade, de acordo com grupo de estudo em que foram alocados (grupo 1: 1.° e 2.° anos letivos; grupo 2: 3.° e 4.° anos letivos; grupo 3: 5.° e 6.° anos letivos). Os dados são apresentados em percentagem
Verificou‐se que 29,2% das mulheres já tinha recorrido à pílula anticoncecional de emergência (n=98), com uma utilização mediana de 2 vezes (pc25=1; pc75=2). Não foram encontradas diferenças significativas no que se refere ao recurso à pílula anticoncecional de emergência entre os grupos (p=0,130), assim como não se encontrou quaisquer associações entre o uso contracetivo e os diferentes métodos de contracetivos ou com a prática ocasional de relações sexuais sem uso de preservativo (p=0,275 e p=0,331, respetivamente). Apenas 2 estudantes referiram ter recorrido a interrupção voluntária da gravidez (0,6%), ambos os casos uma única vez.
Nível de satisfação sexual referido pelos inquiridos do sexo masculinoOs participantes também foram questionados acerca da sua satisfação sexual, tendo 51,9 e 38,8% dos inquiridos referido um nível de satisfação máxima e intermédia, respetivamente, enquanto 9,3% indicaram baixa satisfação sexual. A satisfação sexual não foi estatisticamente diferente entre os 3 grupos académicos (p=0,231).
Em geral, 81,1% dos estudantes afirmou que sua atividade sexual melhorou após ter iniciado o ensino universitário (n=142), mas foi entre os estudantes mais velhos (grupos 2 e 3) que se verificou a maior proporção relativa à melhoria da sua atividade sexual (tabela 2).
Nível de satisfação sexual referido pelos inquiridos do sexo femininoNo que respeita à perceção da primeira relação sexual, 76,5% classificaram‐na como normal, 15,4% como tendo ultrapassado as suas expetativas e 8,1% como uma experiência traumática, não se tendo verificado diferenças significativas entre os 3 grupos de estudantes (p=0,461). Entre as mulheres inquiridas, 53,2% afirmaram ter uma satisfação sexual máxima, 39,0% um nível intermediário e 7,8% referiram baixa satisfação sexual. Igualmente, também não foram observadas diferenças ao longo dos anos académicos (p=0,141). Globalmente, 76,9% dos estudantes do sexo femininos afirmou que sua vida sexual melhorou depois de entrar na universidade (n=225), sendo esta melhoria referida sobretudo entre os estudantes mais velhos (grupos 2 e 3) (tabela 3).
Estado civilDe acordo com o descrito na tabela 4, o estado civil influenciou a maioria das variáveis estudadas. Assim, verificou‐se que os estudantes casados são sexualmente mais ativos relativamente àqueles com relacionamentos de longo prazo, e estes, por sua vez, mais ativos do que os solteiros. O mesmo pode verificar‐se em relação ao número médio de relações sexuais por semana. Por outro lado, o número de parceiros sexuais foi menor entre os estudantes casados, seguidos por aqueles em relacionamentos de longo prazo. Além disso, a idade da primeira relação sexual foi superior nos estudantes casados, por comparação quer com os que têm um relacionamento de longo prazo quer com os solteiros.
Comportamento sexual dos estudantes de medicina inquiridos em função com o seu estado civil (solteiros, num relacionamento de longo prazo e casados). Os dados são apresentados em percentagem
Solteiros | Relacionamento de longo prazo | Casados | p | |
---|---|---|---|---|
Relações sexuais | 44,6 | 88,1 | 100,0 | <0,001* |
Idade da 1.ª relação sexual | ||||
<15 anos | 11,0 | 8,9 | 0,0 | <0,001* |
15‐18 anos | 62,6 | 64,8 | 33,3 | |
≥19 anos | 26,4 | 26,3 | 66,7 | |
Relações sexuais por semana | ||||
0 | 63,5 | 5,5 | 0,0 | <0,001* |
1 | 14,9 | 29,2 | 7,1 | |
2 | 12,2 | 29,4 | 57,2 | |
≥3 | 9,4 | 35,9 | 35,7 | |
Número de parceiros sexuais | ||||
1 | 57,6 | 75,7 | 93,3 | <0,001* |
2‐5 | 36,3 | 21,3 | 0,0 | |
6‐10 | 5,0 | 2,7 | 0,0 | |
11‐20 | 1,1 | 0,3 | 6,7 | |
Sexo masculino | ||||
Satisfação sexual | ||||
Baixa | 18,8 | 1,9 | 0,0 | <0,001* |
Intermédia | 51,2 | 33,0 | 0,0 | |
Máxima | 30,0 | 65,1 | 100,0 | |
Métodos contracetivos | ||||
Preservativo | 66,2 | 26,3 | 16,6 | <0,001* |
Contracetivo oral | 5,0 | 32,3 | 66,7 | |
Preservativo + contracetivo oral | 28,8 | 39,4 | 0,0 | |
Outro | 0,0 | 1,0 | 16,7 | |
Nenhum | 0,0 | 1,0 | 0,0 | |
Sexo feminino | ||||
Satisfação sexual | ||||
Baixa | 20,0 | 2,3 | 11,1 | <0,001* |
Intermédia | 57,0 | 31,2 | 22,2 | |
Máxima | 23,0 | 66,5 | 66,7 | |
Métodos contracetivos | ||||
Preservativo | 23,5 | 18,8 | 12,5 | <0,001* |
Contracetivo oral | 15,7 | 42,6 | 50,0 | |
Preservativo + contracetivo oral | 60,8 | 38,2 | 12,5 | |
Outro | 0,0 | 0,4 | 25,0 | |
Nenhum | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Em ambos os sexos, pode verificar‐se que o casamento se associa a uma taxa mais elevada de satisfação sexual do que um relacionamento de longo prazo. Relativamente à utilização de contracetivos, o uso de CO foi superior entre os indivíduos com um relacionamento de longo prazo por comparação aos solteiros, tendo‐se verificado o inverso para o uso de preservativo. Não se constataram diferenças significativas relativamente ao uso da pílula anticoncecional de emergência entre os diferentes estados civis (p=0,256). Para ambos os sexos também não foram encontradas dissemelhanças entre os estados civis e relações sexuais ocasionais sem uso de preservativo (p=0,316 e p=0,308, para inquiridos do sexo masculino e feminino, respetivamente).
DiscussãoO presente estudo transversal, realizado numa amostra de grande dimensão e abrangente, incluindo não só a avaliação do comportamento sexual, mas também de DS e de comportamentos sociais de risco, permite‐nos ter uma visão mais ampla do perfil do estudante de medicina. Tanto quanto é do nosso conhecimento, este é o primeiro estudo relativo à sexualidade dos estudantes de medicina portugueses.
Em Portugal, os candidatos ao curso de medicina são alocados em uma das 8 escolas médicas do país, de acordo com o numerus clausus (número máximo de alunos que podem integrar o 1.° ano do curso de cada instituição de ensino superior). Por este motivo, a integração num curso de medicina implica que os estudantes sejam detentores de resultados académicos de elevado nível durante o ensino secundário. De uma forma geral, estes alunos apresentam um comportamento particularmente competitivo e obsessivo, o que pode comprometer o estabelecimento de relacionamentos sexuais saudáveis. Efetivamente, o presente estudo corrobora resultados prévios de outros autores, na medida em que indica um início tardio da vida sexual destes jovens, em comparação com os pares na população em geral5,7,9,15–17. Apesar da percentagem dos estudantes universitários que não tiveram qualquer tipo de atividade sexual ser semelhante à verificada por Daniyam et al. em estudantes de medicina na Nigéria (33,9 versus 38,0%), ela é superior à descrita noutros estudos quer europeus quer americanos, mas muito inferior à inexperiência sexual verificada em estudantes de medicina chineses (menos de 1% tinha iniciado atividade sexual)5,9,13,18. Por outro lado, o fato da idade da primeira relação sexual ser mais precoce nos estudantes mais jovens, revela uma tendência das gerações mais jovens para iniciar a atividade sexual mais cedo, o que sugere que o comportamento sexual nesta população universitária pode estar a mudar.
Globalmente, este trabalho demonstra que os alunos do sexo masculino são sexualmente mais emancipados, uma vez que iniciam a sua atividade sexual numa idade mais jovem e referem ter mais parceiros do que os pares do sexo feminino, o que reforça a influência sociocultural no comportamento sexual na dependência do género. No que respeita à orientação sexual, a homossexualidade é mais frequente nos homens do que nas mulheres (6,2 versus 0,6%, respetivamente), predomínio que é concordante com a maioria dos relatórios existentes (4‐5% para os homens e 2‐3% para as mulheres)19–21. No entanto, quando estes dados são comparados com os da população portuguesa, a homossexualidade masculina é reconhecida numa proporção semelhante (6,2 versus 6,4%), mas a homossexualidade feminina em proporções muito inferiores (0,6 versus 5,6%)22,23. A maior prevalência da prática conjunta de sexo vaginal e oral, referida pelos estudantes de ambos os sexos da nossa amostra, é consistente com outros estudos24,25. Não obstante, os homens referem praticar sexo anal com mais frequência do que as mulheres, o que pode estar relacionado com o fato dos inquiridos do sexo masculino serem sexualmente mais ativos e desde uma idade mais jovem, mas também à existência de um maior número de homossexuais masculinos.
A masturbação, de uma forma geral, é admitida em maior proporção pelos alunos mais jovens, o que pode ser reflexo da sua insegurança e menor experiência sexual, já que 50,3% dos alunos mais jovens referiu não ter qualquer experiência sexual. A masturbação foi maioritariamente referida pelos estudantes do sexo masculino, que é consistente com o início mais precoce da atividade sexual no sexo masculino. Por oposição, menor proporção de mulheres participantes neste estudo referiu masturbar‐se, o que discorda com resultados de outros trabalhos (32,3% versus 70,5‐90,0%)5,9. Este fato poderá ser devido à omissão da sua prática e/ou a aspetos culturais da sociedade em que estes indivíduos estão integrados.
Em comparação com resultados obtidos em estudantes de medicina americanos, os homens da nossa amostra referem menores taxas de DE (7,8 versus 28,0%), dificuldade em atingir orgasmo (3,2 versus 11,0%) e disfunção ejaculatória (18,2 versus 28,0%)5. Em relação à população portuguesa, estes estudantes apresentam também uma menor incidência de DE (7,8 versus 12,9%), mas uma proporção superior de disfunção ejaculatória (18,2 versus 11,6%). No entanto, a prevalência de disfunção ejaculatória é semelhante à verificada em indivíduos entre os 18 e os 24 anos do estudo Premature Ejaculation Prevalence and Attitudes survey (PEPA) (18,0%)22,26. Não obstante, sendo a mediana do IELT superior ao limite estabelecido para a definição desta DS (120 segundos), pode afirmar‐se que poderá não ser uma verdadeira disfunção ejaculatória, mas sim uma disfunção ejaculatória do tipo prematura. Apesar da baixa incidência de DE nos estudantes de medicina portugueses, naqueles que a referem verifica‐se uma elevada percentagem de consumidores de drogas ilícitas. Embora existam resultados controversos relativos ao papel da marijuana na promoção da DE, os resultados obtidos neste estudo suportam a possível associação entre o consumo de cannabis e o desenvolvimento de disfunção endotelial em adultos jovens27,28.
Neste trabalho verificou‐se uma maior prevalência de DS nas mulheres do que nos homens, tal como evidenciado na maioria dos estudos. No entanto, as DS femininas divergem em função da população estudada. Por exemplo, Shindel et al. demonstraram igualmente numa população de estudantes de medicina taxas semelhantes de dispareunia (40,8 versus 39,0%) e de dificuldade em atingir o orgasmo (34,7 versus 37,0%), mas uma menor proporção de mulheres com problemas de lubrificação (18,5 versus 26,0%)5. No entanto, quando comparamos os resultados obtidos na nossa amostra com os observados na população portuguesa, estas estudantes revelaram taxas semelhantes na dificuldade em atingir o orgasmo (34,7 versus 31,6%), menos problemas de lubrificação (18,5 versus 31,6%) e uma percentagem mais elevada de dispareunia (40,8 versus 34,1%)23. No entanto, deve ressalvar‐se que a idade média das mulheres incluídas no estudo população portuguesa é 44 anos, pelo que as diferenças relativas à falta de lubrificação poderão dever‐se à faixa etária, já que esta DS é sobretudo reportada por mulheres após a menopausa23. Por outro lado, a maior prevalência de dispareunia na nossa amostra é consistente com o observado por Christensen et al. em mulheres dinamarquesas com idade inferior a 30 anos29. Esta observação reflete as dificuldades sexuais com que as mulheres jovens se deparam numa fase da vida caracterizada pela experimentação sexual e nenhum parceiro sexual estável.
No que concerne a métodos contracetivos, a maioria dos estudantes da nossa amostra escolhe o preservativo ou a combinação da utilização do preservativo e CO, numa proporção consideravelmente mais elevada do que o verificado noutras populações de estudantes de medicina5,9,11,12. O número de alunos do sexo masculino que referem utilizar unicamente o preservativo é semelhante ao verificado por Rowen et al. (43,2 versus 49,7%), enquanto a utilização combinada do preservativo e CO é bastante superior (33,5 versus 19,7%) e o uso isolado de CO menos frequente (21,6 versus 33,7%)12. Já nas mulheres, o uso combinado de preservativo e CO é muito superior ao verificado no estudo acima (44,6 versus 17,2%), mas a utilização isolada quer do preservativo quer de CO inferior (20,1 versus 40,2% e 34,4 versus 41,0%, respetivamente)12. Assim, dada a elevada prevalência da utilização do preservativo e do uso combinado deste com CO, a nossa população de estudantes de medicina parece estar melhor protegida de doenças sexualmente transmissíveis, assim como de uma eventual gravidez não desejada. No entanto, um aspeto interessante encontrado no comportamento sexual destas mulheres relaciona‐se com o uso excessivo da pílula anticoncecional de emergência, sobretudo quando estes dados são comparados com os dados estatísticos da população espanhola, onde apenas 0,7% das mulheres entre os 16 e os 29 anos recorreu à contraceção de emergência nos últimos 12 meses (dados publicados em 2011)30. Este resultado foi inesperado, na medida em que cerca de metade dos estudantes afirmou usar um método duplo de contraceção. Para além disso, é também possível que os métodos anticoncecionais não estejam a ser utilizados corretamente, uma vez que não seria de esperar uma proporção tão expressiva de contraceção de emergência numa população altamente informada como os estudantes de medicina. No entanto, noutros países, as mesmas questões têm sido levantadas acerca do abuso ou uso indevido destes fármacos que não exigem prescrição médica. Por exemplo, na Suíça, o livre acesso à contraceção de emergência não tem qualquer impacto no comportamento contracetivo regular nem dá origem a uma menor utilização de métodos contracetivos eficazes31. Tal como na nossa população, a utilização combinada de pílula e preservativo é muito elevada (cerca de 85%), sendo o recurso à contraceção de emergência usado sobretudo como um método adicional de segurança e, raramente, no contexto duma relação sexual desprotegida31.
Relativamente à satisfação sexual observada na nossa amostra de estudantes, esta é superior à verificada na população geral americana5,9. Por oposição aos estudos de Shindel et al. e de Fickweiler et al., os estudantes do sexo feminino afirmam maior satisfação sexual do que os homens5,9. Efetivamente, o fato dos estudantes referirem ter um relacionamento de longo prazo influencia o seu comportamento sexual, designadamente referindo ter maior atividade sexual, taxas mais elevadas de satisfação sexual e um menor número de parceiros sexuais.
Quanto a comportamentos sociais de risco, em ambos os sexos regista‐se uma menor prevalência de fumadores em relação à população portuguesa em geral (15,5 versus 36,1% e 9,1 versus 20,6%, para homens e mulheres, respetivamente)22,23. No entanto, no que se refere à ingestão de bebidas alcoólicas, registam‐se quer diferenças entre sexos na nossa população quer entre esta e a população portuguesa em geral: os alunos do sexo masculino consomem menos bebidas alcoólicas (72,9 versus 82,0%), enquanto nas mulheres a prevalência de consumo de álcool é superior (57,4 versus 27,6%)22,23.
Este estudo apresenta algumas limitações. De fato, apesar de ter sido pedido o anonimato e ter sido garantida a confidencialidade das respostas aos questionários, as mesmas podem ter sido dadas de acordo com o que é considerado socialmente aceitável. Para além disso, desconhece‐se o perfil dos alunos que não quiseram participar no estudo ou cujos questionários foram excluídos. Salienta‐se também o fato deste estudo ter sido apenas realizado numa única instituição de ensino médico, o que não permite extrapolar ou generalizar os resultados para todos os estudantes de medicina portugueses.
Os resultados deste estudo revelam alguns aspetos relativos à sexualidade dos estudantes de medicina, constituindo uma base sólida para estudos futuros nesta área. Na amostra de estudantes de medicina que analisamos verifica‐se que duma forma geral estes iniciam a sua atividade sexual mais tardiamente, apesar de existirem já indícios que este padrão pode estar a alterar‐se na medida em que os alunos mais jovens referem um início comparativamente mais precoce. Os estudantes do sexo feminino da nossa amostra afirmam ser mais inexperientes, mas simultaneamente apresentam maior prevalência de DS em relação ao verificado no sexo oposto. Além disso, também é na população feminina que se verifica uma maior sensibilização relativamente à utilização de métodos contracetivos, mas paradoxalmente um maior recurso à pílula de contraceção de emergência, o que revela a insegurança destas mulheres.
Urge a realização de um estudo sobre o comportamento sexual de homens e mulheres portuguesas de diferentes idades, o qual irá permitir aferir com rigor o perfil sexual dos estudantes de medicina com a população geral.
Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animaisOs autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.
Confidencialidade dos dadosOs autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.
Direito à privacidade e consentimento escritoOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
Conflito de interessesOs autores declaram não haver qualquer tipo de conflito de interesses.
Os autores agradecem ao Dr. Silvio Bollini por disponibilizar o questionário utilizado neste estudo.